Proposta de aclaração do pacto sucessório à luz de novos dados
Todo o começo é involuntário / Deus é o agente. / O herói a si
assiste, vário / e inconsciente. / À espada em tuas mãos achada / teu
olhar desce. / Que farei eu com esta espada? / Ergueste-a, e fez-
se.
(«O Conde D. Henrique», Poemas esotéricos, Fernando Pessoa)
Não conheço documento na História Medieval Hispânica que tenha sido tão
longamente debatido como o designado pacto sucessório. Sob a égide do abade
Hugo de Cluny, o conde D. Henrique reconhece o conde D. Raimundo como legítimo
herdeiro do reino de Leão e Castela. Como recompensa, D. Raimundo promete a D.
Henrique o território de Toledo ou da Galiza. Nem sempre os textos que usamos
para fazer História são tão significativos como este mas, apesar dos esforços
feitos por historiadores de mérito, continua a suscitar opiniões muito diversas
por parte da comunidade científica.
Quando o estudei pela primeira vez, pareceu-me que se tratava de um falso
histórico e apresentei essa hipótese num artigo publicado em 2011 na revista
Medievalista1. Admiti, nessa altura, que podia ter sido uma contrafação
elaborada pouco depois de 1640 no contexto da restauração da independência
portuguesa, para favorecer, implicitamente, a tese da submissão de Portugal a
Espanha e demonstrar que todos os reis de Portugal desde Afonso Henriques
tinham usurpado um direito da Coroa espanhola. Todavia, como não o pude afirmar
categoricamente, não dei o assunto por encerrado. Havia, desde logo, que
considerar a nota que o Professor José Mattoso elaborou sobre o meu estudo, com
o contributo do Professor Arnaldo do Espírito Santo relativamente ao argumento
linguístico. Perante a ausência de sinais evidentes do uso de um latim clássico
que denuncie um falsário da época moderna, o Diretor da Medievalista considerou
que se impunha um exame mais aprofundado.
No presente trabalho, apresento os resultados do meu percurso de investigação
ao longo dos dois últimos anos. Na primeira parte, começo por examinar as
dúvidas levantadas pela análise linguística do texto, passando pela revisão do
que desde então se escreveu a propósito do pacto, até um aprofundamento da
investigação sobre o seu aparecimento na época moderna. A descoberta do
manuscrito e o estudo da atividade do centro de erudição maurista revelar-se-
iam decisivos para rever a minha posição. Defendo agora que o pacto pode ser
utilizado como base para uma reconstituição histórica credível. Em
conformidade, apresento uma proposta de datação crítica, baseada na crítica
interna do texto2.
Na segunda parte do trabalho analiso o papel dos condes na conjuntura leonesa-
castelhana. São assim estudados os antecedentes que conduziram à realização do
pacto, o tempo em que se deve ter concretizado o acordo e as consequências que
dele podem ter derivado, num cenário político que rapidamente o tornou caduco.
1. O pacto sucessório (novamente) revisitado
1.1. O argumento filológico
Comecemos então pelo problema filológico levantado pelo Professor Arnaldo do
Espírito Santo e que se concentra numa única palavra do texto, o uso de Leon em
vez de Legione, o que justificou um exame cuidadoso. Comecei por consultar os
Documentos Medievais Portugueses, publicados por Rui Pinto de Azevedo, onde o
pacto se encontra inserido, tendo verificado que a presença da forma Leon no
pacto é singular, pois em outros documentos só temos formas derivadas de
Legione3. Este primeiro resultado parecia não abonar a forma Leon num documento
do conde D. Henrique, ou mesmo do século XII. Mas, como sabemos que o conde D.
Henrique confirmou 20 documentos de Afonso VI e o conde D. Raimundo confirmou
39 documentos do mesmo rei, fui também percorrer os documentos desta
chancelaria, tendo encontrando apenas três exceções relativamente ao topónimo
usual Legione: um falso, um suspeito e um que resulta de uma reformulação
posterior4. Atente-se, todavia, que na coleção diplomática da Rainha D. Urraca
surge um original de 1119 com a forma Leone5. Impunha-se também uma pesquisa
aos documentos da Abadia de Cluny aos quais o pacto pertence, onde se verifica
a predominância das formas derivadas de Legio mas não se exclui a possibilidade
de Leon6.
Colmatando o facto de aqui no Porto não encontrar os volumes que necessitaria
das Fontes da História Leonesa de José Maria Catón, o Professor Ermelindo
Portela enviou-me amavelmente a informação que na documentação leonesa se
encontra, para Legion, a referência mais antiga no ano 944 e, para Leon, a
indicação mais antiga é de 9117. Finalmente, num documento particular de 1111
do Mosteiro de Santa Maria de Trianos, descobri «in terra de Leon»8.
Estes dados, não sendo exaustivos, permitem-nos desde logo tirar algumas
conclusões provisórias. Revelam-nos um cultismo em documentos de chancelaria
régia na preferência de Legione e um vulgarismo fora dela nas variantes Leone
ou Leon.Segundo Menendez Pidal, a luta pela perda ou conservação do 'e final
durou vários séculos9. Sendo Leon mais raro em documentos latinos anteriores ao
século XII, dá-se depois o contrário. Pesando tudo, apenas posso concluir que
num pacto para a partilha do reino pelos condes D. Henrique e D. Raimundo fosse
mais expectável encontrar Legione mas não é impossível a presença de Leon.
Por outro lado, o Professor Arnaldo do Espírito Santo refere que a tendência de
um latinista do séc. XVII seria para escrever terras Legionisou terras
legionenses e que o citado Philippus Prudens de Caramuel Lobkowitz (1639) seria
uma exceção. No jogo de palavras que é feito entre o nome do leão animal e o do
Reino de Leão, este Autor fez passar a ideia incorreta de que a antiga
monarquia da Península IbéricaLeónderiva de Leo / Leonise que só mais tarde foi
considerado como derivado de Legio / Legionis, o território onde esteve
acantonada a Legio Septima Gemina. Contudo, encontrei muitos eruditos do século
XVII que, ao referirem-se ao reino de León, escreveram em latim
Leonis10
. O motivo pode ter sido por uma desatenção na retroversão, pois enquanto na
língua latina não há equívoco entre o nome do animal leo e o do reino Legio,
para o hispânico, León tanto pode ser o rei da selva como o nome do antigo
reino. Mas o uso de Leon também pode resultar da confusão entre a designação do
reino e o símbolo adotado para as suas armas, o leão11.
Em conclusão, o problema do Leon versus Legione levantado pelo Professor
Arnaldo do Espírito Santo é deveras interessante e complexo. Tendo recorrido a
um estudo de casos, posso concluir não ser viável obter a partir da forma Leon
suporte para uma decisão segura sobre o problema da veracidade histórica do
pacto. Se a utilização de Leon é possível num documento medieval, não seria
menos possível numa falsificação moderna. Mas, dado que o Professor Arnaldo do
Espírito Santo não detetou outros elementos no texto que se pudessem considerar
suspeitos, é de relaxar a presunção de falsidade, ou seja, que do ponto de
vista linguístico é razoável considerar a sua autenticidade. Neste sentido,
tornou-se necessário aprofundar a revisão da literatura não só sobre o
controverso documento mas também sobre as relações entre os condes borgonheses,
o rei Afonso VI e o abade Hugo de Cluny.
1.2. Opiniões desencontradas
Tendo o pacto sido publicado, pela primeira vez, pelo beneditino francês Dom
Luc D'Achery, em 1659, na sua obra magna, o Spicilegium, e divulgado na
península pelo Cardeal Aguirre, em 1694, seguir-se-ia um século de dúvidas ou
mesmo negação da sua veracidade12. Só a partir de João Pedro Ribeiro é que o
documento foi universalmente aceite, embora os historiadores nunca tenham
chegado a acordo quanto às condições em que foi produzido, para o que contribui
o facto de não se encontrar datado. A situação manteve-se até meados do século
XX e é espelhada no prudente intervalo crítico apontado pelo diplomatista Rui
Pinto de Azevedo, abarcando treze anos. A polémica em torno do pacto pareceu
acalmar um pouco com a publicação, em 1971, de um artigo do historiador
americano Charles Julian Bishko. Este Autor, que estudou em profundidade as
relações de Cluny com a Península Ibérica, atribuiu a realização do pacto ao
ano de 1105, o que foi aceite por um número significativo de historiadores13. A
primeira dissensão de peso veio de Bernard Reilly. Este autor, que estudou
praticamente toda a documentação hispânica relativa ao reinado de Afonso VI,
admitiu que o pacto tivesse sido celebrado dez anos antes da data proposta por
Bishko14. Embora não lhe encontremos seguidores diretos, parece que o seu
contributo teve o efeito de reacender a polémica. Entrando na primeira década
do século XXI, vemos dois historiadores espanhóis, primeiro Gonzalo Martínez
Diezhttp://es.wikipedia.org/wiki/Gonzalo_Mart%C3%ADnez_Diez#cite_note-0 e
depois Ermelindo Portela, a admitirem a possibilidade de o pacto ter sido
produzido em 1096 ou 109715. Esta era, no essencial, a informação que possuía
quando publiquei o meu artigo em 2011.
Só posteriormente é que dei conta que um ano antes tinham sido publicados dois
artigos com opiniões divergentes sobre a datação crítica do pacto, num mesmo
volume da revista argentina Estudios de História de España. Um deles é da
autoria de István Szászdi León-Borja e Vitaline Correia de Lacerda16. Estes
coautores, que dedicam a sua atenção ao papel do conde D. Henrique como
inspirador da política separatista que fez do condado portucalense um reino
reconhecido da Europa cristã, apresentam uma interpretação audaciosa,
considerando que o pacto foi elaborado, assinado e arquivado em solo da
Borgonha, com o acordo e a conivência do abade Hugo de Cluny e do duque Eudes
Borel. Neste contexto, atribuem-lhe uma data anterior a 1094, antes do
casamento de D. Henrique com D. Teresa e, portanto, antes do conde receber a
Terra Portucalense do seu sogro Afonso VI. O outro estudo publicado na mesma
revista é de Júlia Montenegro. Sendo professora na Universidade de Valladolid,
tal como István Szászdi, tem uma opinião muito diferente. Depois de analisar
algumas questões relativas ao problema sucessório, considera impossível que o
pacto se tenha realizado em 1093 e associa-se aos historiadores que o situam na
parte final do reinado de Afonso VI, mais concretamente em 110617.
Um estudo posterior de Armando Martins, apesar de valorizar alguns aspetos
inovadores do trabalho de Júlia Montenegro, que revelam a deterioração das
relações entre o rei e o abade a partir de 1080, considera, como mais provável,
que o pacto se tenha realizado em 1103 ou 110518.
Last but not the least, refira-se a recente biografia de D. Teresa, dos
Professores Luís Carlos Amaral e Mário Barroca19. Aguardava com elevada
expectativa o seu lançamento, não só por ser o primeiro trabalho a levar em
conta o meu artigo sobre o pacto, mas também pelo reconhecido mérito dos dois
investigadores, o que me levou a evitar concluir o presente trabalho antes de
conhecer a sua obra. Inserida numa coleção direcionada para um público amplo,
não deixa por isso de ser muito rigorosa na identificação das fontes. Também,
no que se refere a estudos, representa o «estado da arte», com a inclusão na
bibliografia de mais de meia centena de trabalhos publicados desde o ano 2000.
