Implementação de novas práticas pedagógicas no Ensino Superior
1. Introdução
A implementação do Processo de Bolonha, em Portugal, foi concretizada através
da definição da estrutura dos ciclos de estudo e do novo modelo a adotar para o
seu funcionamento. Esta alteração foi realizada, essencialmente, através da
alteração legislativa imposta a todas as Instituições de Ensino Superior (IES),
com prazos definidos para a entrada em vigor destas mudanças e para a
concretização destas transformações. Desde 2006, quando este processo teve
início, tem sido necessária uma adaptação contínua de todos os intervenientes
no processo, tanto pelas alterações ao nível funcional como organizacional, o
que promoveu o atraso nas alterações centrais: as mudanças pedagógicas.
De uma forma muito sintética, podemos dizer que o Processo de Bolonha se baseia
num modelo de ensino centrado no estudante (European Comission, 2009) onde o
foco é o que o estudante realiza' e como o relaciona com a atividade de
aprendizagem'. Assim surge o sistema de créditos ECTS (European Credit Transfer
and Accumulation System) e a quantidade de mudanças a ele associadas,
implicando regimes de avaliação e de garantia da qualidade mutuamente
reconhecidos. Neste contexto, é fundamental definir os níveis de conhecimento
pretendidos, como o estudante os concretiza e se as competências necessárias
foram atingidas em cada um deste níveis. Motivar o estudante para a
aprendizagem e para a participação nas atividades propostas pressupõe ainda dar
significado a estas atividades, despertando o interesse em desenvolvê-las
(Biggs & Tang, 2007). Esta tarefa está diretamente relacionada com o
docente ou formador, vulgo professor neste nível de ensino.
Ser professor do Ensino Superior é, ainda, certamente, considerado pela
sociedade em geral como sendo um privilégio a que apenas algumas pessoas,
poucas, têm acesso. Esta visão sobre o estatuto social que o docente deste
nível de ensino possui transporta consigo uma carga de exigência intelectual e
social (Cachapuz, 2001) que sempre acompanhou esta profissão ao longo dos
tempos. Situados ao nível do topo do conhecimento científico afeto à sua área
de intervenção profissional, os docentes do Ensino Superior desde sempre foram
alvo de admiração por parte da maioria dos seus aprendentes e familiares mais
próximos. Importantes agentes de aprendizagem, os docentes deste nível de
ensino eram considerados, até há bem pouco tempo, o mais importante, senão o
único, meio de (in)formação dos estudantes. Detentores de um saber ímpar,
marcavam um papel preponderante ao nível da relação, tendencialmente
unidirecional, professor-estudante.
Contudo, o tempo de hoje é outro, pois, para além do professor do Ensino
Superior dever continuar a preocupar-se com o domínio científico dos conteúdos
a trabalhar com os seus estudantes, também deve passar a dar atenção ao que se
passa ao nível do ambiente de aprendizagem relativo às unidades curriculares
que ministra. Concordamos com Guerra (1990, cit. em García-Valcárcel, 2001, pp.
9-10), quando refere que:
el profesor ha de ser un conocedor de la disciplina que desarrolla,
un especialista en el campo del saber, permanentemente abierto a la
investigación y a la actualización del conocimiento. Pero ha de
saber, también, qué es lo que sucede en el aula, cómo aprenden los
alumnos, cómo se puede organizar para ello el espacio y el tiempo,
qué estrategias de intervención pueden ser más oportunas en ese
determinado contexto.
De facto, recentemente, a componente pedagógica afeta à docência do Ensino
Superior tem merecido a atenção dos especialistas em Ciências da Educação. A
título de exemplo, Cachapuz (2001) refere a necessidade de haver "um
aperfeiçoamento pedagógico dos docentes" (p. 56). Esta sugestão vem ao encontro
da ideia defendida por Román (1980) no sentido de se contrariar a tendência
excessiva para o verbalismo, dogmatismo e a tipologia de classe magistral deste
tipo de ensino. Hoje valoriza-se, pois, "a interacção e a troca de informação
entre professor e aluno. No lugar da reprodução passiva de informações já
existentes, deseja-se cada vez mais o estímulo à criatividade dos estudantes"
(Blikstrein & Zuffo, 2003, p. 25). A inter-relação entre a investigação, a
inovação e a necessidade de formação é uma necessidade profissional que os
professores deverão construir, com benefícios para o aprendente (Gonçalves,
2006).
