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EuPTHUHu0873-65292001000300002

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variedadeEu
ano2001
fonteScielo

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Sondagem ao mercado de emprego dos quadros, em 1989 e 1997

Introdução Apresentam-se aqui os principais resultados de uma sondagem ao mercado de emprego dos quadros.1 O seu objectivo é fornecer um contributo para o conhecimento da evolução durante os anos 90 das preferências das empresas, nacionais ou instaladas em território nacional, sobre as características dos quadros e técnicos médios e superiores candidatos ao seu recrutamento externo.

Trata-se, como é sabido, de uma categoria de assalariados onde predominam as qualificações escolares elevadas, e uma das vertentes do trabalho contempla a análise das preferências empresariais por essas qualificações, especialmente as de nível superior. O período considerado, como veremos, é de forte afluxo de diplomados do ensino superior ao mercado de emprego. Parte-se de pressupostos teóricos genéricos, e de outros mais específicos que adiante serão precisados, quer no decurso da apresentação das escolhas metodológicas, quer na própria análise de dados.

Genericamente dá-se importância ao papel da concorrência entre empresas, muito pronunciado no estado actual da internacionalização da economia. Bem como às estratégias empresariais de recrutamento dos quadros e técnicos, e de gestão da utilização das suas capacidades, que podem ser consideradas, em parte, uma expressão dessa concorrência acrescida. Considera-se que essas estratégias são capazes de se alterar em diferentes condições do correspondente mercado de emprego. Os empresários e dirigentes empresariais são no essencial actores sociais como outros. As organizações que dirigem detêm recursos determinados (no sentido sociológico do termo) e com eles fazem escolhas e tomam decisões no interior de estruturas de oportunidades que mudam através do tempo, procurando tirar partido de tais oportunidades, sem as deixar para outros (Ashton, 1998; Martinelli, 1994).

Considera-se igualmente que as empresas, ao anunciarem, se colocam numa relação de troca com os potenciais candidatos. Nesse sentido, e tal como em qualquer mercado social, como por exemplo o mercado matrimonial (Singly, 1984), as empresas oferecem a quem pretendem recrutar vantagens determinadas, procurando, face a eles, valorizar os seus recursos, apresentando nomeadamente os que mais as favorecem. O objectivo é o de recrutar candidatos eles próprios detendo recursos determinados, implicitamente considerados de nível semelhante ou equivalente ao da empresa no mercado em questão, logo sendo candidatos em princípio disponíveis para se empenharem no processo de trocas solicitado.

Identificam-se e analisam-se não as preferências das empresas relativas às qualificações escolares dos candidatos a emprego de quadros e técnicos, mas ainda as que respeitam a outras características dos candidatos, correspondendo a competências técnicas e a outras que designamos de informais.

Precisando melhor, o estudo articula-se à volta de dois eixos fundamentais: - ver até que ponto as alterações verificadas na produção de diplomados pelo sistema educativo, em particular na produção de diplomados pelo ensino superior, que registou uma forte inflexão na sua frequência a partir de aproximadamente 1986/7, tiveram ou não consequências plausíveis (e em caso afirmativo quais foram), em matéria das preferências das empresas quanto a estas competências formais dos candidatos; - analisar como se distribuem as competências formais e informais requeridas pelas empresas, se a estrutura dessa distribuição evoluiu, e como; e quais as prováveis relações entre essa evolução e a acrescida competição económica que tem marcado nos últimos anos a evolução do mundo empresarial.

Crescimento e transformações no ensino superior Realizaram-se duas sondagens ao mercado de emprego, a primeira correspondendo ao ano de 1989 e a segunda a 1997. A data de 1989 foi escolhida por anteceder aproximadamente de perto a inflexão na produção de diplomados pelo sistema educativo, especialmente pelo ensino superior, consequência da referida inflexão na sua frequência. A de 1997 por eventualmente repercutir as alterações em questão, sendo por outro lado a data mais próxima possível da actualidade, na altura e nas condições em que foi realizado o estudo (data e condições em que era impraticável a opção por 1998 e datas ulteriores).

Vejamos em primeiro lugar o ensino superior. Em 1985/6 e 1986/7 houve de facto uma acentuadíssima inflexão ascendente na frequência deste ensino, marcando uma arrancada sustentada até data recente, com taxas de crescimento de dois dígitos ano após ano. É conhecido em traços largos o perfil deste processo, no qual oferta e procura de ensino combinaram poderosamente os seus efeitos. Procuremos caracterizá-lo brevemente. No que respeita ao volume da frequência e das formações, sabe-se como até meados da década de 80 a oferta pública era insuficiente perante o número de candidatos. Daí a luz verde governamental dada ao ensino superior privado, que vai ter um duplo papel: por um lado, vem responder em parte à procura até não satisfeita de ensino superior e, sobretudo, irá acompanhar de perto o acentuar do seu movimento ascendente.

Movimento que ficou a dever-se ao aumento dos rendimentos reais das famílias, que alterou rapidamente as suas perspectivas, e as dos jovens, no que toca à continuação ou cessação dos estudos. Historicamente trata-se do segundo grande movimento expansivo do ensino em Portugal no após guerra, tendo o primeiro tido lugar aproximadamente desde meados dos anos 50, e por idênticas razões de alteração na procura de ensino associada a um aumento do ritmo do crescimento económico e dos rendimentos reais (Grácio, 1998: 151-9).

Quanto à estrutura da frequência e das formações, do lado do sector público, temos o acentuado crescimento das formações tecnológicas e científicas (sobretudo as primeiras), deliberadamente assumido pelos sucessivos governos.

Verifica-se também, em termos de oferta, um crescimento moderado, e mesmo um freio, em geral para todas as outras formações. Crescimento igualmente acentuado do ensino politécnico e igualmente largamente dinamizado pela oferta.

No que respeita ao ensino privado, assistiu-se no essencial à expansão explosiva das formações não tecnológicas e ao desenvolvimento extremamente moderado de um sector de formações curtas, correspondente ao politécnico público. No conjunto do ensino superior, as formações de ciências humanas e sociais, da economia e gestão, e das ciências jurídicas, registaram o mais forte crescimento, logo seguidas pelas formações tecnológicas. Daí que todo o processo tenha resultado menos desequilibrado do que poderia supor-se. Acima de tudo, a sua adesão ao perfil da própria procura terá sido particularmente acentuada. É isso que sugerem, aliás fortemente, a diversidade da oferta, em especial a sua estratificação por área de formação, e a extrema diversidade do valor e capacidades escolares dos candidatos.

A adesão à procura vai a par da existência de um importante sector privado.

Isso sugere nomeadamente que globalmente o ensino superior é um sistema dotado de razoável elasticidade. Isto é, trata-se de um sistema capaz de reagir, através das estimativas, preferências e escolhas dos seus utilizadores, efectivos e potenciais, ao valor que conferem aos seus diplomados as empresas e ao estado do mercado de emprego. Retomaremos esta questão mais adiante.

Quanto ao ensino secundário, a progressão da sua frequência e o número dos seus diplomados seguiu aproximadamente os mesmos contornos do ensino superior, havendo a destacar a importância numérica dos diplomados do 12.º ano via de ensino. De assinalar igualmente os progressos na produção de diplomados por um ensino secundário profissional e tecnológico, desde o início da segunda metade dos anos 80, com os cursos técnico-profissionais. E também, desde os primeiros anos da década de 90, com as escolas profissionais e os cursos tecnológicos, embora o seu volume permaneça modesto no conjunto.