Constitui assim um imprescindível guião para quem pretender estudar o período
do segundo condado portucalense e veio facilitar em muito o meu trabalho. No
que respeita ao pacto, estes Autores subscrevem a interpretação de Charles
Bishko, considerando que em 1105 estavam reunidas as condições para ele se
realizar20. Em resumo, mantem-se bem acesa a polémica em torno da datação
crítica do pacto, com propostas recentes que medeiam entre os anos de 1093 ou
1094, 1096 ou 1097, 1103, 1105 ou 1106.
1.3. O testemunho manuscrito
Ao longo desta investigação alimentei sempre a esperança que ainda pudesse
encontrar o manuscrito do pacto que foi publicado por Luc d'Achery. La Barre,
na edição de 1723, acrescentou uma nota marginal informando que os nomes dos
condes e do rei estavam referidos por siglas no manuscrito que serviu de base à
primeira edição21. Depois de La Barre, nenhum outro autor se referiu a esse
manuscrito. Na monumental coleção dos documentos de Cluny, o pacto aparece
registado de forma abreviada, citado do Spicilegium, sem cota arquivista, como
é norma desta coleção diplomática22. Por essa razão, Rui de Azevedo considerou
improvável que no fundo cluniacense se conservasse ainda o texto aproveitado
por d'Achery. Apesar disso, continuei a minha pesquisa no sítio da Gallica,
onde a Biblioteca Nacional de França tem vindo a colocar online muita
documentação. Foi com grande júbilo, como se pode calcular, que encontrei a
tradição manuscrita do pacto usada por Luc d'Achery. Consta de um volume de 583
folhas de papel, formando um in-folio, contendo cópias de cartulários e
originais da Abadia de Cluny, em parte da mão de Etienne Baluze e outras
colecionadas por ele23. O fólio que nos interessa é o que tem o número 470 e o
pacto ocupa apenas o lado frente. No canto superior esquerdo tem uma menção à
obra onde foi pela primeira vez impresso24. Segue-se o texto que conhecemos
(vd. Anexo_I), com algumas diferenças relativas às versões impressas, embora
sejam pouco significativas25. A única que importa aqui relevar é, precisamente,
a que diz respeito ao nome dos condes e do rei, que são referidos apenas por
siglas26.
Uma nota de rodapé, em francês, informa-nos que o autor da transcrição não
conseguiu identificar o rei nem os seus genros e deixa expressa a sua
estupefação pela pretensão de condes aspirarem a transformar-se em reis, não
alcançando o tempo histórico em que tal facto pudesse ter ocorrido27. Na
verdade, teremos de recuar até ao século XI, para encontrar uma epístola de
Gregório VII, datada de 28 de junho de 1077, em que o Papa se dirige
simultaneamente a reis e condes, implicando a ausência de uma hierarquia entre
essas categorias nos termos em que se viria a fixar mais tarde28. Esta
conjuntura irrepetível na história é a mesma a que pertence o pacto, onde
efetivamente um conde se propõe suceder a um rei.
O desdobramento das iniciais dos nomes dos condes e do rei só apareceu na
edição impressa, sem que se identificasse a operação como atualmente se exige
nos trabalhos paleográficos, pela colocação de parênteses retos29. De qualquer
forma, todos os autores que mostraram confiança na autenticidade do pacto,
grupo no qual também agora me passo a incluir, aceitaram a identificação dos
intervenientes, proposta pelo seu primeiro editor.
Logo a seguir à transcrição do texto do pacto, uma frase latina informa que o
documento foi recolhido numa lixeira entre outros documentos valiosos, ali
lançados por ignorantes que não sabiam interpretar o seu valor30. Segue-se o
nome (que penso ser a assinatura) de Anselme Le Michel e a menção ao ano de
164531. Este religioso beneditino da congregação de São Mauro e pilar da
primeira erudição maurista foi responsável pela constituição de um corpo
histórico da Ordem de São Bento e, em particular da Ordem de Cluny, em França.
Ele fez um reconhecimento muito completo das bibliotecas e dos arquivos de um
grande número de mosteiros. As suas notas, depois de servirem de base aos
trabalhos de D'Achery, de Mabillon, de Sainte-Marthe e de tantos outros, são
ainda uma mina abundante de informação sobre a história e a literatura da Idade
Média32. As transcrições de documentos efetuadas por Anselme Le Michel são
consideradas de muito boa qualidade do ponto de vista da restituição do
texto33.
Em 1645, Dom Anselme Le Michel visitou a biblioteca de Cluny e encontrou-a ao
abandono, tendo copiado muitos diplomas e tomado muitas anotações dos
manuscritos34. O pacto, ainda que não esteja expressamente referido, deve ter
sido incluído no rol dos documentos que tentou, sem sucesso, transportar da
abadia de Cluny à de Saint-Germain-des-Prés, os quais, na sua maior parte,
estão desaparecidos35. O sucedido, embora não esteja muito claro, envolve o seu
assistente Robert Jamet, acusado de roubo dos documentos36. Anselme Le Michel
deve ter morrido pouco tempo depois, em data que se desconhece. Quando Luc
d'Achery publicou o pacto em 1659, não teria outra informação do documento para
além do fólio que agora encontrei.
Estas informações, associadas à ausência de indícios linguísticos que traíssem
um falsário erudito do século XVII, levaram-me a reconsiderar a minha posição
sobre o pacto. Ao considerar, agora, que se trata de um documento histórico
verídico, impõe-se uma abordagem do problema da sua datação crítica.
1.4. A data crítica
Apesar de Rui de Azevedo ter atribuído ao pacto um intervalo de datação crítica
extraordinariamente largo, entre a chegada do conde D. Henrique à península em
1095 e a morte do conde D. Raimundo em 1107, vimos que, num trabalho recente,
István Szászdi León-Borja e Vitaline Correia de Lacerda propuseram uma data
anterior ao seu limite inferior. Por serem autores respeitáveis, poderíamos ser
tentados a dilatar ainda mais o intervalo crítico proposto por Rui de Azevedo.
Creio, contudo, que a carta que antecede o texto do pacto propriamente dito,
contém um pormenor, até aqui descurado, que permite restringir
significativamente o intervalo de datação crítica. Depois de se identificar o
destinatário - «Domino atque Reverentissimo Cluniacensi Abbati Hugoni, omnique
beati Petri Congregationi» - nela se refere os remetentes: «R[aimundus] Comes
eiusque filius [Alfonsus Raimundi], et H[enricus] Comes eius familiaris».
João Pedro Ribeiro viu nas referências a «filius» e a «familiaris», atribuições
protocolares diferenciadoras de Raimundo e Henrique perante o abade Hugo37.
Apesar de a sua argumentação ter sido aceite por quase todos os historiadores,
alguns não deixaram de mostrar alguma perplexidade perante tais designações.
Como nos refere Charles Bishko, não se encontram razões para o hipotético
tratamento protocolar que Raimundo se assaca perante Cluny38. Mais
recentemente, Armando Martins, refere também «a desconcertante titulação que os
dois condes se atribuem»39. Na minha opinião, a interpretação deste passo do
texto tem sido prejudicada pela sua pesada herança historiográfica.
Comecemos pelo termo «familiar». Não me parece que se deva entender aqui como
um estatuto de Henrique resultante das suas ações beneméritas perante Cluny.
Parece-me mais razoável entender familiar como sinónimo de parente. Os autores
da recente biografia de D. Teresa esclarecem as dúvidas que existiam sobre o
parentesco dos condes, identificando-os como primos afastados, pelo que o termo
me parece adequado40.
Também não se pode reconhecer «filho» como um estatuto especial de Raimundo
perante Cluny, que nunca o teve, e nem mesmo uma leitura atenta do texto latino
o permite41. Para figurar com o sentido de filho espiritual do abade Hugo,
exigiria também uma retórica que não se encontra aqui presente42. Tratar-se-á,
pois, de uma referência ao filho de Raimundo, D. Afonso Raimundes, opinião
partilhada pelos autores da monografia da condessa-rainha43. Não vejo razão
para suspeitar de um eventual problema de transmissão textual, apesar de o
menino não ter completado três anos quando o pai morreu44. Na verdade, é normal
os diplomas medievais aludirem a filhos menores. Como se pode ver no documento,
a referência ao filho é protocolar, aparecendo apenas no texto da carta que
antecede o pacto propriamente dito. Assente que se trata de uma referência ao
futuro Afonso VII de Leão e Castela, ela marca o terminus a quo do pacto a 1 de
março de 110545. O terminus ad quem mantém-se na data em que faleceu o conde D.
Raimundo, que deve ter sido a 20 de setembro de 110746.
É verdade que este intervalo temporal já tinha sido proposto pelo sábio
medievalista Pierre David há sessenta e cinco anos atrás47
. Mas ao retomá-lo, fizemo-lo numa base nova, a partir da crítica interna do
texto. Por outro lado, se até aqui já existia um amplo consenso de que o pacto
visava afastar Sancho da sucessão
de Afonso VI, podemos agora acrescentar que o nascimento de Afonso Raimundes
foi o trigger para a sua realização. Creio, pois, que encontrei o motivo a que
Andrès Gambra alude para congregar os condes na realização do pacto48. Seria na
sequência de tão auspicioso evento, que se realizaria o acordo amigável entre
os dois principais membros do «partido» pró-francês49.
2. O significado do pacto na conjuntura leonesa-castelhana
2.1. Os antecedentes que levaram à sua realização
Importa aqui recordar que o pacto procura antecipar o cenário político que
deveria suceder ao desaparecimento de Afonso VI. O processo relativo à sucessão
teria ficado inquinado quando, depois da morte da rainha D. Constança, em 1093,
ou provavelmente ainda em vida desta, a princesa muçulmana Zaida tornou-se
«amiga» de Afonso VI, e teve dele o infante D. Sancho. Com o posterior
casamento do rei com Zaida, em maio de 1100, convertida ao cristianismo e
batizada com o nome de Isabel, estava dado o primeiro passo para que o monarca
viesse a escolher Sancho como seu sucessor50. Mais tarde ou mais cedo, os dois
condes resolveram conspirar contra essa situação. Não fosse a datação crítica
interna que nos proporciona o texto do pacto e poderíamos remontar a sua
realização a esse ano de 1100 ou, então, a 1103, quando Sancho começa a
confirmar diplomas do seu pai51. Mas como entendo que a referência ao filho de
Raimundo no texto da carta que antecede o pacto não permite datá-lo antes de
1105, haverá que dar uma atenção especial à proposta de Charles Bishko. Este
Autor considerou que o pacto foi firmado entre 14 de maio e 22 de setembro de
1105. Apesar de numa nota, que acrescentou posteriormente na reedição do seu
trabalho, ter admitido que houve erro na datação do documento que se refere à
primeira das datas, Bishko manteve, no essencial, a sua datação crítica, no que
foi seguido, talvez de forma inadvertida, por muitos historiadores. Se não,
vejamos. Bishko considerou que o pacto não se podia ter realizado em 1106, por
o conde D. Raimundo já estar doente e por não encontrar evidência de o conde D.
Henrique se encontrar fora do seu condado, o que não tem suporte face às fontes
que foram publicadas após o seu trabalho, que mostram claramente que D.