No sentido de se adaptarem às alterações paradigmáticas do ato de ensinar-
aprender, propostas pelo Processo de Bolonha, muitas IES investiram em
metodologias de ensino não presencial, não só para diversificarem o leque de
oferta formativa, mas também para incutirem no estudante o papel de agente
ativo da sua própria aprendizagem. Termos como e-learning, b-learning, formação
síncrona e assíncrona, competências, carga de trabalho, passaram a fazer parte
do vocabulário inerente aos ambientes de ensino-aprendizagem propostos pelas
instituições deste nível de ensino. Contudo, atente-se à chamada de atenção
produzida por Ardizzone & Rivoltella (2004) ao referirem-se ao termo
"falácia tecnológica" (p. 29), pois não basta transportar' os cursos, tal qual
eles existem, para as plataformas de ensino à distância para que se possam
produzir milagres de aprendizagem nos estudantes. De facto, concordamos
igualmente com Lagarto & Andrade (2009) ao referirem que:
A Sociedade da Informação e a Internet trouxeram ao mundo da educação
e da formação novos paradigmas para ensinar e aprender. Se através da
Internet podem ser disponibilizados conteúdos de uma forma mais
alargada, mais rápida, atractiva e interactiva que antes, a verdade é
que isso pode implicar a necessidade de novos modelos de ensino e
aprendizagem bem como da sua distribuição (p. 56).
Não basta, pois, haver evolução tecnológica para que se possa pensar que os
resultados de aprendizagem melhoram de forma tácita. De acordo com Bustamante
(2001), ter-se-ão que conceber conteúdos de qualidade, adaptados a cada
realidade local, concebidos não apenas pelos docentes, mas tendo também o
auxílio de especialistas em comunicação à distância. Utilizar plataformas
tecnológicas de ensino-aprendizagem, que permitem uma enorme interatividade dos
agentes que a ela se ligam, para promover materiais didáticos estáticos como
são os tutoriais, sebentas ou algumas sugestões de leitura para que os
estudantes possam aprender, é desaproveitar as potencialidades interativas
dessas plataformas formativas (Belisário, 2003).
Sensibilizar os docentes e os estudantes para a necessidade de estes últimos
promoverem competências de estudo autónomo eficaz que lhes permitam ter sucesso
no Ensino Superior, à luz do Processo de Bolonha, é uma das principais
finalidades inerentes à conceção do Projeto ConstAp, que o Instituto
Politécnico de Castelo Branco (IPCB) quer ver incutido em todos os seus cursos.
Para tal, interessará saber em que medida as plataformas de ensino-aprendizagem
à distância poderão contribuir para que o estudo autónomo dos alunos seja
eficaz, bem como saber que tipo de tarefas são propostas para o desenvolvimento
da componente do estudo autónomo, e analisar a forma como são monitorizadas
essas atividades pelos docentes.
A melhoria das práticas de ensino é, para os bons professores, um estímulo
evolutivo e de partilha, mas este processo é mais eficaz se se traduzir num
processo académico, fundamentando-se estas mudanças em dados, e não suposições,
pelo que são necessários modos de recolha de informação e de documentação para
partilha de novas práticas pedagógicas.
Dada a natureza do processo de ensino-aprendizagem, a sua complexidade e a sua
multidimensionalidade, para ser avaliado é necessário fazê-lo a partir de
várias fontes. Desde logo, existe a necessidade de considerar os atores do
processo, docentes e estudantes, assim como os outros agentes envolvidos, tais
como os órgãos de gestão científica e pedagógica da IES.
Aos docentes e estudantes, a aplicação de questionários, onde possam ser
inquiridos diretamente sobre a maioria dos indicadores/critérios considerados,
passa por ser uma fonte de informação relevante. Os resultados de inquéritos de
avaliação de desempenho pedagógico de docentes e da avaliação da unidade
curricular pelo docente constituem outro elemento fundamental em termos
quantitativos. A validação das metodologias pelo órgão científico da IES
constitui uma garantia relativamente à adequação entre as várias componentes,
os conteúdos programáticos, os objetivos e as competências pretendidas para
cada ciclo de estudos.
O Ensino Superior é uma teia complexa de competências, conhecimentos e
aptidões. Nenhuma preparação, por muito boa que seja, dura toda uma carreira.
Os estudantes e as suas atitudes para a aprendizagem mudam com o passar do
tempo, assim como a investigação sobre o ensino evolui.