O mercado de emprego dos quadros e técnicos As sondagens ao mercado de emprego foram realizadas a partir de anúncios publicados na secção Expresso emprego do semanário Expresso, para os anos de 1989 e 1997. A larga maioria destes anúncios dirige-se ao recrutamento de quadros e técnicos. Eliminámos os anúncios que não correspondiam a pedidos de estes profissionais, e que incidiam, sobretudo, sobre operários e empregados qualificados (por exemplo secretárias de direcção). Isto porque o seu reduzido número remete claramente para a sua irrelevância em matéria do lugar que ocupa o recrutamento destas categorias através do Expresso emprego, que no entanto ocupam na população activa um volume de empregos pelo menos de grandeza semelhante ao dos quadros e técnicos. Por falta de espaço não discutimos aqui teoricamente os contornos da categoria quadros e técnicos, o que implicaria em particular que fosse devidamente explicitada a combinação da perspectiva simultaneamente objectivista (Goldthorpe, 1987: 40-3) e construtivista (Gonçalves, 1991, Boltanski, 1982) que adoptámos. A análise de conteúdo dos anúncios revelou a variedade de informação que contêm no seu conjunto. Ela permitiu construir 42 variáveis que julgámos pertinentes dados os objectivos do estudo. Em cada variável foi criada a categoria não indica, o que permite, para cada anúncio, considerar a totalidade das variáveis. Para cada ano aplicou-se uma taxa de sondagem de cerca de 27%, com tiragem ao acaso, de que resultou uma amostra total de uns 6000 anúncios.

Claro que os anúncios em questão representam apenas uma parte do recrutamento externo das empresas. Parece lícito admitir que a maioria das empresas anunciantes têm uma posição importante, ou relativamente importante, no seu sector de actividade, na medida em que recorrem, no mínimo ocasionalmente, a estes métodos não informais de recrutamento externo dos seus quadros e técnicos. Uma parte destas empresas deve ter mesmo uma posição elevada no seu ramo (o que frequentemente é indicado nos anúncios, como veremos) e, como tal, pode supor-se que as suas práticas de recrutamento e a sua evolução representam tendências assinaláveis.

Com efeito, sabe-se que as empresas também recrutam largamente por métodos que podemos designar de informais, é certo que de modo muito variável consoante as funções a ocupar e as próprias características da empresa, especialmente a sua dimensão (Guerreiro, 1996). As redes informais são redes de relações interpessoais voltadas para o recrutamento externo das empresas, onde estão inseridos os empresários e os assalariados, e/ou potenciais assalariados. Têm uma racionalidade e eficácia próprias na realização do tendencial ajustamento entre oferta e procura de trabalho. São mais selectivas do que poderia supor-se à primeira vista, constituem uma maneira extremamente barata de obter informação relevante e em quantidade suficiente sobre os interessados (de ambos os lados, empresarial e assalariado), sendo este aspecto particularmente importante para as empresas. Além disso favorecem uma rápida circulação da informação sobre lugares vagos e um rápido acesso a força de trabalho disponível. Acima de tudo, talvez, são baseadas em laços pessoais, participando na cadeia de trocas sociais entre os seus protagonistas, e fornecem deste modo garantias mínimas de lealdade, desempenho e remuneração do trabalho (Granovetter e Tilly, 1988: 191-4; Tilly e Tilly 1994: 288-303).

Ora, por contraponto aos mercados de emprego baseados na informalidade, que têm em geral uma natureza mais circunscrita geograficamente, o mercado a que correspondem os anúncios em questão é um mercado nacional. Veja-se em particular o papel que aqui desempenham as firmas multinacionais, com um peso importante no conjunto dos anúncios, e que são o tipo de firma que deve estar mais afastado das redes informais. Não ignoramos que nas multinacionais existem quadros recrutados nos países de origem (Peixoto, 1999). Contudo, quando estas empresas anunciam num jornal português dirigem-se essencialmente a quadros portugueses. De qualquer modo, quando uma empresa anuncia no Expresso emprego, uma publicação periódica de larga e bastante equilibrada difusão nacional, coloca-se em concorrência com outras num conjunto mais vasto de empresas do que o que é permitido pelas redes informais de recrutamento.

Considera-se portanto em condições de suportar essa concorrência. E por isso mesmo as empresas anunciantes devem ser de razoável importância nos respectivos ramos. Daí que as tendências detectadas devam ser elas próprias relevantes, num duplo sentido. Com efeito, por um lado, parece lícito supor que se trata de tendências em processo de difusão e, por outro lado, situar-se-iam em segmentos mais dinâmicos e estratégicos da actividade económica. Refira-se de qualquer modo um indicador simples, mas sugestivo, para situar minimamente as empresas anunciadoras no conjunto do universo português, a confrontar adiante com a análise de dados: na amostra de empresas nacionais de Manuel Lisboa (1998: 476), 60,5% não tinham licenciados ao seu serviço.

Principais variáveis e sua construção Globalmente, as variáveis foram divididas entre duas grandes categorias. As que respeitam às características pedidas dos candidatos, e reconhece-se aqui talvez mais espontaneamente o essencial da informação contida nos anúncios, mas também as variáveis construídas a partir de certas características das empresas, que são igualmente possíveis de apreender a partir dos anúncios. A razão parece óbvia: ver quem pede o quê, e com que eventuais alterações entre as duas datas, é preparar o terreno para realizar algumas inferências e propostas interpretativas. Como veremos, não se trata aliás apenas de perguntar aos dados quem pede o quê (sobre os candidatos) mas igualmente para realizar que tipo de tarefas.

A construção das variáveis, em particular das suas categorias, seguiu de perto os resultados da análise de conteúdo dos anúncios, aderindo tanto quanto possível às próprias nomenclaturas e designações utilizadas pelas empresas.

Para a elaboração deste trabalho seleccionámos um conjunto de variáveis que considerámos de valor estratégico para a análise de dados. No que respeita às empresas, trabalhámos com três variáveis: o seu estatuto (noção adiante precisada), e mais duas variáveis sobre a função a ocupar pelo candidato.

Incluímos igualmente na análise variáveis relativas às contrapartidas e vantagens que as empresas oferecem aos candidatos, funcionando como factores da sua captação ou como incentivos aos seus desempenhos. São elas a oferta de carreira, a oferta de remuneração aliciante ou acima da média, e a oferta de automóvel para uso do candidato. Toda esta informação pode, com efeito, remeter para aspectos importantes da gestão da força de trabalho dos quadros e técnicos nas empresas. Gerir a força de trabalho é ajustar os seus custos salariais aos contributos que os assalariados fornecem à empresa. no essencial duas maneiras de o fazer: - ajustar o salário à produtividade do assalariado, sem tentar influenciar o seu esforço e capacidade, procurando sempre que possível a empresa trocar os seus assalariados por outros de idêntica produtividade, mas dispostos a receber salários mais baixos; - procurar influenciar o desempenho dos assalariados (a sua produtividade), o que pode ser obtido seja pelo exercício da autoridade seja através de incentivos.

O uso da autoridade tem custos evidentes: custos salariais dos supervisores, além de que a supervisão pode ser considerada alienatória pelos assalariados e levar deste modo a desempenhos mínimos. É por isso que as empresas recorrem frequentemente aos incentivos (o que não significa obviamente que a autoridade seja eliminada). fundamentalmente três meios de criar incentivos: - pagar acima do que as outras empresas pagam; - ligar o pagamento à quantidade de trabalho fornecida (à peça, à comissão ); colocam-se aqui em certos casos problemas de medição dos desempenhos, como é seguramente o caso dos quadros e técnicos (os vendedores são aqui uma excepção); - remunerar os assalariados segundo estimativas do seu mérito, das suas capacidades demonstradas e adquiridas, através de sistemas de promoção como por exemplo a oferta de carreira (Sorensen, 1994: 505-10).

O estatuto ou posição das empresas no mercado dos produtos é inferido a partir do facto de a empresa anunciante mencionar (ou não), no anúncio, que tem uma posição forte no seu ramo, ou que é multinacional. A partir daí foram criadas três categorias da variável: - empresa nacional de estatuto elevado: a empresa menciona uma posição forte no mercado dos produtos, afirmando, por exemplo, ser líder no ramo; - empresa nacional de estatuto baixo: não menciona posição forte nem que é multinacional; - empresa multinacional: menciona-o.

