Contributos para Uma Tributação Simplificada das Pequenas Entidades
Introdução
As PME são factor de crescimento, inovação, dinamismo empresarial, de criação
de emprego e instrumento de desenvolvimento social. Portugal aparece entre os
membros da OCDE que, para estimular a atividade empresarial, colocaram em
prática um conjunto de medidas fiscais de apoio às pequenas empresas. Neste
sentido, a política fiscal pode funcionar como um instrumento de incentivo à
criação e desenvolvimento de pequenas empresas, mas também comporta dimensões
geradoras de obstáculos, designadamente ao nível da complexidade das normas
tributárias e dos elevados custos de cumprimento. Assim, a responsabilidade dos
governos consiste em criar um clima legal e fiscal que estimule a criação e o
desenvolvimento de empresas (Poutziouris et al, 2000). Embora esta temática
seja hoje em dia mais importante do que nunca, tem sido desenvolvida muito
pouca investigação nesta área (Poutziouris et al, 2000).
Em Portugal, e segundo dados da Direção Geral dos Impostos (DGI), relativos ao
ano 2006 (Portela, 2010), as microempresas com valor de proveitos inferior a €
150.000 representam cerca de 51% do total das sociedades que declaram contas à
Administração Fiscal. No plano tributário, com a reforma fiscal de 2001, estas
microempresas foram objeto de uma política de tributação específica. Esta
consistiu na criação do regime simplificado de determinação do lucro tributável
em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC). Contudo,
esta forma especifica de tributação deste segmento de empresas obteve uma fraca
adesão.
Com o presente estudo procura-se estudar as razões pelas quais as microempresas
não aderiram ao regime simplificado de tributação. E, desta forma, procura-se
contribuir para a obtenção de informações relevantes na concepção de novos
regimes de tributação simplificados, a desenvolver no futuro.
O presente estudo está estruturado em quatro partes. Na primeira é feita uma
revisão da literatura sobre a caracterização e tributação das pequenas
empresas. Na segunda parte é descrita a metodologia usada no estudo empírico
efetuado e são apresentados os resultados obtidos. No ponto seguinte procede-se
à discussão dos resultados. E, na última parte são apresentadas as conclusões
da investigação, identificadas as limitações do estudo e feitas algumas
sugestões de investigação futura.
1. Enquadramento Teórico
Um dos pilares da estrutura empresarial portuguesa reside precisamente nas PME,
sendo-lhes atribuídas funções de criatividade, dinamismo, inovação,
flexibilidade, competitividade, e mais importante a criação de emprego e a
geração de crescimento económico (Lopes, 1999). Num estudo recente[i], elas
representam 99,6% das unidades empresariais (em regime societário), são
responsáveis por 75,2% dos empregos – emprego privado (2,1 milhões dos postos
de trabalho) e realizam mais de metade dos negócios (56,4%). De acordo com o
mesmo estudo, as Micro e Pequenas Empresas (MPE) representam 97,3% do total das
empresas e são responsáveis por mais de metade do emprego privado (55,2% - 1,5
milhões de empregos). Ao nível do volume de negócios, realizaram cerca de 106,7
mil milhões de euros de negócios (mais de 1/3 do volume de negócios total –
35,3%). Comparativamente com a União Europeia, Portugal apresenta a seguir à
Republica Checa, o maior índice de PME por cada 1000 habitantes – 80,5%, sendo
a média Europeia de 39,3% (Eurostat, 2008). Por outro lado, e segundo a mesma
fonte, ao nível de emprego imputável às micro e pequenas empresas Portugal
apresenta das maiores taxas da União Europeia, cerca de 42% contra a média
Europeia de 30%.
No âmbito da criação de um ambiente simplificado para as pequenas empresas nas
áreas do direito das sociedades comerciais, contabilidade e auditoria, a
Comissão Europeia (2007) concluiu recentemente, após consulta dos Estados
Membros, que os limiares definidos na Recomendação 2003/361/CE eram demasiado
elevados para as mais pequenas empresas[ii]. Por esse facto, na Proposta de
Diretiva do Parlamento e do Conselho de 26/2/2009 – COM (2009) 83[iii], (CE,
2009) surge definida uma nova categoria de empresas - as Microentidades. Estas
definem-se como sendo aquelas que no fecho do balanço não ultrapassam dois dos
três limites[iv]: Balanço inferior a € 500.000; volume de negócios menor de €
1.000.000; menos de 10 empregados durante o ano. Apresentando ainda as
seguintes características:
· Vocação para o mercado local/ regional com atividades internacionais muito
reduzidas;
· Dispõem de recursos escassos;
· São importantes na criação e manutenção de postos de trabalho, na
investigação e desenvolvimento e no lançamento de novas atividades económicas;
· Estão sujeitas às mesmas regras de informação que as empresas de maior
dimensão.
Deste modo, e uma vez que os requisitos de prestação de informações que lhes
são exigidos, não são proporcionais às suas necessidades contabilísticas,
incorrem em custos administrativos desnecessários. Esta situação consome uma
boa parte dos seus recursos escassos, os quais deveriam ser utilizados
eficientemente na sua atividade económica. Atendendo ao intervalo alargado de
faturação, que permite a uma unidade económica ser classificada como micro
empresa e pequena empresa, impõe-se analisar a forma como estas empresas se
distribuem, por segmentos de proveitos[v]. Assim e embora à data de 2006, o
sistema jurídico nacional ainda não tivesse introduzido o conceito de
microentidade, foi sentida a necessidade de efetuar esse levantamento para uma
análise da situação que nos permitisse efetuar alguma análise comparativa com
outros estudos. Para o efeito e recorrendo a dados publicados pela Direção
Geral dos Impostos referentes ao ano de 2006 apresenta-se a Tabela_1. Dos dados
apresentados é possível concluir que cerca de 78% das empresas nacionais,
segundo esta segmentação da DGI e atendendo apenas ao valor dos proveitos,
seriam “microentidades”, sendo que cerca de 71% do total, declara a realização
de valores de proveitos inferiores a € 500.000.
Destacam-se pelo seu número e representatividade, são as sociedades com
proveitos declarados de valor igual ou inferior a € 150.000, que representam
cerca de 51% do total das empresas em regime societário. Resulta do exposto que
quando se aborda a questão das PME em geral e das Micro e Pequenas Empresas em
particular, é necessário prestar a devida atenção a este segmento de empresas,
atendendo ao seu número e representatividade.
Para Maydew (2001) a importância da investigação na área da fiscalidade advém
do contributo que esta pode dar na compreensão das forças que moldam o mundo
económico e empresarial, designadamente o efeito que os tributos têm no
processo de tomada de decisão das empresas. A nível tributário e segundo o
autor, as opções tomadas pelas empresas, visam a economia de imposto, ainda que
balizadas por critérios de racionalidade económica que atendem à existência de
outros custos associados.
