A Influência da Alteração dos Ciclos Circadianos na Auto-Percepção Individual:
a Experiência Subjectiva de Fadiga, Atenção, Tensão e Satisfação na Tarefa
Por natureza, os seres humanos possuem níveis de funcionamento oscilatórios,
havendo momentos de maior e menor actividade, o que condiciona o seu
desempenho, no quotidiano. Os seres humanos são, na sua maioria, activos
durante o período do dia apresentando durante a noite uma maior disposição para
o repouso ou período de sono (Rutenfranz, 1989), num processo de tipo cíclico,
que introduz uma noção mais ou menos padronizada de ritmo. De acordo com
Sherrer (1981), os ritmos biológicos afectam a alternância sono/vigília,
abrangendo os ritmos circadianos (sincronizados em dias e noites, segundo
Schultz & Steimer, 2009). Todas as funções biológicas, incluindo a memória
e a vigilância (Simões & Carvalhais, 2000). Numa investigação levada a cabo
por Valdez et al. (2005), as conclusões indicaram que os indicadores de
vigilância (atenção continuada, concentração) não manifestaram modificações
circadianas enquanto a atenção selectiva mostrou essas variações. Estas
alterações podem ser críticas no desempenho de várias tarefas, exemplo da
leitura e cálculo, assim como na memória, o que atesta a pertinência do estudo
desta e de outras funções associadas.
Entendida como uma função psicológica através da qual concentramos a nossa
actividade mental sobre um estímulo específico, seja esta uma sensação, uma
percepção, uma representação, um afecto ou um desejo, de forma a elaborar
determinados conceitos. (Eysenck & Keane, 1997; Fiske & Taylor, 1991;
Gleitman, 1999; Habib, 2000; Hampson & Morris, 1996; Sternberg, 2000;
Styles, 1997), a atenção pode ser o resultado de um processo voluntário ou
involuntário. O primeiro depende directamente de cada indivíduo, enquanto o
segundo está condicionado pelo ambiente exterior onde se localiza o indivíduo
num determinado momento (Eysenck & Keane, 1997; Gleitman, 1999; Hampson
& Morris, 1996; Styles, 1997).
Estas duas categorias são de especial relevância quando a pessoa se confronta
com condições de trabalho continuado, por turnos ou com outras condições
stressantes. (Garbarino, 2002), para além de que as variações na atenção são
relevantes para a diminuição da produtividade e para o risco de acidentes
nocturnos. A dissociação entre a vigilância e outros componentes da atenção
sugerem um forte elo entre esta última variável, a tensão ou stresse e a
fadiga.
O stresse, visto como uma transacção dinâmica entre a pessoa e o seu meio
ambiente (Cohen et al., 1995; Cooper et al., 2001; Lazarus, 1995; Taylor et
al., 1997), implica na perspectiva do nosso estudo que exista uma auto-
avaliação de inferioridade do indivíduo, perante as exigências impostas pelo
ambiente (Maslach, 1986).
Segundo vários autores, pode-se considerar que determinados níveis de stresse
ou tensão estão associados a determinadas respostas comportamentais, as quais
se manifestam quer no trabalho, quer fora dele (Dunnette & Hough, 1992;
Jex, 1998; Lazarus, 1995; Murphy & Hurrell, 1987).
As respostas psicológicas a uma situação de tensão e stresse são uma realidade
e têm sem dúvida graves implicações na saúde, no desempenho profissional e na
vida pessoal dos indivíduos (Caplan & Jones, 1975; Cohen et al., 1995;
Cooper et al., 2001; Dunnette e Hough, 1992; Jex, 1998; Lazarus, 1995; Murphy
& Hurrell, 1987; Stroebe & Stroebe, 1999). As características de
trabalho stressantes podem originar estados de fadiga, caracterizando-se esta
por um estado geral de menor vigor físico e apatia (Nahas, 2001), podendo
também ser encarada como uma manifestação fisiológica que contribui para a
incapacidade de manter um determinado nível de esforço físico, por vezes
acompanhada de um aumento da percepção do esforço, consequência da evolução dos
seus mecanismos fisiológicos (Irala, 1993; Powers & Honley, 2000; Stern,
1971).
Para Walter (1993) a fadiga constitui uma diminuição funcional dos órgãos,
provocada pelo excesso de trabalho e acompanhada de uma sensação característica
de mal-estar.
