O verde produtivo na AMP no horizonte 2020
1. Nota Introdutória[1]
Valorizar a importância dos espaços verdes - produtivos ou não - nas áreas
metropolitanas, parece hoje consensual. No entanto, quando em 1990, Bernard
kaiser (1926 - 2001) publicou o livro La renaissance rurale, ou ainda quando,
por exemplo, Pierre Donadieu e André Fleury, em 1997[2], descolam dos antigos
conceitos que consignavam e remetiam a prática agrícola em territórios de
matriz urbana para os espaços periurbanos, excluindo-a das malhas mais densas e
consolidadas, reservadas a parque e jardins separando, portanto, os parâmetros
estéticos e ambientais dos produtivos, para colocar o acento tónico no carater
multifuncional e integrador da pratica agrícola, estava-se longe de antever a
panóplia de artigos científicos, de revistas da especialidade que se publicam
regularmente, de seminários ou congressos que discutem o tema, ou da existência
de planos "urbanos" que recentemente convergem na assunção da
importância do verde agrícola em territórios de elevada densidade populacional.
Qualquer sinopse bibliográfica releva não só a multiplicidade de escalas de
análise, indo da articulação e coerência da estrutura verde da grande
metrópole, à casuística das experiencias de implementação de hortas urbanas,
mas também as diversificadas perspetivas no tratamento do tema e que nem sempre
se vinculam ou encerram na estrita formação disciplinar dos autores. Em todo o
caso, parece não ser já mais possível a disjunção entre a proteção e
conservação ambiental, as cambiantes estéticas e paisagistas e o contributo
para a produção alimentar. Ainda que para Donadieu (2012) a concretização da
"agropolia", nos seus múltiplos enlaces enquanto fusão territorial
que descola da cidade e do campo tradicional, criando uma nova textura
territorial mais fragmentada, complexa e plástica do território, pouco mais
seja ainda que uma utopia.
2. As condicionantes
O complexo agroflorestal é talvez aquele que, no domínio dos sistemas
produtivos de criação de valor, está mais condicionado por decisões que são
estranhas à nossa soberania. As políticas de incentivos e preços são
essencialmente determinadas pela PAC. E é a ela que temos que recorrer para
entender o sector nas duas últimas décadas, como é a ela que nos temos que
reportar, para tentar vislumbrar as tendências de curto e médio prazo.
Em 2011, foi apresentada a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do
Conselho, relativo ao apoio ao Desenvolvimento Rural pelo FEADER. Nela se
destacavam, enquanto fins, promover uma produção alimentar viável, uma gestão
sustentável dos recursos naturais e ações climáticas e um desenvolvimento
territorial equilibrado. O acordo político sobre a reforma da PAC (Comissão,
Conselho e Parlamento Europeu) foi conseguido em Setembro de 2013, nele se
consagrando dois pilares fundamentais, o primeiro relativo aos pagamentos
diretos e medidas de mercado e, o segundo, relativo ao desenvolvimento rural.
É, então, também crucial escrutinar ainda o Programa de desenvolvimento rural
2014 - 2020, documento de orientação (GPP / Ministério da Agricultura, do
Mar, do Ambiente e do Ordenamento do território), o qual pretende explicitar,
em consonância, os parâmetros fundamentais de sistematização de políticas
públicas.
Na parte III do documento, relativa à visão estratégica, salientam-se como
objetivos a atingir a autossuficiência, em valor, do sector agroalimentar em
2020 promovendo a sustentabilidade de todo o território nacional, valorizando a
produção de bens transacionáveis e bens públicos.Depois, remetendo para o
regulamento de desenvolvimento rural, pretende-se:
1 -Promover a transferência de conhecimentos e a inovação nos sectores agrícola
e florestal e nas zonas rurais;
2 - Melhorar a competitividade de todos os tipos de agricultura e reforçar a
viabilidade das explorações agrícolas;
3 - Promover as cadeias alimentares e a gestão do risco na agricultura;
4 - Restaurar, preservar e melhorar os ecossistemas que dependem da agricultura
e das florestas;
5- Promover a utilização eficiente dos recursos e apoiar a passagem para uma
economia debaixo teor de carbono e resistente às alterações climáticas nos
sectores agrícola, alimentar e florestal;
6 - Inclusão social, a redução da pobreza e o desenvolvimento económico das
zonas rurais.
