Procura turística dos estudantes do ensino superior em Portugal continental:
uma análise comparativa entre as regiões
1. Introdução
O presente artigo visa refletir sobre a procura turística protagonizada pelos
jovens residentes em Portugal continental, circunscrevendo-se aos estudantes do
ensino superior. A incidência neste segmento estudantil apoia-se no pressuposto
de que possui uma natureza heterogénea e diferenciada relativamente ao segmento
jovem, uma vez que, entre outros aspetos, se associa a um estrato sócio-
económico e cultural tendencialmente mais elevado e com maior
representatividade na procura turística.
É de salientar que os estudos no domínio do mercado turístico jovem e
estudantil, e especificamente os referentes aos estudantes do ensino superior,
são ainda escassos (Carr, 2003) e datados fundamentalmente a partir de meados
da década de 90 (Richards & Wilson, 2003). Também em Portugal, o número
limitado de estudos relativos a esta população estudantil apela ao
aprofundamento deste domínio investigacional.
Neste contexto, tem-se como objectivo geral identificar as principais
caraterísticas do turismo no segmento dos estudantes do ensino superior em
Portugal, delimitando-se o seu perfil de procura e evidenciando semelhanças e
diferenças a nível das regiões/NUT II de Portugal continental.
Em termos metodológicos, o estudo assenta num inquérito por questionário a 1311
estudantes do ensino superior residentes em Portugal. Os resultados obtidos
permitem caracterizar os estudantes tanto em termos nacionais como à escala
regional, evidenciando, entre outros aspectos, a periodicidade da viagem, forma
de planeamento, tipos de alojamento e de transporte, época da viagem, gastos e
sua estrutura, obtendo evidência empírica de diferenças regionais no padrão de
consumo turístico e motivações turísticas.
Este artigo assenta em quatro grandes pontos. Um primeiro, onde se apresenta um
corpo conceptual relacionado com o turismo jovem e procura turística,
preocupando-se em evidenciar algumas características específicas da procura
turística dos estudantes. Um segundo, onde se expõe a metodologia
investigacional aplicada, assente fundamentalmente num inquérito por
questionário aos estudantes do ensino superior em Portugal. De notar que a
amostra integra estudantes residentes das cinco regiões/NUT II, o que permite
estabelecer algumas comparações regionais na procura turística destes
estudantes. Uma vez que a consideração das motivações é um elemento
determinante na compreensão do turista, foi aqui preocupação construir os
indicadores designados por Indicador de Relevância das Motivações Turísticas
(IRMT) e Indicador Regional de Relevância das Motivações Turísticas (IRRMT). No
terceiro ponto, apresenta-se o estudo de caso relacionado com a procura
turística dos estudantes do ensino superior, por região de residência habitual.
Após a verificação da importância económica do turismo (internacional e
doméstico) em Portugal discutem-se os resultados obtidos através do
questionário, nomeadamente enfatizando algumas das características do segmento
de procura dos estudantes do ensino superior bem como algumas das
características distintivas desses estudantes em função das regiões de
residência habitual. Por fim apresentam-se as conclusões.
2. Turismo jovem: conceptualização e perspetivas
Definir turismo jovem não é consensual, fato com implicações na avaliação das
suas caraterísticas, dimensão e limites (World Travel Organization - WTO, 1991;
WTO, 2002; Richards & Wilson, 2008). No entanto, devido à necessidade de
precisar conceitos, é aqui considerada a definição da WTO (2002), segundo a
qual turismo jovem inclui indivíduos com idades compreendidas entre os 15 e 25
anos a viajar, contemplando todas as viagens independentes ou em grupo,
domésticas ou internacionais, com estadas de pelo menos uma noite.
Embora existam estudos que atribuem à idade uma influência limitada na
participação no turismo (European Union/Eurostat, 2010), o turismo jovem tem
vindo a deixar o seu status de nicho de mercado especializado para se tornar
um importante elemento do travel mix de qualquer destino (UNWTO/WYSE, 2011, p.
6), sendo cada vez mais reconhecido enquanto segmento de mercado particular
(EU, 2010, p. 44), importante e de elevado valor (UNWTO/WYSE, 2011, p. 5 e
7), no presente e no futuro (UNWTO/WYSE, 2011; WTO, 2008; Wheatcroft &
Seekings, 1995).