Outros dos sintomas mais comuns são a diminuição da motivação, da percepção, da
atenção, da capacidade de raciocínio e um menor desempenho em actividades
físicas e psicológicas (Nahas, 2001; Walter, 1993). Pode traduzir-se também
numa perda de eficiência, ou seja, numa diminuição da capacidade de trabalho e
da concentração (Nahas, 2001), assim como na resposta reflexa, no tempo de
reacção e em todo o processo de decisão (Powers & Honley, 2000).
No que se refere ao âmbito profissional, as causas que envolvem a fadiga são
múltiplas e em geral são decorrentes da associação entre as más condições de
trabalho, o desencontro entre os ritmos biológicos e os horários de trabalho
(Maslach, comunicação pessoal, 2010).
Segundo Sallinen (1997), a fadiga é mais frequente durante a noite e em
horários de trabalho que se iniciam muito cedo de manhã. Nestes últimos pode
ocorrer uma privação parcial do sono, uma vez que exige que o indivíduo
trabalhador acorde muito cedo, reduzindo dessa forma o período de repouso.
Especialmente à noite, a privação do sono causada pelas dificuldades de repouso
diurno e a dessincronização dos ritmos biológicos podem reduzir
significativamente os níveis de alerta dos trabalhadores e acentuar os sintomas
de fadiga (Akerstedt, 1998; Walter, 1993).
A falta de uma boa qualidade de sono entre os trabalhadores nocturnos pode
conduzir à fadiga crónica, a qual pode ser manifestada através do cansaço,
irritabilidade e depressão. Desta forma, verifica-se muitas vezes um maior
absentismo por razões de saúde e maior número de consultas médicas (Grandjean,
1993; Kogi et al, 1998; Walter, 1993).
Soni et al., numa investigação efectuada em 2008 concluíram que o trabalho
nocturno realizado de forma constante altera os ritmos circadianos,
independentemente de factores como a idade ou do cronotipo, com consequências
nefastas no futuro da sua saúde.
Num estudo efectuado em 2000, Chandrawanshi e Pati relativamente à fadiga
subjectiva e atenção subjectiva que afirma a possibilidade de ressincronizar
estas variáveis passando os trabalhadores que estão a trabalhar à noite e que
sofrem uma influência negativa a esse nível para os turnos de dia, na maioria
dos trabalhadores. Notam no entanto que a ressincronização destas variáveis
subjectivas sofrem menos alterações de sincronia do que variáveis com a
temperatura da pele, o batimento cardíaco ou factores respiratórios.
Inúmeros estudos demonstram que a habilidade para desempenhar a maioria das
tarefas é reduzida durante as primeiras horas da manhã. Da mesma forma, o
desempenho parece diminuir em turnos com mais de oito horas, onde os
trabalhadores desempenham tarefas físicas e psicológicas mais exigentes e
repetitivas, que vão afectar o grau de atenção e concentração (Simpson, 2000).
É importante salientar que geralmente a eficiência humana diminui em indivíduos
que continuam a trabalhar, após terem consciência do seu estado de fadiga
(Brow, 1994; Walter, 1993).
Contudo, existem factores, como a satisfação no trabalho, que podem amenizar o
efeito da fadiga e do stresse no desempenho dos trabalhadores, como defendem
Vala, Monteiro, Lima, e Caetano (1995, p. 108), para quem a satisfação com o
trabalho é um constructo que visa dar conta de um estado emocional positivo ou
de uma atitude positiva face ao trabalho e às experiências em contexto de
trabalho, ainda que o efeito desta variável mediadora não seja linear: existem
colaboradores que se sentem satisfeitos e possuem um bom desempenho, enquanto
outros se revelam insatisfeitos mas que demonstram igualmente um bom
desempenho, sendo o inverso também verdadeiro para a associação entre estas
variáveis (Gibson, Ivancevich, Donnelly, & Konopaske, 2006).
Apesar desta constatação, a satisfação com o trabalho aparece como um forte
factor de realização pessoal e de saúde organizacional (Maslow, 1970),
assumindo-se também que terá um impacto positivo a nível interno e externo da
organização. Segundo Gibson et al., (2006), os estudos revelam uma moderada
relação entre a satisfação e a diminuição do absentismo e da rotatividade e
alguma influência da satisfação com o trabalho com a veiculação de uma imagem
mais positiva da organização junto da comunidade.