Raimundo não deixou de confirmar documentos até ao mês em que morreu e que em
muitas dessas ocasiões o faz juntamente com D. Henrique em Sahagún, o local
favorito de permanência da corte52. Bishko considerou também que no ano de 1107
não se podia ter realizado o pacto, por Dalmácio Geret se encontrar na Borgonha
por volta de 13 de agosto de 1107. Na verdade, o documento que o coloca em
Berzé foi primeiramente publicado com data de «antes de 13 de agosto», sendo
posteriormente datado entre 22 de fevereiro e 13 de agosto, pelo que não se
pode excluir que, em 1107, o camareiro cluniacense pudesse vir a Espanha com a
incumbência de promover o pacto, ainda que se admita que a sua viagem se
realizasse preferencialmente nos meses de primavera e verão53. Dito isto, mesmo
que aceitasse as razões apresentadas por Bishko para a realização do pacto,
elas não permitem afastar a possibilidade de a sua realização ter ocorrido em
1106 ou 1107.
Não deixo, no entanto, de considerar muito frágil a reconstituição feita por
Charles Bishko. Este Autor considera que o pacto reflete um antagonismo entre
os dois condes borgonheses, ao mesmo tempo que reconhece que, para além do
pacto, o papel do conde D. Henrique na crise sucessória é apenas conjetural e
que a sua opinião contraria algumas autoridades como o Cardeal Saraiva,
Alexandre Herculano, Pierre David e Rui de Azevedo54. Para Bishko, a elevada
concentração de portugueses na doação ao mosteiro de Santo Isidro de Duenas de
30 de janeiro de 1105, seria um indício de um ato de conspiração para se
posicionar como herdeiro de Afonso VI, em confrontação direta, tanto com as
pretensões do rei relativas ao seu filho Sancho, como com as de Raimundo. O
documento em causa é uma cartula testamenti feita por sufrágio das suas
almas55. Nele se refere a doação dos dízimos da produção agropecuária das suas
possessões na Terra de Sanabria (Zamora) e de quatro igrejas em território
leonês-castelhano. Por agora, resta-me dizer que a sua elaboração pelo notário
régio Pelayo Erígez e a presença, entre o elevado número de quarenta e três
confirmantes, de três bispos, três abades, três priores, um conde e três
tenentes de terra, todos eles leoneses, e de próceres portugueses que se
encontram fora dos seus senhorios em pleno inverno, contribuíram para a
solenidade do ato.
2.1.1.Um documento inédito particularmente esclarecedor
Duas semanas antes, a 16 de janeiro de 1105, o conde D. Raimundo fez uma doação
ao Mosteiro de São João de Poio, que se situa junto a Pontevedra. Desta doação
tive conhecimento parcelar pelas obras de Prudêncio de Sandoval e de António
Yepes, mas sem referência ao paradeiro do documento56. Seria necessário
consultar a obra monumental de Antonio López Ferreiro para obter a vaga
referência que estava no Archivo Histórico Nacional57. Por sua vez, Xosé
Filgueira Valverde refere a existência de duas cópias do documento58. Ainda que
sem precisar a localização daquele que se encontra no Arquivo Nacional de
Espanha, informa que é uma cópia de letra do século XVI. Sem outros elementos
percorri a documentação que se encontra online no Portal de Archivos Españoles
(PARES) e, milagre da tecnologia, encontrei o documento inédito, de que obtive
impressão sem sair de casa59. Mas ovello profesor dá ainda a informação da sua
existência também no Archivo Arzobispal de Santiago. Comecei por contactar o
Archivo Histórico Diocesano de Santiago de Compostela, tendo o Sr. Damián Porto
Rico informado que parte dos documentos do antigo archivo arcebispal estão
atualmente no archivo catedralicio. Contactado o Archivo da Catedral de
Santiago, foi possível, pelos bons serviços do Doutor Xosé Sanchez, identificar
a cota atual do documento e uma deslocação do Porto a Santiago levou-me ao
encontro certeiro da segunda cópia do inédito documento60. Recordo que Bernard
Reilly o tinha dado como perdido61. Tive ainda o cuidado de verificar que não
se encontra na recolha dos documentos da Galiza de D. Urraca, nem é referido na
monografia da rainha62.
Creio que tanto o documento do Archivo da Catedral de Santiago como o do
Archivo Histórico Nacionalsão segundas cópias de uma transcrição do original,
realizada em 29 de Janeiro de 1301 pelo notário de Compostela Laurentius Petri.
A cópia do arquivo da catedral é figurada e, seguramente, a mais fiel ao
original perdido, enquanto a cópia existente no arquivo nacional revela
múltiplas intervenções modernas. Por esse motivo apresento no Anexo_II a
transcrição paleográfica da primeira, sinalizando contudo as variantes da
segunda, dado que não me parece que esta tenha sido obtida diretamente a partir
daquela63.
Ficamos deste modo a conhecer a cartula testamentique o conde D. Raimundo,
acompanhado da sua mulher D. Urraca e da filha Sancha, fizeram por sufrágio das
suas almas ao mosteiro beneditino de São João do Poio. Nela se refere um
importante património constituído por igrejas, herdades, salinas e a ilha de
Tambo. Era preciso uma motivação forte para se reunirem, em pleno inverno,
quarenta e quatro confirmantes, entre os quais três bispos, onze abades, dois
condes, seis juízes e outras personalidades religiosas e civis com cargos na
gestão do palácio e na administração do território da Galiza. Naturalmente,
muitos outros homens e mulheres participaram no evento e asseguraram a sua
logística, dos quais o diploma não nos informou. O documento também não nos
elucida da razão da data escolhida, mas seria tão óbvia para todos os presentes
na cerimónia que não precisava de ser registada na escritura e que, de alguma
forma, o evento não podia ser adiado para o tempo mais clemente da primavera.
D. Urraca estava no oitavo mês da gravidez de Afonso Raimundes que, como se
sabe, viria a nascer perto do mosteiro, em Caldas de Reyes64. Não posso deixar
de ligar a concessão deste privilégio ao nascimento do filho, como sendo a
expressão de um voto para um parto bem-sucedido. A única filha que tinham, de
que este documento é a primeira notícia que temos, devia ter então cerca de 10
anos65. O conde D. Raimundo devia ansiar pelo nascimento de um filho varão.
Creio ser essa a razão da invocação, na robora, de uma graça celeste66. Mas o
acontecimento não se esgotaria na componente religiosa. Ficaram também selados
importantes compromissos políticos, conforme se viria a manifestar mais tarde
num processo liderado pelo conde Pedro Froilaz de Trava e pelo prelado
compostelano D. Diogo Gelmires (as duas mais destacadas personagens que
confirmaram a doação ao mosteiro de Poio), que culminou com a coroação do
infante Afonso Raimundes como rei da Galiza no dia 17 de setembro de 1111, em
Santiago de Compostela.
Devo esclarecer que o meu interesse pelo documento do conde D. Raimundo resulta
da sua semelhança formal com o documento do conde D. Henrique, da aproximação
das datas entre os dois documentos e dos locais onde foram produzidos, que,
como notou Bernard Reilly, parecem inferidos no texto do pacto67. Da análise
sistemática dos confirmantes de ambos os documentos, feita no sentido de
formular uma interpretação credível do seu significado político, constato que
nenhum dos confirmantes de um dos documentos confirma o outro. Todavia, não
creio que daí se possa deduzir a existência de um antagonismo entre os condes
borgonheses, como inferiu Charles Bishko. Talvez a doação do conde D. Henrique
possa estar relacionada com o nascimento de uma das suas filhas, ou mesmo de um
filho que não tenha sobrevivido, pois D. Afonso Henriques não deve ter nascido
antes de 110668. Seja como for, uma hipotética conspiração do conde D. Henrique
contra D. Raimundo, como sustentou Bishko, seria extemporânea, sabendo-se que a
filha legítima de Afonso VI estava prestes para dar à luz. Não creio, portanto,
que o pacto tenha por base uma resposta a um desafio prévio de Henrique para a
posse de Leão e Castela.
2.2. A conjunção dos acontecimentos entre 1105 e 1107
Ora, o nascimento de Afonso Raimundes, a 1 de março de 1105, veio estabelecer
uma alternativa à sucessão do infante Sancho e a possibilidade, muito real, de
uma regência dominada por Raimundo em nome do neto legítimo de Afonso VI. Dado
a importância que se dava ao nascimento de um herdeiro masculino, o nascimento
do futuro rei Afonso VII deve ter tornado as relações mais tensas entre
Raimundo e Afonso VI e ajudado a precipitar os acontecimentos. Mas a reação
pode não ter sido imediata. Algum tempo haveria de passar antes de ser claro
que o recém-nascido iria sobreviver, dado que se estima que a taxa de
mortalidade no primeiro ano de vida era da ordem de um em cada quatro
nascimentos69.
É por isso que ainda vemos num documento de Afonso VI de 31 de março de 1105, o
infante Sancho a confirmar após o conde D. Raimundo70. Mas, a partir de
setembro de 1105, o filho de Afonso VI começa a figurar nos diplomas
imediatamente depois da rainha sua mãe e antes dos condes borgonheses; sinal
inequívoco de sua ascensão, ao menos de facto, à categoria de herdeiro71. O
infante Sancho volta a aparecer em 19 de março de 1106, numa concessão do seu
pai à igreja de Oviedo, feita em Sahagún72. É novamente em Sahagún que confirma
um documento particular a 18 de janeiro de 110773. Num documento da Catedral de
Astorga, datado de 14 de abril de 1107, o rei Afonso VI, referindo
expressamente estar acompanhado de sua mulher Isabel e do filho de ambos,
Sancho, concede uns foros aos povoadores de Riba de Tera e Valverde74.
Confirmam o documento, logo a seguir, o arcebispo de Toledo D. Bernardo, e os
condes Henrique e Raimundo. Um documento particular de São Salvador de Oña,
datado do dia 23 do mesmo mês, revela que Sancho já tinha recebido de seu pai o
comando oficial militar da fortaleza chave de Medinaceli, que Afonso VI tinha
conquistado em 110475. A 8 de maio de 1107, Afonso VI concede um diploma à
catedral de Toledo datado do castelo de Monzón. A fórmula de datação revela ter
sido executado pouco depois de uma cúria em Leão76. Como vinha acontecendo,
Sancho confirma o diploma imediatamente após a sua mãe. A confirmação dos dois
condes borgonheses e das suas mulheres dão-nos indicação que também devem ter
participado nessa reunião. Seis dias depois, Afonso VI concede ao bispo de
Santiago o privilégio de cunhagem de moeda. Os dois condes borgonheses e as
suas mulheres estão presentes a confirmar este documento em que, de uma forma
explícita, aparece a nomeação oficial de Sancho como herdeiro do trono77.
Podemos admitir que o recente concílio teve por principal finalidade o
reconhecimento de Sancho como o sucessor oficialmente designado do rei Afonso
VI. O infante deve ter atingido a maioridade, que naquela época era aos 14
anos.
É difícil estabelecer uma relação de causa e efeito destes acontecimentos com a
realização do pacto. A perspetiva de que a coroa fugisse ao «Partido Borgonhês»
inquietava a abadia de Cluny. Era aí que, nas palavras do grande historiador
Alexandre Herculano, «um velho monge influía então nos negócios mais graves da
Europa»78. As más relações de Afonso VI com o abade Hugo de Semur,
identificadas recentemente por Júlia Montenegro, ajudam-nos a entender melhor a
intervenção do abade em relação à crise sucessória, consubstanciada no «pacto
sucessório»79.
