Microestudo sociológico de um centro novas oportunidades
Apresentação
O processo, em curso, de reconhecimento e certificação de competências
adquiridas informalmente ao longo da vida e o programa governamental Novas
Oportunidades têm suscitado reacções controversas na opinião pública e também
no seio de alguns círculos de especialistas mais qualificados.
Tendo surgido de uma oportunidade fortuita que pôde ser aproveitada, o presente
trabalho pretende ser um microestudo que, analisando ponderadamente um caso
pontual de concretização daqueles processos, possa ajudar a uma melhor
compreensão dos mesmos e, eventualmente, ao aprofundamento de algumas questões
críticas que resultem numa melhoria da sua aplicação prática e dos seus
resultados.
Nestes termos, o que vai seguir-se é um relatório analítico de um Centro
Novas Oportunidades localizado na província, que o autor teve a possibilidade
de acompanhar durante alguns meses na qualidade de consultor,1 entre finais
de 2007 e meados de 2008. O estudo foi decidido por iniciativa própria, com
conhecimento do pessoal técnico da instituição e sem qualquer destinatário
encomendador. Foi, em primeira mão, entregue àqueles técnicos, para que o
discutissem e dele retirassem o que melhor lhes servisse, e é agora publicado
por se julgar poder eventualmente interessar públicos mais alargados.
Metodologicamente, trata-se de um estudo de caso. As fontes de informação foram
documentais (um acervo de papéis, os mais importantes dos quais figuram na
bibliografia final) e um trabalho de campo algo intermitente, consistindo
numa observação participante realizada ao longo daqueles meses de facto,
uma percepção visual-compreensiva dos locais, actores e processos (participação
do autor em reuniões mensais das equipas técnicas, conversas informais, actos
públicos formais, etc.) e num conjunto de entrevistas semidirectivas.
Desejando manter-se o sigilo sobre a identidade do objecto de estudo e dos
interlocutores privilegiados, denominamos os técnicos/as entrevistados/as
pelos nomes fictícios de Sónia, Andreia, Leocádia, Zulmira e Isolda,
e os adultos/formandos pelos nomes de Antónia, Beatriz, Carlos e Dália.
A todos os membros da Bagatela nome também fictício pelo qual designámos o
centro estudado deixamos o nosso agradecimento pela colaboração prestada a
este nosso intento e os votos dos melhores sucessos para o futuro.
A organização e o quadro local
Os instrumentos de uma política
A Iniciativa Novas Oportunidades (NO) foi lançada pelo governo chefiado por
José Sócrates, constituído após a vitória com maioria absoluta do Partido
Socialista nas eleições legislativas de Março de 2005.
Com a criação em 2007 de uma nova instituição central de controlo e coordenação
de todo o processo a Agência Nacional para a Qualificação (ANQ) , o programa
integrou parte do dispositivo regulamentar anterior existente no campo da
educação de adultos, em particular o processo de reconhecimento, validação e
certificação de competências (RVCC), destinado a equiparar formalmente as
capacidades eventualmente adquiridas pelos indivíduos ao longo da sua vida
(profissional, familiar, social, etc.) às qualificações académicas concedidas
pelo sistema formal de ensino, nos níveis básico e secundário. Outra área de
intervenção importante, prosseguida desde cerca de 2001 e agora também
integrada no mesmo dispositivo, é a dos cursos de educação e formação de
adultos (EFA, para maiores de 23 anos) e dos cursos de educação e formação
(CEF, para jovens dos 15 aos 25 anos), destinados principalmente a formar e a
atribuir um grau de qualificação profissional dentro do quadro sancionado
pela União Europeia (UE) numa determinada especialidade técnica.
Por outro lado, tentando superar um obstáculo bem conhecido de há décadas,
procurou-se articular institucionalmente estes programas de qualificação (e
requalificação) dos portugueses adultos (geralmente já inseridos na vida
activa) submetendo-os à dupla tutela dos Ministérios da Educação e do
Trabalho.2
Além disso, o dispositivo operacional desta nova tentativa de formação de
adultos estabeleceu-se debaixo da concepção de mais uma modalidade de parceria
público-privada, que tem caracterizado a evolução das políticas estatais dos
últimos anos em diversos países, incluindo Portugal. Deste modo, a rede
territorial de instituições onde têm lugar os processos de RVCC e outros agora
integrados neste programa é constituída por uma pluralidade de entidades
autónomas (escolas públicas e profissionais, centros de formação profissional,
autarquias, associações, empresas, etc.) certificadas pela ANQ sob a designação
de Centros Novas Oportunidades (CNO). Segundo informação oficial do programa,
em finais de 2007 existiam 269 CNO no Continente e R.A. da Madeira, estando
neles inscritos cerca de 350 mil indivíduos adultos (maiores de 18 anos de
idade), dos quais 200 mil no nível básico e 150 mil no secundário.
3
Desde 2001, ano em que se iniciaram estes processos (RVCC e EFA), terão já
sido certificados cerca de 143 mil indivíduos.4
Os documentos estruturadores e operativos da doutrina e da estratégica
pedagógica em que assenta o RVCC são, sobretudo, os seguintes:
- referencial de competências-chave para o nível básico;5
- referencial de competências-chave para o nível secundário;6
- catálogo nacional de qualificações;
- carta de qualidade dos CNO.
Segundo aquele primeiro documento, o conteúdo das competências (isto é,
conhecimentos exigidos e atitudes desejáveis) correspondentes ao ensino básico
distribui-se por quatro áreas: linguagem e comunicação; tecnologias da
informação e comunicação; matemática para a vida; e cidadania e
empregabilidade, perfazendo um volume de 200 a 600 horas de trabalho escolar.
Para o ensino secundário, as áreas são três: cultura, língua e comunicação;
sociedade, tecnologia e ciência; e cidadania e profissionalidade; com um total
de 88 créditos e um volume de trabalho de 530 a 1060 horas, havendo necessidade
de cumprir 44 créditos para o grau ser validado.
A pedagogia é activa, mais assente num conceito de auto-aprendizagem apoiadado
que em ensino, individualizada mas aproveitando algumas dinâmicas grupais, e
estruturada em torno da construção, reflectida e enriquecida pelo conhecimento,
de uma história de vida autobiográfica intitulada portefólio reflexivo de
aprendizagem (PRA) que, no final do processo, é discutida perante um júri de
validação que inclui um avaliador externo.
Este processo que não tem uma duração fixa, outrossim depende da capacidade e
ritmo de progressão demonstrado pelo adulto desenvolve-se ao longo de uma
série de etapas, a saber: o acolhimento, o diagnóstico/triagem e o
encaminhamento (conduzidos por profissionais e técnicos superiores de RVCC);
depois, em alternativa, o adulto pode prosseguir o processo de RVCC, entrando
na fase de reconhecimento das suas competências e de aquisição da formação
complementar considerada necessária (com intervenção do profissional de RVCC e
de formadores, eventualmente externos) concluindo com a ida a júri, ou então
ser dirigido para outras ofertas educativas e formativas disponíveis para os
sujeitos maiores de 18 anos (que incluem agora uma vasta gama de
possibilidades: cursos EFA, cursos profissionais, CET, CEF, ensino recorrente,
vias alternativas de conclusão do secundário); em todos os casos, o processo
deve terminar pela certificação da qualificação obtida pelo adulto, de carácter
escolar e/ou profissional.