Contudo, Welsh e White (1981) alertaram para o facto de que as empresas de
pequena dimensão não poderem ser analisadas sob a óptica de que são grandes
empresas em ponto pequeno, diferenciando-se destas apenas em função de menores
vendas, menos empregados, estrutura de menor dimensão. Estes autores,
concluíram que as empresas de menor dimensão sofrem da denominada pobreza de
recursos, derivado das dificuldades financeiras e de gestão. São empresas que,
geralmente, operam em ramos de atividade em que existe uma grande
competitividade (serviços de baixo valor acrescentado, comércio a retalho,
pequenas atividades produtivas/industriais que resultam do know-how do
empresário), o que gera uma forte pressão sobre o factor preço, estando a sua
sobrevivência fortemente dependente das oscilações deste factor externo.
Os custos fixos são muito mais relevantes nestas empresas do que nas de maior
dimensão, atendendo ao facto de serem mais permeáveis às oscilações de mercado
e disporem de poucos mecanismos de resposta. Ao nível da organização e gestão
do negócio, esta surge condicionada pelo facto de a gestão e propriedade estar
centralizada no empresário, havendo uma interdependência com a sua esfera
pessoal, estando o poder de decisão balizado por essa conveniência de
interesses. Por outro lado a organização administrativa e financeira
caracteriza-se pela informalidade dos relacionamentos, estando dependente da
atuação do empresário.
Tendo em conta estas especificidades, será que tem fundamento a aplicação de
uma tributação do lucro diferenciada em função da dimensão das empresas?
Nabais (2005) defende o princípio de que a tributação das empresas, não deve
ter apenas como corolário, o IRC que pagam, mas a totalidade dos tributos
económicos que prestam à comunidade. Daí que tanto as micro como as pequenas
empresas, dada a sua natureza sedentária, a sua capacidade de resistência às
crises económicas, o importante papel em matéria de criação e manutenção de
emprego, os obstáculos que enfrentam, devem ser contempladas com uma tributação
diferenciada face às restantes empresas. Neste sentido, Nabais (2005) defende
uma tributação do lucro diferenciada em função da dimensão:
- Microempresas - tributadas com base num rendimento normal. Estas deverão ser
dispensadas, na medida do possível, da carga burocrática associada, assentando
a sua tributação num rendimento normal a ser definido em concertação com as
próprias empresas através das respectivas associações, prescindindo-se por essa
via da exigência de contabilidade organizada. Assim, a determinação do
correspondente imposto seria o resultado de um procedimento automático que
poderia ser alcançado através do aperfeiçoamento do regime simplificado.
- Pequenas e médias empresas - tributadas com base em indicadores objetivos de
base técnico-científico, a aprovar pelo Ministro das Finanças para cada sector
de atividade económica, situação que está atualmente prevista na Lei Geral
Tributária. Para a fixação desses indicadores, devem também participar as
respectivas empresas através das suas associações representativas, de modo a
que esses indicadores, se aproximem da realidade empresarial e económica em
causa.
- As grandes empresas - tributadas exclusivamente com base no lucro real,
revelado pela contabilidade organizada. Em relação a estas já não se revelam
desproporcionadas as exigências resultantes da obrigatoriedade de contabilidade
organizada e da sua elaboração em conformidade com as normas contabilísticas em
vigor.
Esta ideia de tributação diferenciada é partilhada por Ferreira (2006). Para
este autor, deve ser mantida a tributação com base no lucro declarado,
certificado pelos técnicos oficiais de contas e revisores de contas (quando
aplicável). No entanto deverá coexistir uma tributação supletiva, na base de um
imposto mínimo que possibilite tributar aqueles contribuintes que não têm
lucros ou que declaram não os ter.
Assim, deverá ser estabelecido um esquema de tributação por colecta mínima, que
deveria substituir o atual pagamento especial por conta, ainda que se reconheça
ser esta uma forma de minorar a deterioração existente. Esse imposto mínimo
seria obtido a partir de indicadores de atividade, tais como: volume de
negócios, Valor Acrescentado Bruto, ativo total ou bruto, etc. Relativamente
aos pequenos contribuintes, advoga-se o princípio de que estes poderiam ser
tributados só com base neste imposto mínimo, na medida em que “…é vão e
dispendioso estabelecer regras de controlo e de contabilidade regulamentária
para contribuintes mais modestos (…)” (Ferreira, 2006: 73). Esta ideia é
partilhada por Thirsk (1997) que caracteriza da seguinte forma as pequenas
atividades empresariais:
Difíceis de tributar (hard to tax);
O seu número é elevado, o que torna impossível o seu controle[vi];
Associadas a uma fraca receita tributária;
Alta rotatividade caracterizada por numerosas novas empresas criadas, muitos
insucessos e alguns êxitos;
Compostas por estruturas informais, de base familiar, em que os detentores do
capital e a gerência coincidem, vivendo por vezes à margem das normas
instituídas;
A contabilidade está meramente vocacionada para o cumprimento das obrigações
legais não refletindo o efetivo desempenho das empresas. No entanto, este
pequeno empresário, independentemente do nível de conhecimentos que possua,
sabe quais são os lucros efetivamente gerados pela sua atividade.
Devido a estes factores, este tipo de operadores económicos pode facilmente
esconder os rendimentos gerados, pelo que as autoridades legais devem criar
regimes alternativos de tributação baseados em rendimentos normais.
Um denominador comum às diferentes correntes de pensamento aqui referidas, é a
criação de regimes alternativos de tributação baseados em rendimentos estimados
para os pequenos operadores económicos. Assim, são conhecidas diferentes
modalidades técnicas e formas de aplicação deste tipo de regimes alternativos à
“Tributação Regra” (Santos e Rodrigues, 2006):
a) Lucro normal presumido - O lucro normal, enquanto método alternativo de
estimação do rendimento empresarial, é entendido como aquele que um determinado
contribuinte poderia ter obtido atendendo às condições normais de mercado. Tem
em consideração as características da atividade desenvolvida, a sua dimensão
relativa, podendo apoiar-se em indicadores ou registos contabilísticos
simplificados tais como o volume de compras ou de vendas.
b) Índices físicos ou objetivos de atividade - Este método baseia-se em
indicadores ou parâmetros “físicos” do exercício de atividade, potenciadores de
gerar rendimento, controláveis através de fiscalização às instalações do agente
económico. Por exemplo, a área utilizada, o número de empregados, os
equipamentos usados, os consumos de eletricidade, de água, número de veículos
ao serviço etc. Através desses factores é estimado o rendimento empresarial
auferido.
