Imigração e trabalho doméstico: o caso português
Baptista, Patrícia (2011), Imigração e trabalho doméstico: o caso português,
Col. Teses, n.º 34, Lisboa, ACIDI-IP, 176 páginas.
Albertina Jordão
Mestra em Estudos sobre as Mulheres
A tese de Patrícia Baptista, Imigração e trabalho doméstico: o caso português,
que, em boa hora o ACIDI, através do Observatório da Imigração, decidiu editar
é um estudo exploratório de uma temática que parece estar a ganhar a comunidade
científica portuguesa. Se é verdade que o tema das migrações já ganhou o seu
espaço, a relação das migrações com o trabalho, e em especial o trabalho de
predominância feminina está por aprofundar.
"Imigração e trabalho doméstico: o caso português" é interessante
por diferentes ordens de razão. Para além do carácter inovador da abordagem,
importa destacar que, a tese que lhe deu origem, não tendo sido feita no quadro
dos Estudos de Género ou dos Estudos sobre as Mulheres, constitui um bom
exemplo da aplicação das "lentes de género" noutras áreas
disciplinares, neste caso, na área do desenvolvimento e cooperação
internacional. Mesmo o objeto de estudo, sobre Portugal e não sobre outros
territórios mais clássicos nos estudos em desenvolvimento, também lhe confere
alguma originalidade e vem confirmar que a transnacionalidade e a globalização
não são fenómenos para lá das nossas fronteiras, estão intramuros.O estudo
incidiu sobre uma realidade laboral (trabalho doméstico) que tem permanecido
invisível por passar-se em espaços fechados, muitas vezes em horários
diferentes da maioria das pessoas (logo mais invisíveis pelos escassos
contactos com outros/as profissionais) e por ser muito marcado pela etnicidade
e feminização. Duas dimensões que têm contribuído para a desvalorização deste
tipo de trabalho, maioritariamente realizado por mulheres e migrantes. A autora
acrescentou-lhe outra variável interessante, a de classe.
A dinâmica que envolve o trabalho doméstico é estruturado pelas
relações de género, classe e etnia que o definem e ele é,
simultaneamente, um mecanismo de produção e reprodução cultural, de
hábitos e estilos de vida que o vinculam a um determinado status
social (2011: 31).
A informalidade que tem rodeado a prestação de trabalho doméstico, a
desvalorização do trabalho feminino e as condições precárias que lhe estão
associadas são tratadas neste estudo, no qual se distingue, e muito bem, a
prestação do serviço através de empresas, na sua maioria na área da limpeza de
escritórios, e a prestação do serviço no contexto de casas particulares. Aliás
esta questão tem contribuído para uma certa ideia redutora daquilo que pode ser
considerado trabalho doméstico, se analisarmos as discussões que, pelo menos
durante dois anos, tiveram lugar no âmbito da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) sobre quais as atividades que podem ser consideradas como tal e
logo cobertas pela norma internacional do trabalho. À tradicional área de
limpezas, podemos incluir, a jardinagem, o cuidado de pessoas idosas ou
doentes, o tomar conta de crianças, etc.
Este estudo decorreu no período em que, a nível internacional, se preparava
legislação que regulamentasse o trabalho doméstico, que lhe conferisse
(inequivocamente) o estatuto de trabalho como qualquer outro e dignidade no
tratamento das trabalhadoras domésticas, ao defender que devem ser tratadas
como qualquer outro trabalhador/a. Os membros tripartidos da OIT acordaram na
adoção de uma norma internacional sobre o trabalho doméstico, o que veio a
acontecer em 2011 (ano da publicação deste estudo). A posição tripartida
(governo, patronal e sindical) está, também, vertida neste trabalho, através
das entrevistas que foram feitas a entidades empregadoras, intermediárias e
institucionais. Foram, igualmente, entrevistadas as trabalhadoras domésticas. O
número de entrevistas não confere representatividade estatística, nem permite
generalizações, mas confere uma dimensão qualitativa muito importante neste
tipo de investigações. Do ponto de vista metodológico, a opção por combinar
técnicas documentais (utilização de estatísticas) e não documentais
(entrevistas), proporciona um aprofundamento da perceção de uma determinada
situação a partir do sentido que lhe é dado pelas pessoas que a vivem, no caso
das entrevistas, mas também oferece a quem lê um conjunto diversificado de
dados estatísticos que ajudam a caracterizar a dimensão de análise. São muitos
os dados estatísticos e são variadas as fontes utilizadas, o que confere maior
complexidade e atenção. Segundo Patrícia Baptista, "as
especificidades" deste tipo de trabalho e a importância de analisar
"a relação entre etnicidade, trabalho doméstico e condições de
trabalho" pode ser uma pista para futuros trabalhos de investigação.
O estudo está estruturado em quatro capítulos, sendo os dois primeiros de
enquadramento geral e conceptual, definição e enquadramento do trabalho
doméstico (capítulo I) e "trabalho doméstico e imigração" (capítulo
II). Os capítulos III e IV analisam o caso português, "imigração e
trabalho doméstico em Portugal " e "a oferta e a procura de
trabalho doméstico imigrante". No final a autora apresenta as conclusões,
conciliando por um lado as respostas aos objetivos e hipóteses de partida e por
outro a identificação de "recomendações e pistas para futuros
trabalhos".
O estudo está disponível em linha em: http://www.oi.acidi.gov.pt/docs/
Colec_Teses/Tese34_WEB2.pdf