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BrBRCVHe0034-71672003000500012

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variedadeBr
ano2003
fonteScielo

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Mulher portadora de câncer de mama: percepção sobre a doença, família e sociedade Mulher portadora de câncer de mama: percepção sobre a doença, família e sociedade1

Woman with breast cancer: perception about the disease, family and society

Mujer portadora de cáncer de mama: percepción, sobre Ia enfermedad, familia y sociedad

Sinvalana Schwerez FunghettoI;Marlene Gomes TerraII; Leila Regina WolffIII; IEnfermeira, Mestre em Enfermagem, Enfermeira Assistencial do Hospital Moinhos de Vento- RS, Docente do Centro Universitário La Salle-RS IIMestre em Educação, Professsora Assistente do Departamento de Enfermagem, Coordenadora do Curso de Graduação de Enfermagem da UFSM, Membro do GEPES, Santa Maria/RS IIIEnfermeira, Professora Assistente do Departamento de Enfermagem da UFSM, Mestre em Enfermagem em Saúde Pública, Membro do GEPES, Santa Maria/RS. E-mail do autor:nursefunghetto@ig.com.br

1 Introdução O câncer de mama é a neoplasia maligna responsável pelo maior número de óbitos em mulheres no mundo e estima­se cerca de um milhão de casos novos no mundo inteiro até o final do ano 2000(1),sendo que a metade nos países em desenvolvimento(2). No Brasil, os óbitos por câncer de mama representam 16% da mortalidade por neoplasia maligna entre as mulheres, ou 2,3% de todas as causas de morte. No período de 1976 a 1990 houve 32.966 casos de diagnóstico de câncer de mama em mulheres. A idade média foi de 53 anos, 95% dos diagnósticos ocorreu nas idades entre 29 e 79 anos.

No Brasil, a ênfase se no tratamento especializado, atestado pelo inexpressivo número de programas de prevenção e detecção bem planejados, executados e avaliados pelo alto percentual de diagnósticos de tumores avançados e pela deficiência de cuidados de reabilitação e paliativos e assim, no ano de 1999, surgiram 31.200 novos casos de câncer de mama no País, sendo que estes 34,9% eram em estágio 111 entre os tumores que mais incidem. Entre nós, brasileiros, encontram-se aqueles que podem ser evitados (os cânceres do colo uterino, estômago, pulmão e boca) e curáveis ou controláveis (os cânceres do colo uterino, mama, estômago e leucemias)(3:313).

No estado do Rio Grande do Sul, o câncer de mama é a neoplasia mais diagnosticada depois do câncer de pele, superando o câncer de cólon uterino, tumor mais freqüente em outros estados(4).

No município de Santa Rosa, no ano de 1999, o número de óbitos de mulheres portadoras de câncer de mama chegou a 1,8% da população feminina e, devido aos casos de câncer de mama chegarem para a consulta médica em fase adiantada não é possível a cirurgia conservadora, sendo, então, indicada a mastectomia radical (1). Assim, como podemos observar, muitas mulheres quando chegam ao hospital estão com a doença em fase avançada, levando-nos a crer que está havendo uma Idcuna no nosso nível primário de saúde. Desta forma, fomos `compreendendo a importância de implantar Serviços Básicos de Atenção Primária, programas de assistência à mulher que visassem a uma melhor qualidade de vida e que elas pudessem ter acesso aos serviços especializados.

A Fundação Municipal da Saúde de Santa Rosa vem desenvolvendo um programa de controle de câncer de mama que objetiva reduzir a morbi-mortalidade por câncer de mama no municipio de Santa Rosa, através da detecção precoce de alterações da mama mediante exame periódico, diagnóstico, tratamento inicial, divulgação e conscientização do auto-exame nas mulheres do municipio. Sabemos que 90% dos nódulos da mama são encontrados pela própria paciente, quando esta é ensinada a realizar o auto-exame de forma clara e precisa, com demonstrações e prática, havendo um maior comprometimento em realizá-Io mensalmente e, neste sentido, o ensinamento prático com linguagem apropriada, ressaltando a necessidade de efetuar o auto-exame de mamas de modo regular, cuidadoso e completo(4).