c) Rácios e indicadores técnico – financeiros - São rácios ou indicadores
sectoriais, determinados a partir da realidade económico-financeira das
empresas, como por exemplo: rendibilidade dos ativos, valor acrescentado bruto,
margens médias de lucro bruto, etc. A aplicação destes indicadores pressupõe
que as empresas detenham uma estrutura organizacional e contabilística
minimamente estruturada, uma vez que a sua seleção se baseia em dados por si
declarados.
d) Imposto/colecta mínima - Trata-se de um imposto mínimo obrigatório, que na
sua formulação mais simples pode consistir num montante fixo, igual para todos
os contribuintes. Embora seja um imposto eficiente na medida em que não é
distorcido pelas escolhas económicas, apresenta a desvantagem de ser pouco
equitativo. Por essa razão, o seu montante pode ser estabelecido de forma
diferenciada em função do agente económico em causa (pessoa singular ou
colectiva), sector de atividade em que se insere, localização geográfica
(rural, urbana) ou de outros critérios simples como sejam o volume de negócios.
Num estudo da OECD (2007), constata-se que vários Países adoptam sistemas de
tributação alternativos, baseados em sistemas de presunção. Verifica-se, ainda,
que os motivos apontados para a utilização destes regimes de tributação, são de
dois tipos:
Áustria, Bélgica, República Checa, Polónia e México apontam no sentido da
simplificação quer da escrituração quer do processamento das declarações de
imposto;
Itália, Japão e Espanha invocam a melhoria no cumprimento das obrigações
fiscais, redução da evasão fiscal, e o desenvolvimento de uma tributação mais
justa e equitativa.
Existem pois, diversos ordenamentos tributários que, confrontados com problemas
de diversa índole, desde o menor desempenho financeiro do sistema (receita
fiscal), até à insuficiente concretização dos desejáveis objetivos de
neutralidade, equidade e simplicidade do edifício tributário, com reflexos
negativos ao nível de uma sã concorrência empresarial e fiscal, vêm entendendo
ser justificável a adopção de regimes alternativos de tributação da atividade
empresarial, a contribuintes de pequena dimensão (Bird e Wallace, 2004).
No entanto e tendo em conta a aplicação a nível internacional, nomeadamente na
Europa, constata-se que estes regimes alternativos de tributação não são
aplicados às empresas em regime societário e incidem sobretudo em agentes
económicos de reduzida dimensão. De igual modo, nos EUA e Austrália não são
aplicados estes regimes de tributação às sociedades.
Assim, embora nos Países Nórdicos e Reino Unido, não sejam aplicados estes
regimes de tributação à atividade empresarial, nos Países Africanos estes são
aplicados de forma geral a todo o tipo de empresas.
Uma das primeiras medidas fiscais desenvolvidas pelo Estado Português para as
microempresas foi instituída com a reforma fiscal de 2001, da qual resultou a
Lei n.º 30 – G/2000 de 29 de dezembro. Consistiu na criação do regime
simplificado de determinação do lucro tributável em sede de Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Colectivas, o qual abrangeu, as micro-empresas com
volume de proveitos inferior a € 149.639,37, que não tenham optado pelo regime
geral de tributação.
Segundo consta do relatório final e anteprojeto da Estrutura de Coordenação da
Reforma Fiscal (ECORFI) “A ECORFI foi concebida como uma estrutura de
operacionalização da reforma fiscal. Ou seja, a partir do vasto acervo de
estudos e relatórios disponíveis sobre os diversos aspectos do sistema fiscal
português, e tendo em conta as orientações políticas fixadas pelo Governo,
pretendeu-se que a ECORFI apreciasse as soluções possíveis para os diversos
problemas identificados e que, uma vez politicamente acolhidas, traduzisse em
projetos legislativos as opções que considerasse mais indicada. Assim, pelas
próprias características da missão que lhe foi confiada, a reflexão da ECORFI
foi toda ela virada para a ação.” (CEF, 2002: 18).
É perceptível o facto de esta reforma fiscal ser o culminar de diversos estudos
anteriormente realizados, sendo o mais importante o denominado Relatório Silva
Lopes – Relatório da Comissão Para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal, Centro
de Estudos Fiscais (CEF, 1996).
Ainda que o relatório da ECORFI, seja omisso relativamente às posições
adoptadas em matéria de introdução de métodos indiretos de aplicação
automática, na proposta de autorização legislativa inicialmente apresentada –
Proposta de Lei n.º 36/VIII, conclui-se que a implementação de regimes
simplificados apenas visaria as atividades empresariais em sede de IRS. Moura e
Fernandes (2000) tinham apresentado as seguintes justificações para
implementação do regime simplificado em sede de IRC: a simplificação, o
alargamento da base tributável com o aumento do número de contribuintes e a
redução da evasão fiscal. E, o seu enquadramento legal, estava definido no
artigo 53º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas[vii].
Assim este regime era aplicável às microempresas residentes, que reunissem
cumulativamente, os seguintes requisitos (CEF, 2008): exercer a título
principal, atividade comercial, industrial ou agrícola; não fossem isentos nem
sujeitos a algum regime especial de tributação; não fossem obrigados à revisão
legal de contas; apresentassem, no exercício anterior ao da aplicação do
regime, um volume de proveitos inferior a € 149.639,67; não tivessem optado
pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
Entre 2001 e 2006, constata-se que a evolução da aplicação do regime
simplificado foi irregular (Tabela_2):
Como resulta do quadro apresentado, a principal conclusão que pode ser retirada
é a de que as empresas abrangidas pelo regime simplificado, nunca representaram
mais de 10% do total das empresas incluídas no intervalo positivo de proveitos
até aos € 150.000.
Só no ano de 2006 regista-se uma acentuada quebra – 7% contra os 10% dos anos
anteriores. Também no caso das sociedades que declararam proveitos iguais a
zero, a sua representatividade nos quatro últimos anos (2003/2004/2005 e 2006),
não foi além dos 19%, registando-se o valor percentual mais baixo de 11%, no
ano de 2006.
Infere-se do exposto que contrariamente às expectativas (dado o elevado número
de micro entidades) o regime simplificado, abrangeu apenas uma pequena franja
de empresas.
Neste contexto, importa estudar quais os motivos que levaram as microempresas a
rejeitarem o regime simplificado de tributação.
Faustino (2004) sintetiza as principais críticas feitas a este regime de
tributação, da seguinte forma:
1 - A inexistência de simplificação. As empresas abrangidas pelo regime
simplificado, são obrigadas a cumprir com todas as obrigações acessórias
aplicáveis aos sujeitos passivos abrangidos pelo regime geral de tributação, e
são obrigados a dispor de contabilidade organizada nos mesmos moldes que as
outras sociedades. A única diferença respeita ao preenchimento de um anexo à
declaração de rendimentos.