2. O paradigma da mudança
De acordo com Tyler, "Learning takes place through the active behavior of the
student: it is what he does that he learns, not what the teacher does" (cit. em
Biggs & Tang, 2007, s/p).
A utilização de métodos expositivos, essencialmente baseados na ação do
docente, é uma característica do modelo tradicional de ensino. Neste novo
contexto, importa refletir sobre estas práticas e tentar orientar a atividade
pedagógica para a adoção de técnicas e atividades que fomentem a participação
do estudante (Esteves, 2010; Leite & Ramos, 2010; Ramos, Costa, Tavares,
& Huet, 2006). A aprendizagem deve estar centrada no que o estudante é
capaz de fazer, motivando o trabalho individual e cooperativo no sentido de
desenvolver competências transversais (soft skills) fundamentais, como a
capacidade de trabalho em equipa.
Na transição para a adoção dos princípios inerentes ao Processo de Bolonha, se
a questão da alteração dos graus beneficiou de uma maior visibilidade pública,
o acolhimento do sistema de créditos (ECTS) teve um impacto mais significativo
na organização pedagógica das IES. Enquanto o anterior sistema de créditos se
baseava no número de horas de ensino presencial, as novas unidades de crédito
são baseadas no número de horas despendidas pelo estudante no seu processo de
aprendizagem. Este novo sistema requer, por um lado, uma definição clara dos
objetivos da formação em termos de competências a adquirir e uma grande
flexibilidade curricular, e, por outro, centralizar o estudante no processo de
aprendizagem.
Esta centralização corresponde a uma prática de ensino que se entende invertida
relativamente a modelos mais tradicionais: em vez de se passar conhecimento
prêt-a-porter, sustentado por um manancial bibliográfico de larga escala,
incentiva-se o estudante a procurar esse conhecimento por meios próprios,
permitindo empowerment e autonomia ao aprendente, relevando as componentes de
trabalho experimental e as competências transversais, favorecendo o
desenvolvimento da sua criatividade e cimentando o raciocínio crítico (Vieira,
Mamede, & Lima, 2008).
O ensino centrado no estudante (ECE) constitui um quadro mental e cultural,
correspondendo a uma abordagem relacionada com as investigações das teorias
construtivistas de aprendizagem. É caracterizado por métodos inovadores de
ensino que procuram a aprendizagem em interação com os professores e outros
estudantes, capacitando os estudantes para uma aprendizagem ativa através da
resolução de problemas, raciocínio crítico e reflexivo (Attard, Di Iorio,
Geven, & Santa, 2010). Os princípios mais sustentados relativamente ao ECE
correspondem, de acordo com Attard et al. (2010), Santa & Geven (2010) e
Biggs & Tang (2007), aos seguintes aspetos: i) um processo reflexivo
contínuo; ii) não existem receitas de sucesso garantido; iii) os estudantes
possuem estilos de aprendizagem diferentes; iv) os estudantes detêm interesses
e necessidades distintas; v) a possibilidade de escolha é central a uma
aprendizagem efetiva; vi) os estudantes têm experiências e conhecimento de base
diferentes; vii) os estudantes devem poder controlar a sua aprendizagem; viii)
focalização na permissão para explorar o conhecimento e não na sua transmissão;
ix) atitudes cooperativas entre estudantes e professores.
O ECE corresponde a um modelo alternativo que se focaliza no que é expectável
que os estudantes consigam fazer no final do módulo ou unidade ' é, neste
sentido, uma abordagem baseada nos resultados da aprendizagem (Kennedy, Hyland,
& Ryan, 2007).
A correspondência entre os resultados de aprendizagem (learning outcomes), as
metodologias de ensino-aprendizagem e o processo de avaliação tem sido alvo de
estudo por diferentes investigadores, nomeadamente Houghton (2004) e Biggs
& Tang (2007), que invocam o conceito de alinhamento construtivo'
(constructive alignment), considerando-o um dos conceitos mais estimulantes
aplicados ao Ensino Superior. O pressuposto de todo o sistema é de que o
currículo é criado para que as atividades de aprendizagem e as tarefas de
avaliação sejam coerentes com os objetivos de aprendizagem que se pretendem
atingir numa determinada unidade curricular.