Toda a população do municipio recebe orientações de como detectar o câncer de mama, sendo que o profissional deve estar atento aos fatores de risco condicionantes desta neoplasia. O diagnóstico é realizado na consulta médica ou de enfermagem, caso haja qualquer alteração, tanto o médico como o enfermeiro podem solicitar a mamografia, conforme protocolo existente no serviço.

Quando a paciente é encaminhada para fazer a mamografia, entra numa fila de marcação de exames, sendo que a mesma é priorizada. Após a realização do exame, esta mulher retorna à unidade sanitária e o médico a encaminha a um especialista.

Na unidade de internação, após a cirurgia e biópsia, notamos a necessidade de orientar a paciente, previamente, quanto ao tratamento de quimioterapia, para que a dietoterapia e a sua inclusão no grupo multiprofissional de apoio psicológico. De forma que assim que chegasse ao ambulatório, tivesse conhecimento do que seria realizado. Isto justifica a inclusão de visitas da enfermagem, no segundo dia pós­operatório, para orientações de alta quanto: à reabilitação, aos cuidados com o dreno de "port-vac",à fisioterapia. Lembramos, que a páciente entra no programa de alta no segundo dia pós­operatório.

Quando esta mulher chega ao ambulatório, é encaminhada a uma consulta de enfermagem onde lhe é explicado como será o tratamento: seus efeitos, sua terapêutica, dentre outras coisas implicadas no processo.

O grupo multiprofissional é composto por uma enfermeira, uma mastologista, um terapeuta ocupacional, uma psicóloga e duas ex-pacientes que encerraram o tratamento. As ex-pacientes que integram o grupo auxiliam na troca de experiências, o que por um lado torna menos estressante o início e a compreensão do tratamento para as demais mulheres que participam do grupo.

O bom êxito do tratamento está relacionado diretamente ao grau de envolvimento da mulher e de sua família. Cabe aos profissionais da área da saúde orientar às mulheres portadoras de câncer de mama, para que as mesmas possam encarar a sua doença e reabilitação através do autocuidado.

Frente a isto, nós profissionais da saúde precisamos resgatar o compromisso técnico-político-científico-social, explicando às pacientes sobre o processo saúde-doença e como prevenir as complicações.

Desta forma, percebemos a importância de conhecermos os aspectos psicológicos da mulher acometida por uma doença que afeta sua estrutura corporal em um órgão ligado à feminilidade desta mulher. Em vista disso, é possível acompanhá-Ia no tratamento, levando-se em consideração que esta mulher é um ser humano e não apenas uma doença ou um tumor de mamas, mas que tem um nome, uma cultura, uma família.

Com a finalidade de entender como ocorre a reabilitação da mulher portadora de câncer de mama, tendo em mente o sentido holístico do ser humano e considerando a pessoa como o resultado da interação do físico e da mente, propomos este estudo, fundamentando-o em alguns conceitos da teoria de enfermagem de Imogene King(5).

Imogene King é uma teórica de enfermagem norte­americana que em 1960, ao direcionar seus estudos sobre a magnitude de conhecimentos que estão disponíveis para as enfermeiras, propôs uma estrutura conceitual de referência para a enfermagem, em resposta aos sobressaltos que o progresso científico e tecnológico vinham causando sobre a profissão de enfermagem(5).

Esta teórica identifica sua estrutura conceitual como uma estrutura de sistemas abertos, na qual o foco da enfermagem é o cuidado aos seres humanos, onde eles tornam-se participantes da dinâmica do cuidado através da racionalização das informações, interagindo na alocação de recursos, sustentando e desenvolvendo sua liberdade intelectual e cuidando da sua saúde, quando em circunstâncias de entender e comunicar as necessidades de ajustamento para a sua reintrodução pessoal, interpessoal e grupal, fundamentada na interação e percepção do paciente/enfermeira.

A percepção, ação, reação, interação, focos da teoria de King, são comportamentos observáveis entre o paciente/ enfermeira no processo de interação com o ambiente na obtenção de suas metas(5).

2 Objetivo Considerando a nossa experiência com mulheres portadoras de câncer de mama, o presente estudo tem como objetivo geral identificar, através de alguns conceitos da Teoria de Imogene King, a percepção da mulher portadora de câncer de mama em relação à doença, à família e à sociedadel5l.