Csikszentmihalyi (2002) preconiza um certo tipo de relação entre a pessoa e a
tarefa, uma relação óptima que contribui para a satisfação no trabalho ou nas
situações que se verificam no seu contexto. Propõe assim um certo estado de
fluxo que é uma experiência autotélica1, e que aparece assim relacionado com
uma ascendência da pessoa a um nível óptimo de potencialidade, tornando-se
pertinente perceber até que ponto um estado positivo de satisfação com a
realização da tarefa interfere na percepção de fadiga, atenção e cansaço
(Csikszentmihalyi, 2002).
Sveinsdóttir (2006) numa investigação efectuada com uma amostra de enfermeiros
procurou averiguar se havia uma influência dos turnos rotativos na satisfação
do trabalho. Apesar de não ter encontrado resultados conclusivos nestas
variáveis o autor verificou que os indivíduos que trabalhavam com escalonamento
apresentavam mais queixas a nível da forma como sentiam os stressores
organizacionais. Para eles havia a percepção de terem turnos mais longos, um
trabalho mais duro e menos controle do seu local de trabalho, o que pode
relacionar-se com as conclusões obtidas por Sadeh, Keinan e Daon (2004) de que
existe uma mediação das estratégias de coping na forma como são sentidos os
stressores provocados por trabalhos rotativos.
Partido dos pressupostos antes apresentados foi desenvolvido um estudo
realizado no âmbito da segunda edição de uma prova de gestão (24Horas de
Gestão) promovido pela empresa SFORI. Esta prova de competição e cooperação
entre equipas visou a criação de uma empresa num espaço de tempo ininterrupto
de 24 horas.
A investigação teve como objectivos averiguar as alterações nas experiências
subjectivas de fadiga, atenção e tensão, ao longo de um período mínimo de 24
horas de vigília (durante o qual foram realizadas várias actividades);
averiguar as relações existentes entre as experiências subjectivas das três
variáveis, e averiguar de que forma a experiência subjectiva de satisfação na
realização de determinada tarefa se relacionava com essas variáveis.
MÉTODO
Participantes
A organização da Prova de Gestão autorizou a aplicação do instrumento durante
todo o evento, tendo o objectivo da investigação sido explicado antes do início
da prova, a todos os participantes (que não possuíam qualquer conhecimento
prévio acerca da realização da investigação). Os participantes eram membros das
equipas inscritas na prova, e foram todos integrados na amostra. A amostra era
composta por 110 indivíduos, de ambos os sexos (61.3% homens; 38.7% mulheres, n
= 106), com idades compreendidas entre os 15 e os 29 anos (M = 21.62; DP =
2.47), estando a maioria dos participantes incluídos na faixa etária entre os
18 e os 25 anos (86.3%, n = 95).
Os participantes eram, na sua maioria, estudantes (entre o 9º ano e a
frequência universitária) havendo, contudo, alguns profissionais de Gestão.
Estavam agrupados em 23 equipas de trabalho, formadas antecipadamente para a
participação na Prova de Gestão. Durante um período de 24 horas as equipas
estiveram permanentemente ocupadas na concretização de várias tarefas - umas de
âmbito mais teórico e intelectual, outras de âmbito mais físico (cada indivíduo
percorreu cerca de 20 km a pé, no total das várias tarefas propostas. Quando a
prova teve início os participantes tinham, em média, 3 horas de vigília
(DP=1.00), havendo algumas pessoas que estavam acordadas há já 6 horas, quando
a prova começou.
Material
Para a realização do presente estudo, foi elaborada uma Escala tipo Likert para
avaliar as experiências subjectivas de fadiga, tensão, atenção e satisfação na
realização da actividade, dos sujeitos. Nesta Escala, de preenchimento simples,
pedia-se aos sujeitos para indicarem como se sentiam, naquele exacto momento,
em cada uma das dimensões indicadas (fadiga, tensão, atenção e satisfação na
realização da actividade). As respostas eram dadas numa escala de 0 a 20,
correspondendo o 0 a Nada e o 20 a Muito.