2 – Os coeficientes de lucro previstos não atendem às especificidades das
empresas, a nível da atividade exercida, localização geográfica e investimento
realizado. E o reduzido número de coeficientes previstos (20% para as vendas e
45% para a prestação de serviços) não permite a representatividade das
especificidades sectoriais, regionais e de investimento em que as empresas se
encontram.
O Regime Simplificado de Tributação (RST) ao nível das sociedades foi alvo de
análise pelo Grupo para o Estudo da Política Fiscal, Competitividade,
Eficiência e Justiça do Sistema Fiscal (Ministério das Finanças, 2009). Sobre a
continuidade ou não do RST foi proferido um conjunto de pareceres:
Os Serviços Centrais de Inspeção Tributária –Entendem não fazer sentido manter
o atual regime simplificado para as pessoas colectivas (presentemente
suspenso), “… até porque por ele só têm sido tributados os “distraídos” e os
“interessados” (Ministério das Finanças, 2009: 251). Para estes Serviços
Centrais, este regime só faria sentido com novas regras de determinação da
matéria colectável, passando a considerar as amortizações e provisões.
Os Serviços Centrais de Gestão dos Impostos sobre o Rendimento – Consideram ter
sido um fracasso, pelo reduzido número de contribuintes aderentes, pelos
conflitos que gerou e burocracias que criou para os Serviços de Administração
Tributária. São do parecer que deve ser extinto.
A Direção de Finanças de Lisboa e Porto – entendem que nos moldes atuais não
deve ser reintroduzido.
Considera-se assim que o regime simplificado em IRC foi um insucesso, pelos
seguintes motivos (Ministério das Finanças, 2009):
i. A obrigatoriedade de permanência durante o período de 3 anos é incompatível
com o facto de se comprovar que o lucro tributável mínimo previsto no RST é
superior ao rendimento efetivamente obtido.
ii. A obrigatoriedade de dispor de contabilidade organizada nos mesmos moldes
que as empresas que são tributadas por esse regime, sendo que esta não é
relevante mesmo que evidencie prejuízos.
iii. As críticas dos Técnicos Oficiais de Contas a este regime de tributação
pelo facto de tornar menos justificada a sua intervenção e consequentes
honorários.
Este estudo conclui que este regime, nos moldes atuais, não é atrativo para as
sociedades, propondo que seja estudada a hipótese do período de permanência de
3 anos passar a ser anual, e que fosse criado um regime simplificado de base
contabilística.
Os membros do grupo responsável pelo relatório, após apreciação destes
pareceres, concluíram que o regime simplificado em sede de IRC, era objeto de
opção, essencialmente, numa óptica de economia fiscal, isto é; a escolha era
feita por empresas que pelo método tradicional (contabilidade organizada) iriam
apurar um lucro superior.
Consequentemente propõem a revogação definitiva do regime simplificado em IRC,
e defendem a criação de um regime contabilístico simplificado.
Um aspecto central deste regime alternativo de tributação em Portugal era o
facto de, o lucro evidenciado pela contabilidade deixar de ser considerado o
ponto de partida para quantificar o resultado fiscal. Existia de certa forma
uma suspeição sobre a situação patrimonial que essa contabilidade refletia.
Deste modo, optou-se por questionar esta situação: Será que existe algum
fundamento para este facto? Qual o papel atribuído à contabilidade e ao Técnico
Oficial de Contas nestas empresas?
Num estudo realizado na Austrália e Nova Zelândia (Breen et al., 2003) sobre a
relação entre as pequenas empresas e os serviços de contabilidade, retiram-se
as seguintes constatações:
- A principal razão para a subcontratação de serviços de contabilidade era a
preparação das declarações fiscais e outras obrigações legais. A elaboração das
demonstrações financeiras surgia apenas em segundo lugar.
- Poucas empresas recebiam colaboração em outras questões relacionadas com a
vida da empresa, designadamente ao nível das decisões de investimento, política
de financiamento, etc.
- O contacto entre os pequenos empresários e os respectivos contabilistas era
pouco frequente, variando entre uma a quatro vezes ao ano. Quando ocorria tinha
como principal motivação tratar de questões relacionadas com a tributação da
empresa.
- Para os pequenos empresários a contabilidade não tinha relevância no processo
de tomada de decisão e era apenas um instrumento para satisfação das
necessidades legais, designadamente as que decorrem das obrigações tributárias.
- Na maioria das pequenas empresas a contabilidade não refletia a realidade do
negócio, por estar direcionada para o mero cumprimento das obrigações fiscais/
legais.
No Reino Unido, os autores de outro estudo (Roberts e Sian, 2003) também
concluíram que a maioria das pequenas empresas utiliza os serviços de
contabilidade fundamentalmente para o cumprimento das obrigações fiscais/legais
e elaboração das demonstrações financeiras legalmente exigidas. Este estudo
demonstrou que os principais destinatários externos das contas elaboradas são a
administração fiscal. Para os pequenos empresários, as fontes de informação
mais importantes são os bancos (extractos bancários). Sendo a informação que
advém da contabilidade demasiado complexa e de difícil compreensão para ser
utilizada na gestão da empresa.
Sobre as razões apontadas pelas pequenas empresas Norueguesas para procurarem
serviços de contabilidade, Gooderham et al (2004) alegam que o principal factor
advém da necessidade de cumprir os requisitos tributários e legais. Neste
sentido, a função atribuída à contabilidade pelos pequenos empresários
noruegueses é o do mero cumprimento destas obrigações.
A importância e natureza das informações financeiras utilizadas por pequenas
empresas, na Austrália, foram analisadas por Dyt (2005). Na investigação
realizada verificou que a maioria dos pequenos empresários utiliza os saldos
bancários como indicador para avaliar o desempenho das suas empresas e não as
demonstrações contabilísticas e financeiras.
Estas, por serem elaboradas numa perspectiva fiscal/legal e segundo normas
contabilísticas consideradas complexas, têm uma limitada capacidade para
informar acerca do real desempenho da empresa.
Num relatório elaborado pelo Financial Reporting Council(FRC, 2006), sobre a
relação entre os pequenos empresários de Inglaterra, País de Gales, Escócia,
Irlanda do Norte, e respectivos serviços de contabilidade, concluiu-se que uma
em cada cinco pequenas empresas considera que o serviço de contabilidade
deveria dar maior apoio à gestão. Segundo os empresários entrevistados, a
contabilidade é demasiado complexa e de difícil entendimento para servir como
instrumento de apoio à decisão.