Partiu-se aqui do pressuposto plausível e referido de que em geral as empresas colocam no anúncio qualquer vantagem estatutária (ter boa posição no ramo, ou ser multinacional), de forma a, simultaneamente, captar os melhores candidatos (reduzindo até eventualmente os custos do recrutamento) e colocar-se em boa posição negocial face a eles.

As duas variáveis sobre a função a desempenhar pelos candidatos fundamentam-se na distinção clássica entre duas vertentes, uma social e outra técnica, da dita função, vertentes as mais das vezes quase inextricavelmente ligadas nos processos de trabalho. A vertente técnica foi designada de área funcional, e foram criadas seis categorias para a apreender (comercial, administração e gestão, estudos técnicos e planeamento, gestão do pessoal e formação, produção, polivalência). A vertente social corresponde ao posicionamento hierárquico (variável posição hierárquica), para o qual foram construídas cinco categorias. No essencial estas categorias da posição hierárquica podem dividir- se entre as que implicam algum trabalho de enquadramento (chefia elevada, apoio à direcção, enquadramento médio), e mais duas que não integram esse trabalho.

Estas últimas foram designadas de individual com autonomia e individual sem autonomia, conforme estejam ou não associadas a maior autonomia nos desempenhos dos candidatos.

As variáveis dos candidatos dividem-se fundamentalmente entre as que traduzem competências formais e paraformais, e as que traduzem competências não formais.

Esta distinção visou essencialmente circunscrever e disponibilizar para a análise os pedidos das empresas dirigidos a qualidades pessoais dos candidatos.

O termo pessoal remete aqui para a terminologia e as representações correntes, e corresponde a aquisições realizadas no decurso da socialização, em princípio, fora de quadros institucionais escolares ou de formação. Com adiante veremos, a ventilação das correspondentes propriedades, e o jogo global entre elas e as correspondentes às competências formais, poderá fornecer elementos importantes sobre as preferências das empresas e a sua evolução.

No primeiro grupo das variáveis dos candidatos estão evidentemente as formações escolares. Para estas foram construídas duas variáveis: o nível (e modalidade) escolar (licenciatura, bacharelato ), com seis categorias, e a área de formação (ciências sociais, tecnologias ) com sete categorias. Em seguida temos a variável competência técnica, com quatro categorias, que traduz o apelo a competências precisas, não necessariamente certificadas escolarmente, e em todo o caso sem correspondente menção dessa certificação.

A experiência profissional, apreendida em parte através do número de anos de experiência pedidos, é de certo modo uma variável charneira entre as que captam as competências formais e as não formais. Pode supor-se, com efeito, que os dirigentes das empresas tomam a experiência como um indicador simultaneamente de competência técnica e de competência social. Sendo esta última a que é relevante e valorizada no mundo social em questão, ela resulta no essencial e evidentemente da socialização no próprio mundo das empresas.

Temos por fim, em matéria de variáveis dos candidatos, as que traduzem as suas competências que designámos acima por informais, e cuja apreensão nos anúncios foi realizada através da variável qualidades pessoais. Vejamos de perto as várias categorias desta variável e o seu significado teórico.

a) Num primeiro conjunto, temos duas categorias correspondentes ao que tem sido designado por novas competências: a capacidade de autonomia (iniciativa, criatividade, inovação, autonomia, capacidade para resolver problemas e identificar soluções alternativas ), e a competência relacional (capacidade de comunicação, gosto pelas relações interpessoais, capacidade de diálogo, de negociação e de persuasão, de integração em grupo e equipa, ser afirmativo ).

Este tipo de qualidades estaria a ser crescentemente requerido pelas empresas, essencialmente devido à pressão da internacionalização das economias, da intensificação da concorrência e da transformação da natureza dos produtos, com ritmos acentuados de inovação, uma tendência típica dos processos capitalistas (Shumpeter, 1984: 118-9; Lisboa, 1998: 515-51), e que se tornou extremamente acentuada de escassos anos para .

Com efeito, tem sido defendido que uma nova racionalidade nas empresas em matéria de regulação do seu funcionamento, na qual é necessário ao mesmo tempo gerir as regulações que produzem regulamentações, as que asseguram a socialização pelo reconhecimento das identidades em contexto de trabalho e as que permitem a elaboração de objectivos comuns legítimos para o conjunto do corpo social da empresa (Sainsaulieu, 1997: 300). A empresa, para responder às fortíssimas pressões envolventes, deve integrar os modos de subjectivação de todos os seus actores (idem). Estas novas realidades têm trazido em particular alguma reformulação das concepções da formação, na qual o desenvolvimento pessoal e o profissional aparecem estreitamente entrelaçados (Alves, 1996: 295).

Tudo isto acompanharia um certo reordenamento das estruturas internas das empresas, no sentido de uma maior horizontalidade e da redução das linhas hierárquicas. Com efeito, a produção de massa tende a saturar-se, enquanto os bens de alta qualidade e mais especializados ganham a dianteira, atraindo um número crescente de consumidores. Ao mesmo tempo as novas tecnologias da informação permitem arranjos produtivos inteiramente novos, mais flexíveis e desagregados. As empresas estariam a valorizar a cooperação horizontal entre funções, uma maior e mais aberta partilha de informações entre os seus assalariados, com maior flexibilidade na própria definição das funções e das responsabilidades de cada um, de acordo com as necessidades de resposta aos problemas, que deve ser rápida e eficaz, e com a própria evolução da interacção entre os actores. Além disso, cada problema tende a ser tratado ao nível mais próximo da sua execução, sem recurso à linha hierárquica. Isso mobilizaria e/ou revalorizaria qualidades humanas que não são as tradicionalmente mais apreciadas em geral no mundo das empresas (Lisboa, 1998: 524; Powell e Smith- Doerr, 1994: 370; Bernoux, 1995: 135-9). Daí que a análise dos dados deva considerar atentamente as correspondentes categorias da variável qualidades pessoais, e em particular examinar a hipótese da crescente apetência das empresas por essas qualidades.

b) No segundo conjunto da variável qualidades pessoais distinguimos cinco categorias, correspondentes ao que poderá ser designado por competências tradicionais: responsabilidade, orientação para a tarefa/empenho (trabalhador, dinâmico, motivado, gosto pela área/vontade de desenvolvimento na área ); capacidade racional/burocrática (capacidade de organização, disciplina, método ); capacidade adaptativa (vontade de aprender, estar preparado para o envolvimento em nova actividade ); capacidade dirigente.

Estas últimas propriedades pessoais dos quadros e técnicos estariam mais ligadas (embora, é claro, não exclusivamente ligadas) a formas organizativas elas próprias mais tradicionais, de tipo taylorista-fordista, com predominância da linha hierárquica e da orientação para a produção de grandes séries, cujo declínio relativo atrás referimos. Nesta organização, como é sabido, a solução para o problema da coordenação do conjunto das actividades tem lugar a partir dos níveis hierárquicos mais elevados, a começar, bem entendido, pela direcção da empresa.

c) Por último, no terceiro conjunto de qualidades pessoais, duas categorias remetendo para qualidades próximas das tradicionais, mas sem lhes corresponderem integralmente: competitividade e apresentação pessoal (no sentido de apresentação física).

Mais geralmente, as empresas estariam a orientar-se para uma mais plena valorização do conjunto das competências dos assalariados (pessoais e sociais, como acabámos de ver, mas igualmente técnicas), subordinando as suas carreiras mais a essas competências e não tanto a postos de trabalho existentes. A noção de organização valorizante, capaz de promover competências nos seus assalariados, passa a integrar a nova temática empresarial emergente com o novo estado do mundo económico. Isto acontece ao lado da invenção ou revalorização de outras noções, como a noção correlata de balanço de competências (através da qual se procura inventariar as capacidades de um assalariado num determinado momento do seu itinerário) (Mestre, 1997) ou a de organização aprendente, oriunda da sociologia das organizações (Argyris, 1999; Darling, 1998; Moingeon, 1998).