Procedimento
A Escala foi aplicada em seis momentos distintos durante as 24 horas de
realização da Prova. A primeira aplicação aconteceu imediatamente antes do
início da Prova. A segunda aplicação foi executada 4 horas após o início da
Prova (cerca das 15 horas), a terceira cerca de 8 horas após a segunda
aplicação (cerca das 23 horas), a quarta aproximadamente 4 horas depois (cerca
da 03 horas), a quinta 4 horas depois (cerca das 07 horas) e a última aplicação
momentos antes do final da Prova (por volta da 11 horas).
A discrepância nos intervalos de tempo entre as várias aplicações deveu-se, por
um lado, aos constrangimentos inerentes à Prova e, por outro, ao intuito de
realizarmos mais aplicações durante o período da noite, não só devido ao
aumento natural do cansaço, nos sujeitos, mas também devido à alteração do seu
período vigília - sono habitual.
Resultados
Os resultados obtidos (tabela 1) revelam, no geral, um aumento estatisticamente
significativo da auto-percepção da fadiga e da tensão ao longo do decorrer da
prova, paralelamente a uma diminuição da auto-percepção da atenção. Estas
alterações apresentam-se significativas entre a primeira e a última aplicação,
uma vez que os participantes se sentiram significativamente mais fatigados, t
(181.39) = -15.21, p< .001, na última aplicação (M = 13.24, DP = 5.34)
relativamente à primeira (M = 3.66, DP = 3.66), o seu nível de tensão aumentou
significativamente da primeira (M = 5.07, DP = 4.04) para a última aplicação (M
= 8.56, DP = 6.17), t(176,12) = -4.86, p< .001, observando-se ainda uma
diminuição significativa da sua percepção de atenção, com valores
significativamente inferiores no final da prova (M = 10.87, DP = 5.45),
comparativamente com o início da mesma (M = 14.16, DP = 4.43), t(198,69) =
4.84, p< .001. Verificamos ainda que as mudanças observadas, em todos os
domínios são, na sua maioria, significativas entre aplicações, isto é, de uma
aplicação para outra registam-se discrepâncias significativas de valores.
Tabela 1
Resultados médios em cada uma das dimensões estudadas: fadiga, tensão e
atenção, e respectiva comparação de médias
No que se refere à auto-percepção de fadiga, esta vai aumentando de aplicação
para aplicação, apenas diminuindo significativamente na última, t(194,04) =
2.30, p< .05, onde o valor médio é ligeiramente inferior (M= 13.24, DP = 5.34)
ao anterior (M= 14.75, DP = 4.14). Observando ainda a relação existente entre
esta percepção e a satisfação na tarefa, verificamos que o facto dos
participantes se sentirem mais ou menos satisfeitos na realização de
determinada tarefa está associado à forma como se auto-percepcionam, mais ou
menos fatigados, como demonstra a correlação negativa, ainda que baixa, entre
satisfação e auto-percepção de fadiga (r =-.18, p=.01).
No que concerne à auto-percepção de tensão, o movimento é similar ao
verificado na dimensão anterior, embora se possa observar uma inversão de
sentido, na quarta aplicação, através de uma diminuição significativa dos
valores médios obtidos, t(218) = 2.03, p< .05, respectivamente 9.55 (DP = 5.08)
e 8.20 (DP = 4.74) na terceira e quarta aplicação.
Analisando a variável idade, no que respeita a auto-percepção da fadiga,
observamos que os sujeitos mais novos (até aos 17 anos) mantiveram, durante
toda a prova, valores inferiores aos restantes sujeitos. Pelo contrário, os
sujeitos mais velhos (com mais de 26 anos) foram os que sentiram um maior nível
de fadiga, tendo sido neste grupo que se registou a maior amplitude de
resultados entre o início e o final da Prova (tabela 2). Contudo, nenhuma
destas diferenças se apresentam estatisticamente significativas.
Tabela 2
Níveis percepcionados de fadiga, segundo os grupos de idade
Em relação à auto-percepção de tensão, os sujeitos com mais de 26 anos foram os
que se sentiram menos tensos ao longo de toda a prova, manifestando um ligeiro
aumento da tensão auto-percepcionada nas horas finais da Prova. As diferenças
encontradas entre este e os restantes grupos situam-se na terceira aplicação, F
(3, 22.71) = 11.41, p<.01. Comparações a posteriorientre pares de médias,
realizadas recorrendo ao teste de post hocHochberg GT2 , revelam que os
participantes com mais de 26 anos apresentam níveis de tensão
significativamente mais baixos que os participantes do grupo com idades entre
os 22 e os 25 anos (p = .04) mas não que os do grupo com 17 anos ou menos
(p=.05) e os do grupo entre os 18 e os 21 anos (p = .10).