3 Descrição do caminhar metodológico 3.1 Campo da Prática O presente trabalho foram desenvolvido na Sociedade Hospital de Caridade de Santa Rosa (SHCSR), no turno da manhã, onde exercia a atividade de chefia do Ambulatório de Oncologia.

3.2 Processo de Enfermagem A população alvo deste trabalho foi às mulheres portadoras de câncer de mama, que não tiveram recidiva, encaminhadas da internação, após a cirurgia, para o ambulatório de oncologia da SHCSR. Foram entrevistadas quatro mulheres, num grupo de oito pacientes, com idades variando entre 40 e 50 anos, escolhidas aleatoriamente, pois todas as mulheres do grupo de ambulatório incluidas na população tinham a possibilidade de pertencer à amostra.

A assistência era realizada as pacientes de forma individual estendendo-se à família. quando as mesmas estavam presentes. Desta forma, o alerta para "o fato de que o processo de interação prevê comportamentos observáveis entre duas ou mais pessoas, ou seja, uma proximidade maior"(6:57). Assim, fomqs percebendo. a importância do familiar estar mais próximo e ac~panhar a paciente no momento do atendimento de enfermagem. Neste sentido, a entrevista aberta tem como finalidade encorajar as pessoas a fornecer informações de suas vidas, seus pontos de vista e visão do mundo(7).

Optamos durante o estudo pela entrevista semi­estruturada e informal, proporcionando, desta forma, uma melhor interação com as mulheres, permitindo abordagens pessoais. De acordo com este tipo de entrevista, as questões são feitas às pessoas diretamente sobre o assunto que se quer compreender.

Procuramos ter o cuidado para não induzir resposta com a pergunta, pois quanto mais aberta ela for, mais amplitude para outras perguntas, e mais outras conforme a necessidade.

O estudo foi realizado durante os meses de agosto de 1999 a setembro de 2000.

Utilizamos o nome de pedras preciosas e semipreciosas para identificar as mulheres entrevistadas, a omissão dos nomes deve-se à preservação da identidade, compromisso firmado por ocasião das entrevistas. Asseguramos às mulheres sigilo absoluto sobre seus dados pessoais, sendo que foi dada ênfase somente à sua opinião, ao seu comportamento, à interação e transação frente às questões norteadoras do estudo sobre mulheres portadoras de câncer de mama. As entrevistas foram realizadas na sala de consulta de enfermagem do hospital e agendadas de acordo com o início do tratamento no ambulatório.

O ambiente da sala inspirava tranqüilidade e, assim sendo, "este processo de interação humana com o ambiente influencia o comportamento, proporciona significado à experiência e representa a imagem e a realidade de cada individuo"(8).

O material auxiliar era o gravador. Era solicitado que fossem fidedignas em suas respostas, as quais eram transcritas após as entrevistas, mas eram comentadas com as mesmas as informações fornecidas.

Assim, iniciamos um processo de interação da entrevistadora com as pacientes, em que foi possível observamos várias reações, comportamentos e a sensibilidade das mesmas durante as entrevistas.

Neste sentido, na relação interpessoal profissional ­paciente, o enfermeiro através da sua percepção, tem a possibilidade de escolher, de informar, de compartilhar sentimentos, vivências e experiências, favorecendo desta forma, a interação e as metas do momento da consulta.

As questões abordadas foram: 1o Qual a sua percepção em relação a sua doença/câncer de mama? 2o Como você percebe a sua relação com a sua família e a sociedade? Diante das implicações psicológicas do câncer de mama à mulher, é válido enfatizar a importância da aplicação de alguns conceitos do processo de enfermagem proposto por Kingonde a estrutura conceitual está identificada por estrutura de sistemas abertos e a teoria por consecução de metas(5); e, de acordo com, King centrou seus estudos na teoria geral dos sistemas das ciências de condutas, identificando nestes níveis distintos de funcionamento, individuo, grupo e sociedade e, nos três sistemas o elemento básico é o ser humano e cada indivíduo é um sistema, sendo este dividido em(6:27): Pessoal- aquele em que a pessoa interage com ela mesma.

É como ela se percebe como ser - as características do crescimento e desenvolvimento, imagem corporal, o tempo e o espaço.

