História Internacional
História Internacional
Ana Mónica Fonseca *
Arne Hofmann,The Emergence of Détente in Europe. Brandt, Kennedy and the
Formation of Ostpolitik
Nova York, Routledge, 2007, 225 pp.
O tema desenvolvido neste livro é o esforço feito pelos dois líderes políticos,
Willy Brandt e John F. Kennedy, para ultrapassarem as divisões da Guerra Fria,
advogando a diminuição das tensões entre os dois blocos, e com isso impedindo
uma guerra entre as duas superpotências. O livro está dividido em três partes.
A primeira, uma descrição histórica das relações entre Willy Brandt e John F.
Kennedy durante o período em que este ocupou a Casa Branca (1960-1963), tem
como objectivo analisar as circunstâncias em que ambos se cruzaram e os
momentos-chave que partilharam. Centrando-se em Berlim e Cuba, como os dois
pontos-chave do período crítico que surgiu a partir de 1958, Hofmann analisa o
papel de dois dos protagonistas responsáveis por mudanças significativas nas
relações Leste-Oeste: Willy Brandt, o burgomestre de Berlim desde 1957, e o
Presidente americano John F. Kennedy.
Na segunda parte, Hofmann centra a sua abordagem nos valores e conceitos que
subjazem ao aparecimento da ideia de détente. Se, por um lado, Kennedy cedo
percebeu que o reconhecimento do Bloco de Leste era determinante para a
détente, por outro, Brandt acabou por ir mais longe e desenvolveu a política de
reconhecer o status quo com o objectivo de o ultrapassar. A Ostpolitik de
Brandt, afinal, era muito mais do que a estratégia para a paz de John F.
Kennedy.
Por fim, na terceira parte são analisadas as dificuldades geradas pela
aproximação Kennedy-Brandt no contexto das relações eua-rfa. As tensões entre o
chanceler Adenauer e o Presidente Kennedy transferiram o papel de partido pró-
americano da cdu para o spd e acentuaram as tensões no triângulo Bona-Berlim-
Washington. Esta aproximação foi também usada a favor do líder social-
democrata na ascensão da sua carreira política, afectando não só a sua postura
internacional, mas também o modo como era percepcionado internamente. A juntar
ao seu passado de resistente antinazi e ao importante papel enquanto
burgomestre de Berlim, estava agora a sua defesa da aliança transatlântica e da
ligação aos Estados Unidos.
Arne Hofmann é investigador no Centro de Estudos da Guerra Fria da London
School of Economics e o livro aqui tratado faz parte da colecção «Cold War
History Series» da Routledge ' características que reforçam a qualidade deste
trabalho.
Oliver Bange e Gottfried Niedhart (eds.),Helsinki 1975 and the Transformation
of Europe
Nova York, Berghahn Books, 2008, 208 pp.
A década de 1960 ficou marcada pela evolução da Guerra Fria. Depois dos
episódios de Berlim e Cuba na primeira metade da década, quer a população em
geral quer os líderes políticos sentiram a «necessidade de civilizar» o
conflito bipolar, esforço que recebeu o nome de détente. Ambos os lados estavam
dispostos a alterar o carácter da confrontação: a détente de De Gaulle, o
bridge buildingde Lyndon Johnson, a Ostpolitikde Willy Brandt ou a
«coexistência pacífica» de Brejnev. Porém, todos estes movimentos partiram de
acordos bilaterais, de onde se formou o caminho da multilateralização e até a
institucionalização desta nova postura. A Conferência de Segurança Europeia
transformou-se na Conferência de Segurança e Cooperação Europeia (csce). Este
processo centrou-se simultaneamente no ordenamento territorial europeu ' para o
qual a questão alemã era fundamental ' e na diminuição das tensões entre os
dois blocos, através do alargamento de contactos entre a Europa de Leste e a
Ocidental.
O que se procura analisar neste livro são as posições de vários países perante
o processo que levou à assinatura do Acordo Final da csce, assinado em
Helsínquia a 1 de Agosto de 1975. Do ponto de vista da Alemanha Federal, a csce
oferecia uma oportunidade para aprofundar a permeabilidade da fronteira intra-
alemã, o que, a longo prazo, iria levar ao desaparecimento da divisão alemã. O
segundo objectivo de longo prazo era a liberalização da Europa de Leste,
procurando assim minar a supremacia soviética naquela região. A reacção dos
países do Pacto de Varsóvia a esta estratégia variou entre a abertura às
iniciativas ocidentais e a ênfase na ameaça que constituíam, dependendo dos
seus interesses próprios.
Os artigos que constituem este volume centram-se na análise das diferentes
reacções ao processo de criação da csce, num período cronológico amplo (1961-
1975). Através de 11 capítulos, obtemos uma análise geral dos principais
elementos em jogo durante o processo de negociação que levou à reunião de
Helsínquia, quer do ponto de vista nacional (como, por exemplo, dos casos
alemão, francês, romeno ou soviético), mas também do ponto de vista do Pacto de
Varsóvia. Este volume é também o resultado de um projecto internacional da
Universidade de Manheim sobre as percepções mútuas entre a Alemanha Federal e
os estados-membros do Pacto de Varsóvia, cujos resultados e publicações
relacionadas estão disponíveis on-line em www.csce-1975.net. Tanto a informação
disponível no site como o conteúdo deste volume tornam-se incontornáveis para o
estudo das origens da csce.
Daniel Möckli,European Foreign Policy during the Cold War. Heath, Brandt,
Pompidou and the Dream of Political Unity
Nova York, I. B. Tauris, 2009, 476 pp.