O fato é compreensível se considerarmos que cada vez mais jovens viajam,
estando associados a elevados níveis de mobilidade (Moisa, 2010, p. 576),
propiciadores de importantes e crescentes fluxos físicos e monetários. O
Secretário-geral da Organização Mundial de Turismo (Taleb Rifai) destaca o
mercado jovem como um dos mais dinâmicos e de maior crescimento do setor
turístico global (UNWTO/WYSE, 2011, p. 2).
No período compreendido entre 2000 e 2010, a representatividade do turismo
jovem no mercado turístico internacional é de 20% (UNWTO/WYSE, 2011), tendo as
chegadas internacionais de jovens aumentado de 136 milhões em 2000 para 187
milhões em 2010 (UNWTO/WYSE, 2011). Quanto às previsões para 2020, elas apontam
para a existência de cerca de 300 milhões de viagens internacionais de jovens
por ano (UNWTO/WYSE, 2011). Na Europa, de 80 milhões de viagens de jovens, em
1995 (European Travel Commission, 1995), atingem-se os 97 milhões em 2007 (EU/
Eurostat, 2010).
Em 2010, em termos de receitas turísticas, o turismo jovem gera 165 mil milhões
USD, com uma representatividade de 18% no total (UNWTO/WYSE, 2011, p. 8). De
notar que no referente aos gastos a EU (2010) assinala que os turistas jovens
tendem a gastar mais do que os outros turistas, uma vez que estão associados a
estadas de mais de 50 dias, pressupondo uma interacção mais estreita entre os
jovens e as comunidades locais visitadas, com impactos directos nas suas
economias.
A importância e expansão do tipo de turismo em consideração não podem ser
dissociadas de vários determinantes de procura turística, entre os quais se
distinguem os assinalados por vários autores, tal como consta da tabela_1.
Este tipo de turismo tende a estar associado a um conjunto de características
da procura, as quais se relacionam com a averiguação das causas que estão na
origem das escolhas e motivações individuais aquando da tomada de decisão de
empreender uma viagem.
Num contexto mais abrangente, procura turística associa-se igualmente ao
crescimento, evolução e sustentabilidade de dado destino, o que nos remete para
os seus impactos. O número de turistas e a dimensão dos seus gastos têm
repercussões no produto, emprego, ambiente e cultura, entre outros aspectos.
Em termos de características da procura, para além do seu importante
crescimento, ela é heterogénea. Heterogénea pela diversidade de tipos de
indivíduos (clientelas) a viajar em função do sexo, idade, estado civil,
estrato sócio-económico e profissional, nível de instrução, número de pessoas
pertencentes ao agregado familiar, local de residência, duração da estada,
rendimentos, personalidades, etc.; pela diversidade dos comportamentos desses
diferentes tipos de turistas, ( ) (Henriques, 2003, p. 64). É também
heterogénea pelos meios de transporte utilizados, forma de organização da
viagem, entre outros (Henriques, 2003, p. 73).
Se nos restringirmos aos jovens, eles tendem a constituir-se como um segmento
global (Hassan & Katsanis, 1991; Moses, 2000; Tully, 1994; Kjeldgaard
& Askegaard, 2006), em que os ditos jovens ' os global teens - partilham
experiências memoráveis (através de televisão, educação internacional, viagens
frequentes), as quais se refletem no seu comportamento de consumo (. . .)
(Hassan & Katsanis, 1991, p. 21). De notar que estes jovens se associam ao
conceito de teenage consumer (Abrams, 1961) referente a consumidores da
classe média livres de responsabilidades de recebimento de salário. Estes
consumidores, como salientam Kjeldgaard e Askegaard (2006: 232), estão por sua
vez associados a uma identidade, a qual está ligada de forma inextricável ao
consumo hedónico e de lazer, potencialmente conducente a experiências mais
duradouras e aprofundadas nos destinos. As experiências mencionadas tendem a
estabelecer-se no contexto de uma cultura global jovem (Gidley, 2001),
configurada por dinâmicas centro-periferia da economia cultural global e seus
fluxos. É preciso, no entanto, problematizar esta questão tendo em conta a
existência ou não de cultura(s) dos jovens e do facto das dinâmicas
referidas, longe de serem pacíficas tenderem a alicerçar-se numa história de
lutas (Heaven & Trubidy, 2003, p. 153) e tensões sócio-políticas.