Acresce ainda a elevada espessura jurídica que regula o sector, fileira a
fileira, mesmo no quadro da legislação portuguesa decorrente ou não dos
imperativos da aplicação da PAC. Recorde-se, exemplificando para o caso das
fileiras competitivas de matriz produtivista, o decreto-lei nº 96 /2013 que
regula as arborizações e rearborizações de cariz florestal - a acrescentar aos
planos específicos como são os casos dos planos regionais de ordenamento
florestal ou dos planos de gestão florestal - a prolixa regulação jurídica que
formata a fileira vitícola, neste caso e neste aspeto, num território
inteiramente sob tutela do organismo interprofissional que é a Comissão de
Viticultura da Região Demarcada dos Vinhos Verdes, as medidas e programas que
condicionam a fileira do leite, nomeadamente o sistema de licenciamento ou
ainda, para os casos dos sistemas produtivos tradicionais ou mais extensivos, a
regulação ambiental e o conglomerado de políticas direcionadas para os
territórios com debilidades produtivas específicas, nomeadamente onde dominam
os sistemas mais frágeis de socalcagem, por regra a cotas intermédias, ou de
pecuária extensiva, em áreas serranas.
O sector depende também muito de conjunturas económicas ou financeiras que, no
essencial, lhe são estranhas e reage mimeticamente, com algum atraso,
relativamente a outros onde a mudança é bem mais rápida. A dependência dos
preços internacionais, sobretudo nos consumos intermédios, é elevada nalgumas
fileiras, a exemplo da do leite, suinicultura e avicultura intensiva e, mesmo
as que operam essencialmente no mercado interno, estão também muito dependentes
da fraca elasticidade da procura. No entanto, as regras excessivamente
restritivas na esferas da comercialização e consumo, que incidiam sobretudo
sobre as pequenas e muito pequenas explorações agrícolas, tendem a ser
mitigadas, o que favorecerá a produção familiar e os mercados de proximidade,
além das diversas modalidades de turismo em espaço rural. Primeiro foi, em
2009, a maior maleabilidade na calibragem de hortofrutícolas e, em 2013, a
possibilidade de abate de animais para autoconsumo, estendendo-se também ao
respeito pelas formas tradicionais, desde que associadas a conteúdos imateriais
(festa da matança do porco, etc.).
O quadro territorial na AMP e respetivas dinâmicas são específicos e não
decorrem de tendências gerais que se possam verificar ao nível do país. Não
será nela que vão surgir os milhares de hectares de regadio intensivo, nem se
podem esperar mudanças de fundo num território onde é diminuta a população
agrícola familiar, ou pouco significativo o valor da produção no produto bruto
agrícola nacional, o que não lhe retira a dilatada importância que tem - e terá
- na qualificação da paisagem, na conservação do património biofísico ou na
preservação dos recursos naturais.
3. Caracterização de síntese
Pese embora a sua progressiva redução recente, ainda que não muito
significativa, comparativamente com territórios pouco urbanizados e de matriz
essencialmente rural, como sucede na metade interior do país, os sistemas agro-
silvo-pastoris, suportados em espaços florestais e agroflorestais, continuam a
ter na AMP uma dimensão espacial elevada (cerca de 1500 Km ²), o que
transparece quer na taxa de cobertura florestal (Fig._1), quer na dimensão da
SAU (cerca de 30 mil hectares) das explorações agrícolas. As florestas e os
meios naturais e seminaturais representavam, em 2007, mais de metade da
ocupação do solo (54,1 %), enquanto as áreas agrícolas e agroflorestais e matos
abrangem cerca de 1/5 (21,7%).
A redução do número total de explorações agrícolas, assim como da dimensão da
população agrícola familiar, marcam não só um processo de desruralização, que
se intensificou a partir do último quartel do século passado, mas também uma
alteração com significado no perfil produtivo, dado que se conjugaram, ou
decorrerem de forma simultânea, diversos fatores. Talvez o de maior impacte
tenha sido o processo de urbanização extensiva que se consubstanciou em
morfologias predadoras / consumidoras de solo agrícola ou florestal e que
acelerou nos últimos 20 anos, sendo particularmente intenso quer nos
territórios adjacentes à urbanização já anteriormente consolidada, quer nas
áreas de urbanização difusa, territorialmente mais excêntricas. Aparentemente
esta 'voracidade' está já a diminuir, particularmente desde a crise
financeira e especulativa internacional de 2008 e, tenderá a diminuir no futuro
próximo (Fig.2).
A redução do número total de explorações agrícolas na AMP (RA,1999/2009)
acompanhou a tendência genérica que se registou para o Continente,
respetivamente menos 31 % e 27%, o mesmo tendo ocorrido em relação às
superfícies totais de SAU, no primeiro caso com uma perda de 5 % e, no segundo,
de 6%. No entanto, se se considerar a dimensão da superfície total das
explorações agrícolas evidencia-se claramente um comportamento distinto. É que,
enquanto no Continente a diminuição foi apenas de 9 %, já na AMP esta perda
sobe para os 24 %, sendo particularmente significativa, aproximando-se da
metade do total, nos municípios de Oliveira de Azeméis (41 %), Valongo (44%) e
Gondomar (44%).