Os sujeitos com idade até aos 17 anos, assim como os do grupo 22-25 anos foram
os que demonstraram uma maior instabilidade nos resultados, observando-se
maiores oscilações. (tabela 3)
Tabela 3
Níveis percepcionados de tensão segundo os grupos de idade
Constatamos, no entanto, que os aumentos na tensão sentida estão ligeira e
negativamente associados a uma menor satisfação com a tarefa (r =-.12, p< .05).
Este sentimento de insatisfação poderá dever-se à natureza da própria tarefa,
ou ao sentimento de incapacidade vivenciado pelos sujeitos para a concretizarem
eficazmente, o que poderá ter contribuído para o aumento da tensão.
No que se refere à comparação entre géneros - homens e mulheres - existem
diferenças significativas em algumas das aplicações, nomeadamente em relação à
auto-percepção de fadiga, de tensão e à satisfação na tarefa, que passamos a
descrever.
Ao nível da fadiga, o grupo das mulheres demonstrou durante maior parte da
prova níveis superiores de fadiga em relação aos homens, como se pode observar
no gráfico 1. A diferença entre homens (M=10.30, DP=4.00) e mulheres (M=12.14,
DP= 3.63) só é estatisticamente significativa, t (107)= -2.42, p<.05) na quarta
aplicação. Ainda assim, o aumento observado é contínuo e crescentemente
acentuado, havendo apenas uma diminuição dos valores na última aplicação.
Gráfico 1
Média dos valores percepcionados de fadiga, por género, nas 6 aplicações
Em relação à auto-percepção de tensão, os dados reflectem o mesmo padrão de
funcionamento, passível de observação no gráfico abaixo: as mulheres mantêm,
durante toda a Prova, níveis mais elevados de tensão, comparativamente aos
homens. As diferenças existentes são significativas na quarta aplicação, t
(107) = -2.84, p<.01, com valores inferiores para os homens (M=7,21, DP=4.54)
relativamente às mulheres (M=9,79, DP=4.73) e na quinta aplicação, t(107)= -
2,74, p<.01), mantendo-se a mesma relação entre homens (M=8.34, DP=5.81) e
mulheres (M=11.48, DP=5.95). Observamos, contudo, que o aumento verificado ao
longo da prova é mais gradual e menos acentuado, enquanto os homens possuem uma
maior oscilação de resultados. Novamente, tal como na auto-percepção da fadiga,
os valores decrescem na última aplicação.
Gráfico 2
Média dos valores percepcionados de tensão, por género, nas 6 aplicações
Na auto-percepção de atenção, evidencia-se uma tendência oposta à verificada
para as duas variáveis anteriores: os valores vão diminuindo ao longo das 24
horas, havendo um pico na segunda aplicação (tabela 4). As diferenças, contudo,
não se revelam estatisticamente significativas.
Tabela 4
Níveis percepcionados de atenção, segundo os grupos de idade
A análise da relação entre a auto-percepção de atenção e a satisfação na tarefa
permite constatar a existência de uma correlação positiva moderada entre as
duas dimensões (r = .39, p=.01), demonstrando que a um aumento de satisfação
corresponderá um aumento da auto-percepção de atenção.
Ao analisarmos os sujeitos segundo a sua idade, e no que se refere à atenção, o
movimento é semelhante em todos os grupos de idade, evidenciando-se o grupo dos
sujeitos até aos 17 anos como aquele onde a diminuição da atenção foi mais
acentuada, e o grupo dos 22-25 anos como aquele que sofreu menos oscilações,
havendo poucas alterações nos valores, ao longo da prova.
Relativamente às diferenças entre os dois sexos, no que se refere à auto-
percepção de atenção, verificamos que a diminuição da atenção, ao longo da
Prova, é mais acentuada no grupo das mulheres (a partir da segunda aplicação),
que obteve valores mais elevados no início da Prova, e valores mais baixos no
fim da prova; Isto é, nos homens a auto-percepção da atenção sofre menos
oscilações, apesar de se verificar uma diminuição gradual, movimento que apenas
sofre alterações na última aplicação.