Os termos que o pacto propõe para o conluio dos condes enquadram-se no tipo de
autoridade e de governo da Borgonha, caracteristicamente feudais. Faz parte da
sua proposta de acordo que os condes deviam tomar Toledo, cidade onde Afonso VI
fora retirar o seu título imperial80. O abade Hugo pretendia dessa forma
alavancar os poderes de que os condes haviam sido investidos em resultado dos
seus casamentos com as filhas de Afonso VI, ponderados apenas pelo caráter
diferenciador decorrente de uma das infantas ser legítima e a outra não81. Se o
conde D. Raimundo via confirmado o seu direito de suceder a Afonso VI, o conde
D. Henrique assegurava uma posição olítica excecional. O conde D. Raimundo
chega mesmo a admitir a possibilidade de dar a Galiza ao conde D. Henrique,
caso não lhe pudesse dar Toledo, o que não era de todo descabido, face à ameaça
almorávide. Se o conde D. Henrique juntasse a Galiza ao Condado Portucalense,
ficaria na posse de todo o território administrado pelo conde D. Raimundo antes
da sua chegada à Península Ibérica. Mas a trama dos acontecimentos não seguiria
nesse sentido. Os recentes biógrafos de D. Teresa salientam o carácter
provisório da redação, tanto do pacto sucessório realizado pelos dois condes
borgonheses, como a do pacto de amizade realizado mais tarde pelas duas
filhas de Afonso VI, suas mulheres, como se os intervenientes tivessem
consciência da condição efémera dos convénios estabelecidos82.
2.3. As profundas alterações no cenário político que lhe sucederam
No que respeita ao pacto sucessório, que é o que agora nos interessa, uma
sucessão de mortes tornou-o rapidamente obsoleto. Em primeiro lugar, a já
referida morte de D. Raimundo, em Grajal, no dia 20 de setembro de 1107.
Inevitavelmente, a morte do conde envolveu grandes alterações no equilíbrio
político real do reino, e estas mudanças tiveram que ser abordadas formalmente.
Entre outubro e dezembro de 1107 realizou-se uma assembleia magna em Leão83. O
velho rei leonês estipula que o filho Afonso Raimundes ficaria com a Galiza se
a sua mãe voltasse a casar. O ato foi presenciado pelo arcebispo Guido de
Vienne, que em 1119 se tornaria no Papa Calixto II. É provável que ele tenha
sido convocado para ajudar a proteger os interesses do seu sobrinho84.
É possível que na mesma ocasião ou no início do ano seguinte, o rei tenha
colocado nas mãos do jovem infante Sancho o governo de Toledo, pois é a ele que
o rei confia o comando da expedição enviada em socorro de Úcles85. No decurso
da batalha travada a 29 de maio de 1108 o infante encontra a morte. A reação de
Afonso VI ao funesto evento não deve ter sido muito diferente das palavras que
o arcebispo de Toledo Don Rodrigo Jiménez de Rada colocou na boca do rei:
«Dónde está mi hijo, la alegría de mi vida, el consuelo de mi vejez, mi único
heredero?». O rei autoritário que se assumiu ao longo da vida como
representante de Deus na luta contra os infiéis, encontrava-se agora velho e
acompanhado da doença que o havia de conduzir à morte86.
Em 22 de fevereiro de 1109, a infanta Urraca doa ao abade Hugo o mosteiro
galego de São Vicente de Pombeiro, seguindo o conselho do seu pai87. Depois de
gorado o seu plano de sucessão hostil a Cluny, o rei soçobrava e procurava
agora uma reaproximação de forma a obter o reconhecimento e aceitação da
infanta como sua sucessora e herdeira. O Abade Hugo deve ter ficado satisfeito
com o inesperado volte-face que acabaria por colocar no trono a sua sobrinha-
neta.
Quem veria frustradas as suas espectativas seria o conde D. Henrique, que
perdia as vantagens prometidas no pacto, agora caduco. O Autor da Primeira
crónica anónima de Sahagún, relata o sucedido88:
«poucos dias antes que o rei [D. Afonso VI] falecesse, não sei porquê
(sem dúvida por desconhecer o pacto e as aspirações que ele tinha
gerado na mente do conde D. Henrique), intervindo discórdia e sanha,
[D. Henrique] afastou-se com a ira do rei».
O Professor José Mattoso considera que esta notícia dá a informação da rutura
do vínculo de fidelidade de Henrique para com Afonso VI89. E continua o Autor
Anónimo:
«E por esta razão, quando o rei estava a morrer e dispunha sobre a
sucessão do reino, este conde não estava presente, pois sendo do
reino afastado, atravessou os montes Pireneus para obter ajuda dos
franceses, com os quais, fortalecido e esforçado, esperava tomar o
reino de Espanha pela força».
Apesar da opinião em contrário de Henrique Barrilaro Ruas, o conde D. Henrique
deve ter colocado na «agenda» de Afonso VI o problema da sucessão90. Percebe-se
no texto transcrito a referência a França por oposição aos interesses da
aristocracia hispânica. A viagem do conde D. Henrique, cujo destino talvez
fosse a abadia de Cluny, deve ter sido iniciada depois de 22 de maio de 110991.
Se, de facto, chegou a atravessar os Pirenéus, já não se encontrou com o abade
Hugo, pois este tinha falecido a 28 de abril desse ano. Também não mais
voltaria a ver o seu sogro, que morreu em 1 de julho de 1109. No dia seguinte
ao enterro do rei em Sahagún, a 22 de julho, D. Urraca emite em Leão o seu
primeiro diploma como rainha92. Entre os confirmantes encontra-se o arcebispo
de Toledo D. Bernardo de Sauvetat. É provável que, uma semana depois, o conde
D. Henrique, regressado recentemente da sua viagem, se tenha encontrado em Leão
com D. Bernardo para a feitura do documento de doação do mosteiro de S. Mamede
do Lorvão à Sé de Coimbra93. Com arrojo, sentencia que nem rei nem conde a
poderiam anular94
.
Estribado no apoio do arcebispo cluniacense e primaz das Espanhas, que lhe
conferia um reconhecimento notável da sua autoridade, não encobre as suas
aspirações de independência. O conde D. Henrique, que antes declarava que
recebera a terra portugalense do rei, seu sogro, considera agora que a
legitimidade do seu poder provém de Deus95
. Segue para Viseu onde os nobres, o clero e os cavaleiros de Viseu confirmam o
documento
96. Daí, parte para Coimbra para a realização da cerimónia solene, in loco,
sobre o altar da catedral97. Congrega agora no ato os nobres, o clero e os
cavaleiros de Coimbra. Torna-se evidente o caráter extraordinário desta doação
e o seu significado político. São os primeiros alvores, ainda incertos, da
aurora na nacionalidade
COMO CITAR ESTE ARTIGO
Referência electrónica:
ESTEFÂNIO, Abel ' Proposta de aclaração do pacto sucessório à luz de novos
dados.http://www2.fcsh.unl.pt/iem/medievalista/MEDIEVALISTA16\
Data recepção do artigo: 31.Outubro.2013
Data aceitação do artigo: 17.Janeiro.2014
Notas
1
Estefânio, Abel ' O pacto sucessório' revisitado: o texto e o contexto.
Medievalista [Em linha]. Nº 10 (Julho de 2011). [Consultado 07.06.2013].
Disponível em:http://www2.fcsh.unl.pt/iem/medievalista/
MEDIEVALISTA10\estefanio1002.html
2
Uma síntese desta parte do trabalho foi apresentada numa comunicação ao 5º
Congresso Europeu de Estudos Medievais realizado na Faculdade de Letras da
Universidade do Porto, de 25 a 29 de Junho de 2013: Do segredo ao esquecimento
e da descoberta à perda: o que resta do célebre pacto sucessório'?. inSegredo
e descoberta na Idade Média. Programa, resumos e caderno. Porto: Faculdade de
Letras da Universidade do Porto, 2013, pp. 105-107.
3
Azevedo, Rui de (ed.) -Documentos Medievais Portugueses, Documentos Régios.
Lisboa: Academia Portuguesa de História, 1958-1962, 2 vol., t. I, DR, doc. 3 de
1096, doc. de 1101, doc. 68 de 1124, doc. 120 de 1131, doc. 288 de 1165 e doc.
279 de 1271.
4
Gambra, Andrès - Alfonso VI, cancillería, cúria e império. 2 vols.. León:
Centro de Estudios San Isidoro, 1997, tomo 2: o falso «Pelagius episcopus Leone
fiat», doc. 81, datado de 1085 mas em cópia da primeira metade do século XII, o
suspeito (Bernard Reilly considerou-o mesmo um falso óbvio): «renante in Toleto
et in Leone et in Galizia et tota urbis Castella», doc. 85, datado de 1086 mas
em cópia de finais do século XII e a reformulação posterior: «Regnate Adefonsso
rege in Toletum et in Leon», doc. 134 de 1095, reformulado em 1148.
5
Ruiz Albi, Irene (ed.) - La Reina Doña Urraca (1109-1126): Cancillería y
colleci?n diplomática. Le?n: Centro de Estudios San Isidoro, 2003, doc. 106:
«Regnante regina donna Urraka in Leone et in Castella et in Gallecia».
6
Uma pesquisa na base de dados em linha Cartae Cluniacenses Electronicae (CCE)
dos 5500 diplomas de Cluny (802-1300), da Universidade de Münster (disponível
emhttp://www.uni-muenster.de/Fruehmittelalter/Projekte/Cluny/CCE/Welcome-
e.htm), revelou os seguintes resultados:
Formas a partir de Legio (37): Legione (16), Legionem (2), Legionense (1),
Legionensem (1), Legionensi (4), Legionensis (12) e Legionis (1).
Formas a partir de Leone (4): Leonensis (1), Leonum (1), Leone (1) e Leon (1),
tal como nos aparece no pacto, mas apenas num documento em castelhano datado de
1286.
7
FERNANDEZ Catón, José Maria - «Index verborum» de la documentación medieval
leonesa: Archivo de la Catedral de León (775-1300). León: Centro de Estudios
San Isidoro, 2002,tomos III e IV: em 17 de novembro de 944 «de termino de
calcata que discurrit ad Legion» e em 1 de abril de 911 «in territorio que
cognominantur Leon».
8
Castán Lanaspa, Guillermo; CASTÁN LANASPA, Javier (ed.) - Documentos del
Monasterio de Santa Maria de Trianos (siglos XII-XIII). Salamanca: Ediciones
Universidad de Salamanca, 1992, doc. 1 de 30 de Junho de 1111, cujo original
está bem conservado e legível, mas com algumas roturas que impedem a leitura de
algumas palavras: «Episcopus in terra de Leon, in sedis Sancte Marie
Leonensis» e «Pero Diez mau in terra de Leon».
9
Menéndez Pidal, Ramón - Orígenes del español, Estado linguístico de la
Península Ibérica hasta el siglo XI. 4ª ed. Madrid: Espasa-Calpe, 1956, pp.
186, 188 e 307.
10
Alguns exemplos desse equívoco:
«filii nostri Castellae, Leonis et Aragonum rex et regina», Bula de Sixto IV,
de 16 de Outubro de 1483, in Diario de sesiones de las cortes generales y
extraordinárias. Tomo VI. Madrid, 1870, p. 4393,
«Carolus Dei gratia, rex Castellae, Leonis, Arragoniae» (Espen, Zeger Bernard
van ' Commentarius in canones et decreta juris novi et in juris novissimum.
Lovanii, 1753, p. 361),
«Hispaniae Reges Legionis vel Leonis» e «Regum Leonis sive Legionis» (Lopez de
Palatios Ruuios, Juan - Repetitio Rvbricae et cap. Per vestras , Lvgdvni,
1576, p. 581),
«Alfonso Regi Leonis, Castellam» e «Ferdinando Castellae & Legionis
Principi» (Bruggen, Joannes Gualtherus del - Vnio divinae et hvmanae domus.