Estas perspectivas novas exprimem a pressão exercida sobre as empresas para tirar o maior partido possível das diversas capacidades dos seus recursos humanos. foi observado a propósito da temática das competências, e das prováveis estratégias de gestão da força de trabalho das empresas, que se poderia estar igualmente em presença da vontade de fazer depender mais das competências, e menos dos diplomas escolares, as oportunidades de carreira dos assalariados. Isso seria obviamente vantajoso para as empresas, dada a maior instabilidade das primeiras relativamente às segundas. A análise dos dados deverá igualmente sondar a evolução neste âmbito.

Uma parte do recrutamento externo dos quadros e técnicos corresponde a uma opção em desfavor da possibilidade de recrutamento interno. Isto acontece, é claro, quando o recrutamento externo não é correlativo de um movimento expansivo da empresa. Ora as características da força de trabalho existentes na empresa no momento em que anuncia foram em muitos casos, sobretudo, forjadas pelo passado, em outras condições da produção, num outro estado da dinâmica competitiva interempresas e com outros níveis educativos da força de trabalho, bem assim como outros níveis da procura social de educação. Presume-se por isso que o recrutamento externo de quadros e técnicos pode ser considerado como um bom ângulo de observação para perceber a natureza e a evolução das preferências e das estratégias das empresas nesta matéria. Por outro lado, o recrutamento externo é classicamente considerado como uma opção que desfavorece a constituição de mercados internos (Marsden, 1998: 258-9). Os dados empíricos de que dispomos não permitem o acesso a informação sobre estes mercados. Contudo, procurar-se-á que a análise de alguns traços do recrutamento externo possa entreabrir as portas sobre os mercados internos, permitindo formular algumas hipóteses e inferências.

Antes de passar aos resultados, procuremos recapitular resumidamente o modelo de análise que propomos. Na tentativa de dar conta das preferências das empresas sobre as características dos quadros e técnicos candidatos ao seu recrutamento externo, partimos de pressupostos genéricos, e também de âmbito mais específico, sobre a racionalidade das duas categorias de actores em questão. A relação que se estabelece entre eles a partir do momento em que se manifesta a intenção de recrutamento das empresas é no essencial uma relação de troca, na realização da qual confluem as estratégias de ambos, orientadas pela competição interempresas e intercandidatos, pelos respectivos recursos e pela procura da melhor relação possível entre benefícios e custos (no sentido lato) a obter dos dois lados. O mercado de emprego assim configurado é antes de mais um mercado externo, embora remeta igualmente, e necessariamente, para os mercados internos das empresas, e os termos da relação formam-se e alteram-se em função do estado do mercado (no caso vertente marcado pelos aumentos da competição entre empresas e do volume global dos recursos dos candidatos).

Análise de dados Competências não formais Consideremos em primeiro lugar as competências não formais dos candidatos, apreendidas, como vimos, através da variável qualidades pessoais.

Vejamos os valores das categorias que correspondem às designadas novas competências: autonomia e competência relacional. Quer em um quer no outro caso, e com destaque para o segundo, trata-se de requisitos bastante mencionados nos anúncios. Entre as duas datas, e também para os dois casos, verificou-se um aumento dos pedidos das empresas destas características dos candidatos. Em 1989, por cada 100 anúncios, houve 42,7 referências a novas competências, em 1997 o mesmo valor foi de 46,5. No que respeita às competências tradicionais houve, em 1989, 63,7 referências por cada 100 anúncios e, em 1997, 61,9.

Continuam, portanto, a ser estas últimas claramente as características mais referidas. Por fim, foi nas competências que designámos de próximas das tradicionais, competitividade e apresentação física, que o aumento das referências foi o mais elevado: respectivamente 11,4% e 14,7%, em 1989, e 12,9% e 14,3%, em 1997. Deste modo, não se verificou uma redução dos pedidos de competências tradicionais e das competências próximas destas a favor das novas competências. Globalmente, o que se verificou foi um aumento quase generalizado dos pedidos de competências de tipo pessoal: em 1989, por cada 100 anúncios havia 134 menções, enquanto em 1997 o mesmo valor era de 141,1. As empresas anunciantes tornaram-se mais exigentes, sem prescindir, para os quadros e técnicos que querem recrutar, das qualidades humanas que tradicionalmente são valorizadas no mundo económico. Algumas dessas qualidades, como a competitividade, tiveram um aumento notável.

Uma qualidade como a autonomia passa a ser nitidamente mais requerida entre 1989 e 1997 em certas áreas funcionais. Tal é o caso, para além da área comercial, quando a empresa não indica a área. E, igualmente, para a polivalência e para a categoria outras, isto é, neste último caso, para muitas das vezes em que se tornou difícil, em termos de análise de conteúdo, classificar o tipo de tarefas. Isto sugere que se pede mais autonomia quando as tarefas são mais variadas e estão menos circunscritas e/ou menos bem definidas.

As empresas são mais exigentes com os seus quadros e técnicos e ao mesmo tempo parece ter aumentado a confiança que concedem às capacidades pessoais destes agentes. Fica sugerido, é claro, que uma coisa depende da outra, que a maior confiança decorre da maior exigência (e, em particular, da possibilidade em ver satisfeita esta última). Por outro lado, estamos aqui aparentemente diante de maior flexibilidade na gestão interna desta força de trabalho, de acordo com as tendências atrás mencionadas e, portanto, talvez em correspondência com a própria orientação global para uma maior flexibilidade por parte das empresas.

Um bom testemunho da coexistência de competências tradicionais com competências novas está no aumento simultâneo dos pedidos de capacidade de autonomia e de capacidade racional/burocrática para as actividades de apoio à direcção da empresa. Ainda quanto à autonomia, deve assinalar-se que o aumento dos correspondentes pedidos se ficou apenas a dever às multinacionais e às empresas nacionais de baixo estatuto. A autonomia hierarquiza estes três tipos de empresas, com as multinacionais à frente (20,0% e 22,7%, em 1989 e 1997), seguidas das empresas nacionais de estatuto elevado (18,3% e 17,9%) e das de estatuto baixo (15,7% e 17,1%). Contudo, e como se , estas últimas empresas aproximaram-se entre as duas datas das de estatuto elevado, não havendo em 1997 quase nenhuma diferença sob este aspecto entre os dois tipos de empresas nacionais.

A importância de uma qualidade como a apresentação física de si regista entre as duas datas uma progressão particularmente acentuada nas actividades de apoio à direcção e sobretudo de gestão do pessoal. Ambas as actividades envolvem contactos interpessoais em grau elevado. Nesse sentido, é provável que a apresentação de si dos quadros e técnicos tenha ganho importância na fabricação da imagem da empresa, quer ela esteja voltada para o exterior, quer para o seu próprio interior. Neste último caso implicando igualmente talvez novas formas de afirmar a autoridade dirigente (enquanto autoridade delegada). De qualquer modo haveria que examinar o papel do género e das propriedades que tradicionalmente lhe estão associadas, como a apresentação física de si, capaz de funcionar como um capital na afectação a certas funções. Não é possível fazê-lo com os dados disponíveis: as empresas não mencionam em caso algum o género dos candidatos nos anúncios (o que seria de resto ilegal). Quanto à competitividade, passou a ser mais requerida nas funções de gestão, sobretudo para o enquadramento intermédio, e igualmente para as funções de não enquadramento (individual), quando requerem autonomia.

Competências técnicas Tal como para as competências informais, as empresas tornaram-se mais exigentes no que respeita às competências técnicas. Em 1989, por cada 100 anúncios havia 129,6 referências a estas competências, e em 1997, o mesmo valor era de 134,6.