Assim sendo, esta devia ser elaborada de forma apropriada às necessidades das
empresas, com maior simplificação das demonstrações financeiras e dos
procedimentos contabilísticos. Aqui também importa registar o facto das
pequenas empresas entrevistadas, reservarem à contabilidade e ao respectivo
serviço prestado um mero papel de satisfação das necessidades fiscais e legais.
Ajustado a esta tendência, em Portugal, Azevedo (2010) considera que os
Técnicos Oficiais de Contas são ainda vistos, junto das PMEs, como meros
cumpridores das obrigações tributárias. Defende por isso um papel mais ativo de
colaboração e intervenção junto dos empresários, em áreas como decisões de
investimento, formas de financiamento, evolução de desempenho, etc., de forma a
evitar erros que ponham em causa a continuidade destas empresas.
Os estudos referenciados indicam que as pequenas empresas atribuem à
contabilidade e ao respectivo serviço prestado um mero papel de satisfação das
necessidades fiscais e legais. Por outro lado a complexidade dos normativos
contabilísticos, está claramente desajustada das necessidades e especificidades
das pequenas empresas, obstando a que ela seja utilizada como instrumento de
apoio à decisão.
No âmbito desta necessidade de simplificação, assiste-se em alguns dos sistemas
fiscais mais evoluídos como o alemão, o francês, o italiano e o norte-
americano, à adopção de uma contabilidade simplificada como forma de apurar o
lucro fiscal nas empresas de pequena dimensão. Esta simplificação fundamenta-se
na necessidade de reduzir os custos de cumprimento e de tornar a contabilidade
menos complexa face às especificidades destas organizações (Nina e Lopes, 2007;
OECD, 2009). E, ocorre por via de:
ü Substituição da imputação temporal dos factos patrimoniais, do critério de
competência económica (ou base de acréscimo) normalmente utilizado na
contabilidade, por um critério de caixa que atende aos recebimentos e
pagamentos efetuados, ainda que no final do ano sejam aceites ajustamentos que
vão para lá dos meros movimentos financeiros.
ü Aspectos formais da contabilidade que se traduzem na redução do número de
registos contabilísticos obrigatórios, e dispensa ou simplificação de algumas
obrigações de elaboração e prestação de contas anuais.
A nível comunitário, a Proposta de Diretiva de 26/2/2009 – COM (2009) 83, prevê
a possibilidade de os Estados Membros excluírem as microentidades do requisito
de elaboração e apresentação das contas anuais. No entanto, estas empresas,
voluntariamente, poderão elaborar as suas contas anuais e efetuar o depósito no
registo respectivo. Com esta exclusão pretende-se também que a prestação das
informações financeiras destas empresas esteja mais vocacionada para as suas
necessidades, evitando-se cargas administrativas desnecessárias (Comissão
Europeia, 2009). Contudo, as microentidades deverão manter os registos
contabilísticos das operações realizadas para efeitos da sua gestão e prestação
de informações fiscais.
Até agora esta Diretiva foi objeto de várias reuniões do grupo de trabalho. Na
primeira verificou-se a oposição dos seguintes Países: Áustria, Bélgica,
Espanha, França, Itália e Luxemburgo. Na segunda realizada em 2009-06-04,
Portugal também se juntou aos restantes opositores. Estes Países sugeriram uma
alternativa que foi a de simplificar os requisitos contabilísticos para as
empresas de menor dimensão mas manter a obrigatoriedade do depósito das contas.
As principias críticas apresentadas por estes Países, são em seguida
sistematizadas:
1. Não aceitam o argumento de que a informação contabilística e financeira
elaborada conforme os requisitos impostos pelas diretivas, não traduza o
efetivo desempenho destas empresas e não tenha valor informativo para os
destinatários. Relativamente ao depósito das contas, não é viável considerar
isso, uma tarefa desnecessária com a justificação de que os utilizadores a
podem obter diretamente do empresário ou por outros meios.
2. Iria desaparecer uma das principias fontes de informação para a realização
das estatísticas empresariais.
3. A Prevenção da fraude fiscal. A Comissão não teve em linha de conta o papel
das exigências contabilísticas na prevenção da fraude fiscal ou no
branqueamento de capitais. Segundo estes Países, os paraísos fiscais mais
procurados são aqueles que não impõe a adopção de sistemas de informação ou em
que a informação financeira publicada é deficiente.
4. O Fomento de opções nacionais supõe a desarmonização comunitária, o que não
faz sentido face à harmonização que se procura à mais de três décadas.
Apesar destas discordâncias a maior parte dos Países aceita a necessidade de
simplificar as diretivas contabilísticas para as empresas de menor dimensão,
aguardando-se novos desenvolvimentos (BIS, 2011).
2. Metodologia
No presente estudo, a unidade de análise é a microempresa e a população é
constituída por todas as entidades com valor de proveitos inferior a € 150.000,
pois só estas reúnem as condições para estar enquadradas no regime simplificado
de tributação. Foram selecionadas apenas as microempresas do distrito da Guarda
que iniciaram atividade no ano de 2008, pois além de ser o ano que proporciona
dados mais recentes é também aquele em que foi, pela última vez possível
exercer a opção por um dos regimes.
A partir da base de dados da DGI, foram identificadas 355 empresas que
iniciaram atividade no ano de 2008. Destas, 242 reuniam condições para ficarem
abrangidas pelo regime simplificado, embora 232 tenham optado pelo regime da
contabilidade organizada e apenas 10 ficaram no regime simplificado (Tabela_3).
Atendendo ao reduzido número de sociedades que iniciaram atividade em 2008 no
distrito em análise, optou-se por estudar as 242 unidades.
O instrumento de recolha dos dados primários, selecionado para a concretização
da presente investigação, foi o inquérito por questionário uma vez que se trata
de um estudo quantitativo que visa testar, caracterizar/descrever uma sub
população e estimar determinadas grandezas (Ghiglione e Matalon, 1992). Trata-
se de um instrumento que segundo Lakatos e Marconi (1996) permite: economias de
tempo; a obtenção de um maior número de observações; uma maior veracidade nas
respostas por via da sua confidencialidade e anonimato; evita distorções
originadas pela intervenção do investigador e pode ser objeto de análise
automatizada. Também lhe são reconhecidas algumas limitações, designadamente a
possibilidade da percentagem de respostas aos questionários ser reduzida e a
dificuldade inerente ao controlo e verificação dos condicionalismos em que os
questionários foram preenchidos (Lakatos e Marconi, 1996).
Na construção dos questionários, um aspecto de primordial importância é a
formulação das questões, uma vez que qualquer erro ou ambiguidade associado à
construção do questionário pode levar a conclusões erradas (Ghiglione e
Matalon, 1992).