Uma vez que a identidade dos jovens está em processo de construção, as práticas
desenvolvidas no seu tempo de lazer e consequentemente as associadas à viagem
apresentam-se como uma oportunidade para divertir, relaxar e aprender através
de aprendizagem informal (e.g. fora do trabalho académico) (EU/Eurostat, 2009,
p. 161), com repercussões positivas a nível social/emocional, vocacional,
físico, cognitivo, e de envolvimento/compromisso e desenvolvimento cívico. Em
consequência, o turismo jovem tem um importante papel a desempenhar na
componente educacional da experiencia dos estudantes em causa, quer através de
viagens espontâneas (e.g. viagens independentes) ou organizadas (e.g. Programa
Erasmus) quer ainda através de visitas de estudo durante a permanência no
ensino superior (Carr, 2003).
Assim, tendo presente que a procura turística jovem é segmentada, caberá
compreender o seu subsegmento estudantil afeto ao ensino superior. Vários são
os autores que avançam com segmentações da procura turística, tais como por
escolha do destino (Scott, Schewe & Frederick, 1978), planeamento da
viagem/método da viagem (Hawes, 1978), características demográficas (Graham
& Wall, 1978), geográfica (Mill & Morrison, 1992), objetivo da viagem
(Bryant & Morrison, 1980), modelo de gastos e preferência pelo descanso ou
o oposto (animação), pela cultura ou natureza, pela agitação ou tranquilidade,
por viajar sozinho ou em grupo, eventos, (Heath & Wall, 1992), embora mais
recentemente tenha havido a preocupação em contemplar, por exemplo, os jovens
estudantes universitários (Carr, 2003) ou backapakers (Maoz, 2007).
A segmentação por motivo de viagem foi alvo do estudo de vários autores que
deram o seu contributo para a identificação dos principais motivos que estão na
origem da visita. Há que ter em atenção que a compreensão da motivação não
passa somente pela determinação dos objectivos mas também pela consideração das
necessidades e desejos do turista. A grande maioria das teorias da motivação
tem como conceito central o conceito de necessidade. A(s) necessidades(s) é/são
a força que motiva o comportamento, pelo que a compreensão da motivação passa
pela determinação das necessidades individuais e de como elas tendem a ser
satisfeitas Henriques (2003, p. 82). Holloway (1994) identifica três dos
principais grupos de objetivos, são eles viagens de negócios, viagens de lazer
e viagens mistas. No referente aos jovens, a(s) sua(s) necessidade(s) de
afirmação da identidade e curiosidade pelo meio envolvente, este autor enfatiza
a viagem e a experiência associada à viagem como um elemento marcante no
percurso pessoal bem como académico. Simultaneamente, tal como salienta
Richards (2011; in UNWTO/WYSE, 2011, p. 7), os jovens adicionam atmosfera e
buzz' aos destinos, atraindo outros visitantes e negócios. Quanto ao segmento
de procura turística estudantil do ensino superior, ele inscreve-se no
designado turismo jovem. Segundo a EU (2010a, p. 44), o segmento assenta em
quatro grandes tipos de jovens viajantes/turistas: backpackers (mochileiros),
viajantes de lazer (leisure travelers), viajantes estudantes (student
travellers) e viajantes por trabalho (work travellers). O segmento atrás
referido tende a estar associado proporcionalmente a níveis mais elevados de
rendimento discricionário bem como a maior tempo para o lazer, incluindo
viagens durante as férias, facto que favorece o turismo e que se traduz numa
estrutura orçamental ou estrutura de gastos particular.
Adicionalmente, embora o turismo tenha sido afectado pela crise actual, no
respeitante aos jovens afectos ao ensino superior, existe o reconhecimento de
que é o sector de melhor performance, não estando a ser substancialmente
afetado com o declínio económico actual (WYSE, 2011; in UNWTO/WYSE, 2011, p.
8).