Estas competências distribuem-se, nas duas datas, por línguas (44,5% e 42,7%), informática (34,6% e 42,6%), competências técnicas especializadas (39,4% e 38,7%) e competências técnicas genéricas (11,1% e 10,6%). Vê-se como o avanço global fica exclusivamente a dever-se às competências em informática, havendo mesmo ligeiros recuos nas outras.

Os requisitos em informática progridem sobretudo na área da produção, logo seguida da área comercial e um pouco mais distanciadamente dos estudos técnicos e planeamento. Quanto aos requisitos em línguas estrangeiras, não obstante o seu ligeiro recuo global, progridem na área de administração e gestão. Isto é confirmado se considerarmos agora a posição na hierarquia: é nas chefias elevadas e no apoio à direcção, sobretudo nesta última, que estas capacidades passam a ser mais pedidas entre 1989 e 1997.

Competências formais Entre 1989 e 1997 houve lugar para importantes alterações nas preferências das empresas anunciantes em matéria da formação escolar dos candidatos ao seu recrutamento externo. Comecemos pela análise do nível e modalidade escolares.

As licenciaturas, que eram preponderantes em 1989 (37,5%), passam a valores ainda mais elevados em 1997 (41,2%). O recuo mais nítido pertence aos bacharelatos, seja quando são pedidos conjuntamente com a licenciatura, em alternativa recíproca (18,5%, em 1989, e 14,7%, em 1997), seja quando são pedidos isoladamente (3,9%, em 1989, e 1,7%, em 1997). Ganhos igualmente assinaláveis para o 12.º ano via de ensino (5,6% e 7,5%), com recuo do 10.º e 11.º anos (3,8% e 2,6%) e do 12.º profissional (1,2% e 1,0%). Deste modo os bacharéis viram o seu espaço reduzir-se no interior de uma tenaz constituída pelos licenciados e pelos detentores do 12.º ano via de ensino.

É possível que a explosão do número de licenciados pelo ensino superior entre as duas datas, ao criar alguma abundância relativa destes diplomados, tenha incentivado as empresas a recrutá-los, a favor nomeadamente de alguma pressão para a contenção salarial. O facto de terem sido as empresas nacionais de estatuto baixo as que aumentaram mais substancialmente o recrutamento de licenciados (35,3% e 40,7%, contra 38,1% e 41,4% para as empresas nacionais de estatuto elevado e 38,7% e 41,2% para as multinacionais) parece ajustar-se à hipótese. Com efeito, se em 1989 eram as empresas nacionais de estatuto baixo que menos recrutavam licenciados, dos três tipos de empresas eram aquelas onde provavelmente era maior a probabilidade de não o fazerem em parte por razões de custos económicos imediatos. São também estas empresas que mais drasticamente reduzem a sua preferência por bacharéis e, ao mesmo tempo, que mais acentuadamente passam a recrutar diplomados com o 12.º ano via de ensino.

Entre as duas datas os bacharéis perdem posições para os licenciados e os diplomados com o 12.º ano via de ensino, sobretudo na área funcional de administração e gestão, mas igualmente em estudos técnicos e planeamento, onde ainda perdem a favor do 12.º ano via de ensino, embora mais moderadamente. Em contrapartida os bacharéis ganham posições em gestão dos recursos humanos e formação.

Na vertente hierárquica das funções as perdas de posições dos bacharéis a favor, simultaneamente, como vimos, dos licenciados e dos diplomados com o 12.º ano profissional, têm lugar antes de mais em funções de enquadramento médio.

Funções para as quais, no entanto, e como é bem conhecido, as formações do ensino superior politécnico estariam particularmente voltadas, de acordo com a definição oficial do papel deste ensino. O mesmo fenómeno tem lugar, embora um pouco mais moderadamente, para as funções que designámos de individuais, e que correspondem, recorde-se, a tarefas de não enquadramento.

No que respeita à área de formação, as formações em engenharia (27,2%, em 1987, e 26%, em 1997), logo seguidas de economia/gestão (18,9% e 15,6%), situam-se na dianteira do conjunto dos pedidos das empresas, a grande distância de todas as outras. Estas últimas repartem-se entre informática/matemática (4,6% e 5,9%), ciências (4,7% e 5,4%), humanidades (2,2% e 2,6%), artes (1,5% e 2,2%) e direito (1% e 1%). Entre as duas datas portanto recuo nítido do espaço para os diplomados em economia/gestão, estabilização das formações em engenharia (as formações em informática/matemática incluem formações em engenharia), pequenos avanços em ciências, humanidades e artes.

O recuo de economia/gestão tem lugar nos três tipos de empresas nacionais de estatuto baixo, nacionais de estatuto elevado e multinacionais , e em todas elas de modo muito semelhante. Isto indicia uma mesma orientação quanto a estes diplomados pela generalidade das empresas anunciantes, pelo que é pouco provável uma reversão da tendência. É notável que os diplomados em economia/ gestão percam terreno entre 1989 e 1997 precisamente na área funcional de administração e gestão (onde representam, em 1989, 54,3% dos pedidos e 45,3% em 1997). Ao mesmo tempo, são remetidos para a gestão e formação de recursos humanos, com um fortíssimo incremento (13,3% e 18,3%), e também para a polivalência, mas desta vez com aumento moderado (26,7% e 29,2%).

Entretanto, os diplomados em engenharia passam a aceder mais aos postos de gestão e administração (9,5% em 1989, 13,5% em 1997), onde vão sobretudo ocupar o terreno deixado pelos diplomados em economia/gestão. Apesar disso os diplomados em engenharia são, previsivelmente e muito largamente, dominantes nas funções de produção, a enorme distância de todas as outras categorias de diplomados, embora tenham perdido ligeiramente terreno de 1989 para 1997 (61,5% e 58,8%). O aumento do recrutamento dos diplomados em informática/ matemática tem lugar sobretudo nas empresas nacionais de estatuto mais elevado.

Em termos de área funcional estes diplomados obtêm os mais fortes incrementos por parte dos pedidos das empresas quando estas não indicam essa área, quando os querem recrutar para os postos de administração e gestão, e também para os de gestão e formação dos recursos humanos.

Examinemos agora as relações entre a área de formação dos candidatos e a posição hierárquica das tarefas para as quais se pretende recrutá-los. Entre 1989 e 1997 teve lugar uma polarização da competição entre as duas principais categorias de diplomados, engenharia e economia e gestão. Confirma-se deste modo o que era patente no que respeita à área funcional, e também aqui, sob este ângulo da análise, com vantagem para os diplomados em engenharia. Com efeito, nas posições mais valorizadas, isto é, nas chefias elevadas e no apoio à direcção, os diplomados em economia e gestão perdem muito nitidamente terreno a favor dos engenheiros (e igualmente a favor dos diplomados em ciências, com destaque para o apoio à direcção). Em contrapartida, para o acesso ao enquadramento médio mantêm-se as posições relativas das duas categorias de diplomados.

No conjunto, a indicação do nível escolar nos anúncios passou de 70,4% dos casos, em 1989, para 68,7%, em 1997. Para a área de formação escolar os mesmos valores são de 60,1% e 58,7%. , portanto, ligeiro recuo das referências à escolaridade, recuo que deve ser colocado lado a lado com os dados vistos relativos ao aumento dos requisitos em conhecimentos informáticos e em qualidades pessoais. A experiência profissional (que é analisada adiante em detalhe) foi referida em 65,2% dos anúncios, em 1989, e em 66,5%, em 1997.

Estes resultados sugerem uma evolução bastante moderada entre as duas datas em direcção ao aumento da importância das competências dos candidatos não escolarmente sancionadas, face às competências escolares. Embora desenhando-se com relativa nitidez, a evolução fica claramente aquém de uma alteração marcante da relação entre as duas ordens de competências. Contudo, deve assinalar-se que isto ocorre num período em que aumenta pronunciadamente o volume do capital escolar disponível.

