Utilização de Gigaspora margarita em plantas micropropagadas de bananeira em
diferentes estádios de enraizamento
Utilização de Gigaspora margarita em plantas micropropagadas de bananeira em
diferentes estádios de enraizamento1
The use of arbuscular mycorrhizal fungi Gigaspora margaritain micropropagated
bananas plants in differents stages of rooting
Gêlva Maria de Lima LinsI; Aldo Vilar TrindadeII; Hermínio Souza RochaIII
ISecretaria de Produção e Reforma Agrária do Estado de Pernambuco, Recife,
50741-380
IIEmbrapa Mandioca e Fruticultura, Cruz das Almas-BA, C. P. 007, CEP: 44380-
000; aldo@cnpmf.embrapa.br
IIIEng. Agrônomo, Gerente de Produção da CAMPO, Companhia de Promoção Agrícola,
Cruz das Almas, 44380-000, BA
INTRODUÇÃO
A micropropagação é uma técnica de cultura de tecidos de grande aplicação em
diversas espécies de planta, importante para a multiplicação massal da
bananeira, que proporciona uma taxa superior ao método convencional, com
obtenção de material livre de doenças e pragas (Souza, 1994). As técnicas de
micropropagação amplamente aplicadas para produção de diversas fruteiras privam
as plântulas de sua microflora natural benéfica, embora promovam condições
ambientais ótimas em relação à água, nutrição e luz. A condição axênica é
geralmente estendida para os estágios iniciais da aclimatação, quando as
plantas são transferidas para solos ou substratos.
As micorrizas constituem-se no estado natural das raízes da maioria das plantas
(Siqueira, 1994). É uma simbiose praticamente universal, tanto pelo grande
número de plantas suscetíveis à micorrização, como por sua ocorrência
generalizada na maioria dos habitats naturais (Azcon-Aguilar & Barea,
1980). Várias plantas, entre as quais fruteiras, como a bananeira, respondem à
inoculação de fungos micorrízicos arbusculares (FMAs) em fase de aclimatação.
Nesta etapa, o maior acúmulo de massa pelas plantas de banana submetidas à
inoculação pode vir acompanhado pelo aumento da taxa fotossintética e
transpiratória (Yano-Melo et al., 1999). Geralmente, o melhor momento para
inoculação é no início da fase pós-vitro, o que depende da espécie de planta a
ser produzida. Sbrana et al. (1994) verificaram que a melhor época de
inoculação foi no início do alongamento radicular. No entanto, conforme
Ravolanirina et al. (1989), a inoculação em plântulas de dendê e uva
micropropagadas foi mais eficiente após o enraizamento completo.
A diversidade de condições utilizadas na obtenção de mudas micropropagadas
dificulta o uso racional dos FMAs, sendo necessário estudar as condições ideais
para a maximização do efeito da associação. As condições testadas são muito
variadas em termos de tipo e fertilidade de substrato, intensidade luminosa,
umidade e aeração, entre outros fatores, sendo que todos estes citados são
reconhecidamente moduladores do efeito da inoculação sobre as plantas. A
efetividade da inoculação também pode depender do grau de desenvolvimento das
raízes, visto que espécies que possuem sistema radicular muito ramificado
dependem menos dos fungos micorrízicos para a absorção de nutrientes, mesmo em
solos muito deficientes (Baylis, 1975).
Este trabalho objetivou avaliar a possibilidade de redução do tempo de cultivo
in vitro de plantas de banana micropropagadas, por meio da inoculação do fungo
micorrízico arbuscular Gigaspora margarita.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido em estufa de aclimatação, na Embrapa Mandioca e
Fruticultura, em Cruz das Almas-BA, com início em fevereiro de 1999.
Utilizaram-se mudas micropropagadas de bananeira, variedade Caipira, produzidas
pela Biofábrica CAMPO ' CPA / Embrapa Mandioca e Fruticultura e crescidas sob
condições de um fotoperíodo médio de 10 horas, luminosidade de 800 ' 1100 lux,
25± 4 oC e 70 ' 90% de umidade.
Cada parcela foi constituída por um vaso plástico com capacidade de 1,3 dm3
contendo uma muda. As plântulas utilizadas foram multiplicadas em meio de MS
(Murashige & Skoog, 1962) suplementado com 3 mg/L de 6-benzilaminopurine,
30 g/L de sacarose, 2 g/L de phytagel. Para enraizamento, utilizou-se o meio de
MS com 0,25 mg/L de ácido naftaleno acético, 30 g/L de sacarose e 6 g/L de
ágar. Foram utilizadas plântulas com enraizamento completo, intermediário e sem
raízes, as quais se encontravam no terceiro subcultivo. Antes do transplantio,
avaliaram-se a altura, número de folhas, comprimento da maior raiz, número
total de raízes e pesos de matéria fresca e seca das plântulas (Tabela_1).