Neste sentido, "Learning outcomes are statements of what a learner is expected
to know, understand and/or be able to demonstrate after completion of a process
of learning" (Kennedy et al., 2007, p. 5), deslocando-se o núcleo central da
formação do ensino para a aprendizagem. Esta revalorização da educação, que
recorre ao debate e à reflexão (por oposição a uma cultura formativa de
reprodução do saber e do consumo das ideias de terceiros), é credora da
coerência referida anteriormente e permitirá ao estudante, numa sociedade
baseada no domínio do conhecimento, uma permanente capacidade de lidar com
mudança e readaptação (Zabalza, 2003).
As dificuldades dos diferentes países em alterar os sistemas tradicionais de
ensino e aprendizagem (seja centralizando o ensino no estudante, seja baseando
esse ensino em competências) têm sido difíceis de ultrapassar, a nível
nacional, mas principalmente a nível supranacional: "( ) under the surface of
the same Bachelor-Master structure the sea is full of different and
incomparable fish" (Ritzen, 2010, p. 175).
Tendo por base os princípios do constructive alignment, que descreve a
congruência entre o que o professor entende que os estudantes devem ser capazes
de executar, saber ou entender, como deve ser ensinado', o que' e como' deve
ser avaliado (Fry, Ketteridge, & Marshall, 2009), foi delineado um projeto
denominado "Construção da Aprendizagem" (ConstAp) no IPCB.
3. O Projeto ConstAp
O Projeto ConstAp foi gizado considerando-se como objetivos maiores: os
desafios do Processo de Bolonha; o ensino centrado no estudante; um ensino
baseado na aquisição de competências. Um objetivo, também fundamental,
intrínseco ao modelo relaciona-se com os aspetos de qualidade do ensino e a
resposta a dar pelos cursos relativamente a procedimentos de avaliação de
ciclos de estudo no âmbito da Agência de Acreditação. Para tentar responder às
exigências deste processo, a Coordenação Institucional do Processo de Bolonha
(Grupo nomeado no IPCB para promover a adoção dos princípios constantes da
Declaração de Bolonha na IES) apresentou a proposta de um projeto que
permitisse responder a algumas lacunas evidenciadas pelo Relatório de
Concretização do Processo de Bolonha no IPCB para o ano letivo 2009/10. Os
desafios referidos anteriormente dependem maioritariamente da motivação e
iniciativa dos docentes, pelo que o projeto permite promover uma discussão
alargada sobre as mudanças necessárias no Ensino Superior.
A dinâmica de desenvolvimento do projeto enquadra-se no sentido de facilitar o
acesso a um conjunto de ferramentas pedagógicas não generalizadas na
instituição, procurando melhorar o ensino e a aprendizagem. Quanto aos
objetivos específicos, podem-se apontar: motivar a utilização de métodos ativos
de ensino-aprendizagem e a implementação de uma metodologia de avaliação
contínua; ajustar a carga de trabalho do estudante ao longo de todo o semestre
(com uma distribuição semanal); acompanhar o tempo dedicado ao trabalho
autónomo, orientado pelo professor da UC; desenvolver um processo de
autorregulação da aprendizagem por parte do estudante (método de trabalho);
promover a cooperação e coordenação das várias atividades pedagógicas
desenvolvidas ao longo do ano; possuir dados concretos sobre o percurso
formativo para análise no âmbito da avaliação da qualidade dos cursos.
O projeto define alguns instrumentos de acompanhamento que revertem num
processo metodológico de definição de atividades de aprendizagem, seus
objetivos e competências a desenvolver. O acompanhamento é realizado através de
fichas específicas para as atividades desenvolvidas nas horas de contacto e nas
horas destinadas ao trabalho autónomo do estudante. Estas fichas foram
definidas considerando-se a disponibilização de informação aos estudantes de
uma forma semelhante e a recolha da informação que permitisse aferir alguns
aspetos do processo pedagógico, tais como:
Tipologia das atividades desenvolvidas pelos docentes nas horas de contacto
e dinâmica na sua utilização;
Tipologia de atividades propostas para o trabalho autónomo dos estudantes;
Valorização da atividade desenvolvida pelos estudantes em sala de aula
através do seu contributo no processo de ensino-aprendizagem;
Tempos de avaliação e organização do trabalho ao longo do ano letivo;
Relação entre o tempo previsto pelo docente para a realização das atividades
autónomas, definido no programa da unidade curricular, e tempo efetivamente
utilizado pelo estudante para a realização das atividades;
Organização e articulação do trabalho num curso (em todas as suas
dimensões), considerando todas as unidades curriculares do plano em causa.