3. Metodologia
Este estudo tem por base um inquérito por questionário aplicado no ano de 2011
aos estudantes do ensino superior, residentes em Portugal continental, por NUT
II (Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve), obtendo-se uma amostra de 1311
observações. Procurou-se que o peso de cada uma das regiões na amostra e a
distribuição desta por áreas científicas das licenciaturas onde estavam
inscritos se aproximasse dos padrões apresentados pelo universo em análise.
O estudo, ao contar com um elevado número de observações, permite assegurar a
aproximação entre as características da amostra e as características do
universo, por um lado e garantir elevados níveis de potência para os testes
estatísticos realizados, por outro. Ao longo do artigo é utilizado um nível de
significância de referência de 5%.
Para efeitos da determinação da dimensão amostral foi utilizada a metodologia
de análise de potência. Esta metodologia de apoio ao planeamento da
investigação empírica e à definição da dimensão da amostra tem vindo a ser
crescentemente desenvolvida e utilizada nas últimas duas décadas, na sequência
do trabalho de Cohen (1988). Neste contexto, um estudo de simulação para
análise da potência, com recurso ao software G*power3 (Faul, 2007) permitiu
concluir por níveis de potência superiores a 80% em todos os testes
estatísticos a realizar. Entre as especificidades regionais identificadas serão
objecto de análise as que se revelam significativas do ponto de vista
estatístico.
Em termos de métodos de estatística descritiva são utilizadas a média e a moda
enquanto medidas de localização central. A este nível a análise é ainda
complementa pela representação em tabela da distribuição de frequência relativa
das principais variáveis caracterizadoras da procura turística.
Quanto aos métodos de inferência estatística são utilizados testes do Qui-
Quadrado à independência entre variáveis. Neste artigo, é atribuída particular
atenção a diferenças nas características da procura turística, em função da
região de residência habitual, nomeadamente, a periodicidade da viagem, do
gasto anual médio com viagens, o tipo de transporte e a época de viagem, entre
outras. Os testes estatísticos acima identificados assumem um papel relevante
na obtenção de evidência empírica de diferenças nos padrões de comportamento
dos estudantes do ensino superior enquanto turistas.
No sentido de comparar a relevância dos diferentes tipos de motivação da viagem
é proposto um Indicador de Relevância das Motivações Turísticas (adiante
designado por IRMT). Este indicador corresponde ao peso das classificações
atribuídas a cada tipo de motivação pelos estudantes que compõem a amostra
(numa escala de relevância de 1 a 5) na classificação máxima admissível (ou
seja, a classificação obtida se todos os indivíduos que compõem a amostra
atribuíssem a uma determinada motivação a classificação máxima de 5 pontos). A
expressão do IRMT é dada por:
onde IRMTj representa o Indicador de Relevância da Motivação de tipo j, com j
= 1,...,16, N representa o número de observação da amostra e 5 é a pontuação
máxima que um indivíduo pode atribuir a uma determinada motivação. O numerador
da fracção corresponde à soma das pontuações atribuídas à motivação j pelos N
indivíduos que compõem a amostra, enquanto que o denominador representa a
pontuação máxima alcançável por pela motivação de tipo j.
Os objectivos de análise deste artigo tornam útil a construção de um indicador
complementar ao IRMT,o Indicador Regional de Relevância das Motivações
Turísticas (adiante designado por IRRMT).
O indicador proposto permite uma análise por região NUT II, a expressão do
IRRMT assume a forma:
onde k=1,...,5 representa as regiões NUT II, com 1 ≡ Norte, 2 ≡ Centro, 3
≡ Lisboa, 4 ≡ Alentejo e 5 ≡ Algarve.
Neste caso, Nk representa o número de observações da amostra correspondente à
região k e o IRRMTj,k deve ser entendido como o indicador de relevância da
motivação de tipo j na região k.
Este indicador pode ser interpretado como o peso das classificações atribuídas
pelos estudantes a uma motivação turística na classificação máxima atribuível.
Tanto o IRMT como o IRRMT permitem a construção de rankings ao nível das
motivações a nível de Portugal continental ou a nível regional.