Interpessoal - são sistemas formados pela interação entre os seres humanos.

Social- "é um sistema de limite organizado de regras sociais, comportamentos e práticas desenvolvidas para manter os valores e os mecanismos que regulam as práticas eas regras"(5:115).

Neste processo, torna-se importante à obtenção de metas onde as enfermeiras e os pacientes possam comunicar as informações e estabelecer metas comuns e, após, interagir para alcançar estas metas.

As fases do processo estabelecidas são apresentadas a seguir, em que relacionamos as fases adaptadas da teoria de King com ações de enfermagem, para possibilitar uma visão geral do desenvolvimento da prática assistencial.

A coleta de dados: Apresentação à mulher com câncer de mama, ao grupo explicando o trabalho. Era realizada entrevista individual informal semi- estruturada a paciente e a questão abordada era: Quais as suas expectativas no seu tratamento? Desta forma, estabelecíamos a interação com as mulheres, através da observação do seu comportamento, comunicação verbal! não verbal e entrevista. No decorrer da entrevista captamos dados referentes aos sistemas Pessoal, Interpessoal e Social.

Diagnóstico de Enfermagem: a partir da entrevista, foram levantados problemas das pacientes os quais denominamos de situações que foram transcritos após as entrevistas e ordenados com os sistemas.

Estabelecimentos de metas: levantadas no diagnóstico de enfermagem nas quais foram discutidas com as pacientes fazendo emergir sugestões interativas para traçar um plano, através do processo interativo/ educativo, sendo selecionadas as prioritárias de acordo com as decisões das pacientes e sobre o desejo ou não de ser atendida.

Avaliação: A avaliação ocorreu pelos resultados comportamentais no momento da comunicação, a percepção, a interação e a transação da mulher.

Nesta etapa do trabalho, são apresentados os resultados obtidos pela análise das entrevistas, da percepção/interação com as mulheres com câncer de mama, tanto na forma de descrição quanto de interpretação, com a finalidade de analisar, interpretar as respostas das entrevistas quanto à percepção que elas têm sobre o tema relativo à questão pessoal, interpessoal e social.

Desta forma, realizamos a leitura das situações coletadas nas entrevistas procurando agrupá-Ias de acordo com a estrutura conceitual de King(5)O entendimento das situações ocorreu a partir da compreensão de enunciados, idéias e reações obtidas nas entrevistas com as mulheres com câncer de mama, identificadas nos referidos sistemas.

4 Percepções das mulheres com câncer de mama A partir da análise das falas, designamos cada experiência como sendo situações vivenciadas pelas pacientes e, por situações, no contexto ao longo das entrevistas.

Primeira situação:sistema pessoal Entendemos que sistema pessoal é aquele em que a pessoa interage com ela mesma, percebendo-se, trocando informações com o meio ambiente e com os outros. Assim, os conceitos relevantes deste sistema são percepção, self, imagem corporal, crescimento e desenvolvimento, tempo e espaço.

Desde o início do tratamento, observamos a questão da percepção presente na mulher portadora de câncer de mama em relação à perda do cabelo, à auto-imagem, ao diagnóstico. Estas experiências se deram num processo dinâmico na busca de adaptação e equilíbrio, uma vez que passam a conviver com o diagnóstico da doença, com perdas, alterações da imagem corporal, complicações relacionadas a sua reabilitação e, ainda, com as incertezas da doença.

Ao realizar a análise das entrevistas, identificamos alguns temas que, juntos, formaram a estrutura essencial da experiência pessoal da mulher portadora de câncer de mama frente à doença.

4.1 Diagnóstico da doença de acordo com as mulheres entrevistadas De acordo com as pacientes, antes do aparecimento da doença, suas vidas transcorriam de maneira ordenada, com certa rotina e organização. Elas sentiam- se saudáveis, que não percebiam qualquer sintoma que se relacionasse à doença. O significado atribuído ao câncer como doença fatal favoreceu a percepção da realidade, como identificaremos na fala a seguir: No início achei que omundo viria abaixo. Puxa como agente era feliz antes semsaber que tinha este problema, por pouca coisa tu vai ter problema, reclamar de tudo, então tudo issoeu fui trabalhando e hoje sou outra mulher que dou valor avida e agente tem que agradecer cada dia, cada momento atudo aquilo que agente teve, não reclamar outra coisa do lado de sentir, tu começa pensar puxa vida e daí (Diamante).