A Carta de Qualidade dos CNO7 foi concebida como um instrumento, essencial,
para a avaliação externa dos centros, para o seu acompanhamento e monitorização
pela ANQ, e para constituir um referencial para o financiamento público.
O controlo administrativo destes processos é assegurado pela normalização dos
formulários e outros procedimentos de candidatura, pela apresentação de
relatórios anuais e por meios informáticos, nomeadamente o Sistema de
Informação e Gestão da Oferta Educativa e Formativa (SIGO).
O financiamento e respectivo controlo financeiro seguem os procedimentos
oficialmente estabelecidos pelo estado, envolvendo a mobilização de fundos
europeus, em particular os quadros de apoio septenais extraordinários.
Um centro de dinamismo local
O estudo de caso desenvolveu-se num CNO de natureza associativa, situado numa
vila da Região Centro de Portugal, mais adossada ao litoral do que ao interior
e próxima de importantes vias de comunicação Norte-Sul.
A povoação é antiga, com profundas influências católicas e um típico padrão
económico empresarial-industrial, que já suscitou estudos académicos recentes
sobre essa específica sociocultura local, favorável ao trabalho e à
empresarialidade. Ecologicamente, encontra-se inserida num meio natural onde
predominam as formações geológicas calcárias, a montanha e as planícies
onduladas, com um clima marítimo; por virtude da acção humana, subsistem as
florestas e alguma actividade agrícola, pecuária e extractiva, um tecido
empresarial de pequenas e médias unidades industriais de mão-de-obra
intensiva,
8
uma rede já significativa de instituições educativas
9
e um povoamento disperso com bons núcleos populacionais modernizados (no
património edificado e nos equipamentos comerciais e colectivos) e algumas
pequenas cidades com vida própria.
O CNO em estudo constitui uma (e a mais recente) das valências da actividade
desenvolvida por uma associação de direito privado sem fins lucrativos a que
aqui atribuímos o nome fictício de Bagatela, fundada em 1982 com o
complemento denominativo de Associação Juvenil de Cultura e Solidariedade
Social (AJCSS), e que veio a ser reconhecida pelo Instituto Português da
Juventude como associação juvenil (em 1997), pela Direcção-Geral do Emprego e
das Relações de Trabalho como entidade formadora credenciada em 1997 e,
finalmente, como CNO pela ANQ em 2006. São estas instituições públicas que, no
essencial, através de diversos programas, constituem as fontes de financiamento
da associação. Além disto, esta tem protocolos de colaboração estabelecidos
desde há longos anos com a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia em que se
integra, com a Associação de Desenvolvimento Empresarial local, com o
Agrupamento de Escolas, a Associação dos Bombeiros Voluntários e muitas outras
entidades locais, colaborações estas que viabilizam a utilização graciosa de
instalações, a circulação de informação e outras pequenas ajudas pontuais.
As principais valências de actuação da associação são:
- o ATL (Actividades de Tempos Livres), para crianças e jovens, que funciona no
espaço e edifício próprios da associação (também sua sede social);
- a ATF (Academia de Trabalho e Formação), que promove essencialmente acções de
formação profissional, geralmente realizadas na sede e em instalações da
Associação de Desenvolvimento Empresarial da Benedita;
- e o Projecto Percursos Alternativos, integrado no Programa Escolhas 2.ª
Geração, em vigor desde 2004 e com duração prevista até 2009, que se destina
prioritariamente a crianças e jovens entre os 6 e os 18 anos oriundos de
contextos socioeconómicos desfavorecidos e problemáticos.
O programa abrange ainda, a título extraordinário, jovens com idades
compreendidas entre os 19 e os 24 anos, famílias e outros elementos da
comunidade, como professores, auxiliares educativos, etc.10 Este projecto (aqui
desenvolvido nas suas quatro medidas11) permitiu ampliar consideravelmente o
impacto local das actividades da associação, atingindo cerca de 200 adultos e
de 1300 crianças e jovens. Destes, uma centena eram casos de insucesso escolar,
60 estavam identificados na escola como casos de necessidades educativas
especiais (NEE) e 160 como tendo problemas familiares, num contexto local
considerado como marcado por situações de negligência familiar e jovens
sujeitos a ambientes de risco e comportamentos desviantes, com consumos
nefastos de álcool, tabaco e drogas ilícitas, geralmente associados a casos
de abandono e insucesso escolar.12 As principais actividades desenvolvidas
pela associação no âmbito deste projecto incluem: o Espaço Encontro,
localizado no centro da vila (em edifício público), com diversos usos e
finalidades; o Centro de Inclusão Digital (CID), com equipamento informático e
frequentado por cerca de mil pessoas/ano (e 40 formandos certificados em
diversas competências em TIC); o Jornal Jovem, de publicação trimestral; o
apoio social (a imigrantes estrangeiros); a mediação familiar e a formação
parental (apoio psicossocial a famílias em dificuldade); as oficinas do
empreendedorismo e o projecto Erva Daninha (quinta agro-bio-turístico-
ecológica, também com tarefas como a limpeza de matas, protocolizada com a
Associação de Produtores Florestais), sobretudo destinados a adolescentes; e
ainda outras, como o grupo de Hip-Hop, as sessões de cinema, as visitas e
intercâmbios, etc.
De entre as ideias de novas valências em fase de preparação ou incubação devem
citar-se a da creche (que implica obras construtivas de vulto no espaço sede da
associação, já com projecto de arquitectura aprovado) e a de uma Cooperativa de
Estudos e Intervenção em Projectos Sócio-Económicos (CEIPSO), de ciência-
intensiva, capaz de se emparceirar com entidades qualificadas (e de âmbito
nacional) de investigação e desenvolvimento.
A associação dispõe, como seu principal activo, de uma equipa técnico-
pedagógica muito qualificada, constituída por uma vintena de colaboradores,
quase todos mulheres com menos de 30 anos de idade, todas residentes na zona (e
a maior parte dela naturais) mas não necessariamente no concelho, licenciadas
em várias áreas científicas, sobretudo nos domínios da educação e das ciências
sociais e humanas. Este manancial porque se verificam também algumas saídas
é alimentado por um recrutamento selectivo num nicho social bem qualificado,
sobretudo mediante a escolha judiciosa de alguns dos estagiários (de diverso
tipo, sobretudo recém-licenciados) generosamente acolhidos pela Bagatela e
que constituem mais um volante de mão-de-obra com que a associação conta para
a execução de todos os seus projectos e actividades.
Embora a zona seja favorável à existência de um tecido associativo popular com
alguma tradição e dinamismo, a associação Bagatela constitui provavelmente o
caso mais relevante existente na freguesia (e mesmo no concelho e outras áreas
limítrofes) de iniciativa particular virada para a intervenção social, sem
intuitos lucrativos, políticos ou religiosos.