4. Estudo de caso: a procura turística dos estudantes do ensino superior,
por região de residência habitual
4.1. Importância económica do turismo em Portugal
O turismo é um setor de atividade económica determinante, nomeadamente em
Portugal, se se considerar a importância da Industria das Viagens & Turismo
e da Economia das Viagens & Turismo. Em 2011, de acordo com a conta
Satélite do Turismo, o contributo das Viagens & Turismo (V&T) para o
PIB foi de EUR26.2bn (15.2% do PIB) e o contributo das V&T para o emprego
(incluindo empregos indiretamente suportados pela indústria) foi de 17.8% do
total de emprego (866,500 empregos) (WTTC, 2012, p. 1). A natureza recetora do
turismo português associada ao produto sol e mar está patente nas exportações
geradoras de EUR 10.3bn (17.3% do total das exportações) bem como em gastos em
viagens de lazer geradores diretamente de 87.5% do PIB (EUR15.0bn) comparado
com 12.5% dos gastos em viagens de negócios (EUR2.2bn) (WTTC, 2012, p. 6).
Em 2010, segundo o Inquérito às Deslocações dos Residentes (Instituto Nacional
de Estatística [INE], 2011, p. 4), cerca de 4 milhões de residentes efectuaram
pelo menos uma deslocação em que dormiram uma ou mais noites fora da sua
localidade de residência (37.4% da população residente). Se considerarmos essa
informação relativa a viagens por estrutura etária, verificamos que o grupo dos
15-24 está associado a 429.7 milhares de turistas (INE, 2011, p. 51) e 1613.3
milhares de viagens num total de 15372.9, com uma representatividade de 10.4%
(INE, 2011, p. 5 e 53). Em Portugal, no mesmo ano, efetuaram-se cerca de 15.4
milhões de viagens por motivos turísticos, das quais 89.5% em território
nacional e 1.6 millhões para destinos no estrangeiro.
Quanto às motivações mais representativas deste grupo distingue-se o lazer,
recreio e férias com 863.4 milhares de viagens (744.5 em Portugal e 118.9 no
Estrangeiro), seguida da visita a familiares e amigos (604.4) e de negócios/
profissionais (100.8) (INE, 2011, p. 53).
Segundo dados da EU/EUROSTAT (2010, p. 10-11), no respeitante a Portugal, para
o período compreendido entre 2004 e 2008, verificou-se uma participação no
turismo, EU-27 (propensão para o turismo) de 17.0%, valor significativamente
menor do que o europeu (53.9%). No respeitante ao grupo etário compreendido
entre os 15-24 anos, apresenta um peso de 17.0% (Portugal) face a um peso de
51.5% na Europa (EU/Eurostat, 2010, p. 10-11).
4.2. Caraterísticas da procura turística dos estudantes do ensino superior
A análise das características da procura turística dos estudantes do ensino
superior em Portugal continental, com desagregação regional/NUT II assenta na
tabela_2.
Com excepção dos itens planeamento da viagem e tipo de alojamento, os quais
estão associados a níveis de significância do teste do qui-quadrado à
independência de variáveis superiores a 5%, para os restantes itens é possível
obter evidência empírica de diferenças na distribuição de frequências relativas
em função da região NUT II (rejeição da hipótese nula de independência entre
cada variável de interesse e as regiões de residência habitual).
Os resultados obtidos apontam para uma elevada propensão ao turismo por parte
dos estudantes do ensino superior. De facto, cerca de 75% dos jovens referem
que se deslocaram para fora da sua região de residência habitual no último ano.
Este é um valor que ultrapassa largamente os valores para 2008 publicados em
2010 pelo Eurostat, os quais indicam que o peso do segmento jovem nas viagens é
de 51.5% e 17% respectivamente para o caso da União Europeia e de Portugal.
Esta diferença pode estar associada a um maior interesse pelo turismo por parte
dos jovens que frequentam o ensino superior, por comparação com aqueles que não
frequentam este tipo de ensino. No respeitante à periodicidade das viagens, dos
inquiridos que afirmaram terem-se deslocado, a maioria dos estudantes (64.6%)
referiu deslocar-se para fora da região de residência habitual uma (33.6%) a
duas (31%) vezes por ano e 27.1% dos estudantes referiram viajar 3 três ou mais
vezes por ano. Apenas 8.2% dos estudantes afirmam que não costumam viajar. É
ainda possível observar que a periodicidade ou frequência da viagem é mais
elevada na região de Lisboa. De facto, 65,1% dos estudantes afirmam que viajam
uma a duas vezes por ano. E 29.9% afirmam viajar pelo menos três vezes por ano.
