EDITORIAL
EDITORIAL
A uma alargada circulação internacional da Sociologia, Problemas e Práticas tem
correspondido um cada vez maior número de propostas de artigos de autores de
diversos países, interessados em publicar os seus trabalhos nesta revista. É
possível, assim, que o primeiro número de 2008 seja constituído integralmente
por artigos de autores com larga reputação científica, de diferentes
nacionalidades e pontos do globo, nalguns casos combinando co-autorias
transcontinentais.
O presente volume abre, pois, com um artigo de Bernard Lahire, que questiona o
tradicional quadro de pensamento da sociologia da cultura acerca das práticas e
preferências culturais. No seu trabalho Lahire valoriza a importância do estudo
das variações intra-individuais dos comportamentos humanos, propondo adoptar
uma outra perspectiva para explicação dos fenómenos associados a tais
variações, que designa por sociologia da pluralidade disposicional e
contextual.
Catherine Wenden examina os processos de integração dos imigrantes, a partir do
estudo que realiza sobre a história dos subúrbios das metrópoles em França. A
autora desenvolve a sua análise através de um percurso cronológico e reflecte
sobre as políticas públicas mobilizadas, as quais na sua perspectiva mais
não têm sido do que medidas de curto prazo, muitas vezes concretizadas em nome
do respeito pela diferença cultural, visando sobretudo clientelas eleitorais e
não tanto a superação das fortes desigualdades sociais, dos problemas sociais
de desemprego, discriminação, falta de oportunidades de mobilidade social e
residencial que estas populações enfrentam e relativamente aos quais
recorrentemente reagem.
O terceiro artigo, de Lise Isaksen, Uma Devi e Arlie Hochschild, centra-se no
trabalho do cuidar à escala global, que entendem em crise. Protagonizado por
mulheres de países com economias pobres deslocadas para os países mais
abastados onde escasseia a oferta de prestadores de serviços interpessoais, o
trabalho de prestação de cuidados estará a gerar um processo de care drain, com
grande impacto nas famílias e nos filhos destas trabalhadoras globais, que
permanecem nos respectivos países de origem.
Karina Kuschnir, por sua vez, fala-nos da experiência da maternidade e da
amamentação e dos processos de construção identitária a ela inerentes, a partir
da sua pesquisa junto de mulheres da Zona Sul do Rio de Janeiro. No seu estilo
elegante de escrita e numa reflexão analítica em que sobressai o recorte
biográfico, o artigo procura evidenciar a complexidade de que tal experiência
se reveste, o modo como contribui para a transformação da identidade da mulher-
mãe, e como pode estar associada à redefinição das relações familiares, tanto a
nível da díade conjugal como dos laços com as outras mulheres e demais
elementos da família.
Beth Perry e Tim May estudaram o papel da ciência, da investigação e do ensino
universitário no quadro actual da globalização e da economia do conhecimento.
Os autores discutem, numa perspectiva comparada, as lógicas subjacentes à
definição de políticas públicas nesta área, analisando de que forma se
entrecruzam posicionamentos nacionais, regionais e globais e as resultantes das
diversas orientações, com maior ou menor atenção aos contextos, que impregnam
tais estratégias de governança.
Por fim, José Francisco Durán Vasquez apresenta uma análise das transformações
ocorridas no valor moral do trabalho. Apresentando-nos, num itinerário
analítico, a génese e transformação dos significados morais do trabalho, Durán
Vasquez defende ser necessário compreender a nova ética do trabalho no quadro
do processo histórico de mudança social e das experiências laborais de
instabilidade e precariedade geradoras de desintegração e desmobilização
colectivas.
Esperemos que os leitores encontrem, nesta diversidade de conteúdos, inspiração
para novos caminhos de reflexão e pesquisa.
Maria das Dores Guerreiro