Análise dos recursos disponíveis
Já dissemos acima que estamos perante uma associação de pessoas, de direito
privado, isto é, que se baseia, à partida, no voluntariado e no contributo que
os seus membros lhe queiram prestar. No entanto, como acontece hoje num número
crescente de casos, parece tratar-se de uma associação que não precisa de
sócios;13 de facto, a angariação de novos associados não surge como uma
preocupação dos seus responsáveis (ao contrário do que é habitual no
associativismo popular), os recursos financeiros que permitem o desenvolvimento
das actividades provêm principalmente de outras fontes que não da quotização
dos membros e o funcionamento dos órgãos sociais estatutários restringir-se-á
ao cumprimento dos actos formais indispensáveis e à tomada de grandes decisões
estratégicas para a sobrevivência da associação (bem diferente das reuniões de
rotina que imperam geralmente nestas instituições).
O número de associados terá variado ao longo dos anos, cifrando-se agora em
cerca de 400, mas nas assembleias gerais é habitual comparecerem apenas 20,
embora quase todos tenham em dia o pagamento das suas quotizações
administrativas. De notar a particularidade de todos os colaboradores
remunerados das actividades da Bagatela serem convidados e aceitarem ser
membros da associação (alguns deles integrando mesmo os órgãos sociais e a
direcção), facto que, visto do exterior, poderá levantar dúvidas quanto ao grau
de sincero envolvimento ou, pelo contrário, de constrangimento ou coacção, que
levará os colaboradores (de vínculo ainda frágil, p. ex. período experimental
do contrato de trabalho) a essa adesão o que não parece ser o caso.
Também se constata que as reuniões da direcção são escassas e sem periodicidade
regular (menos de uma vez por mês), apenas quando há assuntos importantes a
decidir, e que um dos seus membros se mantém oficialmente em funções apesar de
há mais de dois anos estar profissionalmente desligado da Bagatela e a
residir a mais de cem quilómetros de distância, não podendo por isso participar
na generalidade das reuniões do órgão.
Em contraste com estes entorses ou anomalias do funcionamento formal da vida
associativa, a Bagatela revela-se e caracteriza-se por uma cultura
organizacional de grande envolvimento, participação e responsabilidade. Quem se
envolve?, quem participa? e quem assume responsabilidades? São os elementos
activos desta instituição, a saber, os colaboradores remunerados(alguns dos
quais são também titulares de cargos formais da associação), o líder/animador
desta entidade e mais alguns (poucos) voluntários benévolos.
Estas características da cultura interna da Bagatela podem ser registadas por
um observador atento e preparado, mesmo exterior à instituição. Mas são também
confirmadas pela generalidade dos colaboradores remunerados: por exemplo,
Sónia considera que o maior desafio é o grande grau de exigência, sempre a
melhorar e que é decisiva a entrega, o envolvimento; Andreia pensa que é
crucial o clima existentee que o envolvimento das pessoas é o aspecto mais
significativo e importante, e só isso permite superar as dificuldades dos
atrasos nos salários; e Leocádia acha que o amor-à-camisola e a juventude
da equipa explicam o clima de envolvimento reinantee também opina que as
reuniões de equipa são fundamentais.14 É também esta última, profissional de
RVCC, quem refere que a disponibilidade para os horários praticados (pela maior
parte dos técnicos, das 14h às 23h) é facilitada pelo facto de quase todas não
terem ainda filhos. Por outro lado, a itinerância exigida pelo acompanhamento
dos grupos de adultos fora da sede da freguesia torna quase indispensável a
posse de um automóvel: a carta de condução é uma condição para a admissão
dizem-nos.
É compreensível, nestas condições, que alguns abandonem a associação e o
projecto. Segundo o relatório de actividades da Bagatela de 2007, três dos
técnicos do RVCC do ensino básico abandonaram a equipa.15 Mas também estes
parecem levar uma marca impressiva positiva da experiência: Zico, que
coordenou o projecto Escolhas durante vários anos, afirma em entrevista
jornalística que sai porque estava também um pouco cansado das minhas funções.
Como sabes, a coordenação de um projecto destes é bastante desgastante e exige
uma motivação total, a toda a hora, concluindo que leva lembranças positivas,
muitas; e alguns cabelos brancos precoces, também.16 A própria presidente da
associação nos afirmou em tom irónico que quem não gosta ou não aguenta afasta-
se: por exemplo, os homens
Registe-se que os momentos de reunião (sentados à volta de uma mesa), discussão
e deliberação (sob a forma de uma orientação consensualizada, a ser
posteriormente operacionalizada por um grupo mais restrito ou por um
responsável) parecem ser instrumentos de trabalho colectivo fundamentais das
equipas de activos da Bagatela. Aqui se auscultam as opiniões e
sensibilidades individuais perante um problema, se sugerem e equacionam medidas
de actuação, e se decidem (ou adiam, ou delegam) grandes e pequenos assuntos.
Deste modo se compreende melhor a redução do papel da direcção associativa que
já referimos acima: as pessoas estão sempre em contacto e as decisões vão-se
construindo desse modo, num processo de informação, auscultação e
consensualização permanentes que envolve toda a equipa técnica e não apenas os
membros da direcção.
Depois, observa-se um elevado espírito de profissionalismo entre todos os
membros da equipa, o qual se manifesta através de vários sintomas: a linguagem
técnica com que discutem entre si; o à-vontade e segurança com que relatam o
desempenho das suas tarefas e equacionam os problemas surgidos; a forma como
confrontam os desempenhos dos colegas e assumem o trabalho em grupo e a
polivalência ou rotação de tarefas; aparentemente, um sentimento de realização
pessoal e um sentido de utilidade social por participarem nesta missão. De
enfatizar o facto de cada técnico ocupar geralmente mais de uma função, com
tarefas bem definidas, mas não havendo separações rígidas e definitivas entre
departamentos, antes adequadas rotações de encargos e conjugação de esforços em
task-groups temporários. Por fim, pela maneira como todos, e cada um, se
empenham na compreensão e interiorização das normas e procedimentos adoptados
pela ANQ e pela maneira regular e inteligente como apresentam as candidaturas e
aproveitam as oportunidades de utilização máxima de recursos públicos
disponíveis, pode dizer-se que também faz parte desta cultura organizacional a
aquisição da melhor competência de expertise, com intuitos de utilidade geral.
Acresce o papel fundamental (e insubstituível, nesta dinâmica) do líder/
animador do grupo, ou melhor, da líder, a que atribuímos o nome fictício de
Isolda. Todos os sinais apontam com evidência o seu tipo de liderança forte,
embora de estilo participativo: nas reuniões, suscita questões, sintetiza os
termos fragmentados de um debate, sugere linhas de saída para um impasse, tira
conclusões de maneira prática e objectiva; nas conversações directas, pode ser
frontal, persuasora, negociadora ou calorosa, sempre inteligente. Fundadora da
Bagatela e dirigente formal de várias das suas estruturas funcionais, também
prestigiada por um elevado título académico, Isolda cumpre essencialmente um
papel de animadora do grupo, de estimulação crítica das iniciativas e de
rosto ou porta-voz da associação para a comunidade envolvente.
Estes são os activos principais e os trunfos do CNO em análise. Mas devem
referir-se também outros recursos, importantes ou complementares: o património
imobiliário e o conjunto de equipamentos tecnológicos possuídos; o
reconhecimento angariado ao longo de já bastantes anos junto dos responsáveis
públicos e privados de entidades sediadas na região; a confiança institucional
dos entes estatais que superintendem nas suas áreas de actuação; os recursos
financeiros prodigalizados pelos fundos públicos mediante processos de
concursos e candidaturas burocráticas; e até o estímulo constituído pelos
problemas sociais existentes na comunidade de proximidade, nomeadamente no seio
das populações infantis e juvenis, dos desempregados e mal-inseridos e dos
cidadãos activos portadores de baixas qualificações escolares e profissionais.