Foram testados dois substratos: 1. turfa + vermiculita média (3:1) - TVm; 2.
turfa + vermiculita média (3:1) + esterco bovino (5%) ' TVmE e dois tratamentos
fúngicos (inoculado e não inoculado), com cinco repetições, em blocos
casualizados.
Visando à eliminação de qualquer propágulo de FMAs, todos os componentes que
formaram as misturas foram fumigados com brometo de metila (393 mL/m3). Para o
enchimento dos vasos, foi utilizado 1,2 dm3 de cada substrato, sendo
posteriormente umedecidos com água destilada, permanecendo em incubação por 15
dias. Decorrido este período, as mudas provenientes da fase in vitro foram
transplantadas e inoculadas com o fungo micorrízico Gigaspora margarita,
utilizando-se de 25 g do inóculo, o qual continha aproximadamente 416 esporos.
O inóculo foi colocado abaixo da muda, para que as raízes ficassem em contato
com o mesmo. O inóculo, composto por esporos, solo e raízes colonizadas, foi
obtido da coleção da Embrapa Mandioca e Fruticultura, tendo sido multiplicado
anteriormente na cultura do sorgo. Os tratamentos não inoculados receberam 10
mL de um filtrado do inóculo, obtido após passagem por peneira de 400 mesh de
abertura, visando a recompor a microbiota do inóculo, fora os propágulos do
fungo micorrízico.
Aos 55 dias após o transplantio, as mudas foram coletadas, separando-se a parte
aérea do sistema radicular na região do colo. O sistema radicular foi separado
em rizoma e raízes totais, sendo os rizomas pesados ainda frescos,
separadamente. As raízes foram separadas em raízes grossas (raízes) e finas
(radicelas), medindo-se o comprimento das raízes pelo método direto, com
auxílio de régua, e as radicelas, pelo método da placa reticulada (Newman,
1966). As radicelas foram utilizadas posteriormente para coloração com azul de
tripan (Phillips & Hayman, 1970) e determinação da taxa de colonização pelo
método da interseção linear (Ambler & Young, 1977).
Os dados obtidos foram analisados pelo programa SAEG, efetuando-se análise de
variância (Teste F) e teste de média (Tukey) para comparar os tratamentos de
inoculação dentro de cada substrato em relação ao estádio de enraizamento.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As produções de matéria fresca e seca da parte aérea das mudas de bananeira
crescidas no substrato TVm foram influenciadas de maneira semelhante pela
interação inoculação x enraizamento (Tabela_2). Com a inoculação, as plântulas
com sistema radicular desenvolvido ou intermediário mostraram-se
estatisticamente superiores àquelas que inicialmente não apresentavam raízes.
Para as mudas não inoculadas, só houve diferença entre os dois estádios
extremos de enraizamento. Nos três tipos de muda, a inoculação aumentou
significativamente o crescimento das plantas, em relação às mudas não
inoculadas. Salienta-se que mudas originalmente não enraizadas e que foram
posteriormente inoculadas, apresentaram um desenvolvimento maior do que aquelas
originalmente enraizadas, mas não inoculadas.
Para as plantas cultivadas no substrato TVmE, a adição de esterco resultou em
crescimento maior das plantas com enraizamento completo ou intermediário
(Tabela_2), mas as plantas originalmente não enraizadas, inoculadas ou não com
o FMA, não se desenvolveram neste substrato. Portanto, o uso de substrato com
maior disponibilidade de nutrientes não permitiu a sobrevivência de plântulas
ainda não enraizadas. Isto pode ser devido a um aumento da condutividade
elétrica do substrato pelo uso do esterco, conforme verificado em trabalho com
mudas de eucalipto (Trindade et al., 2001a), resultando em dificuldade de
emissão de raízes e conseqüente absorção e retenção de umidade pela planta.
Para o substrato com menor riqueza de nutrientes (TVm), é possível que a
formação inicial de raízes tenha sido favorecida e a conseqüente sobrevivência
da planta, embora com desenvolvimento final comprometido.Entre as plantas
enraizadas ou com enraizamento intermediário, não houve diferença significativa
quanto à produção de parte aérea. A inoculação promoveu o crescimento das
plantas nas duas condições de enraizamento.