Assim, na construção dos itens de um questionário, no caso de não existirem
inquéritos já testados para a temática em investigação, algumas fontes básicas
devem ser consideradas, entre as quais a entrevista exploratória (Hill e Hill,
2000). Nesse contexto e tratando-se de uma área de investigação onde a
literatura especializada não aponta para a existência de questionários pré-
estandardizados, para ajudar na sua concepção foi realizada uma entrevista
exploratória. Com ela procurou-se também o desenvolvimento de ideias, tomar
consciência dos diferentes aspectos do problema e clarificar pressupostos e
noções pré existentes.
De entre as diferentes categorias de interlocutores apontadas por Quivy e
Campenhoudt (2008), optou-se pela entrevista de uma testemunha privilegiada
[viii]. Ou seja, de uma pessoa que pela sua posição e responsabilidades, tem um
conhecimento aprofundado do problema.
A conjugação da revisão da literatura com as informações recolhidas na
entrevista exploratória, permitiu a elaboração do questionário. Relativamente
às questões formuladas no questionário, optou-se sobretudo pela utilização de
questões fechadas de escolha múltipla, cujas respostas obedecem a uma escala
previamente definida, em detrimento de questões abertas, mais difíceis de
tratar. No que respeita ao tipo de escala, optou-se por utilizar uma escala
tipo Likert (com valores de 1 a 5), também designada por verbal com ordenação
(Moreira, 2004), que permite ao inquirido manifestar a respectiva opinião.
Depois de redigido, o questionário foi testado (Ghiglione e Matalon, 1992) por
uma pequena amostra da população – 4 empresários, de modo aperfeiçoar o
vocabulário e conteúdo das questões. Com base na sua análise crítica foram
feitas algumas alterações, designadamente a nível do vocabulário, substituindo
algumas palavras por sinónimos de mais simples compreensão.
Depois de corrigido, deu-se início ao envio do inquérito por via postal, sendo
que as cartas foram enviadas de forma faseada para os diferentes Concelhos do
Distrito. As respostas foram obtidas durante os meses de junho a setembro do
ano de 2009.
Procurando minimizar as limitações inerentes à utilização do inquérito,
designadamente o facto da recolha de dados ser feita de um modo indireto, sem a
participação do investigador inviabilizando por essa via a supressão de falhas
interpretativas por ambas as partes (Ghiglione e Matalon, 1992) e a baixa taxa
de respostas associada (Lakatos e Marconi, 1996), foram adoptados os seguintes
procedimentos:
a) Todos os questionários foram acompanhados de uma carta na qual se explicavam
os propósitos da investigação;
b) Foi disponibilizado um endereço electrónico que poderia ser utilizado pelos
inquiridos para qualquer esclarecimento adicional.
Em meados do mês de outubro de 2009 deu-se por concluído o processo de recolha
dos questionários. Dos 242 questionários enviados, foram recebidos 67, dos
quais 63 foram considerados válidos.
A informação obtida com os questionários foi objeto de análise estatística.
Para o efeito foi utilizado o programa estatístico SPSS V.16.0.0 (Statistical
Package for Social Science).
Desde logo, importa registar que através do Teste de Kolmogorov-Smirnov se
concluiu que não se encontram reunidos os pressupostos da normalidade na
distribuição (Pestana e Gageiro, 2005), pois os valores do nível de
significância que se observam, são todos iguais a zero (<0,05), à exceção da
variável “ Motivo pagamento IRC inferior”.
Conclui-se este ponto apresentando uma síntese das principais características
da investigação desenvolvida (Tabela_4).
3. Resultados Obtidos[ix]
Com a caracterização da amostra (conjunto de empresas que responderam ao
inquérito), salientam-se alguns dos aspectos que descrevem as empresas
inquiridas, designadamente: (1) Sectores de atividade, (2) Número de Sócios,
(3) Número de Gerentes, (4) Número de Trabalhadores, (5) Sexo dos sócios/
gerentes, (6) Idade dos sócios/gerentes e (7) Nível de escolaridade dos sócios/
gerentes, tal como descrito na Tabela_5. Depois de caracterizada a amostra, são
em seguida apresentadas as principais conclusões do inquérito efetuado:
a) Escolha do regime de tributação: motivos apresentados pelos inquiridos
As 4 empresas que ficaram enquadradas no Regime Simplificado, referiram que a
opção pelo RST se deveu ao facto do pagamento de IRC ser inferior ao que
ocorreria se optassem pelo Regime de Contabilidade Organizada. Sendo, a
economia de imposto potenciada pelos seguintes factores:
- Os coeficientes utilizados (20% sobre as vendas e 45% sobre a prestação de
serviços) são favoráveis à atividade que exercem (75% dos casos).
- Face à impossibilidade de documentar todas as suas despesas, o RST veio
suprir essa limitação potenciando por essa via uma economia fiscal ao nível do
imposto sobre o rendimento (25%).
As empresas da amostra que optaram pelo regime de contabilidade organizada (59
empresas), apresentaram as seguintes razões por tal opção:
- 91,5% das empresas (54) indicaram como motivo da opção o facto de este regime
permitir pagar um IRC inferior.
- 5,1% das empresas (3) optaram pela contabilidade organizada, por precaução,
uma vez que o RST obriga a um período de permanência de 3 anos, o que poderia
tornar-se pouco favorável à empresa.
- 3,4% das empresas (2) indicaram que sendo as obrigações contabilísticas e
fiscais iguais nos dois regimes, não existindo qualquer simplificação e sendo-
lhes exigida a contabilidade organizada, optaram por esta forma de tributação.
Inquiridas as empresas sobre os motivos pelos quais o regime de contabilidade
organizada, permite um pagamento de IRC inferior ao que resultaria da aplicação
do RST, 79,6% das empresas (43) consideram os coeficientes de lucro do regime
simplificado desajustados da atividade que desenvolvem e da área geográfica
onde estão sediadas.
A opção “Tendo realizado investimentos de instalação, os custos iniciais são
superiores aos proveitos gerados. O Regime simplificado não tem isso em conta
”, foi escolhido por 20,4% (11 empresas).
Resulta do exposto que a opção por um dos regimes foi realizada em função da
poupança de imposto, tal como preconizava o Relatório do Ministério das
Finanças (2009). Demonstra-se, ainda que estas empresas, ainda que de pequena
dimensão, tomaram as suas decisões, de natureza fiscal, procurando a economia
de imposto (Maydew, 2001).
Sobre o principal factor que levou a grande maioria a rejeitar o RST, comprova-
se que é a existência[x]de coeficientes de lucro desajustados da atividade que
as empresas desenvolvem e da área geográfica onde estão implantadas, tal como
alega Faustino (2004).