O projeto, desde o seu início, foi criado considerando a sua implementação no
1º ano dos cursos, com o objetivo de contribuir para a integração dos
estudantes neste contexto formativo no início do seu percurso no Ensino
Superior, facilitando o seu sucesso no ano curricular e imprimindo dinâmicas de
gestão de tempo e de organização pessoal que conduzissem ao seu sucesso também
nos anos curriculares subsequentes, visando a diminuição do insucesso académico
e do abandono escolar.
4. Metodologia
Em termos metodológicos, é proposto que o docente disponibilize, no início de
cada semana, os planos das aulas a lecionar, identificando claramente as
atividades que serão desenvolvidas, assim como a sua tipologia. Estas
atividades devem estar diretamente relacionadas com as competências a adquirir,
permitindo ao estudante relacionar os conteúdos com a prática pedagógica. As
atividades de avaliação decorrem deste processo e devem resultar das suas
etapas. Deve, por outro lado, existir uma definição clara das atividades a
desenvolver durante o trabalho autónomo, que devem constituir elementos de
complementaridade relativamente às horas de contacto, e realizar-se o controlo
do tempo despendido pelo estudante para as executar.
Ponderando o objetivo de sistematizar o processo de ensino-aprendizagem,
considerou-se a adoção de princípios de planificação e organização das
atividades pedagógicas transversais, que permitam ao estudante uma perceção
clara dos objetivos e competências envolvidos em cada etapa do seu percurso
formativo. É ainda necessário promover a intensificação da utilização de um
processo de avaliação contínua e relacionar os momentos de avaliação com as
atividades de aprendizagem desenvolvidas.
O Projeto ConstAp pretende facilitar uma análise formal do tempo de trabalho
dedicado pelo estudante ao estudo autónomo, realizado de forma consistente
através da orientação fornecida pelo docente. A realização deste registo
permite aferir a carga de trabalho dos estudantes num determinado ano/curso.
Finalmente, a implementação de uma Grelha Única de Avaliação permite, a todos
os docentes envolvidos na lecionação, o acompanhamento do aproveitamento dos
estudantes, identificando durante o percurso formativo os casos de insucesso ou
abandono escolar. Este acompanhamento permite o conhecimento atempado de
situações de insucesso ou abandono escolar, o que viabiliza uma intervenção no
sentido de reverter o processo ao articular-se com o sistema de acompanhamento
do estudante delineado na instituição (Regime de Tutorias).
5. Implementação do Projeto
5.1. Fase I
O Projeto foi implementado em alguns cursos do IPCB, com a participação
voluntária dos docentes, sendo os dados recolhidos analisados com base numa
matriz criada para este efeito. Esta matriz contempla a análise da dinâmica
durante as horas de contacto, assim como a tipologia adotada para o trabalho
autónomo e a carga que este representa no trabalho semanal do estudante. Esta
análise permite ainda aferir a gestão dos trabalhos propostos aos estudantes e
o tempo de trabalho final face ao que inicialmente foi previsto (ECTS).
Em termos dos indicadores de avaliação, preconiza-se a obtenção de informação
relativamente a: atividades realizadas; metodologias utilizadas nessas
atividades; repartição dos momentos de avaliação ao longo do semestre/ano;
relação entre as horas de estudo autónomo previstas (no plano curricular) e as
que foi possível apurar; dificuldades verificadas.
As ações para a implementação do projeto foram desenvolvidas sequencialmente e
podem-se resumir em: 1. sessão de esclarecimento em todas as escolas sobre as
questões essenciais do projeto e a sua operacionalização; 2. acompanhamento e
incentivo, ao longo do período lectivo, da implementação do projeto; 3. recolha
de dados a partir das fichas coletadas de todas as unidades curriculares; 4.
análise estatística simples dos dados; 5. formulação de relatórios: global, com
reporte à instituição; por curso, com reporte aos coordenadores de curso.
5.2. Resultados
Tendo em linha de conta os objetivos definidos, as questões a responder e os
indicadores de avaliação preconizados, referidos anteriormente, foi possível
extrair alguns resultados ' já que o projeto se encontra a ser implementado no
IPCB desde o ano letivo 2010-2011 ', que passamos a especificar.
1. A reunião de um conjunto de informação relativamente às atividades e
metodologias utilizadas pelos docentes. Podem-se observar as tabelas
exemplificativas (Tabelas_1, 2 e 3) relativas a algumas unidades curriculares
de um curso ministrado no IPCB.