Para o comprimento de raízes de plantas crescidas no substrato TVm, a
influência da inoculação não dependeu do estádio de enraizamento inicial e
vice-versa (Tabela_3). Neste substrato, a inoculação promoveu o crescimento de
raízes e radicelas, independentemente do tipo de muda. O uso de plântulas
enraizadas, no processo de aclimatação, resultou em mudas com maior crescimento
de radicelas. Semelhantemente ao que ocorreu para a parte aérea (Tabela_2),
plântulas com sistema radicular intermediário, inoculadas, apresentaram
comprimento de raiz ao final do processo de aclimatação, equivalente aos
resultados verificados para mudas originadas de plântulas enraizadas, não
inoculadas (Tabela_3).
O uso de esterco no substrato teve um efeito menos intenso no aumento do
comprimento de raízes do que no de radicelas (Tabela_3). Nesse substrato, a
inoculação aumentou o comprimento de raízes das mudas com enraizamento
completo, mas diminuiu o comprimento quando as plantas se apresentavam com
enraizamento intermediário. O comprimento das radicelas não foi influenciado
pelos fatores inoculação e enraizamento. O efeito do fungo mostrou-se na maior
proporção de radicelas em relação às raízes, nos diferentes tipos de mudas e
nos dois substratos. Em se tratando de um substrato pobre como o TVm, a maior
produção relativa de radicelas pode ser o mecanismo responsável pelo efeito da
inoculação, tal como sugerido por Trindade et al. (2001b) para algumas
cultivares de mamão. Com a adição de esterco, isto também se verificou, mas
apenas em plantas com grau de enraizamento originalmente intermediário,
corroborando a hipótese anterior. Ou seja, provavelmente, a planta já dispunha
de um aparato de absorção mais adequado. Trabalhos com ameixa (Berta et al.,
1995) e morango (Normam et al., 1996) relatam alterações na morfologia do
sistema radicular com a inoculação de FMAs, resultando principalmente em maior
ramificação do sistema radicular. Entretanto, este efeito pode ser dependente
do momento em que os fungos são inoculados. Locatelli & Lovato (1999)
verificaram em maçã que a inoculação antes do enraizamento das plântulas
promoveu aumento no número e comprimento de raízes, dependendo da variedade
considerada.
Para os teores de nutrientes, não foi possível determinar os valores nas
plantas crescidas no substrato TVm em função da baixa produção de matéria seca.
No substrato TVmE, o P foi influenciado apenas pela inoculação, sendo maior na
presença desta (Tabela_4), independentemente do estádio inicial de
desenvolvimento radicular. Verifica-se, entretanto, que plantas com
enraizamento intermediário, quando inoculadas, absorveram mais fósforo do que
plantas com enraizamento completo. Isso demonstra o papel da micorriza no
aumento da absorção de nutrientes pela muda de banana, mas também mostra que o
efeito pode dar-se pela maior ramificação do sistema radicular e
conseqüentemente pela maior absorção de nutrientes e água. Confirmando essa
hipótese, a inoculação também promoveu maior concentração de K na parte aérea
das plantas originalmente com sistema radicular intermediário. Portanto, para o
substrato TVmE, o uso de plântulas com enraizamento intermediário deverá ser
feito com a inoculação de FMA, fato verificado para outras características. A
literatura tem raros relatos da influência da inoculação na absorção de
potássio. Em mamão, Trindade et al. (2001b) obtiveram significativos aumentos
com a inoculação de Gigaspora margarita, mas, em banana obtida por
micropropagação, Yano-Melo et al. (1999) relataram redução nos teores desse
elemento nas plantas submetidas à inoculação de diferentes FMAs. Os teores de
zinco não sofreram influência dos tratamentos de enraizamento e inoculação,
enquanto os teores de cobre foram maiores nas plantas inicialmente enraizadas
(Tabela_4). Os menores teores de cobre verificados nas plantas com enraizamento
intermediário, no substrato TVmE, aparentemente não afetaram o crescimento da
planta. Verifica-se que o efeito da inoculação se mostrou também na nutrição da
planta onde mudas inoculadas no estádio de raízes intermediárias se
apresentaram sadias. O efeito geral da inoculação foi muito maior do que o do
grau de enraizamento e influenciou até mesmo o K, nutriente de maior mobilidade
no solo.