Quanto à duração da estada média dos estudantes segundo a região de residência
habitual, destacam-se os estudantes das regiões Norte e Lisboa com estadas de
maior duração (7.6 e 7.1 noites) contrapondo com os do Algarve, os quais surgem
com menor estada média (4.8 noites).
Os estudantes tendem a viajar acompanhados pela família (53.4%), amigos (22.2%)
ou pelo cônjuge/namorado(a) (15.3%). Apenas 7.1% dos estudantes afirmam viajar
sozinhos. A viagem com familiares destaca-se pela sua importância na região de
Lisboa (60.3%) por comparação com 53.4% da média nacional. A viagem na
companhia do cônjuge/namorado(a) tem, no caso dos estudantes do Algarve, um
peso muito superior ao da média nacional (22.8% por comparação à média de
15.3%).
É também de salientar o elevado peso do recurso à internet (65.6% dos
estudantes) e a familiares e amigos (19.8%) para efeitos de planeamento das
viagens. As agências de viagens /operadores turísticos são utilizadas por 12.1%
dos estudantes e os operadores especializados em viagens para jovens por 2.0%.
Em termos do alojamento, por outro lado existe uma preferência por casa
própria, familiares e amigos (35.7 %) e pela procura de estabelecimentos para
jovens (pousadas da juventude) (26.9%). A hotelaria tradicional representa
apenas 20.6% da preferência dos estudantes. Alguns estudantes recorrem ainda a
casa a arrendada (10.5%) e a parques de campismo (6.0%).
Ao nível do meio de transporte, os estudantes tendem a privilegiar o automóvel
próprio (59.1%) e o avião (22.4%). Outros meios com alguma procura são o
autocarro (12.0%) e o comboio (5.8%). Interessa também salientar a presença de
alguma diversidade nos padrões de utilização dos diferentes tipos de
transporte. Por razões que se prendem com a existência de infra-estruturas
aeroportuárias, os estudantes das regiões Norte, Lisboa e Algarve revelam um
maior interesse pela utilização do avião (27.3, 26.5 e 24.2% por comparação a
22.4% da média nacional). Em sentido inverso, no Alentejo a utilização do avião
é referida por apenas 14.8% dos estudantes). Ainda ao nível do tipo de
transporte é possível observar um maior interesse relativo pela utilização do
automóvel próprio por parte dos estudantes da região Centro e do Alentejo
(66.0% e 65% contra os 59.1% que correspondem à média nacional).
A época preferencial para a realização das viagens é o verão (férias do verão)
com um peso de 83.6%. Outras épocas como as férias da Páscoa, férias de
semestre ou férias de Natal apresentam pesos muito baixos por comparação com as
férias de verão (respectivamente 6%, 4.2% e 5.3%). Ao nível da época da viagem
é possível destacar os estudantes do Algarve como aqueles que menos viajam na
época de verão enquanto época privilegiada na realização de viagens (74.3% dos
estudantes do Algarve contra 83.6% da média nacional).
Quanto aos rendimentos, de notar que os valores mais elevados de rendimento
disponível médio são observados no Norte (332 Euros) e Lisboa (327 Euros)
contrapondo com o Algarve e o Alentejo com rendimentos disponíveis médios de e
304 e 325 Euros respectivamente.
O gasto anual em viagens observado revela que perto de 50% dos estudantes
gastam menos de 500 Euros/ano em viagens e 84.3% menos de 1500 Euros. O
intervalo entre os 500 e os 2500 Euros/ano é composto por 47.1% dos estudantes.
Apenas 4.7% dos estudantes gastam 2500 Euros ou mais anualmente. Ainda ao nível
dos gastos é possível destacar o elevado peso de jovens que afirma gastar até
500 Euros/ano em viagens observado no Algarve e no Centro (com pesos de 55.3 e
54.5% por comparação com os 48.2% do conjunto das regiões (total). Ainda neste
âmbito, destaca-se a região de Lisboa por apresentar um peso de 39.3%, inferior
à média para o conjunto de estudantes que gastam até 500 Euros/ano. Nesta
região, 54.7% dos estudantes gastam entre 500 e 2500 Euros/anos.