A conjugação destes diversos factores traduz-sein finenum caso (quiçá pouco
frequente, ou mesmo de alguma singularidade) de uma organização muito flexível,
com grande homogeneidade, profissionalidade e forte envolvimento dos seus
membros activos, e uma liderança pessoal estimulante e indutora de atitudes
participativas e auto-responsabilizadoras. Isto aproxima-se do modelo que
Mintzberg designa por adhocracia, com uma coordenação por ajustamento mútuo
17
porém, mais estranho no que toca à sua forma de liderança.
Alguns constrangimentos e fragilidades
Segundo Isolda, a animadora da associação, a sociocultura local é bastante
apelativa para os valores do trabalho e do empreendedorismo. Contudo, também
ela nos fez entrever, em diversas oportunidades e circunstâncias, os
compromissos, as negociações e pequenas cedências que igualmente era obrigada a
fazer com o meio local para levar avante os seus projectos. O gosto pelo poder
e as lógicas partidárias dos políticos, os bairrismos e querelas paroquiais,
os prazeres experimentados pelo acesso a bens caros e pelo reconhecimento de
maiores eis alguns traços do tecido social local com os quais uma entidade
como a Bagatela (para mais com o título que ostenta) tem de saber conviver
para não se marginalizar e deixar fechar num gueto. Deste modo, a associação (e
Isolda, com quem, para o exterior, frequentemente é confundida) pôde ir
sobrevivendo e, ao longo dos anos, conquistando respeito e admiração, mesmo por
parte daqueles que a acham excêntrica.
Da análise e da reflexão por nós intentada acabou por sobressair a ideia de que
alguns dos trunfos e das peculiaridades mais interessantes do caso Bagatela
trazem associadas outras tantas fragilidades que pairam sobre o futuro da
instituição. Com efeito, foram três as fraquezas que principalmente
identificámos:
- o tipo de liderança, que não é intercambiável e, se consegue adesões
fortíssimas e sinceras, também é susceptível de gerar resistências
pessoalizadas (por sentimentos de inveja, suspeições de nepotismo, etc.);
- o eventual esgotamento ou dificuldade de preservação do espírito da equipa
técnica actual referimo-nos à sua forte mobilização e envolvimento,
permitidos também pelas características de baixa idade, fase primária da
carreira profissional e poucos encargos familiares, que tem ido ao ponto de
aceitar conscientemente atrasos no pagamento de salários , a partir da gradual
mas inexorável modificação daquelas condições sociográficas;
- e a dependência quase total em que a associação se encontra dos
financiamentos públicos directos, provenientes dos programas de apoio à
juventude e de qualificação dos portugueses, na previsão de que eles possam ter
uma forte redução no futuro, sobretudo a partir do fim do actual QREN, em 2013.
Porém, é possível também formular três correspondentes linhas de orientação
para mitigar estas fragilidades. Ei-las:
- em primeiro lugar, será avisado que a Bagatela vá preparando (para o médio/
longo prazo) uma solução alternativa de modelo de liderança, já que, se é
verdade que não se trata de um problema para amanhã, também não é pensável a
simples substituição de uma pessoa por outra, pois o papel construído pela
actual líder é inseparável dela própria, e com qualquer outro na liderança
imediatamente será afectada a cultura desta organização;
- para a segunda questão, sugere-se a procura de um melhor equilíbrio no seio
da equipa técnica, diversificando o perfil sociográfico dos futuros recrutados,
em termos de idade (e, por arrastamento, situação familiar);
- finalmente, é conveniente que a associações procure fontes de receita
alternativas, aumentando os recursos próprios obtidos no mercado ou por via de
emparceiramento com entidades de investigação e desenvolvimento (I&D),
porfiando para a venda de serviços, técnica e cientificamente qualificados, com
base na qualificação pessoal de alguns dos seus colaboradores, e talvez
potenciada com o lançamento da já referida cooperativa CEPSI de estudos e
projectos.
Já depois de produzida a análise supra, tomámos conhecimento dos resultados de
um diagnóstico de avaliação SWOT18 realizado colectivamente pelos membros da
equipa técnica da Bagatela, sob a forma de uma discussão brainstorming, no
âmbito de uma sessão de formação conduzida por especialistas da ANQ.19
Curiosamente, no capítulo da organização,20 as conclusões a que chegaram
encontram-se praticamente todas referenciadas, explícita ou implicitamente, nos
desenvolvimentos anteriores. Eis um bom indício de que estas nossas observações
serão perfeitamente entendidas por estes actores principais da organização, que
delas poderão apropriar-se para melhorarem ainda mais os seus desempenhos
individuais e colectivos.
As práticas e as representações sobre o RVCC e as Novas Oportunidades
As percepções dos adultos beneficiários
De acordo com os dados registados no relatório elaborado pela Bagatela
relativo ao ano de 2007, a população de adultos inscritos nas NO para o nível
básico atingiu 607 pessoas, e para o nível secundário 723 pessoas, sempre com
uma pequena maioria de mulheres (a rondar os 58%). Já quanto à idade se notam
acentuadas diferenças entre os dois grupos, pois no básico a média andará pelos
40 anos e no secundário pelos 30, sendo sempre residuais (5 a 10%) as pessoas
com mais de 50 anos de idade.
O mesmo relatório apresenta os resultados de um inquérito feito pela Bagatela
de avaliação do processo de RVCC de nível básico e respondido pelos adultos que
o concluíram com sucesso, e de um outro inquérito à mesma população realizado
seis meses depois. Os resultados da aplicação do primeiro destes instrumentos
(com 195 respondentes) dão-nos a indicação geral de um franco agrado com a
experiência acabada de viver. Juntando as categorias classificativas de Bom e
Muito bom,21 obtemos o score de 92%22 para a avaliação do processo em geral;
97% para as informações prestadas pela equipa; 100% para o relacionamento com
(o)a profissional de RVCC; 97% para as actividades realizadas durante o
processo de reconhecimento; e 99% para a forma como decorreu a sessão de júri
de validação.
As avaliações feitas a três aspectos do processo instrumentos utilizados,
relacionamento com o(a) formador(a) e duração da formação complementar em
cada uma das quatro áreas de competências-chave em que está estruturado o
programa pedagógico mostram já algumas variações entre elas e alguns indícios
de maiores dificuldades ou insatisfações. O quadro 1 apresenta os valores
apurados. A dúvida objectiva deixada pelos números menos favoráveis acerca da
duração das formações complementares deve ser interpretada à luz das nossas
inquirições individuais a formadores e formandos como de constatação de uma
insuficiência do tempo dedicado a estas formações, para colmatar os défices de
conhecimento que os próprios adultos reconhecem ter. De resto, correspondendo a
esta apreciação, o número de horas de formação complementar foi já duplicado
desde então, cifrando-se agora em 50 horas. De igual modo, a equipa foi levada
a estudar e adoptar novos instrumentos pedagógicos, para os adaptar melhor às
carências e às características do público-alvo.