Gráfico 3
Média dos valores percepcionados de atenção, por género, nas 6 aplicações
Quando comparamos homens e mulheres sexos no que concerne à satisfação na
execução das tarefas, as mulheres obtiveram resultados mais elevados que os
homens, ao longo de toda a Prova. Essa diferença é significativa no terceiro
momento, t (106) = -1.95, p=.05, onde as mulheres revelam, em média, mais
satisfação com a prova (M=14.27, DP=3.12) que os homens (M=12.76, DP=4.30).
(Gráfico 4)
Gráfico 4
Média dos valores percepcionados de satisfação com a tarefa, por género, nas 6
aplicações
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos permitem-nos verificar a existência de uma associação
estreita entre fadiga e tensão, assim como uma relação estreita, porém inversa,
relativamente à variável atenção, o que confirma a importância do equilíbrio
dos ciclos circadianos, descrita por Simões e Carvalhais (2000) e Schultz e
Steimer (2009).
Fica também comprovada a importância da auto-percepção da fadiga na actividade
cognitiva dos sujeitos, particularmente nas capacidades de atenção e percepção,
na motivação e em todas as respostas motoras e cognitivas (Nahas, 2001; Powers
& Honley, 2000; Walter, 1993).
À medida que o número de horas de vigília aumentava, os indivíduos foram-se
sentindo cada vez mais fatigados, mais tensos e menos atentos, em consonância
com as observações de Rutenfranz (1989), Nahas (2001) e Walter (1993), tendo-se
este movimento alterado somente na última aplicação. Possivelmente, os
resultados dever-se-ão ao facto de, na última aplicação (por volta das 11 horas
da manhã), ser novamente dia, o que terá influenciado positivamente o nível de
actividade dos sujeitos, sentindo-se assim menos fatigados e tensos, como
descrito na revisão da literatura. A luminosidade do ambiente terá influenciado
o mecanismo regulador das actividades fisiológicas, permitindo aos sujeitos
sentirem-se mais acordados, isto é, menos fatigados, menos tensos e mais
satisfeitos na realização das tarefas.
De acordo com Sallinen (1997), a fadiga é mais elevada durante a noite, facto
que é confirmado pelos nossos dados. Contudo, embora vários autores afirmem que
nas primeiras horas da manhã a fadiga é mais manifesta, podendo ser amplificada
pela falta de sono (Kogi et al., 1998; Sallinen, 1997; Walter, 1993), os
resultados obtidos são contraditórios, uma vez que o surgimento da luminosidade
do dia conduz a uma diminuição da auto-percepção da fadiga e da tensão. Esta
discrepância relativamente à literatura estará associada ao elevado nível de
satisfação com a tarefa verificado na última aplicação do instrumento (que terá
feito diminuir a percepção de fadiga e de tensão e aumentar a atenção), o que é
congruente com o proposto por Maslow (1970) e Csikszentmihalyi (2002),
relativamente à alteração positiva das percepções, face à experienciação de
realizações muito agradáveis para a pessoa. Acrescentamos, ainda, a função
motivacional derivada do sentimento de missão cumprida, emergente no término
da prova, e da ultrapassagem com sucesso do desafio, o qual funcionou como
fenómeno indutor de um sentimento de capacidade e satisfação (pelo considerável
grau de competência que exigia).
O facto dos participantes mais velhos se sentirem significativamente mais
cansados poderá remeter para uma influência da idade sobre as funções
analisadas, embora o limite superior de idade inferior a 30 anos dificulte a
aceitação do factor diminuição da resistência física como único factor causal,
e possamos pensar num progressivo aumento, com a idade, da consciência do
estado organísmico de cada um em relação às suas capacidades, ao que se acresce
o facto dos participantes mais velhos serem já trabalhadores, com índices
diários de esforço superiores relativamente aos mais novos, estudantes e com
rotinas quotidianas distintas.
Em relação à tensão, a experiência (profissional e de vida) dos participantes
mais velhos tê-los-á dotado de mais competências (das requeridas para a
realização da Prova), assim como de uma capacidade de avaliação mais realista
das mesmas. Como afirma Maslach (1986) o sentimento de stresse implica uma
auto-avaliação de inferioridade do indivíduo, perante as exigências impostas
pelo ambiente, podendo ser essa a justificação para os valores verificados.