2. Regista-se uma repartição desigual das atividades, tanto em termos das
diversas unidades curriculares no contexto de um curso, como entre os diversos
cursos ' coexistem unidades curriculares que repartem atividades ao longo do
período de estudo com outras que concentram as atividades num conjunto limitado
de momentos, e ainda com as que concentram num período específico as atividades
relacionadas. Pode-se aferir esta ilação a partir da exemplificação relativa a
algumas unidades curriculares (Tabela_4).
3. Aquela desigual repartição de atividades afeta o tempo de trabalho
dedicado pelo estudante ao longo do período (semestre/ano). Esta repartição
desigual pode ser observada nos Gráficos_1 e 2.
4. É possível afirmar, com um grau de certeza ainda não validado, que o tempo
de trabalho desenvolvido pelos estudantes é inferior ao previsto na atribuição
de ECTS (Tabela_5 e Gráfico_3), permitindo extrair a informação que ainda
predomina um modelo de avaliação mais tradicional.
6. Projeto ConstAp: O novo modelo ' Fase II
6.1. Dificuldades e redefinição de elementos do Projeto
Da implementação deste projeto, no 2º semestre do ano letivo 2010/11, foi
possível analisar não só os dados recolhidos, mas também as considerações e
propostas dos professores envolvidos, no sentido de simplificar e agilizar as
ferramentas de acompanhamento do projeto e de recolha de dados. De entre as
principais dificuldades referidas pelos professores podemos salientar: i) a
necessidade de preenchimento de um número excessivo de fichas; ii) a
dificuldade em compreender alguns dos elementos solicitados; iii) a fiabilidade
da informação dos estudantes em relação ao tempo de trabalho autónomo.
No âmbito da coordenação do projeto também é importante manifestar a
dificuldade em consciencializar os professores sobre a necessidade de orientar
o trabalho autónomo dos estudantes e monitorizar a sua execução, assim como
prever ferramentas que permitam valorizá-los no âmbito da avaliação da unidade
curricular. Embora o tempo de trabalho do estudante deva ser continuado ao
longo do semestre, é possível identificar períodos com cargas de trabalho
excessivas e outros sem qualquer atividade autónoma. Aprofundar os
conhecimentos dos professores no âmbito da pedagogia é fundamental, porque o
"acto pedagógico pode funcionar como elemento potenciador dos factores
concorrentes para o (in)sucesso escolar" (Veloso, Costa, & Lopes, 2010, p.
56). Foi igualmente possível identificar algumas carências ao nível da inovação
pedagógica e da formação contínua dos docentes.
Após análise destes elementos, considerou-se necessário proceder a uma
reformulação e simplificação das fichas utilizadas para recolha de informação
no sentido de recolher os dados fundamentais ao acompanhamento da atividade
pedagógica.
6.2. Reformulação do Projeto ' Fase II
Atendendo à informação coletada, seja por via de observações de docentes, seja
pela análise da operacionalização do projeto, podem referir-se algumas das
reflexões que foram efetuadas pela equipa responsável no sentido de introduzir
melhorias: explicitar melhor a componente operacional do projeto; reestruturar
as fichas disponibilizadas, facilitando o seu preenchimento; incentivar a
participação de mais unidades curriculares no projeto, nos cursos onde foi
implementado anteriormente; alargar a sua implementação a outros cursos, nas
diversas unidades orgânicas do IPCB; aprofundar o sistema de acompanhamento da
implementação.
A revisão da forma de implementação do projeto e subsequente alteração das
fichas disponibilizadas ao docente, que deverão ser de resposta mais fechada,
foi uma medida imperiosa resultante da experiência do 1º ano de implementação.
Das três fichas distribuídas para preenchimento, no início do projeto, resultou
uma única ficha, na sua maioria com respostas diretas, onde se pretende que o
professor ajuste as atividades realizadas na UC aos objetivos e competências a
atingir pelos estudantes, estimular o seu trabalho autónomo e a sua avaliação
contínua.
No processo de consolidação das novas formações, as anteriores práticas
docentes de organização e gestão curricular vão sendo reestruturadas e vão
sendo introduzidas novas práticas pedagógicas, mais adaptadas às mudanças
perspectivadas ' não sendo um processo fácil, uma vez que a identidade do
docente do Ensino Superior, pela sua autonomia e estratégias de sobrevivência,
muitas vezes apresenta elevada relutância em colocar os seus próprios métodos
de ensino em questão.