Quadro 1
Avaliação do RVCC pelos adultos — 2007 (% de respostas Bom + Muito bom)
Quanto aos resultados apurados pelo segundo inquérito por questionário aplicado
a uma amostra da mesma população (agora já só com 56 respondentes) seis meses
depois do primeiro, as conclusões são menos nítidas e não tão entusiásticas.
Dos dados disponíveis, pode-se perceber que estes sujeitos que obtiveram a
certificação escolar do 9.º ano consideram que a sua valorização foi sobretudo
de ordem pessoal, com algum incentivo para o prosseguimento de estudos (para
obter a certificação do 12.º ano, imagina-se) e algo menos em termos
profissionais (ainda que sempre do lado da positividade), como mostra o quadro
2.
Quadro 2
Avaliação do RVCC pelos adultos, seis meses depois — 2007 (% horizontais)
A resposta a um outro quesito acerca da importância de apostar na sua
formação (com 57% a considerarem que é muitíssimo importante) é menos
significativa do que a percentagem de 25% dos respondentes que indicam que a
sua primeira opção de futuras formações iria para assistente de acção
educativa (fragmentam-se as restantes respostas por grande número de outras
alternativas). Por outro lado, 11% dos que definiram eles próprios uma outra
formação escolheram a da hotelaria. Sabendo que as ocupações presentes dos
inquiridos mais referenciadas eram as de empregado(a) fabril (18%),
vendedor/comerciante, hotelaria e auxiliar de acção educativa (com 7% de
casos, cada), estas respostas revelam uma racionalidade, um realismo prático e
uma consistência muito assinaláveis.
Vale a pena ainda reter que 23% destes adultos tinham já frequentado alguma
acção de formação depois do RVCC, mas apenas 7,1% tinham arranjado um emprego e
1, 8% tinham mudado de emprego, tantos como aqueles que tinham entretanto
perdido o seu emprego.
Usando agora os dados qualitativos recolhidos aquando das nossas entrevistas a
adultos, complementados com outras fontes,23 podemos expor o seguinte leque de
motivações principais para a inscrição no processo de RVCC e prosseguimento da
frequência do mesmo:
- gosto pessoal de aprender e progredir, e ver reconhecidos esses progressos;
- aprender de maneira diferente sem voltar a repetir a escola;
- maior rapidez na obtenção do diploma escolar do que na escola normal, mas
também em outros CNO (que não na Bagatela);
- flexibilidade e ajustamento pessoal do processo;
- oportunidade de conhecer outras pessoas com percursos e motivações
semelhantes;
- conhecer pessoas que já fizeram (ou estão a fazer) o RVCC e ter boas
referências do mesmo (feito na Bagatela);
- o apoio de familiares (filhos, em particular) na execução dos trabalhos do
RVCC;
- ter novas oportunidades no mercado de trabalho;
- obter um diploma escolar que lhe é legalmente indispensável para uma
actividade profissional já exercida ou projectada.24
Como se percebe, parece haver aqui quatro tipos de factores decisivos: a)
satisfação intrínseca de realizar novas aprendizagens, como adulto; b)
vantagens instrumentais, para consolidação ou melhoria da situação
profissional; c) novas experiências de sociabilidade; d) condições favoráveis
para a realização deste projecto.
Em segundo lugar, exibimos os principais aspectos de avaliação positiva do
processo, no que toca ao método pedagógico, de acordo com as opiniões
expressas pelos adultos:
- o método da história de vida é interessante, motiva e revigora os adultos;
- a ida a júri é assumida como um verdadeiro teste;
- a individualização da progressão é uma característica importante;
- a rapidez na obtenção de um diploma escolar (em relação à escola normal)
também conta;
- facilita a compreensão mútua o facto de os técnicos e formadores serem quase
sempre mulheres (sendo mulheres também a maioria dos adultos e dos nossos
entrevistados).
Finalmente, identificámos na opinião dos entrevistados osaspectos de
avaliação negativado método pedagógico (sendo que, em sentido geral, todo o
processo é visto de forma claramente positiva):
- o método da história de vida acrescenta pouco aos saberes existentes; seria
preferível terem aulas, ensino e testes tradicionais;
- os trabalhos feitos em casa prestam-se a fraudes;
- há épocas do ano (geralmente no Verão) em que o processo do RVCC se torna
mais difícil de prosseguir, devido a um maior empenho dos adultos na sua
actividade profissional.
As opiniões dos colaboradores
Depois dos adultos envolvidos no processo, vamos agora virar a nossa atenção
para os colaboradores remunerados da associação, que desempenham as várias
funções técnicas da equipa de RVCC. Analisamos sucessivamente a organização
institucionalizada do processo (dirigido pela ANQ), as condições oferecidas
pela Bagatela, os méritos do processo RVCC, as vantagens e os pontos
negativos do método pedagógico e, finalmente, algumas sugestões de melhoria.
As fontes de informação aqui utilizadas foram as entrevistas que realizámos com
alguns destes actores e também as notas tomadas nas reuniões de coordenação da
equipa a que fomos assistindo ao longo de cerca de um semestre.
No que toca à organização institucionalizada do processo, é a coordenadora
Sónia quem nos assinala as seguintes apreciações:
- Em geral, as normas e instruções dimanadas da ANQ são de boa qualidade e têm
sido assimiladas pela equipa. A ANQ funciona bem, acompanhando de perto os CNO
e esclarecendo as suas dúvidas (por telefone e e-mail). Contudo, o SIGO tem
tido problemas técnicos (bloqueios, etc.) e as transferências de dinheiros
estão com atraso de vários meses, o que se reflecte no pagamento dos salários e
obriga a Bagatela a uma complicada ginástica financeira.
- Por outro lado, as alterações que, com alguma frequência, têm sido
introduzidas causam sempre dificuldades e constituem talvez os principais
obstáculos que têm de ser superados pela Bagatela. A principal alteração
recente foi a nova ênfase posta na valência de diagnóstico-encaminhamento
(apenas a parte RVC), que parece tender a superar o próprio processo RVCC,
orientando desde logo os adultos para os cursos EFA, com dupla certificação,
escolar (9.º ou 12.º anos) e profissional (níveis II ou III), realizados pelo
próprio (alguns) ou numa rede de instituições certificadas para o efeito. Esta
alteração trouxe também a nova figura dos técnicos superiores de RVCC, que se
ocupa da referida valência e se acrescenta às figuras já existentes do
coordenador (do CNO), dos profissionais de RVCC (vulgo técnicos) e dos
formadores de RVCC, que constituem, no conjunto, a chamada equipa técnica.
A segunda importante mudança foi a entrada em vigor do RVCC do secundário,
que arrancou efectivamente em Janeiro de 2008, ainda não certificou ninguém e
está numa fase de algum tacteamento e experimentação, com alguns adultos com
processo já concluído e que estão a aguardar júri.
- O âmbito territorial de acção de cada CNO é a NUT III em que está inserido.
Dentro desta, pode haver concorrência entre vários CNO; a ANQ procura ter uma
cobertura equilibrada de todo o território nacional em termos de CNO, sem
agudização da concorrência entre eles, mas como a iniciativa é dos próprios CNO
que se candidatam a sê-lo, isso pode sempre acontecer. Por exemplo, na zona da
Bagatela há outros CNO em concelhos vizinhos, a menos de 30 km ao redor, e o
próprio concelho tem mais dois.