Conclui-se desta forma e para as empresas que responderam ao inquérito, que o
RST falhou claramente na determinação de coeficientes adequados para a
tributação dos rendimentos. Contudo, não deixa de ser curioso o facto de terem
sido estes próprios coeficientes que levaram algumas empresas a ficar
enquadradas no RST, pois a sua aplicação era-lhes favorável, obtendo com isso
uma poupança a nível de IRC. Isto apenas vem comprovar a necessidade de
aumentar o número de coeficientes de modo a ajustá-los à realidade da empresa.
b) Necessidade de uma tributação diferenciada
Sobre esta questão foi solicitado aos inquiridos que classificassem um conjunto
de afirmações em função do seu nível de concordância:
A1) “ A complexidade do atual sistema fiscal, com demasiadas exigências
documentais e de organização contabilística, é penalizador para estas empresas.
Deveriam por isso ser implementadas novas formas simplificadas de tributação do
rendimento.”
A2) “ A tributação do rendimento favorece as grandes empresas, ao nível das
taxas, incentivos fiscais, deduções fiscais, outros. A política de tributação
deveria ser definida em função da dimensão das empresas ”
Constata-se que a maioria dos inquiridos (55,6% concorda totalmente e 44,4%
concorda parcialmente) se identificou com estas afirmações.
Quando inquiridas de forma direta sobre se consideram que deveriam ser criados
novos regimes de tributação optativos, aplicáveis às empresas com Volume de
Negócios anual até € 150.000, uma clara maioria afirmou que sim (76,2%):
Os resultados obtidos permitem constatar que estas empresas consideram
necessária a aplicação de uma tributação diferenciada, que simplifique todo o
processo de apuramento do resultado fiscal em sede de tributação do rendimento,
tal como Nabais (2005) e Ferreira (2006) defendem.
Aspecto importante é a opinião que estas empresas têm do sistema fiscal
vigente, que lhes é penalizador e deveria ser definido em função da dimensão
das empresas.
Neste contexto o principio defendido por Welsh e White (1981) de que as
empresas de pequena dimensão não podem ser analisadas sob a óptica de que são
grandes empresas em ponto pequeno, é ele próprio defendido por estas
microempresas ao nível da aplicação de um sistema fiscal diferenciado que tome
em linha de conta as suas especificidades.
Por outro lado as necessidades de simplificação, impulsionadas pela Comissão
Europeia (2008; 2009), são sentidas por estas empresas.
Outro resultado que convirá destacar é a aceitação que elas demonstram na
aplicação de novos regimes simplificados de tributação. De certa forma, o facto
de o RST em Portugal ter sido rejeitado pela maioria das empresas, não quer
dizer que elas sejam contrárias a essas formas de tributação, ainda que
defendam uma concepção diferente, como será analisado no ponto seguinte.
c) Futuro regime simplificado de tributação
Tendo como objetivo aferir sobre as características que um novo RST deve
assumir no futuro, as empresas inquiridas foram confrontadas nos inquéritos com
quatro tipologias diferentes (Santos e Rodrigues, 2006)
Comprovou-se que 56,2% (27) das empresas escolheram a opção “Pagamento de um
imposto estimado, pré definido anualmente em função do sector de atividade,
localização, e volume de negócios” . Nenhuma das outras possibilidades
ultrapassou os 19% de resposta, sendo que a opção “Estimativa de um lucro
normal definido por sector de atividade e localização geográfica, negociado
previamente com as associações representativas de cada sector de atividade”,
foi a menos escolhida – apenas 10,4% (5 empresas).
Ou seja as empresas inquiridas optaram por uma escolha que visa o pagamento de
um imposto estimado pré definido, tal como defendem Nabais (2005) e Ferreira
(2006).
O papel atribuído à contabilidade
No âmbito do estudo efetuado, as empresas foram inquiridas sobre o papel da
contabilidade. Quando confrontadas com a afirmação “Atendendo à dimensão da
minha empresa, a contabilidade atual, não se ajusta e não traduz a realidade do
meu negócio. A contabilidade deveria ser simplificada” as respostas dividiram-
se entre o concordo parcialmente (49,2%) e o concordo totalmente (47,6%).
As classificações “Discordo parcialmente” e “não concordo nem discordo”
apresentam resultados residuais. De ressalvar que não foi apresentado nenhum
inquérito com a resposta assinalada de “discordo totalmente”.
Sobre a função atribuída à contabilidade, foram apresentadas três opções
possíveis:
“Apenas para o cumprimento das obrigações fiscais e legais”;“Instrumento de
apoio à decisão e de gestão do negócio”;“As duas opções”.
É preocupante o facto de 79,4% dos empresários responder que ela “ Serve apenas
para o cumprimento das obrigações fiscais e legais”e de apenas 15,9%
considerarem que a contabilidade é também um instrumento de apoio à tomada da
decisão e gestão do negócio. Os resultados aqui apresentados vão de encontro às
conclusões de outros estudos realizados (Roberts e Sian, 2003; Gooderham et al,
2004; Dyt, 2005; FRC, 2006), nos quais se concluiu que:
- A contabilidade não tem relevância no processo de tomada de decisão e é
apenas um instrumento para satisfação das necessidades legais, designadamente
as que decorrem das obrigações tributárias.
- A contabilidade não reflete a realidade do negócio, por estar direcionada
para o mero cumprimento das obrigações legais, designadamente as tributárias.
- A informação que advém da contabilidade é demasiado complexa e de difícil
compreensão para ser utilizada na gestão da empresa.
Por outro lado, a consideração de que a contabilidade deveria ser simplificada
encontra eco nas novas tendências internacionais que apelam para uma menor
complexidade do processo face às especificidades destas organizações (Nina e
Lopes, 2007; OECD, 2009; Comissão Europeia, 2009).
e) O Papel do Técnico Oficial de Contas
À questão: “Quem o aconselhou na seleção do regime de tributação?”os inquiridos
foram confrontados com as opções: o Técnico Oficial de Contas, Outro
empresário/amigo, o Serviço de Finanças Local.
Aproximadamente 98,4% dos inquiridos respondeu ser o Técnico Oficial de Contas,
a pessoa que os aconselhou a optar pelo respectivo regime de tributação.
Refira-se que a opção empresário/amigo foi apenas objeto de uma escolha e o
Serviço de Finanças local de nenhuma.
Assim, constata-se que o Técnico Oficial de Contas desempenhou um papel
fundamental na opção pelo regime de tributação da empresa o que permite
corroborar resultados de estudos realizados que demonstram serem as questões
tributárias aquelas que estão na base da relação entre os pequenos empresários
e os Serviços de Contabilidade (Breen et al, 2003; FRC, 2006; Azevedo, 2010).