Antverpiae, 1669, p. 71),
«Philipii IV. Titulus fuit: Philippus DEI Gratia Rex Castiliae, Leonis, » e [de
Carlos V] «Rex Germaniae, Castiliae, Aragonum, Legionum, » (BACMANN, Johann
Christoph - Notitia dignitatum illustrium civilium, sacrarum, eqvestrium. 2ª
ed., Academia Francofurtana, 1677, pp. 61 e 62).
11
Encontra-se devidamente discriminada em «Alphonsus rex Legionis» e «arma regia
mixta sunt ex Castellis & Leonibus», (SCHOTTUS, Andreas; PISTORIUS, Johann;
SCHOTTUS, Franciscus Schottus - Hispaniae Illvstratae. Francofvrti, 1603, tomo
I, p. 282), mas é natural que nem sempre assim acontecesse.
12
Achery, Luc d' - Veterum aliquot scriptorum qui in Galliae bibliothecis,
maxime Benedictinorum, latuerant, Spicilegium opera et studio D. Lucae
d'Acheri[ ]. Parisiis: apud C. Savreux., 1659, t. III, pp. 122-123 e Aguirre,
Joseph Saenz de - Collectio máxima conciliorum omnium Hispaniae et Novi Orbis.
Roma: Jacobi Komarek Bohemi, 1694, tomo III, p. 305.
13
Bishko, Charles Julian ' Count Henrique of Portugal, Cluny and the
antecedents of the «Pacto Sucessório». in Revista Portuguesa de História. 13
(1971), pp. 155-188. Reedição com nota adicional in Spanish and portuguese
monastic history: 600-1300. London, Variorum Reprints, 1984, IX, pp. 166-167.
14
Reilly, Bernard F. - The Kingdom of León-Castilha under King Alfonso VI, 1065-
1109. Princeton: Princeton University Press, 1988, p. 252.
15
Martínez Díez, Gonzalo - Alfonso VI, señor del Cid, conquistador de Toledo.
Madrid:Temas de Hoy, 2003, p.170 e Portela SILVA, Ermelindo ' Galicia después
del reino de Galicia. Conferência apresentada ao Colóquio D. Afonso Henriques:
em torno da criação e consolidação das monarquias do ocidente Europeu
(Faculdade de Letras de Lisboa, 14-16 de Dezembro de 2009). Texto cedido
amavelmente pelo autor.
16
Szászdi León-Borja, István; LACERDA, Vitaline Correia de ' El Conde de
Portugal D. Henrique: ambición y lealtad. [em linha]. Estudios de Historia de
España, 12(2), 2010, pp. 527-528 e nota 19. [Consultado 29.09. 2012].
Disponível em: http://bibliotecadigital.uca.edu.ar/repositorio/revistas/conde-
portugal-henrique-ambicion-lealtad.pdf.
17
Montenegro, Julia ' La crisis sucesoria en las postrimerías del reinado de
Alfonso VI de León y Castilla: el partido Borgoñón [em linha], Estudios de
Historia de España, 12(2), 2010. Vd. p. 376, nota 16 e p. 385. [Consultado
29.09.2012]. Disponível em: http://bibliotecadigital.uca.edu.ar/repositorio/
revistas/crisis-sucesoria-postrimerias-reinado-alfonso.pdf.
18
Martins, Armando ' Cluny e a formação de Portugal. in A Idade Média
Portugusesa e o Brasil: reminiscências, transformações, ressignificações. Porto
Alegre: Vidráguas, 2011, pp. 79-92 e, em especial, a p. 89.
19
Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge ' A condessa-rainha Teresa. S.l.:
Círculo de Leitores, 2012.
20
Ibid., p. 159, nota 3.
21
Achery, Luc d' - Spicilegium sive collectio veterum aliquot scriptorum qui in
galliae bibliothecis delituerant. Cura L. F. J. de la Barre (ed.), Paris: apud
Franc. Montalant, 1723, t. III, p. 418: «In exemplari quo usus est Dacherius,
nomina horum Comitum et Regis signantur tantum per primas litteras». Rui de
Azevedo (AZEVEDO, Rui de - Documentos Medievais Portugueses, Documentos Régios.
II, nota II, pp. 547-553) transcreve esta nota, mas não a comenta. O único
comentário relativo a essa nota que encontrei, ainda que colocado de forma
despiciente, foi o feito por Frei Manuel de Figueiredo (FIGUEIREDO, Manuel de -
Origem verdadeira do conde D. Henrique. Lisboa: Oficina Patriarcal de Francisco
Luiz Ameno, 1789, p. 35, nota 2): « as iniciais H. e R. , ainda que fosse
verdadeiro o documento, tanto podia dizer Raymundo de Tolosa, como de Galliza».
22
BRUEL, Alexandre ; BERNARD, Auguste (ed.) - Recueil des chartes de l'abbaye de
Cluny. Paris : Imprimerie Nationale, 1894, t. V, p. 27, nº 3673.
23
Recueil de Chartes de Cluny [Em linha], Bibliothèque Nationale de France,
Département des manuscrits, Coleção Baluze nº 86, f. 470, (12/03/2012).
[Consultado 07.06.2013]. Disponível em: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/
btv1b9001316h/f335.image.r=chartes%20cluny.langPT.
24
«Edita to. 3. Spicilegii pag. 122.».
25
O passo impresso «atque adquirere praeparatus occurram» resulta de uma
correção erudita da expressão menos elegante do manuscrito «atque occurrere
praeparatus occurram». Também, por consulta do manuscrito e da edição de 1659,
foi possível confirmar que o erro em «conjucti» em vez do correto «conjuncti»
apontado por Rui de Azevedo, apenas acontece na edição de 1723. Por sua vez,
Rui de Azevedo omite o «ejus» na expresão «Henricus Comes ejus familiaris», que
consta tanto no manuscrito como nas edições de 1659 e 1723. O abade Hugo
aparece no manuscrito com o vocativo «Karissime», tendo o «K» sido substituído
por «C» em todas as versões impressas.
26
Na primeira vez em que é nomeado, Afonso VI, aparece identificado pelas
iniciais «AL» e nas vezes seguintes com as iniciais «IL». Na edição de 1659
estas iniciais foram sempre substituídas por «Ildephonsi» (com «ph»), enquanto
na edição de 1723 temos na primeira vez «Aldefonsi» (com «f») e nas seguintes
«Aldephonsi» (com «ph») (Achery, Luc d' ' Spicilegium. 1723, t. III, p. 418).
No desdobramento do nome do rei Afonso evidencia-se uma intervenção moderna, na
opção pelo grupo «ph» em vez do medieval «f», segundo a lição de A. Bruel
(BRUEL, Alexandre; BERNARD, Auguste (ed.) - Recueil des chartes de l'abbaye de
Cluny. Paris: Imprimerie Nationale, 1894, t. V, doc. 4072, pp. 423-425). Note-
se que «Alfonsus» é já, por si, uma abreviação hispânica de «Ildefonsus» e que
o pacto não é o único documento em que as duas formas se encontram em
diferentes lugares do mesmo texto (Pallares, Maria del Carmen; PORTELA,
Ermelindo ' La reina Urraca. San Sebastián: Editorial Nerea, 2006, p. 195, nota
91: « regem Ildefonsus de Aragona. rex Aldefonsus de Aragon »). Por sua
vez, os condes Henrique e Raimundo aparecem no manuscrito apenas pelas iniciais
«H» e «R», respetivamente.
27
«Il ny a pas encore longtemps que les Roys de Castella ne rapelloyent que
comtes Castella».
28
Montenegro, Julia ' La alianza de Alfonso VI com Cluny y la abolición del
rito mozárabe en los reinos de León y Castilla: una nueva valoración.
inIacobus: revista de estúdios jacobeos y mediavales. Sahagún, nº 25-26 (2009),
p. 50: «regibus, comitibus, ceterisque principibus Hyspanie».
29
À versão impressa foi ainda acrescentado o título «RAIMVNDI Gallæciæ, &
HENRICI Portugalliæ Comitum, HVGNI Abbati Cluniacensi» e a nota «Mittut exeplar
fderis amicitiæ inter se initæ, & pactorum de partienda successione soceri
sui Alphonsi, Castellæ ac Legionis Regis».
30
«Apud cluniacum collegit ex sterquilinio in quod cum alys huiusmodi
sacrosanctae vetustatis reliquiis magno numero, fuerat proiectum ab imperitis».
31
«f[rater] Anselmus Le Michel anno 1645».
32
Delisle, Léopold Victor -Le cabinet des manuscrits de la Bibliothèque
impériale. Hildesheim : G. Olms, 1868, volume 2, p. 138.
33
Noizet, Hélène ' La transmission de la documentation diplomatique de Saint-
Martin de Tours antérieure à 1150. in Histoire et archives. 17 (2005), pp. 7-
36.
34
Stratford, Neil ' Jean Mabillon et Cluny. in Comptes-rendus des séances de
l'Académie des Inscriptions et Belles-Lettres. Vol. 151, no 4 (23 de novembro
de 2007), pp. 1597-1604 e p. 1780.
35
Gasnault,Pierre' Dom Anselme Le Michel et les manuscrits de l'abbaye de
Cluny. in Bibliothèque de l'École des Chartes. Vol. CXXXI, nº 1 (1973) pp.
209-219 ; Delisle, Léopold - Inventaire des manuscrits de la Bibliothèque
Nationale. Fonds de Cluny. Paris : H. Champion, 1884, pp. 383-396.
36
Barret, Sébastien - La mémoire et l'écrit: l'abbaye de Cluny et ses archives
(Xe-XVIIIe siècle). Mu¨nster : Lit, 2004, p. 27.
37
Ribeiro, João Pedro- Dissertações Cronológicas e críticas. Lisboa: Academia
Real das Sciencias de Lisboa, 1857, t. III, pp. 45-48 (1ª ed. 1813).
38
Bishko, Charles Julian ' Count Henrique of Portugal, Cluny and the
antecedents of the «Pacto Sucessório». in Revista Portuguesa de História. 13
(1971), p. 180.
39
Martins, Armando ' Cluny e a formação de Portugal. in A Idade Média
Portugusesa e o Brasil: reminiscências, transformações, ressignificações. Porto
Alegre: Vidráguas, 2011, p. 88.
40
Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge ' op. cit., pp. 50-51.
41
«Raimundus Comes eiusque filius», que se deve ler «o conde D. Raimundo e seu
filho». OPadre Enrique Flórez (Flórez, Enrique - Memorias de las reynas
catholicas. Madrid: en la oficina de la viuda de Marin, 1790, t. I, pp. 234-
235) duvidou da legitimidade deste pacto, que teve conhecimento pela edição do
Cardeal Aguirre, considerando que «vemos allí à Don Ramon mencionando à su
hijo», não entendendo de que filho se tratava, pois que o único conhecido,
Afonso Raimundes, só nasceu em 1105 e o pacto aparece nessa edição datado de
1093.
42
Veja-se, por exemplo, as duas cartas que o imperador do Sacro Império Romano-
Germânico Henrique IV escreveu em 1106, quiçá o ano do pacto, ao seu
«queridíssimo pai» o abade Hugo de Cluny, pedindo as suas orações e a sua
interseção na disputa que tinha com a Santa Sé: «H[enricus], Dei gratia
Romanorum imperator augustus, clarissimo atque dilectissimo p[atr]i H[ugoni] et
universis sanctis fratribus Cluniacensis cenobii dulcem filii affectum ac
devotum fratris, immo servi obsequium » (Paris, BNF, lat. 11826 n° 4) e «H
[enricus], Dei gratia Romanorum imperator augustus, U[goni], venerabili
Cluniacensi abbati, quicquid licet peccator, tamen spiritalis filius devotius
et humilius suo desiderantissimo et dilecto spiritali patri » (Paris, BNF, lat.