Quanto às condições oferecidas pelo CNO em análise, segundo a mesma
entrevistada e também Isolda, a grande animadora da associação, esta
apresenta algumas peculiaridades (além das já descritas anteriormente), tais
como:
- os vínculos laborais dos colaboradores são sempre estabelecidos com a
Bagatela e consistem em contratos de trabalho sem termo certo, mas são sempre
explicadas as normas da casa, incluindo a hipótese de atrasos nos salários, a
flexibilidade de horários, a não existência de separações estanques entre as
diversas valências, a rotação de encargos, etc.;
- a captação dos públicos adultos privilegia dois métodos: os contactos
colectivos locais, nos lugares e aldeias da zona (sobretudo com associações;
mais raramente autarquias, paróquias ou empresas) e o método do passa-
palavra;
- as salas onde se realizam as sessões (geralmente cedidas por entidades que
estabeleceram protocolos com o CNO) têm geralmente condições mínimas, mas estas
são suficientes; os equipamentos também satisfazem, embora por vezes falte um
simples quadro preto, haja escassez de escritórios para o trabalho dos
técnicos e atendimentos individualizados dos adultos, e alguns formadores
registem a falta de certos dispositivos pedagógicos específicos.
Passando agora à avaliação dos processos de RVCC, citamos algumas das
principais vantagens que os técnicos da equipa da Bagatela encontram na sua
aplicação:
- o processo é especialmente adequado às populações-alvo e às suas condições de
vida;
- o processo é exigente e, ao contrário do que alguns afirmam, não é verdade
que seja facilitista;
- são muito importantes as sessões de reconhecimento das competências, cujos
instrumentos técnicos deverão ser ainda aperfeiçoados, no sentido da exigência;
- é patente a evolução pessoal dos adultos ao longo do tempo do processo e, por
outro lado, os adultos que já fizeram o RVCC do básico distinguem-se dos
restantes quando fazem o secundário;
- os objectivos das competências-base exigidas são atingíveis e eficazes, por
exemplo, na área de comunicação e linguagem (do básico) os adultos têm que ler
um livro e artigos de jornais e são-lhes prescritas tarefas como a de redigir
textos, exprimir-se oralmente, etc.; nota-se perfeitamente, quando há casos de
fraude, tais como ajudas de familiares na escrita feita em casa.
Mais especificamente sobre o método pedagógico prescrito e a importância de
este ser estruturado com referência à história de vida dos sujeitos, as
opiniões dos técnicos e formadores vão no sentido da sua validação: o método é
bom (Sónia); é um instrumento importante (Zulmira); o mais difícil é
pôr as pessoas a reflectir, a criticar, a escrever (Sónia); permite
detectar lacunas importantes na ortografia, pontuação, estruturação de um
texto (Leocádia); é um instrumento fundamental, tanto para o próprio, como
para o formador e o técnico, pelas indicações que lhes fornece (Andreia); é
um instrumento muito positivo e de grandes potencialidades: fornece auto-
estima, e faz o formador aprender (Leocádia). Permitimo-nos, pelo nosso
lado, chamar a atenção para a vantagem final apontada por estes dois últimos
testemunhos: o método é importante para o técnico/formador conhecer melhor o
adulto e orientar a sua intervenção. É, sem dúvida, uma qualidade importante,
mas que não responde à questão de saber se será o método mais adequado para a
formação do adulto.
Vejamos agora os aspectos negativos que, na opinião dos técnicos da Bagatela,
afectam o rendimento do processo de RVCC:
- Há uma certa imagem pública de facilitismo neste sistema de formação de
adultos que, embora não correspondendo à verdade pelo menos neste CNO ,
afecta sempre as atitudes das pessoas, dos adultos candidatos ou envolvidos,
dos empregadores, etc. Sandra e Zulmira, por exemplo, enfatizam este
fenómeno. E Andreia considera mesmo que o diploma RVCC é menosprezado pela
sociedade em geral.
- Por outro lado, os técnicos conhecem bem algumas atitudes negativas que se
encontram no seio das populações que frequentam o RVCC. Entre elas, a daqueles
que acham que não precisam de formação e julgam que só lá vão buscar o
papel' e alguns mesmo ameaçam mudar para um outro centro, onde as coisas são
mais fáceis (Leocádia); as diferenças de expectativas entre adultos
empregados e os desempregados (entre estes, alguns até escondem as suas reais
competências para não perderam os subsídios que recebem pelas formações que vão
frequentando e alguns até ganham mais com esses subsídios do que estando
empregados )(Andreia); há comportamentos de machismo e atitudes
sobranceiras em alguns adultos (Isolda); verificam-se ausências, abandonos
ou desistências sem que os próprios forneçam qualquer aviso ou explicação;
outros tentam transferência de centro, por uma ou outra razão e explorando
eventuais concorrências ou rivalidades entre CNO vizinhos; há adultos que vêm
com a ideia fixa de fazer a escolaridade em três meses (vários testemunhos,
inclusive dos próprios); muitos atribuem um estatuto menor aos técnicos e
formadores de RVCC, não os equiparando aos professores do ensino regular e
julgando-os subqualificados em relação a estes; e, finalmente, segundo o juízo
de Sónia para explicar certos comportamentos minoritários indesejáveis, há
sempre pessoas inadaptadas.
- Quanto às necessidades de formação reveladas pelos adultos e aos meios
utilizados para lhes responder, Zulmira, por exemplo, considera que existem
lacunas na formação científica de base que é preciso colmatar, com pedagogias
adequadas e que 50 horas de formação são ainda insuficientes, nomeadamente
para a língua estrangeira; Leocádia e outras confirmam a necessidade de mais
horas de formação, sendo difícil organizar grupos homogéneos (de 15 pessoas)
para estes efeitos; e Sónia, como coordenadora do CNO, considera ter falta de
respostas para as formações externas, havendo por outro lado alguma caça aos
públicos de formandos por empresas de formação da região. Este facto parece
estar a agravar-se com o surgimento de maior número de adultos jovens que
buscam uma forma de conclusão dos estudos secundários.
- As sessões de júri também deixam insatisfeitos alguns formadores, nuns casos
porque acham que deviam ser mais exigentes (Leocádia); noutros casos,
observados em CNO vizinhos, porque se percebe que os jurados nem sempre leram
devidamente os dossiês em discussão (Zulmira).
- Finalmente, a pressão institucional (externa, mas assumida também pela
liderança da Bagatela) para o cumprimento de metas pode ter por efeito
indesejável um abaixamento da qualidade de exigência dos processos de RVCC.
Sónia, a coordenadora, é particularmente sensível a este perigo, mas o tema é
verbalizado nas reuniões da equipa. De facto, embora em 2007 tivessem sido
atingidas praticamente todas as metas contratualizadas entre a Bagatela e a
ANQ,25 para 2008 estava a registar-se algum atraso ao nível do secundário e
realçava-se a importância de efectivar júris de certificação nos próximos
meses.
Na sequência destas avaliações, algumas recomendações ou propostas de alteração
surgem da parte de elementos da equipa técnica. Todos subscrevem a conveniência
de formações complementares mais longas ou intensas. Mas, mais agudamente,
Andreia preconiza queo modelo do certificado devia ser igual ao dado na
escola, para não ser menosprezado pela sociedade. E no exercício colectivo de
avaliação SWOT (capítulo 2, processos de RVCC) que já referenciámos,26 existem
algumas outras sugestões, é certo que genéricas e mais implícitas do que
explícitas, entre as quais podemos referir o envolvimento e mobilização das
populações e das diferentes entidades locais, a promoção do empreendedorismo,
uma maior oferta no terreno de cursos EFA, a melhoria (quantitativa) de
equipamentos ou as vantagens do amadurecimento etário da equipa técnica.