A valorização e implementação do trabalho autónomo do aluno, controlado pelo
docente numa perspetiva de acompanhamento, integrado nas práticas de formação e
avaliação, é um dos processos mais difíceis de implementar e avaliar, pelo que
são necessárias estratégias que auxiliem este processo e promovam, por parte do
docente, uma reflexão concertada da sua estratégia formativa, assim como, por
parte do aluno, uma sensibilização para a importância da dedicação a este tipo
de atividade autónoma. Com este objetivo e na perspetiva de facilitar o
processo ao docente, numa lógica inovadora de formação surgem as fichas a
preencher no âmbito do projeto ConstAp.
Para além da redefinição de novas fichas a implementar neste novo ano letivo,
outras atitudes foram imperiosas e resultaram da inércia que por vezes ocorre
em relação à mudança e à estruturação burocratizada de um sistema de ensino
que, por via das circunstâncias, se foi acomodando a métodos novamente mais
expositivos, contrariando aquilo que é preconizado por Bolonha para o Ensino
Superior Politécnico, que aviva o paradigma do aprender fazendo'. Assim,
impôs-se a execução de sessões em que se apresentaram os resultados do 1º ano
de implementação do projeto a toda a comunidade escolar de docentes e
estudantes, para que o mesmo fosse contextualizado e sentido como um
instrumento de apoio e ajuda à mudança de paradigma. Foi também explicitada a
componente operacional do projeto em cada uma das Escolas/Unidades Orgânicas
(UO) do IPCB, dando lugar a esclarecimentos e a momentos de discussão de novas
metodologias e sugestões para a melhor prossecução do projeto.
Foi, pois, estimulada e incentivada a participação de mais UC's no Projeto, nos
cursos onde tinha sido implementado anteriormente e/ou noutros cursos da UO.
Neste sentido, foi introduzido um conjunto de alterações, que se identificam em
seguida: simplificação das fichas; respostas direcionadas através das
metodologias propostas; recolha de dados mais objetivos e mensuráveis.
Foi implementada, no atual ano letivo, uma versão revista do projeto, do qual
se encontra atualmente em curso o processo de recolha de informação, para poder
ser analisada.
Outro aspeto que se tornou fulcral foi um maior acompanhamento da implementação
do projeto de cada UO, pelo que, para além do coordenador de curso, o
responsável do grupo adstrito a cada UO ficou a dar o apoio necessário, assim
como a efetuar a análise final dos dados do projeto.
6.3. As novas fichas
Numa primeira fase, é importante decidir o objetivo principal da ficha para a
qual a informação será utilizada. Posteriormente, em função da amplitude que se
pretender atribuir à divulgação dos resultados, pode perspetivar-se a avaliação
dos dados e uma reflexão sobre os mesmos, definindo pontos fortes e fracos do
sistema de ensino.
As fichas informativas encontram-se organizadas em duas folhas diferentes. A
ficha que consta do Anexo I pretende avaliar, por UC, as atividades de contacto
e de trabalho autónomo desenvolvidas. O docente terá, agora, apenas que
preencher dois campos principais. Por um lado, envolve o registo do que
acontece em sala de aula, em horas de contato, através do preenchimento
simplificado da informação sobre as atividades desenvolvidas, conduzidas pelo
docente ou cumpridas pelo estudante, bem como a percentagem de tempo que
ocuparam as várias atividades; por outro, pretende-se o registo, também
simplificado, das atividades desenvolvidas em tempo de trabalho autónomo pelo
estudante.
A segunda ficha, que se mantém, pretende apenas reunir informação sobre o tempo
dedicado pelo estudante à realização de atividades em tempo de estudo autónomo,
no sentido de articular o tempo autónomo previsto com o tempo de trabalho
autónomo efetivo.
6.4. Orientações para a futura implementação do Projeto
Face aos conhecimentos que a literatura vai debitando sobre processos de
mudança sociocultural que a sociedade vai registando, e em função da
aprendizagem que a aplicação do projeto vai produzindo, é importante refletir
sobre os aspetos positivos que se descortinaram, no sentido de os reforçar, e
sobre os aspetos negativos que naturalmente afloram, para que se possam
corrigir e ultrapassar.
A existência de um processo de monitorização anual parece corresponder a um
período suficientemente sustentado para implementar um processo de melhoria
permanente no projeto, até ao ponto em que as práticas assumidas o tornem
dispensável.
