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BrBRCVHe0004-28032003000400004

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variedadeBr
ano2003
fonteScielo

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Divertículo único do ceco: experiência de um hospital geral brasileiro ARTIGO ORIGINALORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO A diverticulite cecal é condição rara que se apresenta como um dilema diagnóstico para o cirurgião. Desde POTIER(16), que descreveu o primeiro caso de diverticulite cecal, alguns relatos, inclusive no Brasil(8).

A prevalência de diverticulite cecal é baixa em populações ocidentais, sendo mais elevada nos descendentes de asiáticos. Na população ocidental, a maior parte dos divertículos cecais são solitários, segundo GRAHAM e BALLANTYNE(7).

Acredita-se que os divertículos solitários são congênitos, surgindo como uma projeção sacular do ceco na sexta semana de gestação(23). Esses são considerados divertículos verdadeiros porque têm todas as camadas da parede colônica, incluindo a muscular. Estudos patológicos freqüentemente são inábeis para identificar a parede muscular do divertículo solitário devido à concomitância de alterações inflamatórias. Divertículos múltiplos são vistos mais comumente na população de origem asiática e são relatados como divertículos falsos, em sua grande parte(20).

O divertículo solitário de ceco geralmente se localiza medialmente, próximo à válvula ileocecal e habitualmente não apresenta associação com diverticulose de outras porções do cólon(2, 21).

Pacientes com diverticulite cecal têm apresentação clínica praticamente indistinguível de apendicite aguda com febre, leucocitose e dor abdominal em quadrante inferior direito. A apresentação clínica da diverticulite cecal também pode ser a mesma do carcinoma ulcerado de ceco envolvendo o apêndice cecal. Desse modo, o correto diagnóstico pré-operatório raramente é obtido(12).

CASUÍSTICA Caso 1 Paciente MSMB, 35 anos, feminino, branca, previamente hígida, foi admitida com o quadro de dor abdominal em quadrante inferior direito, de forte intensidade, iniciada 24 horas antes da internação. A dor era precipitada pela movimentação com aumento gradual de sua intensidade.

O exame físico revelou dor à palpação profunda e à descompressão súbita do quadrante inferior direito. Temperatura axilar de 38ºC, contagem de leucócitos de 14.000 x 106/L e 10% de bastonados, hemoglobina de 12,8 g/dL e hematócrito de 38%. O exame qualitativo de urina (EQU) foi normal.

O diagnóstico presuntivo foi de apendicite aguda. Porém, durante a laparotomia, observou-se massa localizada no ceco próximo à válvula ileocecal, de aproximadamente 4 cm de diâmetro, que estava perfurada e tamponada pelo omento maior. Havia aumento do volume dos linfonodos do mesocólon. Devido à suspeita de malignidade, foi realizada hemicolectomia direita com íleo transverso anastomose primária término-terminal. A evolução pós-operatória foi sem intercorrências.

O exame anatomopatológico revelou divertículo verdadeiro único de ceco com diverticulite aguda necrosante e perfuração tamponada pelo omento maior, observando-se peritonite aguda focal e periapendicite aguda focal.

Caso 2 Paciente JDA, 47 anos, masculino, branco, admitido com quadro de dor abdominal em fossa ilíaca direita, iniciada 3 dias, com piora progressiva de intensidade, associada à febre e a fezes diarréicas. Realizada apendicectomia 15 anos.

Ao exame apresentava abdome distendido, timpanismo à percussão abdominal, defesa abdominal, dor à palpação abdominal profunda, principalmente em fossa ilíaca direita, sem dor à descompressão súbita. Temperatura axilar de 37,2ºC, hemoglobina de 13,4 g/dL, hematócrito de 38,8%, contagem leucocitária com 19.300 x 106/L com 5% de bastonados. O EQU estava normal. Foi realizada ecografia abdominal, que evidenciou grande espessamento de paredes do ceco, saculação de sua parede lateral, com conteúdo ecogênico, medindo 2,5 cm x 1,6 cm, circundada por gordura omental infiltrada. Diagnóstico ecográfico: provável diverticulite cecal. A seguir, foi realizada tomografia abdominal, que revelou espessamento parietal e infiltração da gordura pericecal, que sofreu discreta impregnação pelo meio de contraste, de aspecto compatível com processo inflamatório cecal. Foi optado por tratamento conservador, iniciando-se antibioticoterapia com ampicilina, gentamicina e metronidazol, obtendo-se completa resolução do quadro em 6 dias.

Caso 3 Paciente OICV, 51 anos, feminino, branca, iniciou 2 dias com quadro de dor abdominal periumbilical, que se localizou na fossa ilíaca direita, associada à anorexia. Não apresentava febre, náuseas, vômitos ou alterações do hábito intestinal.

Ao exame, apresentava abdome flácido, dor à palpação da fossa ilíaca direita, sem sinais de irritação peritonial. Apresentava temperatura axilar de 36,7ºC, hemoglobina de 13,4 g/dL, hematócrito de 39,6%, contagem leucócitária 6.900 x 106/L com 2% (de neutrófilos bastonados). A ecografia abdominal demonstrou lesão arredondada e tubular de 2 cm, com intensa sombra acústica, podendo estar relacionada a quadro de apendicite aguda. A seguir, foi realizada tomografia computadorizada abdominal, que revelou espessamento parietal do ceco e infiltração da gordura adjacente, podendo representar processo inflamatório, não sendo descartada doença neoplásica. Também se identificou imagem arredondada de 1,0 cm, que pode estar relacionada com fecalito no interior da luz do apêndice cecal.