No substrato sem adição de esterco, a taxa de colonização foi afetada pelo
estágio de enraizamento inicial das plantas (Figura_1), sendo
significativamente menor nas plantas não enraizadas, embora ainda com valores
considerados elevados. A adição de esterco ao substrato praticamente não
alterou o percentual de colonização, permanecendo em valores acima de 80%.
Assim como no outro substrato, o uso de plantas com enraizamento intermediário
não afetou o percentual de colonização. Assim, a formação inicial dessas raízes
possibilitou a colonização micorrízica, resultando em maior produção de parte
aérea e também de novas radicelas e raízes (Figura_1, Tabelas_2 e 3). A
expressão da colonização mostra-se mais intensa quando se verifica que plantas
originalmente não enraizadas, mas inoculadas, apresentaram crescimento
equivalente e até maior do que aquelas enraizadas, não inoculadas (Tabela_2),
sugerindo que, neste substrato, a etapa de enraizamento in vitro seria
dispensável para plantas inoculadas. Por outro lado, isto abre possibilidades
de fazer-se a inoculação com FMA ainda na fase in vitro.
Esta possibilidade é tecnicamente viável e foi inicialmente executada por Pons
et al. (1983), com ameixa, usando o próprio solo como inóculo. Usando um
sistema mais controlado, Elmeskaoui et al. (1995) obtiveram produção in vitro
de plantas de morango micorrizadas, utilizando raízes de cenoura ou tomate
transformadas como fonte de inóculo do FMA. A inoculação foi feita logo após a
indução radicular, em sistema axênico, resultando em plântulas colonizadas com
raízes mais extensas e melhor crescimento da parte aérea.
O efeito da inoculação está embasado nos elevados valores de colonização
micorrízica nos dois substratos, mesmo para plantas inicialmente não
enraizadas. O menor valor neste tipo de plântula justifica-se pelo maior tempo
necessário para o contato entre as estruturas do fungo e a raiz a ser ainda
formada, o que pode ter diminuído o potencial do inóculo aplicado. Portanto,
quanto à colonização, as mudas de bananeira poderão ser inoculadas em estádios
iniciais de enraizamento. Verificando o efeito da inoculação de FMAs em
plântulas de maçã e pêra com diferentes comprimentos de raiz, Sbrana et al.
(1994) constataram que a melhor época correspondeu ao início do alongamento
radicular (enraizamento), tendo a inoculação contribuído para o crescimento e
sobrevivência das plântulas. Por sua vez, Ravolanirina et al. (1989) observaram
que a inoculação de FMAs em plântulas de dendê e uva micropropagadas foi mais
eficiente quando efetuada após a indução radicular em relação ao estádio após o
enraizamento completo. Já para plantas de Annona cherimola, Azcon-Aguilar et
al. (1994) verificaram que a melhor época para inoculação foi após o período de
aclimatação.
Assim, mudas originadas de plântulas com sistema radicular intermediário, desde
que inoculadas com FMAs, apresentam, ao final da fase de aclimatação,
desenvolvimento normal. Para efeitos práticos, isto é válido para o substrato
TVmE, mais rico e portanto mais apto ao cultivo das mudas, sugerindo, portanto,
que é possível retirar as plântulas da fase in vitro antecipadamente à
finalização do processo de enraizamento, sendo necessária a introdução de
fungos micorrízicos arbusculares.
O experimento mostrou que o uso de plântulas em estádio intermediário de
enraizamento pode ser ainda mais benéfico para o desenvolvimento da muda, mesmo
em relação àquelas inicialmente enraizadas, mas não inoculadas, que é a
situação comum no sistema de produção adotado. Pode-se ter melhor formação da
muda e, principalmente, economia de tempo e espaço na formação das mudas in
vitro. É necessário que se faça essa adequação também para outros substratos.
CONCLUSÕES
1) O fungo micorrízico arbuscular Gigaspora margarita colonizou intensamente e
mostrou-se benéfico para o desenvolvimento das mudas de bananeira, sendo seu
efeito modulado pelo substrato de crescimento.
2) A inoculação de fungo micorrízico arbuscular mostrou-se benéfica em qualquer
dos estádios de crescimento testados.
3) O substrato turfa + vermiculita + 5% de esterco, quando associado à
inoculação de fungos MA, promoveu a formação de mudas normais e sadias.
4) O início da fase de aclimatação de mudas micropropagadas de bananeira pode
ser antecipado pelo uso da inoculação com fungo micorrízico arbuscular, em
substrato adequado.