A importância do tribunal de contas na sustentabilidade financeira do estado
A importância do tribunal de contas na sustentabilidade financeira do estado
Guilherme d'Oliveira Martins, Presidente do Tribunal de Contas
I - É hoje patente a importância da temática do equilíbrio das contas
públicas. Na sequência da adesão ao Euro, Portugal e os demais Estados
aderentes estão sujeitos a regras e limites. Há, assim, um conjunto de poderes
que foram transferidos para a União Europeia e em especial para o Banco Central
Europeu e para o Sistema Europeu de Bancos Centrais.
São claras as vantagens da moeda única. No entanto, para garantir a sua
estabilidade e a sua afirmação, os Estados aderentes deverão cumprir um
conjunto de regras comuns que influenciam as suas decisões em matéria de
finanças públicas.
Falamos do chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento (adoptado em 1997 e
reformado em 2005), o qual coloca limites ao défice orçamental mas sobretudo ao
endividamento público. Relativamente ao défice orçamental, o limite de 3% do
PIB não pode ser visto isoladamente, devendo ser considerado na perspectiva da
equidade intergeracional. Na verdade, o limite de 3% não deve ser atingido, a
não ser por motivos de força maior.
Assim se compreende a necessidade de finanças públicas equilibradas, por força
das exigências e responsabilidades perante as gerações futuras e dos nossos
compromissos internacionais.
No entanto, existem outras razões para se buscar o equilíbrio financeiro. Desde
logo, finanças públicas sãs são um indicador de uma economia desenvolvida,
equilibrada e sustentada. Por outro lado, a equidade intergeracional exige que
os gastos do Estado sejam controlados e criteriosos, devendo ser um elemento
fundamental na ponderação dos gastos realizados e dos compromissos assumidos. O
que hoje pedimos emprestado, deve ser pago amanhã. Uma sociedade não pode, por
isso, viver acima das suas possibilidades sob pena de empobrecer e onerar
gravemente as gerações futuras.
II - Como em qualquer organização ou empresa, a utilização dos dinheiros
públicos exige uma adequada fiscalização. Desde logo, pelo volume de fluxos
financeiros envolvidos e pelo facto de esses dinheiros resultarem das
contribuições dos cidadãos, sendo o Estado um mero fiel depositário e um
catalizador de iniciativas em nome do interesse geral e do bem comum.
Essa tarefa de controlo cabe, em primeiro lugar, aos órgãos de controlo
interno, como as inspecções gerais. Mas um sistema adequado de fiscalização
obriga a que haja controlo externo. Compete ao Tribunal de Contas (e
instituições congéneres ' Instituições Superiores de Auditoria) desempenhar o
papel de instituição suprema de controlo independente da gestão e utilização de
dinheiros e valores públicos.
Em Portugal, o Tribunal de Contas é um Tribunal Superior com exclusividade de
jurisdição para fiscalizar, julgar e efectivar responsabilidades financeiras.
Cabe-lhe a missão de zelar pelo cumprimento das regras de utilização de fundos
públicos. Pretende-se, assim, com a actuação do Tribunal alcançar uma gestão
eficaz, eficiente e económica dos recursos públicos, sempre com o interesse
público como norte da sua acção.
O Tribunal de Contas dispõe, neste sentido, do poder de fiscalizar previamente
os actos e contratos geradores de responsabilidades para o Estado, assegurando-
se de que só poderão ser visados os actos e contratos que estejam conforme a
lei.
O Tribunal exerce ainda um controlo permanente e concomitante da gestão
financeira pública mediante a realização frequente de auditorias a todas as
entidades que utilizem ou beneficiem de dinheiros e valores públicos,
independentemente da sua natureza. Trata-se de dar cumprimento ao princípio do
seguimento ou da perseguição dos dinheiros públicos onde quer que estes se
encontrem.
Detém ainda o Tribunal a jurisdição exclusiva sobre o julgamento de infracções
financeiras e efectivação de responsabilidades inerentes à utilização de
dinheiros públicos. O Tribunal, através da sua Câmara especializada, julga os
ilícitos financeiros que envolvam dinheiros públicos. E pode condenar em multa
ou na reposição de fundos ilegalmente utilizados.
Tão importante como a sua função sancionatória e fiscalizadora, é a vertente
pedagógica do Tribunal. Através dos seus pareceres, instruções e comunicações,
o Tribunal de Contas é um poderoso instrumento de auxílio à gestão dos
dinheiros públicos. As auditorias revestem-se de grande importância para o
gestor da coisa pública, mostrando os pontos a melhorar, por força das suas
recomendações.
À semelhança da instituição homóloga britânica, o National Audit Office (NAO),
também o Tribunal de Contas tem desenvolvido esforços no sentido de melhor
contabilizar o resultado da sua actuação. Por exemplo, em 2007, a acção do
Tribunal de Contas poupou ao Estado ' e logo aos contribuintes ' cerca de 200
milhões de Euros.
Numa perspectiva de value for money, por cada Euro gasto com o Tribunal, os
contribuintes poupam 8. Este exercício é importante, para que fique claro que
sendo o Estado mero fiel depositário dos dinheiros dos contribuintes, é
indispensável que eles saibam qual a eficácia da actuação do Tribunal na defesa
dos interesses dos cidadãos.
Trata-se não só de poupar, mas também de ajudar a gastar melhor. Economia,
eficácia e eficiência são as pedras de toque da boa gestão pública. O combate
ao desperdício está, neste sentido, no topo das prioridades do Tribunal. Assim,
a avaliação e o controlo da despesa pública deve incidir, cada vez mais, em
resultados de desempenho e não apenas na regularidade da utilização dos
recursos. Dentro do âmbito e jurisdição da actividade do Tribunal, deve olhar-
se, pois, mais para a materialidade da operação e não focalizar somente a sua
formalidade.
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