Destaque-se também a progressão do recrutamento dos diplomados em artes nas chefias elevadas e no apoio à direcção, bem como nas posições individuais com autonomia, o que pode indiciar maior investimento na concepção dos produtos.

Embora, é claro, na escala correspondente à parte extremamente modesta que cabe a estes diplomados.

Experiência profissional Quando nos anúncios menção do número de anos de experiência profissional as preferências das empresas concentram-se largamente nas categorias de 1 a 3 anos (9,3%, em 1989, e 11,9%, em 1997) e >3 a 5 anos (8,8% e 10,2%), com ligeira predominância do primeiro intervalo. Isto em detrimento das categorias >5 anos (5,5% e 5,0%) e dos recém-diplomados (2,2% e 1,6%). Entre as duas datas os requisitos 1 a 3 anos e >3 a 5 anos aumentaram portanto nitidamente, sobretudo no primeiro caso. Note-se, contudo, que na maior parte dos casos as empresas não especificam o número de anos de experiência, quer a mencionem como obrigatória (43,3% e 33,8%), ou simplesmente com preferencial (5,1% e 4,1%). De qualquer modo, entre as duas datas aumenta a proporção dos casos em que as empresas especificam o número de anos de experiência.

Procuremos ver mais de perto alguns aspectos das preferências pelas duas categorias temporais da experiência dos candidatos mais pedidas. Em termos de área funcional, em primeiro lugar. Os candidatos com 1 a 3 anos, face aos de >3 a 5 anos, estão mais vocacionados para as funções polivalentes e os estudos técnicos e planeamento e menos para as funções de produção. Para a vertente hierárquica das funções vemos as chefias elevadas e o enquadramento, e em menor grau o apoio à direcção, a atrair mais os candidatos de >3 a 5 anos de experiência, o que mostra a importância da idade na definição pelas empresas do trabalho de enquadramento. A função a desempenhar pelos candidatos orienta assim claramente as preferências das empresas quanto às suas idades.

Mas a função não esgota a lógica do recrutamento em termos etários. Com efeito, se considerarmos agora o estatuto das empresas, vemos que o requisito 1 a 3 anos de experiência segue de perto esse estatuto: são as multinacionais que mais pedem candidatos com esta experiência (12,5%, em 1989, e 14,5%, em 1997), seguidas das empresas nacionais de estatuto elevado (8,8% e 12,4%) e por último das empresas nacionais de estatuto baixo (5,4% e 7,5%). Para a categoria >3 a 5 anos temos semelhante distribuição, mas de modo menos vincado (6,2% e 7,3% para as empresas nacionais de estatuto baixo, 9% e 10,5% para as empresas nacionais de estatuto elevado, 10,8% e 11,9% para as multinacionais). Em todo o caso, para os candidatos de >5 anos a relação inverte-se: quanto mais elevado o estatuto da empresa, menor é a probabilidade de mencionar este requisito etário (6,0% e 6,9% para as empresas nacionais de estatuto baixo, 6,2% e 5,4% para as empresas nacionais de estatuto elevado e 4,3% e 3,3% para as multinacionais).

Ou seja, e para resumir o conjunto da distribuição: o estatuto das empresas está inversamente correlacionado com o nível de experiência dos candidatos que desejam recrutar. Em particular, a predilecção das empresas de estatuto mais elevado pelos candidatos com 1 a 3 anos de experiência sugere a seguinte hipótese: essas empresas, se estiverem em condições de fixar estes candidatos, como parece plausível, transferem uma parte do que poderia ser designado como os seus custos de formação inicial no mundo económico para as empresas menos bem colocadas no mercado dos produtos.

Isto sucederia na medida em que as empresas melhor posicionadas estão em condições de atrair os candidatos com aquela experiência colocados nas empresas de menor estatuto, beneficiando assim dessa mesma experiência sem terem suportado os custos que necessariamente lhe estão associados. Esses custos seriam largamente custos de socialização. O próprio intervalo 1 a 3 anos de experiência parece indicar que tudo se passa como se fosse necessário um contacto suficientemente prolongado com o mundo económico para conhecer o essencial do seu funcionamento. Mas um contacto, ao mesmo tempo, não demasiado prolongado, para que os candidatos não estejam moldados por uma cultura determinada de empresa (Sainsaulieu, 1997: 234-63), logo, em condições de serem devidamente socializados pela empresa anunciante. Além disso, 1 a 3 anos de experiência seria também favorável à empresa em termos negociais.

uma forma de obter uma repartição equitativa pelas empresas dos custos de formação, por exemplo, os custos de formação que aqui designámos de inicial, por incluírem com toda a probabilidade uma componente socializadora que pode ter lugar no próprio meio empresarial. Ela implica mecanismos institucionais que coloquem todas as empresas, ou uma parte importante de entre elas, e economicamente estratégica, na obrigação de realizar a correspondente formação (Marsden, 1998: 259-60). Historicamente uma tal situação ocorreu na Alemanha com o sistema dual de aprendizagem nas formações de nível secundário, através da acção do estado e da efectiva e maciça mobilização das empresas (Buechtemann, 1993; Tanguy e Kieffer, 1982). Quando a obrigação está totalmente ausente, como no caso do mercado de emprego dos quadros e técnicos, é elevada a probabilidade de ocorrer a transferência dos custos, através das correspondentes estratégias das empresas.

De qualquer modo tudo indica, nos nossos dados, que as empresas de estatuto mais elevado estão de facto em condições de atrair e fixar candidatos com as características mencionadas: nos seus anúncios oferecem também mais frequentemente carreira e automóvel, além de mencionarem mais vezes que oferecem vantagens remuneratórias, mencionando frequentemente que pagam salários acima das outras empresas. Por exemplo, para os candidatos com 1 a 3 anos de experiência, as taxas de oferta de carreira, em 1989 e 1997, são de 29,0% e 26,3% para as empresas nacionais de baixo estatuto, de 31,5% e 30,4% para as nacionais de estatuto elevado, e de 40,4% e 41,9% para as multinacionais. Mesmos valores, na mesma ordem crescente do estatuto das empresas, para a oferta de remuneração acima da média: 58,0% e 50,0%, 62,2% e 59,8%, 72,5% e 64,8%. Para a oferta de automóvel: 5,8% e 5,3%, 5,5% e 6,5%, e 15,2% e 15,2%.

De uma maneira geral é provável que estejamos aqui perante um conjunto de procedimentos orientados: - quer para captar os melhores quadros (seria sobretudo essa a função da oferta de salário vantajoso); - quer para que uma vez ingressados na empresa, esta possa obter o mais alto empenho e esforço da sua parte (função sobretudo do incentivo da oferta de carreira).

No primeiro caso estaríamos mais perto de estratégias confortando a concepção neoclássica do mercado de emprego, com as empresas pagando mais para terem um grande número de candidatos, entre os quais podem em seguida escolher os melhores. No segundo caso estaríamos perante um modelo de comportamento empresarial enfatizando a promoção da concorrência entre os assalariados interna à empresa e os correlativos mecanismos de controlo social (Le Grand, 1995: 286-7; Finlay e Martin, 1995: 161).

Na literatura consultada vimos igualmente referência à experiência prévia dos candidatos como um meio de assegurar uma socialização em aspectos do funcionamento do mundo económico, alguns deles elementares, como a capacidade para cumprir horários (Finlay e Martin, 1995: 153). Contudo, nada encontrámos sobre estratégias empresariais ligando entre si o conjunto destes procedimentos: (a) a captação e (b) a fixação de assalariados com (c) modalidades de socialização que aparentemente levam em conta a especificidade das culturas organizacionais, bem como (d) a transferência para empresas menos bem colocadas no mercado dos produtos dos custos da socialização anterior.