11826 n° 7).
43
Veja-se a tradução do latim para português do texto do pacto feita pelo Prof.
Doutor Manuel Francisco Ramos, em Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge '
op. cit., pp. 331-332.
44
Flórez, Enrique - España sagrada. Madrid: M. F. Rodriguez, 1766. Vol. 20:
História Compostelana, cap. 46, p. 95 «Hic Rex cum ejus generum Consulem
Raimundum à visione praesentis lucis fata funditos subduxissent, & ejus
filius, qui adhuc trienii tempus nequaquam expleverat, ».
45
Conf. Reilly, Bernard F. - The Kingdom of León-Castella under Queen Urraca
(1109-1126). Princeton: Princeton University Press, 1982p. 45, nota 2: Os
«Anales toledanos» referem a sua data de nascimento a 1 de Março de 1106 (HUICI
MIRANDA, Ambrosio (ed.) ' Las crónicas latinas de la reconquista. 2 vols.
Va1encia: Estab. Tip. Hijos de F. Vives Mora, 1913, vol. 1, p. 344); FLÓREZ,
Enrique ' Memorias de las reynas catholicas de España. Madrid: por Antonio
Marín, 1761, tomo 1, pp. 234-235, corrige a data para 1105; esta data é seguida
por SÁNCHEZ BELDA, L. (ed.) ' Chronica Adefonsi Imperatoris. Madrid: CSIC,
1950, p. 5, n. 2. Mais recentemente, a data foi aceite por Amaral, Luís Carlos;
BARROCA, Mário Jorge ' op. cit., p. 372.
46
Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge - op. cit., p. 50.
47
David, Pierre ' Le pacte succéssoral entre Raymond de Gallice et Henri de
Portugal. inBulletin Hispanique. Bordeaux: Faculte dês Lettres, tomo L (1948),
p. 290.
48
Gambra, Andrès - op. cit., tomo 1, p. 437: «Aquellos personajes debieron
formar en el marco 'Palatium regis´ un clan restringido, con intereses
familiares y políticos bien diferenciados y dispuestos, llegado el caso, a
apoyarse mutuamente según se deduce del enigmático texto conocido como el
´pacto sucessório´».
49
A sugestiva expressão é do Professor José Mattoso (MATTOSO, José ' D. Afonso
Henriques. Lisboa: Temas e Debates, 2007, p. 31) e de algum modo seguida por
Júlia MONTENEGRO no título do seu artigo La crisis sucesoria en las
postrimerías del reinado de Alfonso VI de León y Castilla: el partido Borgoñón
(in Estudios de Historia de España. Vol. XII, Tomo 2, 2010, pp. 369-388).
50
É pela autoridade do Bispo Paio de Oviedo que somos informado de Zaida que
«babtizata Helisabeth fuit vocitata» (Sánchez Alonso, Benito (ed.) - Crónica
del Obispo Don Pelayo. Madrid: Imprenta de los Sucesores de Hernando, 1924, p.
87). A rainha Isabel, que aparece mencionada em documentação régia fiável entre
1101 e 1107, seria realmente a princesa Zaida, mãe de Sancho Alfónsez (Amaral,
Luís Carlos e Mário Barroca, op. cit., p. 58).
51
Gambra, Andrès - op. cit., tomo 2, Docs.: 169 ([1102-1103], janeiro, 17), 170
(1103, janeiro, 25), 171 (1103, fevereiro, 10), 173 (1103, maço, 23), 174 (
[1103], abril, 23, suspeito), 175 (1103, maio, 6), 176 (1103, junho, 22), 178 (
[1103], dezembro, 12).
52
Entre 1105 e 1107, os dois condes encontram-se a confirmar documentos num
número muito significativo de ocasiões. Sem pretender ser exaustivo, refira-se
cinco documentos da chancelaria de Afonso VI e dezassete documentos do Mosteiro
de Sahagún, respetivamente: Gambra, Andrès - op. cit., tomo 2: 183 (1105,
junho, 1), 184 (1105, setembro, 22), 185 (1106, março, 19), 188 (1107, maio,
8), 189 (1107, maio, 14); Herrero de la Fuente, Marta (ed.) - Colección
Diplomática del Monasterio de Sahagún. Tomo III. Leon: Centro de Estudios e
Investigacion San Isidoro, 1988: 1123 (1105, junho), 1124 (1105, junho, 2),
1127 (1105, setembro, 11), 1128 (1105, dezembro, 13), 1129 (1105, dezembro,
13), 1132 (1106, janeiro, 10), 1133 (1106, janeiro, 12), 1134 (1106, janeiro,
16), 1135 (1106, janeiro, 22), 1137 (1106, fevereiro, 19), 1139 (1106, março,
4), 1145 (1106, junho, 10), 1149 (1106, novembro, 7), 1150 (1107, janeiro, 18),
1153 (1107, junho, 12), 1154 (1107, julho, 27), 1156 (1107, agosto, 7) e 1157
(1107, agosto, 27).
53
BRUEL, Alexandre; BERNARD, Auguste (ed.) - Recueil des chartes de l'abbaye de
Cluny. Tomo V, 1894, doc. 3862: «1107, avant le 13 août». David, Pierre ' Le
pacte successoral entre Raymond de Galice et Henri de Portugal. in Bulletin
Hispanique. Tomo 50, nº3-4 (1948), p. 284, nota 4 refere que Dalmácio Geret se
encontra em Berzé a confirmar um diploma de Guilherme II de Mâcon, datado do
oitavo ano do papa Pascal II, sendo que o nono ano começou a 13 de agosto de
1107; os outros dados cronológicos aplicam-se ao ano de 1107. Cf. Wischermann,
Else Maria - Marcigny-sur-Loire. München: Fink, 1986, p. 409, que cita um
estudo de H. Diener datado de 1959 no qual se atribui ao documento (Cluny, doc.
3862) a data crítica entre 22 de fevereiro e 13 de agosto de 1107.
54
Bishko, Charles Julian - op. cit., pp. 173-174.
55
Documento de 30 de Janeiro de 1105, publicado por Bishko, Charles Julian '
Count Henrique of Portugal, Cluny and the antecedents of the «Pacto
Sucessório». in Revista Portuguesa de História. 13 (1971), pp. 155-188.
56
SANDOVAL, Prudêncio de - Antigüedades de Túy. Braga, 1610, f. 109r-v e
Historia de los reyes de Castilla y de León. Pamplona, 1634, f. 95r-v. YEPES,
Antonio de, A, Crónica General de la Orden de San Benito. Estudio preliminar y
edición por Fr. Justo Pérez de Urbel. Madrid: Biblioteca de Autores Españoles,
1959-1960, n. 43, t. II, pág. 305.
57
López Ferreiro, Antonio - História de la Santa A. M. Iglesia de Santiago de
Compostela. Santiago: Imp. y Enc. del Seminario Conciliar Central, 1900, t.
III, p. 288, nota 2: «Documentos procedentes de San Juan de Poyo en el Archivo
Histórico Nacional. - Yepes, Corónica , t. V, al año 942, f. 61».
58
Filgueira Valverde, Xosé - Tiempo y gozo eterno en la narrativa medieval: la
cantiga CIII.Vigo: Edicio´ns Xerais de Galicia, 1936, p. 110: «en 16 de enero
de 1105 confirma com el título de maiordomus super mensam' la donación de coto
hecha por los Condes al monasterio de Poyo» e, pela nota 279, ficamos a saber
da existência de uma cópia do documento no «Archivo Arzobispal de Santiago,
«Docs. Varios», t. I, ff. 19 a 47», para além da outra em «Docs. Del Monasterio
de San Juan de Poyo. Inéditos. Copias de letra del s. XVI».
59
Archivo Histórico Nacional: Clero-Secular/Regular, L.10319, «Libro único de el
merino de el coto y su jurisdicción» do «Monasterio de San Xoán de Poio», f.
118 na numeração antiga e 126 na numeração nova.
60
Novás Pérez, Maria Elena - Catálogo de la Colección de Tomos de Varia
(primeira serie) del Archivo-Biblioteca de la Catedral de Santiago de
Compostela. Santiago de Compostela, 2006, pp. 13-14, sig.: IG 703/4 (fols. 19-
41 del vol.) post. 1560 (sine loco): «Tralado de privilégios del monasterio de
San Juan de Poyo de la ordem beneditina realizado por los notários Fernando de
Rosende y Diego Suárez de Pazo». Inclui a doação de Raimundo de Borgonha nos
ff. 39r-40r do volume.
61
Reilly, Bernard F. - The Kingdom of León-Castilha under King Alfonso VI, 1065-
1109. Princeton, Princeton University Press, 1988, p. 320, nota 76.
62
Recuero Astray, Manuel (dir.) - Documentos medievales del reino de Galicia:
Doña Urraca (1095-1126). Santiago de Compostela: Xunta de Galicia, 2002, e
Pallares, Maria del Carmen; PORTELA, Ermelindo - La reina Urraca. San
Sebastián: Editorial Nerea, 2006, respetivamente.
63
O documento aqui transcrito, de forma a tornar mais acessível o conjunto dos
passos dados para resolver os problemas suscitados pelo estudo do «pacto
sucessório», foi, posteriormente à redação deste artigo, publicado em
ESTEFÂNIO, Abel ' Um documento significativo para a história da Galiza, in
Annuarium Sancti Iacobi, Archivo-Biblioteca de la Catedral de Santiago, nº 2
(2013), pp. 17-30.
64
Cfr. SANDOVAL, Prudêncio de - Historia de los reyes de Castilla y de Leon.
Madrid: Benito Cano, 1792, p. 320: «Y el Arzobispo Don Rodrigo en el lib. 6
cap. 34 dice, en estos dias criaba en Galicia el Conde Don Pedro de Trava al
Infante Don Alonso, hijo pequeño del Conde Don Ramon y de Doña Urraca, donde
habia nacido en un lugar que llamaban Caldas de Rey, cerca del Monasterio de
San Juan del Poyo y de Pontevedra, y en la costa del mar Océano».
65
A filha Sancha teria nascido entre 1094 e 1095, cfr. Amaral, Luís Carlos;
BARROCA, Mário Jorge ' op. cit., p. 50.
66
Conf. Anexo II: «Ego Comes Raimundus celestis gratia conpuctus in hunc
testamentum meo iussu factum manu mea confirmo».
67
Reilly, Bernard F. - The Kingdom of León-Castilha under King Alfonso VI, 1065-
1109. Princeton: Princeton University Press, 1988, p. 252: «The proper
inference is that Raymond will likely be far away in Galicia and that Henry
will be in León and in a position to seize the initiative».
68
Estefânio, Abel ' A data de nascimento de AfonsoI. Medievalista [Em linha].
Nº 8 (Julho de 2010). [Consultado 13.09.2013]. Disponível em: http://
www2.fcsh.unl.pt/iem/medievalista/MEDIEVALISTA8\estefanio8002.html
69
Cfr. Reilly, Bernard F. - The Kingdom of León-Castilha under King Alfonso VI,
p. 338.
70
Gambra, Andrès - op. cit., t. 2, doc. 182. O conde D. Henrique, que
habitualmente confirma após o conde D. Raimundo, está ausente neste documento.