As concepções: ensaio de conclusão
Orientações e mobilização geral de vontades e interesses
Tal como foi concebido e tem vindo a ser implementado, o dispositivo de RVCC e
as NO configuram, a nosso ver, um sistema social bastante aberto, com uma
pluralidade de actores, interesses e lógicas, e resultados finais (em termos de
balanço input/output) incertos e ainda indeterminados.
Com efeito, pode considerar-se positivo e encorajador o esforço (orçamental e
de ajustamento administrativo) desenvolvido pelo estado para fazer conjugar
numa mesma dinâmica os intentos (antigos) de educação de adultos (justificados
pelo elevado grau de iliteracia da população), melhorar o aproveitamento dos
recursos despendidos na formação profissional dos activos (que diversas fontes
apontam como tendo sido muito desperdiçados, desde a nossa entrada na CEE) e
ajudar a tornar mais eficiente o desempenho do sistema de ensino regular (em
particular no seu segmento secundário, conferindo-lhe melhores potencialidades
para a inserção dos jovens na vida activa) tudo isto devendo traduzir-se numa
elevação do nível de qualificação dos portugueses, de molde a permitir a
sustentação de outras ambições na competição económica internacional. Esta
dimensão da acção política governamental, apesar de dispor de condições gerais
favoráveis (maioria absoluta no parlamento, horizonte de estabilidade
governativa a quatro anos, equipa ministerial coesa e ainda recursos
financeiros externos extraordinários, de baixo custo), não deixa de enfrentar
obstáculos e adversidades: acções de oposição partidária e de resistências
sociais; adesões mais ou menos mitigadas das autarquias locais; deficiências no
funcionamento da máquina administrativa pública para pôr as políticas no
terreno; limitações orçamentais; e a prova de fogo da bondade das próprias
concepções e políticas decididas no topo.
Devido à natureza de parceria público-privada da iniciativa NO, a execução
dos processos de RVCC compete à (e depende fundamentalmente da) tal rede
diversificada de instituições disseminadas pelo território que adquirem a
certificação de Centros NO. Ora, se esta diversidade de parceiros (privados,
públicos, associativos, empresariais, etc.) constitui uma aposta muito
interessante no envolvimento da sociedade civil e de algumas elites locais/
territoriais, ela está longe de poder evitar contradições e deturpações dos
objectivos maiores do programa ou de prevenir contra o surgimento de efeitos
perversos. É certo que o estado fixa as regras do jogo, controla o
financiamento e deve inspeccionar a qualidade das execuções, na base do
sistema. Mas pode ser incapaz de impedir aproveitamentos ilícitos ou de
detectar disfuncionamentos que ocorram ao nível dos CNO e das populações de
adultos envolvidas. Ou então, pelo contrário, agir de tal forma inepta que os
centros (privados) se sintam abusados ou violados na sua independência e passem
de uma atitude de colaboração para uma outra, de aproveitamento de
oportunidades, enquanto possível Tudo aqui parece jogar-se na inteligência e
na sageza do equilíbrio conseguido entre autonomia/responsabilidade (dos CNO) e
centralização/eficiência (da administração pública), e na preservação desse
equilíbrio face ao decorrer do tempo, à evolução (inevitável) do sistema e às
estratégias dos outros actores participantes.
Um outro tipo de actor central neste processo é constituído pelos profissionais
e formadores que formam as equipas técnico-pedagógicas dos CNO. Trata-se de uma
nova profissionalidade, desenhada e alimentada em doses reforçadas por este
programa público, sem contudo se perfilar como mais uma categoria aspirando a
integrar-se no funcionalismo do estado. Tal como os observados por nós no caso
da Bagatela, acreditamos tratar-se, na sua generalidade, de um segmento de
técnicos superiores bem qualificados, jovens e muito empenhados na suas funções
e actividades, embora também admitamos poder existir, em paralelo, todo um
outro conjunto de situações, em especial em escolas, centros de formação,
empresas e autarquias, onde o perfil destes técnicos e formadores de RVCC seja
bem diferente, e a actividade seja assumida de forma quase supletiva ou
temporária, em relação a desempenhos profissionais anteriores e prevalecentes.
É, porém, sobre os primeiros que queremos debruçar-nos, destacando a inovação
profissionalque eles estarão progressivamente configurando (ao desempenharem as
suas funções com interesse e proficiência), mas também chamando a atenção para
a frustração de expectativas que poderá advir de uma menor atenção prestada
pelos responsáveis quanto às condições laborais actuais (remuneração, etc.) e
ao seu futuro profissional, com previsíveis efeitos de turn-over e menor
investimento pessoal nos desempenhos o que teria certamente as piores
consequências para os objectivos sociais do programa.
E temos, finalmente, as populações-alvo, que constituem o destinatário final de
todo este investimento, mas igualmente são um actor do sistema, embora não
orgânico e disperso por milhares de comportamentos e discursos individuais,
todavia inteligíveis, nas suas grandes linhas, através dos procedimentos
adequados de pesquisa social. A resposta destas populações aos convites do
programa NO e à informação publicitária que tem sido divulgada parece ser
globalmente encorajadora. No entanto, na falta de conhecimento rigoroso sobre
os volumes, as motivações e os comportamentos desta procura, não deixamos de
chamar a atenção para a especificidade de grupos sociais com necessidades bem
diferenciadas e que por isso devem ser atendidas de maneira diferente: os
jovens adultos que não se destinam a estudos superiores mas devem ser
qualificados profissionalmente; os jovens adultos que falharam o sistema de
ensino mas, mesmo assim, precisam de ser encaminhados para uma actividade útil
e sustentável; os activos empregados carentes de melhor qualificação; os
desempregados e activos ameaçados de desemprego, que precisam de se
reconverter; os não-activos(as) desejosos(as) de uma inserção tardia; etc.
Aqui, no quadro económico e social existente, deverão ser decisivas as
condições da oferta (formativa, qualificativa e requalificativa),
nomeadamente: diversidade de possibilidades oferecidas; condições legais de
contratualização entre o estado e o interessado; subsidiação (ou não) dos
sujeitos; contemplação das suas trajectórias pessoais, escolares e
profissionais; grau de empregabilidade, sustentabilidade e autonomia dos perfis
profissionais e das qualificações adquiridas no final do percurso proposto.
Estas são, em síntese, as principais variáveis que provavelmente estarão
presentes neste jogo aberto entre grandes actores sociais, posto em movimento a
propósito do programa NO.
O que se quer reconhecer, validar e certificar? E para quê (com que efeitos)?
Os objectivos do processo de RVCC pareciam suficientemente claros: reconhecer,
validar e certificar (como equivalentes aos graus e diplomas do ensino geral)
os saberes e capacidades adquiridos ao longo da vida activa pelos cidadãos, nas
diversas vertentes da sua vida social.