Foi indicada laparotomia exploradora durante a qual foi identificada massa de consistência endurecida de aproximadamente 3 cm de diâmetro no ceco. Devido à suspeita de malignidade foi realizada hemicolectomia direita com anastomose primária ileocólica término-terminal. A evolução pós-operatória foi sem intercorrências.

O exame anatomopatológico evidenciou divertículo único de ceco, com diverticulite crônica supurativa e periviscerite.

Caso 4 Paciente LSB, 26 anos, masculino, branco, previamente hígido, foi admitido com quadro de dor abdominal em fossa ilíaca direita, com evolução de 4 dias, de forte intensidade, com piora progressiva, associada à febre. Negava náuseas, vômitos e mudança de hábito intestinal.

O exame físico revelou dor à palpação profunda e à descompressão súbita da fossa ilíaca direita. Temperatura axilar de 36ºC, contagem de leucócitos de 13.400 x 106/L e 20% de bastonados, hemoglobina de 14,5 g/dL, hematócrito de 43,8%. A ecografia abdominal evidenciou imagem hipoecóica com 2,6 cm de calibre, arredondada, alongada, com intensa sombra acústica central, podendo estar relacionada à apendicite aguda.

Foi indicada laparotomia exploradora, durante a qual foi observada massa localizada no ceco, de aproximadamente 2,5 cm de diâmetro, ulcerada. Havia aumento do volume dos linfonodos do mesocólon. Devido à suspeita de malignidade, foi realizada hemicolectomia direita com íleo transverso anastomose primária término-terminal. A evolução pós-operatória foi sem intercorrências.

O diagnóstico anatomopatológico foi divertículo de ceco, com inflamação crônica abscedida, hemorragia e periviscerite. Linfadenite crônica em linfonodos retrocecais e mesocólicos.

DISCUSSÃO A maioria dos pacientes com diverticulite de ceco se apresenta com dor abdominal indistinguível de apendicite aguda. O diagnóstico pré-operatório requer alto índice de suspeição, especialmente em pacientes jovens, com ancestrais asiáticos, que apresentam dor em quadrante inferior direito por mais de 24 horas de duração, sem náuseas, vômitos ou anorexia, e paciente apendicectomizado(1, 4, 9, 13).

A radiografia de abdome pode revelar fecalito em até 50% dos casos e enema opaco pode ajudar na delimitação do divertículo com ou sem fecalito(22). A dificuldade de visualizar o divertículo não exclui a possibilidade de sua presença, pois o lúmen diverticular pode ser obstruído por um fecalito ou por edema do colo do divertículo(6, 19). RAO et al.(17) avaliaram a tomografia computadorizada para o diagnóstico diferencial de dor abdominal em quadrante inferior direito e encontraram sensibilidade de 98% e especificidade de 98% no diagnóstico de apendicite aguda. Além disso, demonstraram que a tomografia computadorizada seria um exame com boa relação custo'benefício a ser empregado no diagnóstico diferencial dos quadros de dor abdominal com suspeita de apendicite aguda, o que se traduziu na redução de explorações cirúrgicas apendiculares negativas.

Quando a laparotomia revela apêndice normal e uma massa inflamatória no ceco, a suspeita clínica não deve ser direcionada somente para malignidade, mas também para diverticulite cecal. Outras condições no diagnóstico diferencial são doença de Crohn, actinomicose, perfuração por corpo estranho, amebíase, tumor carcinóide e tuberculose(18).

Algumas manobras intra-operatórias têm sido sugeridas para o correto diagnóstico e apropriado tratamento(3). A mobilização do ceco pode auxiliar durante a investigação. Palpação direta da lesão pode revelar um fecalito, sugerindo diverticulite cecal, e palpação indireta através da parede intestinal oposta pode permitir a palpação do óstio diverticular(6, 19). Alguns autores(3, 11) recomendam cecotomia e biopsia de congelação; outros, porém, argumentam que este procedimento pode aumentar o risco de contaminação fecal e, em caso de malignidade, pode haver disseminação de células neoplásicas. Para divertículo solitário sem reação inflamatória apenas diverticulectomia simples com apendicectomia en passant, tem sido proposto(11, 13, 14, 19).

Se diagnóstico conclusivo de diverticulite cecal é obtido antes da realização de cirurgia, tratamento conservador com antibióticos de amplo espectro pode ser apropriado. Alguns autores recomendam que, se um divertículo cecal é reconhecido durante a cirurgia, ele deve ser deixado in situ e tratado somente com antibióticos de amplo espectro(5, 6, 10), conforme a conduta adotada no caso 2 da presente casuística.

Estudo de revisão encontrou um correto diagnóstico intra-operatório em somente 65% dos pacientes submetidos a hemicolectomia direita de emergência(16). Em outra revisão, esse índice foi de 84%(15). Nesta situação, diagnóstico de câncer não pode ser apropriadamente excluído. Adicionando-se a isso, se o divertículo é mantido, existe risco de recurrência de 15% a 71%(7, 9).

Finalmente, estudos retrospectivos têm mostrado que a hemicolectomia direita de emergência é segura para diverticulite cecal, com taxa de mortalidade de 1,4% (7), tendo sido realizada nos três pacientes em que não se obteve diagnóstico pré-operatório.

Recomenda-se laparotomia exploradora quando não certeza diagnóstica pré- operatória, especialmente em pacientes idosos. Em virtude da dificuldade no diagnóstico transoperatório e de o diagnóstico diferencial envolver doença maligna, aconselha-se hemicolectomia direita para massas cecais inflamadas descobertas no transoperatório.


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