71
Ibid., doc. 184 (1105, setembro, 22).
72
Idem, doc. 185.
73
Herrero de la Fuente, Marta - Coleccion Diplomática del Monasterio de Sahagún
(857-1230).Vol. III(1073-1109). León: Centro de Estudios e Investigacion San
Isidoro, 1988, doc. 1150.
74
Salazar y Acha, Jaime de ' De nuevo sobre la mora Zaida, Hidalguia. Nº 321
(2007), p. 241, citando Gregoria CAVERO DOMÍNGUEZ e Encarnación MARTIN-LÓPEZ -
Colección Documental de la Catedral de Astorga. I (646-1126) e II (1126-1299).
Léon: Centro de Estudios e Investigacion San Isidoro, 1999, I, 534, p. 397:
«cum uxore mea Elisabet et filio nostro Sancio».
75
Documento original de 23 de Abril de 1107. AHN, Clero, Carpeta 272, no 9;
publicado por Alamo, Juan del (ed.) - Colección diplomática de San Salvador de
Oña. Madrid: CSIC, 1950, tomo I, doc. nº 128, pp. 163-164,: «regnante rege
Adefonso in Toleto et in Leione et in omni regno Yspanie. Santius filius eius
in Medina».
76
Gambra, Andrès - op. cit., t. 2, doc. 188: «post celebratum concilium apud
Legionem».
77
Ibid., doc. 189, de 14 de maio de 1107: «Sancius puer filius regis regnum
electus patrifactum conf.». É possível que esta porção de texto tenha sido a
fonte utilizada por Rodrigo Jiménez de Rada, no De Rebus Hispaniae, para
informar que, em 1108, quando participa na Batalha de Uclés, Sancho era ainda
criança. Jiménez de Rada usa parvulo como sinónimo de puer, que entendeu como
criança, mas segundo o dicionário de Niermeyer (NIERMEYER, J. F. ' Mediae
latinitatis lexicon minus. Leiden: Brill, 2002) puer pode também significar
jovem príncipe, o que me parece ser mais adequado. Por essa razão sigo os
autores que colocam o nascimento provável de Sancho por volta de 1103. Não
posso deixar de fazer um paralelo com o conde D. Henrique, que surge pela
primeira vez num documento de 1079 em que aparece mencionado entre os
confirmantes. Três anos mais tarde, numa carta datada de 1082, Henrique da
Borgonha, é tratado como puer. O tratamento repete-se num outro diploma datado
de 1083. Também não se conhece o ano exato do nascimento do futuro conde
portucalense, mas supomos que terá nascido por volta de 1069, pelo que teria
então 13 ou 14 anos (Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge - op. cit., p.
37).
78
Herculano, Alexandre - História de Portugal. Pref. e notas críticas de José
Mattoso. t. I. Lisboa: Bertrand, 1989, p. 282.
79
A Professora Júlia Montenegro veicula a tese de o diploma de confirmação
solene do censo duplicado, datado do tempo pascal de 1090, ser um falso, o que
lhe permite propor que as relações de Afonso VI com Cluny «debieron de quedar
seriamente deterioradas a partir de 1080 y heridas de muerte diez anos más
tarde» e conclui que «Así se entende mejor la actitud de Cluny en relación com
la crisis sucessória que tantas aflicciones provocó a Alfonso VI y a sus
reinos» (Montenegro, Julia ' La alianza de Alfonso VI com Cluny y la abolición
del rito mozárabe en los reinos de León y Castilla: una nueva valoración.
inIacobus: revista de estúdios jacobeos y mediavales. Sahagún, nº 25-26 (2009),
pp. 47-62).
80
«Imperator Toletanus».Vd.Gambra, Andrès - op. cit., t. 1, pp. 702-705.
81
Na doação que faz da igreja de Santa Maria Madalena de Sahagún, em 1 de maio
de 1106, o conde Raimundo e a sua mulher fazem uma exibição deliberada dos seus
direitos soberanos à sucessão (Herrero de la Fuente, Marta ' op. cit., doc.
1142: «comes Raimundus habens principatum apud Hispanie» e « regalibus orta
natalibus ego Urracha». Bishko, Charles Julian ' op. cit., p. 185 e nota 85:
«Note also that elsewhere in this document the Condes refer to regalem morem'
and reges nostri antecessores', while Gelmirez' eschatocol describes the text
as testamentum regale'»). Novamente, num pergaminho de 17 de março 1107,
Raimundo proclama-se um homem com autoridade absoluta sobre a Galiza, ainda que
esse poder lhe advenha do seu sogro Afonso VI (Lucas Álvarez,Manuel- La
documentación del Tumbo A. Estudio y edición.León: Centro de estudios e
investigacio´n San Isidoro, 1997, doc. 76: « Ego comes domnus Raimundus, totius
Gallecie imperator seu Adefonsi Tolletane principis gener»). Segundo Rodrigo
Ximénez de Rada (De Rebus Hispaniae, cit. de Martins, Armando ' Cluny e a
formação de Portugal, in A Idade Média Portugusesa e o Brasil: reminiscências,
transformações, ressignificações. Porto Alegre: Vidráguas, 2011, p. 91, nota
61) D. Afonso VI teria expulsado da corte o seu genro D. Raimundo, por suspeita
de reivindicação indevida do poder. Por seu lado, o conde Henrique, na doação
da herdade de S. Romão (concelho de Seia) em 1 de agosto de 1106 apresenta-se
«Ego comes Henrricus Portugalensium patrie princeps» (Azevedo, Rui de (ed.) -
Documentos Medievais Portugueses, Documentos Régios. Lisboa: Academia
Portuguesa da História, 1958, I, doc. 10).
82
Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge ' op. cit., pp. 183-184.
83
Gambra, Andrès ' op. cit., t. 1, p. 549.
84
É a partir da Historia Compostelana (FlÓrez, Enrique - España Sagrada. Madrid:
M. F. Rodríguez, 1765, vol. 20, pp. 95-96) que sabemos que o arcebispo Guido de
Vienne (na França), irmão de Raimundo e futuro Papa Calisto II, esteve
presente. O velho rei concede ao infante Afonso Raimundez o direito de herdar o
governo da província da Galiza, se a sua mãe voltar a casar: «nepoti meo,
proculdubio famulatures exhibeo, et totam ei Gallaetiam concedo, si ejus mater
Urraca virum ducere voluerit».
85
Falque Rey, Emma (ed.) - Historia Compostelana. Madrid: Ediciones AKAL, 1994,
p. 125: «el hijo del rey, Sancho, a cuya custodia según ordem de su padre
estaba confiado el domínio de Toledo».
86
A Crónica del obispo don Pelayo (cit. de Montenegro, Julia ' La crisis
sucessória , op. cit., 2010, p. 388, nota 45) refere que o rei esteve enfermo
dezanove meses antes de morrer: «Cum iam tempus immineret mortis eius decidit
in lecto et parmansit in infirmitate annum unum integrum et mensibus septem».
Ubieto Arteta, Antonio, (ed.), Crónicas Anónimas de Sahagún. Zaragoza: Anubar
Ediciones, 1987, p. 25: «Ca como el de la mui noble memoria rei don Alfonso
feçiese sesenta y dos annos de su hedad e ya mucho obiese estado enfermo en la
muy noble cibdad que él había ganado del poderío de los islmaelitas e infieles,
conviene a saber, de Toledo, en el quarenta y quatro annos de su reino pagó la
debda de la natura mortal».
87
Bishko, Charles Julian ' The Cluniac Priories of Galicia and Portugal: Their
Acquisition and Administration (1075-ca.1230). in Studia Monastica. 7 (1965),
p. 306, liga esta doação «to the imminent accession of Alfonso VI's daughter,
the Infanta Urraca».
88
Amaral, Luís Carlos; BARROCA, Mário Jorge ' op. cit., p. 317.
89
Mattoso, José - D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, 2007, p. 31.
90
Ruas, Henrique Barrilaro - Se partio ayrado del rrei. Separata da Revista
Portuguesa de História. Coimbra, tomo IV, 1955.
91
Herrero de la Fuente, Marta (ed.) - Colección Diplomática del Monasterio de
Sahagún, III, Leon: Centro de Estudios e Investigacion San Isidoro, 1988, doc.
1167.
92
Ruiz Albi, Irene - La Reina Doña Urraca (1109-1126). Cancillería y colección
diplomática. León: Centro de Estudios e Investigacion San Isidoro, 2003, doc.
1: «ego Urraka, Dei nutu totius Yspanie regina».
93
Rodrigues, Manuel Augusto; Costa, Avelino de Jesus da; VELOSO, Maria Teresa
Nobre (ed.) - Livro Preto, cartulário da Sé de Coimbra, Coimbra: Arquivo da
Universidade de Coimbra, 1999, doc. 59, de 29 de julho de 1109.
94
Ibidem: «Si autem quilibet rex aut comes, seu cujuscumque dignitatis et
potentie homo, illud irrumpere temptaverit, ».
95
Idem: «Ego, Henricus, Dei gratia comes et totjus Portugalis dominus».
96
Idem: «Hec sunt nomina confirmantium qui viderunt et audierunt hanc cartam
confirmatam in Viseo ». Talvez a confirmação em Viseu resulte de uma alteração
do plano inicial de D. Bernardo se deslocar a Coimbra. O arcebispo de Toledo
retornaria para Leão onde, a 10 de Setembro de 1109, confirma o documento no
qual D. Urraca renova os foros de concelho de Leão que seu pai havia outorgado
(Ruiz Albi, Irene - La Reina Doña Urraca, op. cit., doc. 2).
97
Azevedo, Rui de (ed.) - Documentos Medievais Portugueses, Documentos Régios,
doc. 15. Este documento da cerimónia de Coimbra deve ser uma cópia do documento
original, que teve confirmação em Viseu. Não creio o inverso, ou seja, da
confirmação posterior em Viseu da doação realizada em Coimbra. É duvidosa a
informação dos Annales Portucalenses Veteresque sustentava esse percurso, de o
conde D. Henrique ter comandado um exército para recuperar o castelo de Sintra,
cujos habitantes se teriam revoltado quando souberam do falecimento de Afonso
VI, (conf. Mattoso, José - D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, 2007,
p. 32, nota 1).
98
1 eius] E omite.
99
2 karissime] CDE carissimo.
100
3 conjuncti] D conjucti. E conjucti (sic).
101
4 occurrere] CDE adquirere.
Anexo_I
[1105, 1107] ' Carta enviada a D. Hugo, abade de Cluny, com o pacto de amizade
estabelecido entre os condes D. Raimundo e D. Henrique, relativo à sucessão do
sogro deles, o rei Afonso VI, escrito e jurado na presença do camareiro D.
Dalmácio Geret.
B.Bibliothèque Nationale de France, Coleção Baluze, nº 86, f. 470. Cópia de
1645.
C. Achery, Luc d' (ed.), Spicilegium, 1659, III, p. 122.
D. Achery, Luc d', la Barre (ed.), Spicilegium, 1723, III, p. 418.
E. Azevedo, Rui de (ed.), Documentos Régios, 1958, I, doc. 2.
Domino atque Reverentissimo Cluniacensi Abbati Hugoni, omnique beati Petri
Congregationi, R[aimundus] Comes eiusque filius [Alfonsus Raimundi], et H
[enricus] Comes eius 98 familiaris, cum dilectione salutem in Christo. Sciatis,
Karissime 99 Pater, quòd postquàm vestrum vidimus legatum pro Dei omnipotentis
atque Beati Petri Apostoli timore vestræque dignitatis reuerentia quod nobis
mandastis in manu Domni Dalmatii Geret fecimus.