Neste sentido, para além das questões operacionais e dos processos de
resistência à mudança já referidos, existem algumas trajetórias que se podem
ponderar:
Team matching;
Validar e avaliar (efetivamente) as competências (e não os conteúdos);
Reforçar a aposta na formação de docentes;
Analisar as atividades avaliadas e construir um portefólio de boas práticas,
retroalimentando a instituição;
Fomentar o trabalho colaborativo e desenvolver um modelo de avaliação desse
trabalho;
Desenvolver os aspetos motivacionais junto de docentes e estudantes;
Correlacionar a implementação do projeto com o sucesso académico e o
abandono escolar;
Desenvolvimento dos processos de comunicação professor-estudante.
7. Conclusões
As mudanças implementadas pelo Processo de Bolonha, ainda que concluídas ao
nível da organização dos planos curriculares, ainda estão por concretizar no
âmbito das atividades pedagógicas desenvolvidas nas IES. Mesmo reconhecendo o
esforço de muitos docentes em adequar as suas metodologias às novas exigências
do processo de ensino-aprendizagem, ainda é necessário reproduzir as boas
práticas pedagógicas e generalizar a utilização de metodologias ativas.
O projeto ConstAp vai ao encontro do preconizado pelos objetivos da Declaração
de Bolonha e das exigências do processo de avaliação dos cursos no sentido da
sua acreditação junto da Agência responsável, procurando conciliar esta
componente normativa/regulamentar com as necessidades efetivas que os
estudantes, altamente qualificados, sentem na atual sociedade ' necessidades
profissionais em rápida mudança que, mais do que conhecimentos, procuram
competências. O alcance do projeto assenta, para além dos objetivos referidos
ao longo deste trabalho e atendendo à metodologia definida, na aposta na
mudança das práticas prosseguidas por uma significativa parte dos docentes da
instituição, na mudança cultural nas práticas de transmissão de conhecimento e
de avaliação. Para tal, julgamos que tanto a metodologia de intervenção quanto
a organização de toda a implementação permitem reunir informação
suficientemente sustentada que conduza à reflexão para a necessidade de
mudança.
A implementação do Projeto ConstAp teve um contributo importante ao abordar as
questões pedagógicas e promover o diálogo entre docentes sobre o que' e como'
mudar. O projeto permite que os professores identifiquem claramente qual a
relação entre os diversos elementos envolvidos no processo pedagógico:
objetivos, competências, metodologias, atividades pedagógicas, atividades de
trabalho autónomo e atividades de avaliação.
As atividades desenvolvidas têm permitido identificar as dificuldades no
processo de mudança em curso e têm permitido orientar o trabalho desenvolvido
no sentido de motivar e formar os docentes para enfrentar este desafio. Uma das
apostas para o futuro passa por tornar mais abrangente a capacidade de
intervenção dos docentes: por um lado, extrapolando para a comunidade
científica a metodologia utilizada e os resultados atingidos, pela participação
em congressos/seminários e/ou publicação de artigos em revistas internacionais;
por outro, patrocinando a realização de ações de formação, apontando desde logo
para as seguintes temáticas: no caso dos docentes, métodos de avaliação,
preparação de material pedagógico e estatísticas no ensino; no caso dos
estudantes, um seminário com a intervenção de técnicos que elucidem sobre as
caraterísticas psicológicas dos estudantes que ingressam no Ensino Superior,
com o objetivo principal de motivar a adesão ao Regime de Tutorias.
Outro dos aspetos salientes do projeto tem a ver com a necessidade de
aprendermos com outros. Existem várias práticas institucionais difundidas,
relatadas em fóruns científicos, em torno de metodologias de aprendizagem
baseadas no modelo Problem Based Learning. É intenção da equipa construir, no
âmbito do projeto, uma abordagem semelhante em cursos ministrados no IPCB por
se entender que, não sendo generalizável, existem possibilidades de gerar bons
resultados junto dos estudantes.
Parece-nos ser este um projeto transdisciplinar e cuja replicação e adaptação
pode ser efetuada, sem grandes dificuldades, a variados contextos de formação
superior. Em termos de visibilidade, a construção de uma página web permitirá
um acesso externo mais facilitado à informação, bem como poderá passar a ser
referenciado e acompanhado pelas IES, constituindo assim uma boa prática
difundida para além da instituição.