América Latina
América Latina
Carmen Fonseca
Laurence Whitehead, Latin America: a new interpretation
Palgrave, 2006, 300 pp.
Latin America: A New Interpretation não é um comentário à actualidade latino-
americana, mas uma análise às grandes tendências que moldam esta região. Os
seis capítulos da obra resultam da compilação de ensaios publicados
anteriormente pelo autor. O principal objectivo do livro é interpretar algumas
orientações e continuidades, na tentativa de encontrar as suas origens e traçar
futuros cenários, numa perspectiva comparativa. Em suma, Laurence Whitehead
abraça o objectivo ambicioso de definir o carácter «distintivo» da América
Latina.
Professor no Nuffield College em Oxford, tem desenvolvido o seu trabalho em
torno das dimensões internacionais da democratização e a sua comparação com a
economia, com especial ênfase para a América Latina, e o México em particular.
Em larga medida, Latin America: A New Interpretation constitui a súmula do
trabalho que tem desenvolvido nos últimos anos.
O argumento central do autor reside na ideia de que a América Latina é uma
região caracterizada por sucessivos projectos de modernidade, conduzidos,
essencialmente, de cima para baixo, razão pela qual esbarram frequentemente com
a resistência da sociedade e acabam por falhar. Daí que o autor considere a
região um «mausoléu de modernidades» caracterizada pela noção de «múltiplas
modernidades». Neste sentido, também a organização política padeceu de
projectos e reformas que conseguissem unir o Estado e a sociedade, persistindo
a ausência de um equilíbrio institucional, a nível económico, político e
social.
O autor evidencia ainda a falta de controlo social sobre o desenvolvimento da
elite, em grande parte devido à influência alcançada pelos tecnocratas sobre o
pessoal político. Para ilustrar esta ideia, Whitehead apresenta as
características peculiares do México, em particular dos tecnocratas que, no
entanto, têm contribuído para a construção de um consenso bem-sucedido na área
da governação económica.
Por fim, no último capítulo, procura oferecer uma explicação para os sucessivos
fracassos dos projectos modernizadores da América. O autor refere que a
democratização não favoreceu na sociedade um sentimento de pertença às escolhas
colectivas porque as elites continuaram a ter um papel preponderante e
inflexível, contribuindo, de certo modo, para o paradoxo da coabitação da
democracia com a desigualdade social e a insegurança, um dos traços mais
emblemáticos da região.
Michael Reid,Forgotten Continent. The Battle for Latin America's Soul
Yale University Press, 2007, 384 pp.
Forgotten Continent. The Battle for Latin America's Soul é uma análise da
história recente da América Latina que nos ajuda a interpretar a actualidade.
Michael Reid, jornalista e editor das Américas no Economist, considera este
livro um «relatório em progresso» de uma região entendida como um laboratório
da democracia e do capitalismo democrático. Relatório esse que deriva da
observação e do trabalho do autor na região durante mais de vinte e cinco anos.
O principal objectivo do livro é destacar a realidade e as particularidades de
uma região que muitas vezes é esquecida ou ocultada, mas onde se têm
desenvolvido exercícios políticos, económicos ou sociais bastante complexos,
uns mais bem-sucedidos do que outros (a democratização da maior parte dos
países na década de 1980 foi acompanhada por alguns fracassos a nível das
reformas económicas talhadas segundo os preceitos do «Consenso de Washington»).
O livro está dividido em doze capítulos. Além dos capítulos introdutórios e do
background histórico, Reid dá primazia à análise do impacto no desenvolvimento
da região do fracasso do Consenso de Washington, dos exemplos reformistas
ocorridos no Chile, no Brasil e no México bem como às mudanças sociais e às
reformas inacabadas do Estado que ocorreram com a democratização. Reid dá
espaço à análise da ideologia populista, centrando‑se na figura de Hugo Chávez
e na sua influência na região, advertindo para o facto de que o populismo
resulta em grande medida das desigualdades sociais extremas. Reid mostra-se
bastante céptico quanto à política de Chávez e considera que a «Alternativa
Bolivariana», proposta por ele, se define em oposição à democracia, sendo o seu
único trunfo a posse de petróleo.
O autor avalia ainda a fragilidade das democracias latino-americanas. Tal como
em muitos aspectos ' também em relação à consolidação democrática a região não
é homogénea ' Reid considera que existem diferentes níveis de solidez
democrática, e por isso mais importante do que assegurar a sobrevivência da
democracia na América Latina é garantir a sua qualidade.
Michael Reid termina a sua análise com uma visão optimista, uma vez que o
cenário democrático já vigora em quase toda a região. O passo seguinte será a
sua consolidação, e encontrar os mecanismos adequados para que os países
consigam conjugar um sistema político efectivo e equitativo com um
desenvolvimento e um crescimento económico sustentado.
Marifeli Pérez-Stable (ed.), Looking Forward. Comparative Perspectives in
Cuba's Transition
University of Notre Dame Press, 2007, 332 pp.