Correlativamente, o peso relativo da população agrícola familiar (RA, 1999/
2009) na população total residente (Censos 2001/2011) reduziu-se de 2,6 % para
apenas 1,5%, tendência semelhante à que ocorreu nas áreas mais densamente
urbanizadas do Continente. Atualmente, tem ainda alguma expressão nos
territórios mais excêntricos situados a Sul da AMP, onde o processo de
desruralização foi mais tardio, a exemplo de Arouca (15,5 %), a que se segue
Vale de Cambra com 10,3%, ainda assim, valores a creditar essencialmente às
freguesias mais interiores e de características serranas destes municípios,
onde se ultrapassam os 20 %. Ao invés e, sintomaticamente, já não se atinge
sequer 1% em todos os municípios coalescentes com a cidade do Porto. Em termos
absolutos, a população agrícola familiar passou de 44847 para 26 145 pessoas, o
que significa uma quebra de 41,7 %, tendo sido particularmente considerável nos
municípios de Oliveira de Azeméis (57,1 %), St Maria da Feira (51,8 %) e Vale
de Cambra (49,8 %), onde caiu para cerca de metade (Fig.3).
Os sistemas produtivos agroflorestais de raiz camponesa foram-se esbatendo,
sendo agora tendencialmente menos importantes, sendo eles que explicam a
redução da SAU, ao mesmo tempo que as explorações agrícolas
'produtivistas' se foram destacando, nomeadamente nas fileiras do
leite, da horticultura, da viticultura e da floresta de produção. A estrutura
de pluriatividade e plurirrendimento de dominância camponesa, até agora
preponderante, tenderá também a diminuir em termos de peso relativo, não só
pela extinção das explorações, como também pela chegada de um novo paradigma
demográfico, também aos "campos", e que se traduz já por uma forte
redução da natalidade.
Conjugando a dimensão da redução do número total das explorações agrícolas e da
respetiva SAU, resulta um aumento claro das áreas médias de SAU, dado que a
extinção incidiu sobretudo nas pequenas ou muito pequenas explorações. No
entanto, o padrão territorial não se alterou (Fig._2). As áreas médias de SAU
mais elevadas creditam-se aos territórios da bacia leiteira primária do
Noroeste (Póvoa de Varzim na "terra preta", Maia, Matosinhos, Trofa
e, particularmente, Vila do Conde que passou de 6,9 para 8,9 ha) e, as mais
baixas, aos restantes, por regra entre 2 e 3 ha, exceção feita ao de Arouca
onde a SAU média por exploração quase duplicou (passou de 2,4 para 4 ha) em
virtude da forma de contabilização das pastagens pobres de montanha (a
superfície de prados e pastagens permanentes passou de 1331 ha, em 1999, para
2602 ha, em 2009, representando agora mais de metade da SAU).
Ainda que a pluriatividade, e sobretudo o plurirrendimento, expliquem a
sobrevivência de uma boa parte das pequenas e muito pequenas explorações
agrícolas não especializadas e com forte componente de autoconsumo, por regra
com trabalho a tempo parcial face à sua reduzida dimensão e, embora continue a
dominar o trabalho de origem familiar, mesmo nas de maior dimensão física, o
que parece ser estrutural, a composição do plurirrendimento tende a bifurcar-se
aumentando o seu peso relativo nas situações extremas. Deve relevar-se neste
caso (RA, 1999/2009) não só o aumento em números absolutos da forma jurídica
"sociedades agrícolas", que passou de 174 para 208, ao contrário do
que ocorreu nos produtores singulares, mas também o facto de nestes últimos o
peso relativo da fonte de rendimento dos respetivos agregados domésticos
proveniente exclusivamente da exploração agrícola ter diminuído ligeiramente em
termos absolutos, mas crescido em termos relativos, passando de 7,2% para 8,8%.
Territorialmente, o plurirrendimento mantém-se estável na maior parte dos
municípios, à exceção dos incluídos na bacia leiteira primária do Noroeste, a
que se acrescenta a faixa hortícola litoral da Póvoa de Varzim, onde o número
de explorações em que a fonte de rendimento do agregado doméstico do produtor
singular proveniente exclusivamente da exploração é mais significativo (Fig.4).
Em síntese, o essencial do VAB na agricultura, mas também o peso relativo no
produto bruto agrícola está a transferir-se para empresas a operar no sector.