Quanto ao padrão de gastos associado verifica-se que a alimentação e bebidas,
alojamento e transporte são, por ordem decrescente as três rubricas mais
importantes de gasto com pesos médios respetivamente de 27.5%, 20.1% e 19.9%.
A animação e diversão surgem como a rubrica prioritária, entre os aspectos não
indispensáveis da viagem, com um peso médio de 14.6%.
Na tabela_3 encontram-se assinalados a cinzento os pesos máximos de cada uma
das rubricas que compõem a estrutura dos gastos dos estudantes no contexto da
viagem. Os estudantes do Algarve são os que apresentam uma maior propensão para
o consumo de alimentação e bebidas, compras e artesanato. Os estudantes da
Região Norte são os que têm uma maior propensão ao nível da animação e diversão
e os de Lisboa em transportes.
4.3 Destinos e Motivações da viagem
Os estudantes tendem a privilegiar destinos nacionais (42%) entre os quais se
destacam Lisboa, Algarve e Alentejo. A opção pelo mercado nacional aspecto que
poderá estar associado a limitações ao nível do rendimento disponível mensal.
Em segundo lugar, surge a Espanha como mercado receptor (24%), seguida do Reino
Unido (5.2%) e França (4.9%).
Tendo em vista a comparação da relevância das motivações da viagem procedeu-se
à construção do Indicador Regional de Relevância das Motivações Turísticas, de
acordo com o enquadramento metodológico descrito no ponto 2. Com base neste
indicador procedeu-se à construção de um ranking para a relevância dos tipos de
motivação para cada uma das regiões/NUT II em análise.
Os resultados do estudo das motivações da viagem constam da Figura_1 e da
Tabela_4. A figura_1 permite observar os valores do IRRMT para Portugal
continental, destacando-se a diversão e convívio como a motivação mais
relevante. Com efeito, este tipo de motivação obtém 83.1% da pontuação
possível. Na 2ª posição do ranking situa-se motivação associada ao sol e mar
(81.4%), seguida da motivação natureza, na 3ª posição (75.9% da pontuação
possível) e da motivação cultural na 4ª posição (75.2% da pontuação possível).
As motivações referidas ultrapassam, em média, a relevância de aspectos como
fazer amigos/ conhecimentos (6º posição do ranking global), eventos (7ª
posição), animação nocturna (8ª posição), visita a amigos e familiares (9ª
posição). Entre as motivações com menor relevância é possível destacar a
religião (33.5%), os negócios (34.4%) e a gastronomia e vinhos (53.4%),
respectivamente nas 15ª,14ª e 13ª posições do ranking geral.
Em termos regionais, a análise da tabela_4 possibilita verificar que a
motivação sol e mar surge no 1º lugar do ranking em 4 das 5 regiões
consideradas (Norte, Centro, Lisboa e Alentejo). O Algarve constitui uma
excepção a este padrão de comportamento. De facto, nesta região, a motivação
sol e mar surge na 10ª posição.
A motivação diversão e convívio, embora a 1ª a nível de Portugal continental,
em termos regionais é também uma das mais relevantes. De facto, este tipo de
motivação surge no 1º lugar do ranking no caso do Algarve, no 2º lugar nas
regiões Norte, Centro, Lisboa e no 3º lugar no Alentejo. É também interessante
observar a elevada importância atribuída pelos estudantes à motivação cultural,
a qual surge no 2º lugar no caso do Algarve, no 3ª lugar no Norte e em Lisboa,
no 4º lugar no Alentejo e no 8º no Centro. Um comportamento similar ao
observado para a cultura ocorre no caso da motivação natureza, a qual ocupa a
3ª posição do ranking nas regiões Norte e do Algarve e a 4ª posição em Lisboa.
5. Conclusões
O segmento de procura turística jovem, bem como o subsegmento de estudantes do
ensino superior em Portugal, por regiões, são ainda alvo de um número limitado
de estudos.