Cuba permanece o país mais marginal da América Latina. Não pelos «excessos» do
populismo ou pelos problemas associados ao narcotráfico, mas pelo tipo de
regime autoritário que ali vigora há décadas. Com a deterioração do estado de
saúde de Fidel Castro, e a passagem de testemunho para o seu irmão Raúl, em
Fevereiro de 2008, começaram a surgir as previsões acerca da «transição»
política na ilha.
Marifeli Pérez-Stable, actualmente vice-presidente do Inter-American Dialogue e
professora na Universidade Internacional da Florida, abandonou Havana na década
de 1960. Este livro resulta da recolha de textos de diversos autores,
interessados pelo contexto cubano, que escreveram sobre os vários temas que
estruturam o livro em 12 capítulos, como sejam, política, economia, sociedade,
sistema militar, mas também a corrupção, a ideologia, a cultura e a diáspora. O
principal objectivo é que os autores apresentem todos os cenários possíveis
para o tema analisado, partindo de um conjunto de interrogações comuns e da
comparação com as experiências das democracias mais recentes, especialmente da
Europa Central e de Leste ou da América Latina.
Embora não sejam abordadas, claramente, as relações de Cuba com a União
Europeia (ou a inexistência delas até há pouco tempo), nem a influência dos
países vizinhos ou o papel de Cuba na região, é dedicado um capítulo à relação
com os Estados Unidos e à sua influência num cenário sem Fidel Castro.
De um modo geral, os contributos dos especialistas são unânimes no que toca à
necessidade de reformas políticas e económicas em Cuba ao mesmo tempo que
apontam as dificuldades que daí poderão advir. Os autores concentram as suas
análises, essencialmente, em torno de dois cenários. Por um lado, apontam para
um processo de sucessão de regime equivalente ao modelo da China e do Vietname,
que seria mais efectivo a nível económico mas que não produziria liberalização
política; por outro lado, para uma transição democrática que seria um processo
mais lento e que teria de contar com o empenho de actores externos bem como das
comunidades cubanas no estrangeiro, especialmente nos Estados Unidos. Os
autores referem contudo que uma transição democrática, semelhante às que
ocorreram nos países da Europa Central e de Leste, poderá não eliminar os
problemas de corrupção, bem como gerar controvérsia entre a sociedade civil se
as suas expectativas forem defraudadas.
O principal factor de influência do regime cubano continua a ser Fidel Castro.
Sem ele, como se vai organizar a política, a economia, o sistema militar ou a
sociedade? É na tentativa de encontrar respostas a esta questão que este livro
se apresenta, além de actual, bastante interessante e completo.
Alain Rouquié,Le Bresil au xxi Siecle ' naissance d'un Nouveau Grand
Librairie Arthème Fayard, 2006, 409 pp.
A eleição de Lula da Silva para a Presidência do Brasil em 2002 suscitou, entre
os politólogos, variadas análises face ao «fenómeno» ocorrido: a eleição de um
sindicalista ex-metalúrgico e fundador do Partido dos Trabalhadores. Para a sua
eleição os analistas encontravam justificação na «vontade de mudança» exigida
pelos eleitores brasileiros depois dos dois governos de Fernando Henrique
Cardoso. Crítico das políticas do seu antecessor e com uma campanha eleitoral
que apostava na ruptura com o passado, Lula ainda fez tremer os mercados
financeiros e os países vizinhos. Contudo, com o fim da campanha a continuidade
foi a pedra de toque do novo Presidente, tanto na parte da governação económica
como, em boa medida, ao nível da política externa.
É este o contexto que vai servir de base ao livro de Alain Rouquié, mais
concretamente, a tentativa de perceber como «um metalúrgico, filho de
camponeses, se torna o primeiro presidente do Brasil do século xxi», ou pelo
menos tentar descrever as condições e os contextos que permitiram que tal
acontecesse num país marcado por fortes contrastes e desigualdades sociais e
elevados níveis de pobreza. Com este livro, Alain Rouquié, embaixador francês
no Brasil entre 2000 e 2003, faz uma análise política da actualidade
brasileira, utilizando uma perspectiva histórica e traçando a evolução política
do Brasil desde o início do século xx.
A primeira parte do livro funciona como uma introdução, descreve os
condicionalismos geográficos, a sociedade, as heranças do império bem como a
evolução económica e a cultura política do país. Por seu turno, a segunda parte
do livro analisa a instalação da democracia com a campanha pelas eleições
directas e a sua concretização em 1989, revê ainda o golpe militar de 1964, o
papel dos militares no sistema político e a formação do sistema partidário. Com
mais detalhe são analisados os governos de FHC marcados pela mudança e
modernidade e, claro, o primeiro mandato de Lula da Silva, que o autor
considera ter conseguido conjugar a resolução dos problemas sociais com os
desafios no domínio da política externa.
Embora num tom pouco imparcial e mais descritivo do que conclusivo, o
embaixador Alain Rouquié oferece-nos uma útil introdução à história do Brasil
contemporâneo e dos seus mecanismos políticos.
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