In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti. Pignus integræ dilectionis, quo
coniuncti100 sunt in amore R[aimundus] Comes, Comésque H[enricus], et hoc
iuramento.
Ego quidem H[enricus] absque ulla diuortii falsitate tibi Comiti R[aimundo]
membrorum tuorum sanitatem, tuæque vitæ integram dilectionem, tuique carceris
inuitam mihi occursionem iuro: Iuro etiam quod post obitum Regis IL[defonsi]
tibi omni modo contra omnem hominem atque mulierem hanc totam terram Regis Al
[fonsi] defendere fideliter ut Domino singulari atque occurrere101 præparatus
occurram. Iuro etiam si thesaurum Toleti prius te habuero, duas partes tibi
dabo et tertiam mihi retinebo, amen.
Et ego Comes R[aimundus] tibi Comiti H[enrico] tuorum membrorum sanitatem,
tuæque vitæ integram dilectionem, tuique carceris inuitam mihi occursionem
iuro. Iuro etiam quod post mortem Regis IL[defonsi] me tibi daturum Toletum
terramque totam subiacentem ei, totamque terram, quam obtines modo a me
concessam, habeas tali pacto; vt sis inde meus homo, et de me eam habeas
Domino; et postquam illas tibi dedero, dimittas mihi omnes terras de Leon et de
Castella; Et si aliquis mihi vel tibi obsistere voluerit, et iniuriam nobis
fecerit, guerram simul in eum vel vnusquisque per se ineamus, vsquequo terram
illam mihi vel tibi pacificè dimittat, et postea tibi eam præbeam. Iuro etiam
si thesaurum Toleti prius te habuero, tertiam partem tibi dabo et duas
remanentes mihi seruabo.
Fiduciam quam Comes R[aimundus] fecit in manum Domini Dalmatii Geret:
Si Ego Comes R[aimundus] nom possum tibi Comiti H[enrico] dare Toletum ut
promisi, dabo tibi Gallæciam, tali pacto ut tu adiuues mihi adquirere totam
terram de Leon et de Castella, et postquam inde Dominus pacifice fuero, dabo
tibi Gallæciam, ut postquam eam tibi dedero, dimittas mihi terras de Leon et de
Castella. Igitur Deo iubente, sic quoque Sancta Dei Ecclesia piis orationibus
interueniat, amen.
Anexo_II
1105, Janeiro, 16 ' O conde D. Raimundo e sua mulher Dona Urraca fazem um
importante conjunto de doações ao Mosteiro de São João de Poio.
C. Archivo de la catedral de Santiago de Compostela, Tomo I de la Primera Serie
de la Colección de Tomos de Varia (signatura: ACS, IG 703), ff. 39 e 40.
D. Archivo Histórico Nacional: Clero-Secular/Regular, L.10319, «Libro único de
el merino de el coto y su jurisdicción» do «Monasterio de San Xoán de Poio»,
fólio 118 na numeração antiga e 126 na numeração nova.
Aludido em RECUERO ASTRAY (coord.) - Documentos Medievales del Reino de
Galicia: Doña Urraca (1095-1126). Santiago de Compostela: Xunta de Galicia,
2002, doc. 41 de 1116.03.31: «Et sicuti uobis dedi medietatem una cum uiro meo,
comite domno (Raimun)do in primis similiter do uobis modo aliam medietatem ».
Citado por Prudêncio de Sandoval - Antigüedades de Túy, Braga, 1610, f. 109r-
v e Historia de los reyes de Castilla y de León, Pamplona, 1634, f. 95r-v,
Antonio de Yepes - Crónica General de la Orden de San Benito. Estudio
preliminary y edición por Fr. Justo Pérez de Urbel. Madrid: Biblioteca de
Autores Españoles, 1959-1960, n. 43, t. II, pág. 305, López Ferreiro, Antonio -
História de la Santa A. M. Iglesia de Santiago de Compostela. Santiago: Imp. y
Enc. del Seminario Conciliar Central, 1900, Tomo III, p. 288 e Filgueira
Valverde, Xosé - Tiempo y gozo eterno en la narrativa medieval: la cantiga
CIII. Vigo:Edicio´ns Xerais de Galicia, 1936, p. 110.
In nomine sancte et individue trinitatis Cristi. Sancti1 Joanis2 Baptiste
honore et aliorum sanctorum quorum reliquie hic continentur et quorum ecclesia
est fundata loco predicto quod dicunt3 Poio territorio Salinense ripa maris
inter monte Castroue et ribulum Lerice. Ego quidam comes Raimundus4,
imperatoris Adefonsi5 gener et totius Gallecie6 dominus, una cum coniuge mea
domna Urraca, eiusdem imperatoris filia, peccatorum mole7 depressi, atque
celestis8 misericordie compuncti concedimus huic ecclesie9 Sancti Joannis
Baptiste et Sancti Andrea apostoli, pro animarum nostrarum remedio, in cirsuitu
ipsius ecclesie LXXX et IIIIorsup>10
passales ab integro sine aliqua dominatione omnium hominum et ex omnibus
hominibus, atque hereditatibus qui sunt modo vel fuerint usque in finem in suo
cauto quod est de Custodias usque ad Sanctum Petrum de Campaniola damus ex eis
medietatem integram de hereditatibus vero id sunt, de Conbarro11 medietatem, de
Curiales medietatem, de Ranecta12 medietatem, Sancte Marie ecclesia integra, de
Raapazules13 medietatem, de Villares14 medietatem, de Casal de Aluito
medietatem, de Rial medietatem, de Maurelles15 medietatem, de Pereira
medietatem, de Bustello medietatem, Paradella16 integra, de Fenulucto17
medietatem, de Moreira medietatem, de Alariz medietatem, de Pagan medietatem,
de Villarino18 medietatem, de altero Villarino19 medietatem, de Casales20 de
Dona Goto medietatem et extra cautum in territorio Morraco21, Sancte Marie
ecclesia integra de Beluco22, ecclesia Sancte Marine de Maurena integra,
ecclesia Sancti Saluatoris de Poyo media, ec[c]lesia Sancti Petri de Campaniola
media, ecclesia Sancte Marie de Simes23 media, ecclesia Sancti Petri de
Tomeça24 media, ecclesia Santi Petri de Cornaço25 media, insula de Thalauo26
integra, ecclesia Sancti Saluatoris de Cordeiro27 integra, salinas qui sunt in
marina Sancti Laurentii, IIII
or28
salinas in corte de Elduara, VI
ex29
in corte Christofoli et in Gonelli30 una integra et altera media et corte de
Mulieres31 integra cum omnibus suis vivaribus32 et caldaribus33 et aquis
dulcibus34 ab integro. Sic damus et concedimus omnes istas hereditates atque
homines huic sancte ecclesie, ut habeant eas omnes serui Dei confesores illius
ecclesie absque ulsa omnium hominum dominatione, tam laicorum quam etiam
aliorum hominum35, tam generationum nostrarum quam etiam et extraneorum, sed
semper stent post partem ipsius monasterii et omnium hominum in ordine Sancti
Benedicti Deo seruientium nunc et in perpetuum.
Facta Series testamenti sub die quod erit XVII kalendas36 februarii, era
millessima centessima XLn III37. Si aliquis homo hanc scripturam quam
eligemus38 temptare vel39 irrumpere voluerit, quis quis ille fuerit,
participetur cum Juda traditore et maledicatur40 a Deo omnipotenti et hunc
nostrum factum psenam atque perfectam habeat stabilitatem in secula seculorum.
Ego Comes Raimundus celestis41 gratia conpuctus42 in hunc testamentum meo iussu
factum manu mea confirmo. Domna Urraca illius uxoris confir. Inffanta43 domna
Santia44 illorum filia confir. Sub diuino auxilio Didacus Compostellane
ecclesie episcopus confirmat. Adefonsus45 Tudensis ecclesie episcopus
confirmat. Didacus Auriensis46 episcopus confirmat. Joanes47 Ranamirez qui tunc
erat maiordomus illius comitis confir. Pelagius Gudesteis48 confir. Guncaldus49
Didas confir. Froila Menendiz confir. Froila Arias confir. Petrus infancti
presbiter Carboniensis hic confir. Petrus Froilanus50 comes confir. Froila
Didas comes51 confir. Moninus Velas confir. Moninus Pelagius52 armiger comitis
confir. Ero Armentaris53 maiordomus super mensam confir. Odiarius54 Sancti
Jacobi archidiaconus confir. Gudesindus canonice55 Sancti Jacobi abbas confir.
Moninus Gudesteis56 maiordomus in Lopeira57 confir. Pelagius Gudesteis58 iudex
Sancti Jacobi confir. Petrus Danielis iudex apostolice aule confir. Menendus
Guncadis59 iudex confir. Gundisindus abbas60 confir. Petrus capellanus illius
infantis notarius confir. Fromaricus ipsius monasterii abbas qui testamentum
hunc scripsit61 confir. Petrus abbas Celenove confir. Petrus abbas de
Antealtares confir. Leouigildus Sancti Martim abbas confir. Aldefonsus62 Sancti
Laurentii abbas confir. Ordonius abbas de Morraco63 confir. Petrus abbas de
Caldas confir. Gundesindus Liandris64 de Caldas iudex confir. Cresconio Citis65
iudex confirmat. Didacus abbas de Arcus confir. Nunius66 abbas Sancti
Salvatoris de Lerez confir. Didagus iudex terra Tabeirolo confir. Nunius67
Pelas de Montes confirmat. Petrus Arias confirmat. Fernandus Arias confirmat.
Fernandus Joannes confirmat. Ovecus Cresconis68 confirmat. Didacus Arias conf.
Gudesteus69 Ferdinandi confirmat. Pelagius Ramiriz confirmat. Fernandus
Ordunez70 confirmat. Aluiens Cengoibus71 confirmat (signum varia).
Variantes em D: O «e» final de algumas palavras foi substituído pelo ditongo
«ae». 1 OmiteSancti 2Joannis 3dicitur 4Raymundus 5Adephonsi 6Galeciae 7molte
8eclesiis 9Por esta e todas que se seguem eclessiae10LXXX et IIIIor] octoginta
quatrior 11Combarro 12Caneita 13Baarazules 14Vilares 15Maurelos 16Paradela
17Fenulicto 18Vilarino 19Vilarino 20Cassales 21Morrazo 22Belucis 23Simis
24Tomeza 25Cornazo 26Talauo 27Cordario 28quatrior 29
sex
30
Boneli 31Mullieres 32vivariis 33caldariis 34ductibus 35aliorum hominum] aliorum
omnium hominum 36XVII kalendas] dizima septima calendas 37XLn III]
tertiadecima, por evidente omissão da leitura da aspa do X 38elegimus 39et
40maledictionibus 41Raimundus celestis] Raymundus divinae celestis 42compunctus
43Infanta 44Sançia 45Adephonsus 46Ariensis 47Jannes 48Gudesteriz 49Gundisalbus
50Froila 51Omite comes 52Pelagius] presbiti conf. 53 Ego Arnundariz. 54Adiarius
55Omite
canonice 56Gudsteris 57Lorepa 58Gudsteris 59Guntadix 60alia 61fecit
62Adephonsus 63Morrazo 64 Adriz 65Cresconio Citis] Creston poatis 66Ticinus
67Ticinus 68Cresconis] Ores conig 69Gudestorius 70Ordonis 71Aluiens Cengoibus]
Alvarus Cenonis.