Em todo o caso, os dados não apoiam o que poderia designar-se como uma versão particularmente forte da hipótese da transferência dos custos de formação inicial. De acordo com essa versão, as empresas que pretendem recrutar candidatos com 1 a 3 anos de experiência profissional, desejosas em muitos casos de os fixar e integrar, oferecer-lhes-iam contrapartidas mais vultuosas do que para os outros candidatos. Nesse caso é de esperar que para os candidatos com 1 a 3 anos de experiência, relativamente às outras categorias etárias de candidatos, as menções às ofertas de carreira, a remuneração atraente e a automóvel fossem mais frequentes. É claramente o caso para as ofertas de carreira nos três tipos de empresas, sobretudo tendo em conta os candidatos com 1 a 3 anos de experiência, face aos com mais de 5 anos. não o é para a remuneração, em que ligeira vantagem dos com 3 a 5 e > 5 anos. Para a oferta de automóvel a experiência ligeira vantagem aos candidatos nas empresas nacionais de estatuto baixo e nas multinacionais, e nítida vantagem nas empresas nacionais de estatuto elevado.

No entanto, também não se pode deixar de pôr aqui em destaque dois pontos. O primeiro é que, no conjunto das três ofertas empresariais, são as ofertas de carreira que mais claramente correspondem à intenção de fixar e integrar os candidatos. Em segundo lugar, as empresas estão com bastante probabilidade em posição negocial relativamente favorável face aos candidatos com 1 a 3 anos de experiência (logo a seguir aos recém-diplomados). Nesse sentido, as contrapartidas que oferecem em remuneração e automóvel poderiam ser particularmente baixas o que não é o caso, como vimos.

Por isso mantêm-se as razões para conservar a hipótese da transferência dos custos de formação inicial, e a sua ligação com os outros aspectos das estratégias empresariais em questão, embora rejeitando o que poderia ser considerado como a versão forte dessa hipótese.

Entre o mercado interno e o mercado externo Retomemos o que atrás foi dito acerca da possibilidade de as empresas se orientarem (a) mais para a escolha do que consideram ser os melhores candidatos, sem incentivos para deles obterem os melhores desempenhos uma vez recrutados, ou então (b) mais para a criação de incentivos após o seu ingresso.

Pode tentar-se analisar a presença de cada uma destas alternativas nos procedimentos das empresas. Obviamente que, aqui como nas demais análises propostas, a informação que iremos usar, contida nos anúncios, tem unicamente o estatuto de um conjunto de indicadores plausíveis da orientação da acção das empresas. Não tem o grau de amplitude e de precisão que resultariam de um inquérito expressamente construído no âmbito das problemáticas que temos ventilado.

As duas variáveis da oferta de carreira e de salário vantajoso podem prestar aqui bons serviços. Com efeito, a oferta de carreira estaria mais próxima das estratégias voltadas para tirar o melhor partido dos candidatos, após recrutamento. A oferta de salário vantajoso, em contrapartida, estaria mais orientada para captar os melhores entre os candidatos possíveis. Considerem-se os quatro casos que resultam da combinação da presença ou ausência nos anúncios das ofertas de salário atraente e carreira, com as correspondentes taxas às duas datas: 1 não oferta de carreira, não oferta de remuneração: atrair os melhores, sem incentivos após ingresso, versão fraca; 33,7% dos casos, em 1989, 39,4%, em 1997; 2 oferta de carreira: atrair e integrar com incentivos; 5,1% dos casos, em 1989, 4,9%, em 1997.

3 oferta de remuneração: atrair os melhores, sem incentivos após ingresso; 39,3% dos casos, em 1989, 34,5%, em 1997.

4 oferta de carreira, oferta de remuneração: atrair e integrar com incentivos, versão forte; 21,8% dos casos, em 1989, 21,2%, em 1997.

A combinatória resume para cada caso a correspondente e provável estratégia das empresas, de modo meramente tendencial, é óbvio, pelas razões atrás expostas.

Em (2) a oferta de carreira funcionaria simultaneamente como elemento de atracção de candidatos e da sua integração na empresa. Não se trata apenas de procurar atrair os melhores, mas de procurar também que dêem o melhor de si uma vez recrutados. Em (4) teríamos uma versão forte desta última alternativa, dado que se conjugam aqui a oferta de carreira e o salário atraente. Em (3) as empresas estariam, sobretudo, orientadas para atrair através de salário vantajoso os melhores candidatos, com menor orientação para os integrar, o que pode implicar maior rotação dos seus quadros e técnicos. Seria o caso mais próximo da abordagem neoclássica do mercado de emprego, com predominância da dinâmica do recrutamento externo. Em contrapartida, no caso (4) as empresas procurariam beneficiar dos incentivos ligados ao funcionamento dos mercados internos. Isto é, a acção das empresas estaria voltada para tirar o máximo de vantagens dos recursos e capacidades dos candidatos recrutados, inclusive favorecendo o próprio desenvolvimento desses recursos e capacidades. Para (1) temos situações mais difíceis de caracterizar. Contudo, não é de excluir que uma boa parte dos anúncios correspondentes a este caso esteja igualmente orientada para o mercado externo. Leve-se nomeadamente em conta o facto de que a simples menção no anúncio de a empresa ser líder no ramo ou multinacional pode funcionar do ponto de vista das empresas como um equivalente da referência ao salário vantajoso.

Em 1989 39,3% de casos em que as empresas anunciantes estão claramente orientadas para o mercado externo, enquanto a figura oposta regista 5,1+21,8=26,9% dos casos. Mesmos valores para 1997: 34,5% e 4,9+21,2=26,1%.

Entre as duas datas os casos em que no anúncio não figura nem a oferta de carreira nem a remuneração atraente passam de 33,7% para 39,4%. Dado o significado atribuído a este último caso é provável que entre 1989 e 1997 não tenha havido finalmente grandes alterações em matéria de orientação para o mercado externo.

Podemos agora examinar a relação entre as ofertas das empresas, o nível de escolaridade dos candidatos e a sua experiência profissional, de acordo com a tipologia atrás proposta. Quando as empresas querem recrutar candidatos com determinadas características o que é que oferecem em troca? Por exemplo: por cada 100 candidatos com 1 a 3 anos de experiência, a quantos as empresas oferecem simultaneamente carreira e remuneração vantajosa? No que respeita ao nível escolar: o traço mais saliente da distribuição (que não detalhamos) corresponde à predominância de oferta de remuneração vantajosa quando as empresas querem recrutar bacharéis e titulares de diplomas do 12.º ano via de ensino. Quanto à intenção de recrutar licenciados, ela não está claramente associada a uma contrapartida definida oferecida pelas empresas. Quando muito uma ligeira maior propensão para oferecer carreira a estes diplomados. Para a experiência dos candidatos: a menção a salário atraente está claramente e positivamente associada à intenção de recrutar candidatos com mais de três anos de experiência; enquanto a oferta de carreira se correlaciona mais com o recrutamento de candidatos com 1 a 3 anos de experiência, especialmente se estiver combinada com oferta de remuneração atraente. A mesma associação positiva existe, embora em menor grau, para os candidatos com >3 a 5 anos de experiência.

Deste modo, o recrutamento externo, mais próximo do modelo neoclássico do mercado de emprego, estaria sobretudo associado aos diplomas de nível mais baixo, enquanto os licenciados estariam mais protegidos destas orientações das empresas. Em contrapartida, a intenção de fixar os candidatos e de tirar o máximo partido das suas competências através de incentivos parece estar, sobretudo, associada ao recrutamento de candidatos com 1 a 3 anos de experiência profissional.

Conclusão Qualidades como a autonomia e a competência relacional, no âmbito do que tem sido designado como novas competências, têm um lugar importante nas preferências das empresas anunciantes, embora claramente atrás das competências tradicionais. As novas competências passaram a ser, moderadamente, mais pedidas entre as duas datas. Por outro lado, este movimento não teve lugar à custa das competências tradicionais.

