Editorial
Editorial
Teresa Pinto
O vigésimo número da ex æquo confere destaque a uma problemática ainda pouco
trabalhada e divulgada no nosso país, apesar de se ter tornado já um assunto
incontornável nos debates teóricos sobre o género a nível internacional. Foi
com agrado que acolhemos a proposta de tema «Fazer o Género: performatividade e
abordagens queer», considerando-o como mais um contributo para a prossecução do
propósito de diversificar as temáticas abordadas na revista, de introduzir
novas investigações, de promover a polémica e de alargar o diálogo intelectual
entre a produção nacional e internacional. O Dossier, coordenado por Conceição
Nogueira e João Manuel de Oliveira, visa estimular, no contexto português, o
aprofundamento e o debate em torno do questionamento e reposicionamento das
ligações entre género, identidade e desejo, bem como da proficuidade do
conceito de performatividade do género e das abordagens queer. As perspectivas
aduzidas tornam por demais evidente a projecção da obra de Judith Butler Gender
Trouble: Feminism and the subversion of identity e os desenvolvimentos
suscitados pela ruptura de paradigma que ela produziu.
O número que ora se publica inaugura uma alteração formal no sentido de adequar
a estrutura da revista à progressiva dissociação do conselho de redacção da
coordenação directa da secção temática. A apresentação específica do Dossier
temático deixa, pois, de ser desenvolvida no Editorial e passa a ser realizada
por quem o coordenou, assumindo a forma de introdução ao próprio Dossier,
precedendo os artigos que o compõem. Remete-se, pois, para a leitura do texto
«Introdução. Um lugar feminista queer e o prazer da confusão de fronteiras», no
qual Conceição Nogueira e João Manuel de Oliveira explicam e fundamentam as
opções do Dossier e introduzem cada um dos artigos que o compõem.
Na secção de Estudos e Ensaios incluem-se dois artigos, intitulados «Género e
mudanças tecnológicas: o caso das indústrias gráficas» e «Diversidade e
Psicoterapia: Expectativas e experiências de pessoas LGBT acerca das
competências multiculturais de psicoterapeutas». O primeiro, de autoria de
António Manuel Marques, evidencia a importância do género nos estudos sobre a
tecnologia, designadamente no que se refere à avaliação do impacto das
transformações tecnológicas em mulheres e homens e às conflitualidades
decorrentes, mas também geradoras, de mudanças na organização do trabalho. Com
base num estudo empírico sobre as representações de homens e mulheres no
contexto das indústrias gráficas, um sector profissional predominantemente
masculino, o autor problematiza a reorganização das relações reais e simbólicas
de poder intrínsecas ao processo de construção social do género em contextos
modificados pela evolução tecnológica. Analisando, por um lado, o grau de
interdependência dos processos de construção da masculinidade e da identidade
profissional e, por outro lado, as estratégias desenvolvidas pelas mulheres
inseridas nesses meios laborais, o artigo mostra a pertinência da pesquisa
sobre os mecanismos de construção da diferença e da discriminação em universos
profissionais em mudança. No segundo artigo, Carla Moleiro e Nuno Pinto,
partindo de um quadro teórico problematizador dos referenciais éticos
orientadores das práticas psicoterapêuticas junto de indivíduos cuja orientação
sexual não corresponde ao modelo heterossexual dominante, apresentam os
resultados de um estudo qualitativo e exploratório sobre as representações de
pessoas LGBT acerca da saúde e da doença psicológicas, bem como das suas
experiências e expectativas face aos processos de ajuda clínica. Face à
centralidade que as situações de discriminação ocupam nos relatos das pessoas
entrevistadas, por um lado, e à expectativa positiva face à capacidade das/os
psicoterapeutas suplantarem, na prática clínica, os seus próprios valores, por
outro lado, a autora e o autor salientam a relevância da introdução das
temáticas LGBT na formação inicial e avançada em Psicologia dos/as
psicoterapeutas.
Na secção de Leituras e Recensões, Paulo Vieira apresenta-nos um estudo
proveniente da literatura que nos oferece, a partir de textos diversificados e
numerosos, uma abordagem da relação entre espaço urbano e homossexualidades
femininas em diversas cidades e épocas históricas. Salomé Coelho introduz-nos o
«Dossier Género e Estudos Feministas» publicado no número 22 da Revista
Diacrítica – Ciências da Literatura, do Centro de Estudos Humanísticos, da
Universidade do Minho, com a qual a ex æquo se honra de ter iniciado uma
relação de permuta.
Lembramos as leitoras e os leitores da ex æquo que a revista, actualmente
indexada na SciELO Portugal – Scientific Eletronic Library Online – e no
Catálogo Latindex – Sistema Regional de Información en Línea para Revistas
Científicas de América Latina, el Caraíbe, España e Portugal –, tem
aperfeiçoado o seu sistema de arbitragem, respeitando a submissão de cada
artigo à emissão de pareceres por duas pessoas, blind referees, especialistas
na respectiva área em que o texto se enquadra ou referencia, com o objectivo de
manter um elevado nível de qualidade científica. A introdução da ex æquo na
biblioteca electrónica da SciELO, a partir do número 18, constituiu, também, um
passo importante na sua abertura a públicos mais abrangentes e constitui uma
responsabilidade acrescida. Consideramos fundamental que a ex æquoacompanhe a
actual tendência de elevação dos padrões de exigência na selecção dos artigos
que publica, afirmando-se no seio das revistas científicas no contexto nacional
e internacional e contribuindo para a legitimação do conhecimento produzido
pelos Estudos sobre as Mulheres, sobre o Género e Feministas. A publicação de
discussões teóricas com base em investigações realizadas no nosso país e fora
dele e a ampla divulgação da revista contribuirão, por certo, para que a ex
æquo, que inicia a sua segunda década de vida, seja, cada vez mais, uma
referência no universo das revistas científicas, em geral, e congéneres, em
particular.