Diferentes foram às formas de como e quando descobriram o câncer; para umas ocorreram durante o auto­exame, para outras ocorreram durante uma consulta médica em que as pacientes buscavam uma melhora da qualidade de vida, conforme o depoimento a seguir: [...] eu fui consultar para dor de cabeça, mas não tinha um neurologista eu consultei com uma ginecologista, quando ela me perguntou se eu tinha algum problema ginecológico eu disse que não sóum carocinho no seio mas não me incomodava, quando ela viu me disse tu chama isso de carocinho [...] (Rubi).

Pela fala, a paciente deixa claro que a alteração da rotina, a organização de vida, o medo do inesperado são algumas das condições que acabam ocasionando a perda do equilíbrio, da saúde e do self.

Desta forma, "o ser é composto de pensamentos e sentimentos que constituem a consciência da pessoa sobre a existência individual, a sua concepção de quem é e o que é". Constitui o mundo interior de uma pessoa, o indivíduo é conhecido por ele mesmo(5:172). Seguindo esta linha de pensamento, podemos perceber que saúde é um processo dinâmico do indivíduo no qual a mudança é constante e permanente e pode ser vista como a capacidade do indivíduo para funcionar em seus papéis habituais.

Estes relatos demonstram o quanto à mulher é frágil em relação ao assunto do câncer de mama e o quanto era temido pelas mulheres, visto que ele é descrito com outros nomes. O aparecimento de sinais de desestruturação do bem-estar evidenciou um desequilíbrio na vida da paciente que antes era tido como organizado e agora, tornara-se totalmente incerto.

4.2 Imagem corporal A aparência, o visual nos é repassado em nossa cultura como o belo, o estar bonito(a), elegante, sentir-se bem. Para a mulher, a retirada da mama passa a ser uma realidade anatõmica, corporal e fisiológica que acarreta uma mescla de sentimentos, como constataremos no depoimento a seguir: [...] eu me sentia mutilada tanto que quando eu ia tomar banho eu chorava sempre mas, eu pensava no subconsciente um dia vou fazer a reposição [...] (Turquesa).

Nas mulheres entrevistadas percebemos uma preocupação em relação a sua imagem corporal onde algumas delas deixam de se olhar no espelho, de se tocar, ficando muitas vezes com vergonha das outras pessoas e, para reforçar a nossa idéia recorremos a definição de ímagem corporal como "a maneira com que a pessoa percebe a si mesma e a maneira como os outros reagem a sua aparência"(5).

Segunda situação: sistema interpessoal Na nossa concepção, os Sistemas Interpessoais são formados por seres humanos interagindo entre si e, à medida que estes se tornam um grupo, aumenta complexidade de interações, tendo como enfoque principal o ambiente. Para este sistema, os conceitos relevantes são: interação, comunicação, transação, papel e estresse.

4.3 Comunicação/relação paciente/profissionais da saúde Algumas mulheres, após procurarem a assistência, frustraram-se com a baixa resolutividade dos serviços de saúde e a forma como os profissionais da saúde se comunicam com as mesmas, o que adiou por diversas vezes o diagnóstico e, consequentemente, os seus tratamentos, como veremos na fala a seguir: [...] acho que tinha que mudar os médicos, fazer mamografia sónão adianta, tem que examinar, sei , comigo foi oque aconteceu apesar que a primeira médica me apalpou [...], talvez se ele tivesse me examinado [...] (Madrepérola) Em vista disso é que nós, profissionais da saúde, devemos dar importância às queixas das pacientes, principalmente às queixas clínicas durante a assistência: a informação representa um comportamento básico para a interação e que compõe a comunicação. Processo de interação social fundamental nas relações humanas que de acordo com as citações da clientela em pauta ela se mostra deficiente tanto na meta do cuidar como no repasse de conhecimentos do cuidado(6:102).

Como podemos observar, com a não valorização dos sinais, sintomas e sentimentos das mulheres pelos profissionais da saúde e a pouca resolutividade dos serviços faz com que o diagnóstico precoce não aconteça e, posteriormente, torna a chance de cura, cada vez, mais remota.