Isto indicia uma mudança talvez não tão pronunciada como seria de esperar, face ao contexto económico, à importância actualmente concedida ao tema, bem como ao tema correlato da flexibilização da actividade e da estrutura das empresas e da intensificação da competição entre elas. Em todo o caso, o facto de os pedidos de autonomia crescerem, sobretudo, nas áreas funcionais menos bem definidas parece estar, em princípio, de acordo com o tipo de alterações nas estruturas das empresas que estão associadas às novas competências. Não é de excluir que o aumento dos pedidos das competências não certificadas escolarmente tenha igualmente algo a ver com o próprio aumento do volume de diplomados. Com efeito, este último, em si mesmo, passa a fornecer menos informação às empresas sobre os candidatos (Breen e Goldthorpe, 2001: 236). Os pedidos de competências técnicas cresceram, mas unicamente em matéria de conhecimentos informáticos.

No que toca às competências formais e para os níveis de formação, as licenciaturas dominam largamente nas preferências das empresas, a grande distância dos bacharéis e dos detentores de diplomas do 12.º ano, da via de ensino ou profissionais. Isto é tanto mais notável quanto a nossa escolha para a análise dos anúncios não incidiu apenas sobre as funções de quadros e técnicos superiores, mas igualmente de quadros e técnicos médios.

Em particular, as funções de enquadramento intermédio são maioritariamente providas por licenciados. Esta estrutura das preferências das empresas contraria frontalmente e felizmente, para bem da empregabilidade do conjunto dos diplomados do ensino superior as crenças e definições de uso corrente sobre o papel e as necessidades de formações intermédias. Para mais, diminui ainda, entre 1989 e 1997, a parte de si exígua que nos anúncios do Expresso emprego cabe aos bacharelatos e ao 12.º ano profissional, sobretudo, nas actividades de enquadramento médio.

Apenas os detentores do 12.º ano via de ensino parecem minimamente fazer jus ao destino mais adequado às formações intermédias. Note-se que estamos aqui perante um tipo de diplomado relativamente ao qual são nulas ou praticamente inexistentes as referências ao seu papel no mundo económico. Claro que é necessário lembrar: o estudo respeita apenas a uma parte do recrutamento externo dos quadros e técnicos. Em particular, uma parte talvez bastante importante do recrutamento dos bacharéis e dos detentores de diplomas do 12.º ano profissional deve ter lugar através de métodos informais. Métodos esses, em todo o caso, diferentes do anúncio em periódico de circulação nacional (veja- se, por exemplo, o papel do estágio em empresa para as formações de nível III, do Ministério do Trabalho).

De qualquer modo, destaque-se o facto de terem progredido nas preferências das empresas as licenciaturas e o 12.º ano via de ensino, precisamente as formações, de longe, com maior volume relativo de diplomados. Pelo menos no caso das licenciaturas, são as que mais cresceram entre 1989 e 1997. Isso sugere que as empresas têm uma larga propensão e capacidade para ajustar uma boa parte das suas preferências à própria oferta de força de trabalho. As empresas podem mesmo, em relativamente curto espaço de tempo, rever muitas das suas perspectivas e concepções nesta matéria, em particular no que se refere às relações entre formação, posição e função, por um lado, e tarefas a ocupar e a desempenhar, por outro lado. E, ao fazê-lo, estão no essencial a colher as oportunidades que lhes oferece o novo estado do mercado de emprego.

Um indício da flexibilidade do comportamento empresarial está na existência, e no reforço entre as duas datas, de estratégias que tudo indica estarem orientadas para fixar e integrar quadros jovens, assegurando a melhor socialização possível às suas culturas organizacionais. E transferindo simultaneamente para outras empresas menos bem colocadas no mercado dos produtos os custos de uma socialização inicial, de carácter genérico, no mundo económico. Pode considerar-se, com efeito, que tais estratégias são particularmente adequadas a um estado do mercado de emprego em que a forte afluência de diplomados do ensino superior é um dos traços dominantes. Isto é, um estado do mercado em que cresce particularmente depressa a parte do segmento juvenil no conjunto dos diplomados do ensino superior.

O recuo das formações em economia/gestão regista-se precisamente numa área em que foi (a) extremamente acentuado o crescimento do número de diplomados, (b) com contributo relevante do ensino superior privado, ao qual o referido recuo também terá ficado a dever-se. O fenómeno não corresponde apenas a uma redução quantitativa global: uma vez recrutados, os candidatos com aquelas formações têm menos oportunidades de ingresso nas funções e posições mais desejáveis. Em contrapartida, os diplomados em engenharia, cujo crescimento entre as duas datas (a) terá sido menos acentuado de que no caso anterior, (b) mas que foi em todo o caso importante e (c) no essencial sustentado pelo ensino público, não mantêm a sua parte no volume global das preferências empresariais, como ainda ganham terreno para ao acesso às posições mais desejáveis, com maior poder formal nas empresas. O que tem lugar em detrimento, precisamente, dos diplomados em economia/gestão e também na área funcional de administração e gestão.

No que toca à orientação empresarial segundo a alternativa mercado interno/ externo, num quadro geral em que domina o recurso ao mercado externo, nota-se no caso desta orientação das empresas alguma prevalência dos recrutamentos orientados, sobretudo, para os candidatos com escolaridade inferior à licenciatura e experiência profissional superior a 3 anos. E maior importância relativa dos incentivos, uma vez realizado o recrutamento (prevalência do mercado interno), muito moderadamente para os candidatos licenciados e bastante mais nitidamente para os que têm experiência de 1 a 3 anos.

A relativa flexibilidade de que provas o mundo empresarial, ou pelo menos uma parte relativamente importante deste mundo social, perante as transformações no volume e estrutura da oferta de formações, deve ter como contrapartida alguma capacidade da própria procura de ensino por parte dos estudantes reagir ao estado das preferências das empresas e às linhas de força do mercado de emprego. Ao que tudo indica os acréscimos de procura de ensino superior verificados desde a segunda metade dos anos 80 são desencadeados, num primeiro tempo, pelo aumento dos níveis de vida e a correlativa alteração das perspectivas dos jovens e das famílias quanto à escolaridade. A prazo, porém, os estudantes protagonistas dos sucessivos suplementos da procura não podem permanecer indiferentes ao estado das preferências das empresas e dos segmentos do mercado de emprego implicados na valorização das suas formações.

É verdade que no caso do ensino superior uma boa parte da informação proveniente do mercado de emprego chega aos jovens depois das escolhas feitas, isto é, no fim ou perto do fim dos estudos, através dos primeiros contactos com o mercado de emprego dos pares com idênticas escolhas e que os precederam na escolaridade. Contudo, a informação deve circular igualmente por outras vias (Alves, 2000: 90-2). É provável que em 1997 o estado do mercado de emprego dos quadros e técnicos fosse o resultado de um conjunto de reajustamentos importantes entre oferta e procura de diplomados, sucedendo à explosão da procura de ensino superior que ocorreu a partir de meados dos anos 80.

Veja-se nomeadamente que o facto de uma parte do ensino superior ser privado deve dar a este ensino alguma flexibilidade perante as modulações da procura.

Por outro lado, sabe-se como, para cursos idênticos ou homólogos, as preferências dos estudantes vão quase sempre para o ensino universitário público. Consideremos assim, por exemplo, a desvalorização dos cursos de economia/gestão, patente, como vimos, quer na redução do volume relativo de pedidos destes diplomados quer na quebra das suas oportunidades de aceder a funções de gestão e enquadramento. Essa perda de valor dos diplomas poderá ter- se repercutido negativamente na procura destes cursos, especialmente no sector privado, com algum provável reajustamento da oferta.


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