Neste contexto, o artigo apresentado visa constituir-se como um contributo para
a compreensão, não só da procura turística dos estudantes do ensino superior,
mas também para a determinação de diferenças entre os estudantes, por regiões/
NUT II de residência habitual.
Considerou-se importante esta incursão investigacional no segmento estudantil,
tendo em conta quer a importância da viagem, em termos pessoais e sociais para
o jovem, quer o reconhecimento institucional e político da dimensão e
importância deste mercado e seus impactos. O aumento da representatividade dos
estudantes no turismo, determinada por tendências várias como o aumento do peso
dos jovens a estudar a tempo inteiro, a maior disponibilidade temporal, a maior
disponibilidade para a mobilidade e espírito de aventura, entre outros, a par
de um maior rendimento e cultura, conduzem à necessidade de analisar mais
profundamente esta realidade em Portugal.
Devido ao número elevado de variáveis a considerar, o estudo apresentado
configura-se apenas como uma introdução à realidade em questão e por isso
circunscreveu-se a um número mais restrito de variáveis.
Entre os resultados obtidos, evidencia-se uma elevada propensão à viagem tendo
em conta que cerca de 75% dos estudantes do ensino superior afirmam ter-se
deslocado para fora da sua área de residência habitual, fundamentalmente para
destinos nacionais, associados a estadas médias de 6.6 noites. Tendem a viajar
maioritariamente em família ou com amigos uma a duas vezes por ano e apresentam
um volume de gastos anual em viagens até 1500 Euros, pernoitando em casa
própria ou de familiares e em estabelecimentos específicos para jovens. A
estrutura dos gastos é mais representativa respetivamente na alimentação e
bebidas, alojamento e transportes.
Ao nível das motivações da viagem é possível concluir, com base nos indicadores
IRMT e IRRMT, que os jovens estudantes do ensino superior atribuem especial
relevância às motivações diversão e convívio, sol e mar, natureza, cultura e
aventura. De acordo com o ranking desenvolvido, estas motivações ultrapassam,
em média, a relevância de aspectos como fazer amigos/conhecimentos, eventos,
animação nocturna, visita a amigos e familiares. De notar que a motivação sol e
mar surge no 1º lugar do ranking em 4 das 5 regiões consideradas, ou seja, no
Norte, Centro, Lisboa e Alentejo. O Algarve constitui uma excepção a este
padrão de comportamento (conduzindo a que em termos de média a diversão e
convívio assuma o lugar cimeiro). Em estudos futuros será uma linha de pesquisa
relacionar as motivações preferenciais dos jovens com os produtos estratégicos
a desenvolver por região, tal como está definido no Plano Estratégico Nacional
de Turismo. É nossa convicção que os estudantes tenderão a procurar o que não
encontram na sua região. Uma vez que no Algarve, um dos seus produtos
estratégicos é o sol e mar, será de tirar a ilação que os estudantes residentes
desta região, usufruem dos atributos a ele associados e consequentemente
deslocam-se maioritariamente a outras regiões nacionais ou ao estrangeiro com
outras motivações (para além do sol e mar).
A consideração da variável região de residência habitual conduziu a resultados
que se consideraram de interesse e que apelam a estudos mais aprofundados. Os
principais aspectos a destacar prendem-se com a evidência de uma maior
periodicidade ou frequência das viagens protagonizadas pelos estudantes
residentes em Lisboa associada a gastos anuais em viagens superiores aos das
outras regiões (maior incidência de gastos nos escalões superiores).
Lisboa e Norte também se destacaram em termos de duração da estada bem como
numa maior incidência de viagens aéreas face aos estudantes das outras regiões.
Em contraponto, os estudantes residentes no Algarve revelam estadas de duração
inferior bem como são aqueles que menos viajam na época de verão, o que é
compreensível se retivermos as características naturais da região algarvia
(associadas ao turismo de sol e mar) conduzindo a que nesta região, a motivação
sol e mar surja na 10ª posição.
Em nota de finalização cabe referir que o estudo foi desenvolvido em 2011.
Acredita-se que o acentuar da crise sócio-económica em Portugal durante o ano
em decurso (2012) associada a cortes nos rendimentos médios anuais das
famílias, possa ter repercussões sensíveis nos resultados, que seria
estimulante em artigo sequente comparar.