Contudo, a iniciativa NO alargou estes objectivos, integrando neles toda a
educação e formação de adultos e indo ainda mais além porém, de uma forma
que não prima pela clareza. Por um lado, encontra-se agora na sua documentação
referência a um RVCC profissional, paralelo ao RVCC escolar.27 Por outro
lado, começa a falar-se mais seriamente na dupla certificação (entenda-se,
escolar e profissional).28 Por último, num documento de 2008 de
responsabilidade governamental,29 depois de uma primeira parte intitulada I
Uma nova oportunidade para os adultos, surge uma segunda designada por II
Uma oportunidade nova para os jovens, sendo que aqui se está falando, não em
de sujeitos com mais de 18 anos de idade (ou seja, jovens adultos), mas
realmente de classes etárias com menos de 18 anos que parece terem agora mais
esta possibilidade (em NO) de obter uma certificação escolar equivalente ao
12.º ano.
Nestas circunstâncias, é legítimo questionarmo-nos sobre se não estaremos a
criar uma nova passerelle que permitirá o acesso a um diploma formal (o do
ensino secundário), e eventualmente à universidade, de uma forma menos exigente
do que o ensino formal,30 desencorajando este (e fazendo baixar o seu nível de
qualidade médio), e inexistindo o pressuposto fundamental do RVCC de que se
trata de reconhecer as competências adquiridas ao longo da experiência de vida
activa do cidadão, que, neste caso, ainda não ocorreu.
É certo que estes processos são complexos e só podem ser tratados pelos
especialistas de forma complexa; mas, para serem eficazes, têm de surgir no
espaço público devidamente traduzidos (por técnicos capazes) para uma versão
simples e acessível ao maior número. Geralmente, a complexidade não-traduzida
que chega directamente aos destinatários finais é recebida por estes como
confusão. E, em casos deste tipo, a inteligência dos sujeitos comuns será
tentada a explorar estrategicamente os caminhos de-mais-baixo-custo para aceder
aos bens (imateriais) que almejam possuir; provavelmente, com ganhos racionais
para os próprios, no curto prazo, mas mais falíveis no médio/longo prazo; e
certamente com perdas e desperdícios para o conjunto da colectividade que,
justamente, se queria promover.
Nestas circunstâncias, julgamos importante sublinhar aqui dois pontos
concretos:
- apesar da sua ligação sistémica (e problemática), parece-nos que os
dispositivos operacionais deveriam separar mais claramente os programas de
educação de adultos (de um lado) dos programas do ensino geral, incluindo o
nível secundário (de outra banda), a despeito de estes últimos deverem
continuar a evoluir para modalidades que contemplem de uma forma mais evidente
a formação de cunho profissional;
- os processos de RVCC deveriam avançar a um ritmo rápido no sentido
ultimamente apontado pelas NO, isto é, para uma muito mais estreita ligação
entre a certificação escolar e a certificação profissional (a tal dupla
certificação), e para um maior papel da formação profissional (cursos EFA,
etc.) para requalificar e fazer elevar o nível de qualificação dos sujeitos
activos.
Nas condições actuais, permanece duvidoso o resultado do balanço que num
momento posterior se venha a apurar entre o esforço consentido pela
colectividade nacional (e as expectativas postas neste sistema por tantos
agentes sociais), e os seus reais efeitos sentidos na economia e na sociedade
(e mediatamente percebidos pelas pessoas), nos seus cotejos internos e
internacionais.
O método
Não está aqui em causa discutir o modelo pedagógico e o método de aprendizagem
que suportam os processos de RVCC31 e as NO. Por isso e tendo sempre presente
as constatações dos investigadores acerca dos factores condicionantes das
trajectórias biográficas dos sujeitos32 , nos limitamos a indicar
sinteticamente alguns pontos que nos surgiram como cruciais ou problemáticos,
ao longo do exercício de observação e da análise a que procedemos num CNO
particular:
- A estratégia de aprendizagem proposta aos adultos a partir do eixo da sua
própria biografia, com base nas áreas de competências-chave e na exploração de
temas de vida tão evidenciada na bibliografia especializada surgida em anos
recentes , parece ter potencialidades efectivas, mas é também muitíssimo
exigente para os técnicos e formadores, e pode prestar-se a aplicações
deturpadoras dos seus melhores sentidos.
- A formação complementar nos processos RVCC ganhará porventura em ser mais
desenvolvida e eventualmente combinada com módulos temáticos e técnicas
pedagógicas em uso no ensino regular. Referimo-nos não apenas às áreas das
matemáticas e da língua portuguesa (aqui acrescentadas com a informática,
indispensável), mas também à segunda língua, a uma base mínima de
conhecimento das ciências naturais, à geografia e à história, que poderão
constituir lacunas maiores da formação humanista destes adultos, não
preenchidas pelos actuais conteúdos curriculares das áreas da cidadania
(todavia importantes e significativos), e talvez não suficientemente cobertas
pelas formações modulares.
- O papel da sessão de júri e, mais em particular, do avaliador externo no
processo de validação e certificação de competências parece dever ser objecto
de um escrutínio avaliativo muito detalhado, para concluir fundamentadamente
acerca da sua eficiência no processo, procedendo depois às correcções julgadas
necessárias.
- Finamente, tal como tem sido apontado por alguns especialistas, a
organização e funcionamento da equipa pedagógica [é] um factor decisivo para a
concretização do modelo curricular.33 Desta avaliação deveriam, pois, ser
tiradas todas as consequências operativas relevantes, no que toca ao seu
estatuto, enquadramento, formação, etc.
Tópicos conclusivos
A primeira recapitulação conclusiva que aqui devemos fazer é a da elevada
qualidade do desempenho do CNO analisado, ou mesmo da sua excepcionalidade.
Pela própria natureza deste estudo, não é possível afirmar que idêntica
qualidade (ou até superior) não exista em muitos outros CNO, mas vários sinais
sugerem que este seja um caso de primeira linha. De todo o modo, deixámos atrás
algumas pistas analíticas sobre os seus pontos de fraqueza e sobre o modo de
lhes responder com suficiente antecipação e eficácia.
Em segundo lugar, parece-nos que o sucesso do modelo pedagógico aplicado
depende em muito (quiçá demasiadamente) da qualidade das instituições locais
que o aplicam. Neste sentido, as instâncias nacionais envolvidas (ANQ e
departamentos ministeriais) deveriam empenhar grande atenção e recursos no
acolhimento e certificação, seguimento, apoio, controlo e avaliação do trabalho
desenvolvido pelos CNO, bem como na formação das suas equipas técnicas, sem
hesitações nem complacências sempre que se verifiquem quebras ou baixas de
qualidade.
Terceiro: a organização do dispositivo e a eficiência do método de aprendizagem
devem ser sujeitas oportunamente a uma rigorosa e criteriosa revisão crítica,
em todos os seus segmentos e factores condicionantes. Não com o intuito de os
invalidar globalmente e substituir por outros, alternativos, mas para
eventualmente reformar algumas das suas componentes e readequar os
procedimentos julgados menos satisfatórios.
Finalmente, parece ser desejável que o empenho político posto no programa de
melhoria da qualificação escolar e profissional dos portugueses seja
prosseguido e não desmantelado ou deturpado ao sabor das conjunturas e dos
protagonistas políticos do momento, a despeito da permanente necessidade de o
ajustar às condições presentes e melhorar sempre que possível.