Apesar da redução total do número de explorações entre os momentos censitários
de 1999 e 2009, aumentou em valores absolutos o número de empresas e também as
que têm contabilidade organizada, o que indica a tendência para a
mercantilização das explorações, agora com maiores enlaces financeiros a
montante e a jusante, incluindo os serviços de apoio à produção e onde a
inovação, nomeadamente no domínio da biotecnologia, é fundamental.
No entanto, tal não significa que não despontem claramente no sector,
nomeadamente na horticultura intraurbana, ou nas periferias de montanha,
sistemas produtivos mais brandos com algum significado e que devem ser
estrategicamente potenciados.
A multifuncionalidade na exploração tem uma importância praticamente
despicienda na AMP, existindo apenas pouco mais de uma centena com atividades
lucrativas não agrícolas, mais de metade no domínio da prestação de serviços, e
somente os municípios de Arouca (25) e St Maria da Feira (25) merecem registo.
Ainda assim, é provável que se assista a um aumento, num futuro próximo,
assumindo provavelmente pelo menos quatro modalidades distintas. A primeira,
quando se trata de territórios de matriz camponesa com formas de organização de
trabalho tradicional (calendário agrícola) e uma estética rural marcante (campo
prado, sistemas de condução e armação da vinha mais antigos, a exemplo do
enforcado, bouças, etc.) ou confinem valores de memória (azenhas, trabalho do
linho, etc.), a segunda, essencialmente nos territórios de renaturalização,
mais próximos dos valores inerentes ao "ícone" natureza, menos
densos e onde prevalecem os sistemas agro -silvo -pastoris de transição para ou
mesmo de montanha, o terceiro associado ao enoturismo nas explorações com
alguma dimensão e onde domina a monocultura da vinha associada a "vinhos
de quinta" pela 'liturgia organolética' que lhe está
associada e, por fim, nos territórios intercalares em malhas urbanas mais
densas, a fruição de "bosques" requalificados por intervenções de
desenho e impacte biofísico minimalistas, ainda que organizadas com dimensão
suficiente de suporte à biodiversidade, o que poderá contribuir para esbater a
tendência de criação de grandes parques urbanos de feição oitocentista.
4. Esboço e tipificação do modelo territorial no curto prazo e dos principais
sistemas produtivos que lhes estão associados
Deve-se, em primeiro lugar, assumir que a gradação da intensidade dos
diferentes sistemas produtivos, nomeadamente no que respeita à maior ou menor
pressão sobre os solos, ou de um modo geral, aos níveis de consumo de recursos
não renováveis continuará a ser diversificada, embora diferente da atual.
Assim, caminhando dos valores mais suaves para os mais acentuados:
i -Territórios de "interdição"
São essencialmente as áreas vulneráveis e de maior risco ambiental, a exemplo
dos cordões dunares da costa atlântica, lagoas e áreas húmidas de interesse
biofísico evidente, leitos de inundação dos rios, ou também a prática eco -
condicionada da agricultura, a fim de proteger os sistemas frágeis de montanha
(nascentes, manutenção dos fluxos de biodiversidade, etc.), sendo ainda
necessário promover a compatibilização com a Estrutura Ecológica do Arco
Metropolitano do Noroeste, definida no PROT Norte.
ii - Territórios de "renaturalização"
Circunscrevem as áreas de características mais rurais, com baixas densidades
populacionais, mais excêntricas e com uma morfologia serrana, onde a ocupação
do solo remete, em grande medida, para a gestão de matos e florestas e para a
manutenção de práticas agropecuárias de baixa intensidade. A elevada espessura
temporal do "isolamento" permitiu marcas de identidade paisagística
a relevar de forma qualitativa e que remetem para uma substância não
quantificável porque radicadas em valores de assunção coletiva de base
imaterial, de memórias e de representações idiossincráticas, mais ou menos
locais, ou seja, de elementos de identidade, até porque experiências recentes
têm demonstrado que uma boa parte delas são facilmente rendibilizáveis. As
"marcas" diferenciadoras implicam a orientação do VAB não só para a
produção florestal, como também para a valorização de saberes e sabores
tradicionais, em parte através das IGP (indicação geográfica protegida), das
DOP (denominação de origem protegida) ou ETG (especialidade tradicional
garantida). Importa a manutenção da estabilidade formal e estética da paisagem,
fundindo a componente produtiva agroflorestal com as questões ambientais.
iii - Novos territórios de amenidade e dominância do verde produtivo
Parece já evidente, a revitalização da agrícola, antes com configuração
territorial periurbana, através de fomento de práticas de agricultura de
proximidade, densificando um verde urbano produtivo. As explorações serão
sempre de pequena dimensão, empresariais ou de "lazer",
essencialmente centradas na horticultura, mercantilizadas e interiorizando
sistemas de distribuição diferentes conforme a dimensão. Tal possibilitará
recuperar parte da atual superfície agrícola, estatisticamente definida como
não utilizada, mas também espaços anteriormente expectantes da urbanização.