O objectivo deste livro é analisar a construção da Cooperação Política Europeia
(cpe), processo iniciado em 1969-1970. O autor defende que até finais de 1973
se dá o culminar da cpe, com tomadas de posição comuns por parte dos Nove que
demonstram a vontade política de aprofundar politicamente a Comunidade
Europeia. Esta análise é feita com base em três actores‑chave para a cpe: o
Reino Unido, a França e a República Federal da Alemanha. A escolha destes dois
últimos países justifica-se pelo papel de motor do processo de construção
europeia que desempenharam historicamente; o do Reino Unido porque, de acordo
com Daniel Möckli, foi a sua adesão à cee que lhe deu peso político reconhecido
internacionalmente.
O livro descreve a evolução da cpe em três períodos distintos. O primeiro,
entre 1969 e 1972, caracteriza-se pela decisão dos Seis em avançar para o
aprofundamento político da Comunidade e, portanto, no processo de constituição
da cep e na preparação para a adesão do Reino Unido à cee. O segundo período
analisado é o ano de 1973, que constitui, segundo Möckli, o momento alto da
cpe. Neste ano, existiu verdadeiramente uma só voz europeia em vários assuntos
de importância internacional: a tomada de posição comum por parte dos (agora)
Nove no conflito israelo-palestiniano; a postura que os Nove adoptaram em
relação à iniciativa americana do «Ano da Europa» e o modo como se apresentaram
durante as negociações que levaram à csce. Esta tomada de posição a uma voz
terá sido possível pelo interesse dos principais países europeus em se tornarem
uma alternativa credível ao domínio bipolar, reforçando a construção política
da Europa como solução para o que acreditavam ser um maior desinteresse dos
Estados Unidos na defesa europeia ' reflexo da procura da détente com a urss.
Porém, logo no ano seguinte, a Europa a uma só voz desaparece, em grande parte
por causa das resistências americanas perante o fortalecimento dos Nove. A
impossibilidade em encontrar uma resposta consensual perante a crise energética
e a dificuldade em impor uma tendência europeia à parceria transatlântica
revelaram todas as limitações existentes entre os países europeus em falarem a
uma só voz.
A principal razão do enfraquecimento da cpe terá sido então a resistência
americana em ter um interlocutor colectivo, em vez dos parceiros bilaterais
tradicionais. Por outro lado, já nos anos 1970 revelou-se uma vez mais que em
tempos de crise torna-se mais difícil ter a Europa a falar a uma só voz.
Martin Klimke e Joachim Scharloth (eds.),1968 in Europe.A History of Protest
and Activism, 1956-1977
Nova York, Palgrave Macmillan, 2008, 344 pp.
1968 in Europe. A History of Protest and Activism, 1956-1977 é o quinto livro
publicado na colecção de «História Transnacional» da Palgrave Macmillan, e tem
como objectivo ser uma referência concisa para os alunos e investigadores dos
movimentos de protesto dos anos entre 1960 e 1970 na Europa. Produto da rede de
investigação «Marie Curie» sobre «Movimentos de Protesto na Europa desde 1945»,
esta obra procura preencher a lacuna existente sobre o tema em análise. Nesse
sentido, o seu objectivo é alcançado. Em cerca de trinta capítulos, são feitos
estudos de caso em quase todos os países da Europa, para além de capítulos
sobre os elementos verdadeiramente transnacionais deste período, como a Nova
Esquerda, o Movimento Internacional de Paz ou a influência da música nos
movimentos de protesto («Music and Protest in 1960s Europe»). A última parte do
livro reflecte sobre os impactos daqueles movimentos em quatro áreas
determinantes: o terrorismo, o movimento feminista, o movimento ecologista e o
seu impacto nas narrativas de democratização.
Os editores da obra, Martin Klimke (Universidade de Heidelberg) e Joachim
Scharloth (Universidade de Zurique), identificam quatro domínios que serviram
de motor para a transnacionalidade destes movimentos de protesto. Primeiro, uma
base comum de orientação ideológica, identificada com a Nova Esquerda e que
procurava uma alternativa quer ao «marxismo ortodoxo», quer ao «anticomunismo
fervoroso». Em segundo lugar, as redes de contacto pessoais e institucionais,
fortalecidas pela realização de encontros internacionais de estudantes. De
seguida, promovidos por estas redes de contactos, os repertórios de acção
tornavam-se comuns, com a partilha de métodos e de formas inovadoras de
protesto. Por fim, e como soma de todas estas trocas de experiências, técnicas
de protesto e ideologias, surgiu a busca por um estilo de vida alternativo e a
criação de uma contracultura que se tornou comum a toda a Europa. Apesar de
haver muitas diferenças no modo como estes elementos foram vividos em cada país
europeu, podemos dizer que são de facto os aspectos que conferem essa sensação
de transnacionalidade aos movimentos de protesto dos anos 1960-1970.
De modo a cumprir a sua função como manual para o estudo deste período, existe
um guia de ensino e investigação on-line, que disponibiliza uma cronologia,
bibliografia e algumas fontes para todos os países europeus. De salientar que,
apesar de o estudo de Portugal não fazer parte do volume em papel, existe um
capítulo on-line, da autoria de Miguel Cardina (Universidade de Coimbra),
disponível em: http://www.1968ineurope.com/.
* Investigadora do IPRI ' UNL. Mestra em História das Relações Internacionais
pelo ISCTE, prepara actualmente uma tese sobre o papel da rfa na transição
democrática em Portugal. Autora de A Força das Armas. O Apoio da República
Federal da Alemanha ao Estado Novo 1958-1968 (2007).
Rua Dona Estefânia, 195, 5 D
1000-155 Lisboa
Portugal
ipri@ipri.pt