Nos restantes grupos, o padrão de percepção da tensão encontrado é
indissociável da natureza das próprias tarefas, acentuando a intervenção
conjunta de variáveis quer internas quer externas aos participantes nos
processos de coping face às situações, uma das quais será, como comprovam os
resultados obtidos, a satisfação com a tarefa já que, conforme salientam Vala,
Monteiro, Lima, e Caetano (1995), esta pode funcionar como um reforço interno
da motivação intrínseca, a qual contribui para a diminuição da tensão.
Relativamente às diferenças de género, verificamos que os processos internos
parecem assemelhar-se; as diferenças encontradas à medida que o período de
vigília aumenta dizem respeito à intensidade de fadiga, tensão e atenção
percepcionadas, e não ao processo em si. Ainda assim, as mulheres parecem mais
sujeitas às consequências da ausência de sono. Pela sua menor resistência
física, parecem sentir-se cansadas e tensas mais rapidamente ou, pelo menos,
terão menos dificuldades em assumir os seus níveis de fadiga, sendo a redução
da atenção, ao longo da prova, também mais acentuada neste grupo.
O cruzamento das variáveis ' fadiga, tensão e atenção ' com a satisfação na
realização da tarefa, torna clara a influência que a forma como esta é
avaliada, subjectivamente, contribui para a maneira como os indivíduos se
sentem.
Walter (1993) e Brow (1994) afirmam que existe uma diminuição da eficiência dos
indivíduos quando estes tomam consciência do seu estado de fadiga. Ainda assim,
e uma vez que este estado é influenciado pela forma como a tarefa é vivenciada,
não se pode falar de uma relação linear entre fadiga e eficiência reduzida. Se
a satisfação constitui um impulso intrínseco de motivação, e se este contribui
para o nível de desempenho dos sujeitos na prossecução de uma actividade, e a
se satisfação influi ainda na experiência subjectiva de fadiga e de tensão,
então a satisfação assume um papel mediador central (que mereceria mais e
aprofundados estudos).
Ainda que, biologicamente, estejam reunidas condições para a diminuição do
nível de desempenho, parecem ser as variáveis motivacionais subjectivas que
permitem aos indivíduos manter-se em funcionamento, isto é, continuar a
trabalhar, mesmo para além do que se julgaria serem os seus limites!
Os resultados obtidos permitem-nos concluir que, como descreve a literatura, os
ciclos circadianos, assim como o aumento do período de vigília associado a uma
privação de sono, influenciam negativamente, ainda que de forma não linear, o
desempenho dos sujeitos, uma vez que interferem com as experiências subjectivas
de fadiga, atenção e tensão. Novamente, o trabalho durante a noite, período em
que o ser humano está naturalmente num estado de maior inactividade, aparece
como potenciador de processos organísmicos negativos, isto é, indutores de
estados de vulnerabilidade. Como defendem inúmeros estudiosos, as respostas
dadas neste tipo de situação bio-psicológica têm implicações sérias ao nível da
saúde, do desempenho profissional e da vida pessoal dos indivíduos (Caplan
& Jones, 1975; Cohen et al., 1995; Cooper et al., 2001; Dunnette e Hough,
1992; Jex, 1998; Lazarus, 1995; Murphy & Hurrell, 1987; Stroebe &
Stroebe, 1999), sendo imperativo uma focalização nos trabalhadores por turnos,
nos trabalhadores nocturnos e, particularmente, nas actividades geradoras de
maior stresse.
Maslach defende uma multifactorialidade de causas para a fadiga em contexto
profissional, geralmente decorrentes de uma associação entre as condições de
trabalho, o desencontro entre os ritmos biológicos e os horários de trabalho
(comunicação pessoal, 2010). Os resultados agora obtidos atestam essa natureza
multifactorial, embora possamos sublinhar a interveniência de factores
motivacionais que podem contribuir para um aumento ou para uma diminuição dos
estados de vulnerabilidade profissional, confirmando a necessidade das
entidades empregadoras levarem em consideração os níveis de satisfação
profissional dos seus colaboradores.
A investigação deverá incidir ainda nos processos organizacionais que
interferem nesse nível de satisfação, em termos individuais e de equipa, no
sentido de optimizar o desempenho profissional e a realização pessoal, nos
trabalhadores que sofrem desta perturbação organísmica originada pelos ritmos
empresariais.