Enquanto as hortas urbanas adquirem uma configuração mais pontualizada (muitas
são de iniciativa municipal) esta prática agrícola de proximidade (biológica ou
tradicional) tenderá a se mais pulverizada.
iv - Territórios de dominância das fileiras produtivas intensivas
Ao contrário dos sistemas anteriores, apresentam uma acentuada concentração
produtiva e um confinamento e compartimentação espacial mais evidente. Com uma
maior produtividade do trabalho e um elevado rendimento por ha, possuem índices
de motorização que atingiram já os patamares adequados de economias de escala.
Estas explorações especializadas são cada vez mais de cariz empresarial, embora
de estrutura familiar na distribuição do trabalho. Tendo crescido formatadas no
período da 'filosofia produtivista' da PAC, inseriram-se em mercado
aberto e competitivo, a exemplo das fileiras do leite, do vinho verde e da
horticultura. Embora distintas na sua configuração económica ou até na
respetiva dominância territorial, estão estabilizadas, a primeira com saída dos
pequenos produtores do sector, a segunda com a decadência do modo de produção
camponês que destinava o vinho principalmente ao autoconsumo, e a terceira,
pela dimensão que adquiriu, permitindo-lhe capturar as relações na esfera da
distribuição e do consumo com as grandes superfícies de retalho que funcionam
num sistema de quase oligopólio.
Especificando, mesmo que terminem as quotas leiteiras, na bacia primária que
abrange, a Norte da AMP, os municípios de Matosinhos, Maia, Póvoa de Varzim,
Trofa e Vila do Conde e, em menor medida, a Sul, o município de Oliveira de
Azeméis, as duas questões essenciais não se prendem com a dimensão do efetivo
ou da produtividade por animal, ambas bastante elevadas, bastando para o
comprovar o exemplo de Vila do Conde, onde o número médio de bovinos por
exploração passou de 51,9 em 1999 para 77,5 em 2009, mas sim com a necessidade
de aumentar a superfície forrageira, no caso do interesse empresarial e de
reduzir, no caso do interesse público, os impactes ambientais resultantes dos
elevados encabeçamentos (CN / SAU) sobre água e solos, pela produção de
chorume.
A fileira hortícola tem forte expressão territorial na faixa arenosa litoral do
município de Póvoa de Varzim, nas chamadas terras de areia, tendo-se expandido
por finais do século XIX em campos em forma de "masseira". Uma boa
parte do processo produtivo é endógeno (viveiros, logística, etc.). Assente
numa estrutura de trabalho familiar, esta prática hortícola intensiva tem
sistemas de distribuição diversificados; nuns casos a exploração interioriza
inclusive a distribuição, noutros existem estruturas associativas que permitem
ganhar escala. Fora deste território que se individualiza na paisagem, a
produção hortofrutícola, além das hortas familiares, apresenta um carácter
disperso e pulverizado, com múltiplos enlaces a jusante (dos mercados locais ao
regional) dependendo do respetivo volume da produção.
Na fileira vitícola ocorreu também, considerando apenas os últimos dez anos, um
processo de reordenamento da estrutura produtiva, embora menos significativa se
comparada com a configuração que resulta de uma maior concentração territorial,
tendências que se devem manter na próxima década. Assim sendo, a produção nos
territórios de menor aptidão vitícola é agora residual e de base camponesa,
portanto despicienda para o conjunto da Região Demarcada dos vinhos verdes.
Embora o decréscimo do número total de produtores vinícolas que declararam os
volumes das suas colheitas (DCPs) tenha sido generalizada, caindo para cerca
de metade, evidenciam-se dois territórios onde a fileira vitícola permanece
relevante: a mancha a Nordeste que inclui os municípios de Valongo, Paredes e
Santo Tirso e, uma outra, a Sul, que abrange o município de Vale de Cambra,
sendo a concentração produtiva (volume /exploração agrícola) mais relevante em
Valongo e Santo Tirso e mais pulverizada em Paredes e Vale de Cambra.
A fileira florestal reparte-se entre a "mata camponesa" as chamadas
bouças dispersas pela área das colinas e alvéolos, portanto a cotas entre os 50
e os 300 metros, enquanto a floresta de produção depende essencialmente da
indústria transformadora que opera na fileira.