Considerações Finais
Esta investigação incidiu sobre um segmento de empresas muito pouco estudado e
que segundo dados da DGI – ano de 2006, representa 51% das pessoas colectivas
que declaram as suas contas ao fisco. Deste modo, os resultados deste estudo
contribuem para melhorar o conhecimento desta realidade.
As conclusões aqui apresentadas derivam das questões inicialmente formuladas,
importando salientar que as mesmas são representativas, uma vez que a taxa de
resposta aos questionários (26,03%), é coincidente com as taxas normalmente
obtidas para este tipo de investigação – 25% (Marconi e Lakatos, 1996).
Sintetizam-se em seguida as principais conclusões do estudo realizado:
1 – A opção pelo regime de tributação foi realizada em função da poupança
prevista de IRC (Ministério das Finanças, 2009). Assim é possível comprovar que
estas empresas, ainda que de pequena dimensão, tomaram as suas decisões de
natureza tributária, procurando obter economias de imposto (Maydew, 2001).
2 – À semelhança de Faustino (2004) constata-se que o principal factor que
levou a grande maioria das empresas a rejeitar o RST, foi a existência de
coeficientes de rentabilidade/tributação desajustados da atividade desenvolvida
e da realidade da área geográfica onde estão implantadas. Assim o problema
deste regime residiu na aplicação de forma indiscriminada dos coeficientes de
20% e 45%, respectivamente às vendas e restantes proveitos, sem atender ao tipo
de atividade e local onde era exercida.
3 - O facto de a maioria dos inquiridos ter rejeitado a opção pelo RST não
significa que as micro-empresas, sejam adversas aos RST. De facto, a maioria
das empresas inquiridas, quando confrontadas com a possibilidade de serem
criados novos RST, respondeu de forma afirmativa.
Quanto à configuração destes regimes, a opção “ Pagamento de um imposto
estimado, pré definido anualmente em função do sector de atividade,
localização, e volume de negócios” que está associada a uma concepção de
Imposto/Colecta mínima (Nabais, 2005; Ferreira, 2006) foi a selecionada pela
maioria das empresas.
4 – Constata-se ainda que o Técnico Oficial de Contas desempenhou um papel
fundamental no momento da opção pelo regime de tributação da empresa o que
permite corroborar resultados de outros estudos que demonstram serem as
questões tributárias aquelas que estão na base da relação entre os pequenos
empresários e os Serviços de Contabilidade (Breen et al, 2003; FRC, 2006;
Azevedo, 2010).
5 – Os inquiridos consideram ser necessária a aplicação de uma tributação
diferenciada para este segmento de empresas. Porém é essencial que este modelo
de tributação permita simplificar todo o processo de apuramento do resultado
fiscal em sede de tributação do rendimento, tal como Nabais (2005) e Ferreira
(2006) defendem.
Neste sentido os inquiridos consideram que o sistema fiscal vigente lhes é
penalizador e deveria ser redefinido em função da sua dimensão.
6 – O peso da fiscalidade na gestão destas empresas é evidenciado quando se
constata que a grande maioria das microempresas que responderam ao inquérito
considerou que a contabilidade “Serve apenas para o cumprimento das obrigações
fiscais e legais”. Por outro lado, todas as empresas concordaram (parcialmente
ou totalmente) com afirmação de que “Atendendo à dimensão da minha empresa, a
contabilidade atual, não se ajusta e não traduz a realidade do meu negócio. A
contabilidade deveria ser simplificada”.
Assim, os resultados obtidos comprovam os de outros estudos desenvolvidos a
nível internacional no âmbito das pequenas empresas (Roberts e Sian, 2003;
Gooderham et al, 2004; Dyt, 2005; FRC, 2006) nos quais se verifica que:
- A contabilidade não tem relevância no processo de tomada de decisão e é
apenas um instrumento para satisfação das necessidades legais, designadamente
as que decorrem das obrigações tributárias.
- A contabilidade não reflete a realidade do negócio, por estar direcionada
para o mero cumprimento das obrigações legais, designadamente as tributárias.
- A informação que advém da contabilidade é demasiado complexa e de difícil
compreensão para ser utilizada na gestão da empresa.
Finalmente, também a ideia de que a contabilidade das microempresas deveria ser
simplificada, encontra eco nas atuais tendências internacionais (Nina e Lopes,
2007; OECD, 2009; Comissão Europeia, 2008 e 2009).
Como qualquer outro trabalho de investigação este estudo apresenta algumas
limitações. Assim, não foi possível estabelecer uma comparação entre os grupos
de empresas que optaram pelos dois regimes de tributação, uma vez que o número
de sociedades abrangidas pelo regime simplificado foi manifestamente
insuficiente para, com alguma relevância estatística, permitir tal comparação.
Teria sido interessante apresentar os valores das médias nacionais de
contribuintes com declarações entregues em RST, o que pese embora não
permitisse a extrapolação, permitiria aferir da representatividade ou não da
região estudada no quadro nacional, a utilização dessa informação foi porém
inviabilizada pela não autorização de divulgação dos dados. Por outro lado a
complexidade técnica associada a este tema, o qual se reconhece não ser comum,
obrigou a um grande esforço de simplificação da terminologia utilizada no
inquérito. Obviamente que por vezes esta simplificação poderá ter criado erros
de interpretação, que não são quantificáveis e se espera terem sido mínimos.
Podem ainda ser apresentadas algumas pistas futuras de investigação.
O presente estudo foi realizado na óptica das empresas. Obviamente e comprovado
o papel que os Técnicos Oficias de Contas desempenham ao nível das questões
tributárias, importaria no futuro realizar um estudo na perspectiva dos
responsáveis pela contabilidade, por forma a efetuar uma triangulação dos dados
e obter ou não a confirmação das conclusões deste trabalho de investigação.
Outro aspecto, preocupante aqui evidenciado, prende-se com o papel atribuído à
contabilidade pela maioria das empresas deste segmento: não tem relevância no
processo de tomada de decisão e é apenas um instrumento para satisfação das
necessidades legais, designadamente as que decorrem das obrigações tributárias.
De facto parece-nos pertinente averiguar: quais as razões e factores que podem
ser alterados para que as microempresas adoptem a contabilidade como um sistema
de informação na tomada de decisão.
Sobre esta temática também nos parece relevante analisar a perspectiva dos
Técnicos Oficiais de Contas para aferir a sua visão sobre este tema.
Também a criação de um novo regime contabilístico simplificado, questão que foi
no presente estudo apenas abordada numa análise das principais tendências
internacionais, constitui um tema que importaria no futuro estudar.