4.4 Relacionamento marital Quando a mulher faz a cirurgia, acaba afetando a sua auto-estima e, consequentemente, diminui o grau de satisfação com o seu corpo e isto acaba influindo na qualidade do relacionamento conjugal.

[..,] orelacionamento com omarido muda, ele gosta do seio, nunca reclamou mas tu sente que muda ... isso tudo eu percebi [...] (Rubi).

King(5:146) define percepção como: ... representação da realidade que cada pessoa tem. É uma conscientização das pessoas, objetivos e eventos. É um processo de atividade humana com o ambiente. É um processo de organização, interpretação e transformação dos dados sensitivos da memória. A percepção sentido à experiência de cada um, representa a imagem da realidade de cada.

4.5 O grupo Mesmo com a doença, entendimento de que existem doenças piores, e as mulheres dão importância ao grupo de apoio para compartilhar os seus sentimentos, ocorrendo uma transação/interação desta com as outras mulheres, e isto aparece bem quando Madrepérola diz: [...] ogrupo é uma beleza, eu acho que não mama deveria ter grupo, asoutras doenças também intestino, estômago, esôfago, todos tinha que ter um pouco de carinho (Madrepérola).

Neste sentido, poder conversar claramente e trocar idéias sobre vários aspectos com outras mulheres que passaram pela mesma experiência ajuda sobremaneira para encontrar suas próprias soluções. Falar de seus medos, de suas angústias, de seus sentimentos abertamente, auxilia na elaboração desta nova realidade. Poder fazê-Io num grupo permite que o paciente encontre com quem se identifique, com quem falar de igual para igual e sentir que suas angústias não são únicas(9). A interação é definida como "um processo de percepção e comunicação entre a pessoa e o ambiente e entre a pessoa e outra pessoa, representada por comportamentos verbais e não - verbais"(5:141).

4.6 Estágios da doença Constantemente, a mulher portadora de câncer de mama vivencia uma situação de estresse, pois ocorrem muitas implicações psicológicas que afetam tanto o lado físico como o emocional, ocasionando prejuízos para a saúde bem como acarretando perda da qualidade de vida. Assim, a idéia na relação doença- estresse refere ser: "um estado dinâmico pelo qual o ser humano interage com o meio ambiente para manter o equilíbrio para o crescimento, o desenvolvimento e o desempenho"(5:146).

[...] eu perdi ocabelo, é uma coisa tão natural, tem gente que raspa porque é bonito, e porque nós por causa de uma doença dessa tem que usar peruca [...] (Madrepérola) [...]quando eu ia para obanho eu sóchorava [...]" (Turquesa).

Terceira situação:sistema social O sistema social é constituído por sistemas menores que compõem grupos com características e interesses em comum, e acabam influenciando o comportamento social com a família, com os grupos de trabalho, com os grupos religiosos, com o sistema educacional, com o sistema de trabalho e com grupos afins.

4.7 A família De acordo com as colocações feitas por algumas mulheres, observamos que elas haviam recebido apoio emocional da família.

Desta forma, a participação da famílía, desde o diagnóstico de câncer, é primordial, e ela deve rapidamente se tornar uma força positiva para o crescimento interior da mulher(10).

A família representa para estas mulheres um importante apoio para o enfrentamento da doença, porém, quando isso não acontece, ocorre um certo sentimento de frustração, fato que identificamos na fala a seguir: [...] quando eu cheguei para falar com omeu filho ele dizia: Mãe não chora, tu sabe eu não posso meincomodar, eu tenho problema de coração (Rubi).

A repercussão de um relacionamento familiar solitário, triste, insatisfatório, acaba refletindo na reabilitação e tratamento da paciente e, assim, a solidão, na realidade, não é temida por si mesma, mas pela impressão de desamparo que provoca(11).

4.8 O Ambiente O ambiente é requisito fundamental, pois é onde a paciente se integra, onde acontecem as interações e transações do cuidar e onde é possível a pessoa se realizar. Quando não se realiza, torna-se difícil à efetivação do processo de cuidado e, neste sentido, "este processo de interação humana com o ambiente influencia o comportamento, proporciona significado à experiência e representação a imagem da realidade do indivíduo"(8:171). Abaixo, constataremos como foi a percepção em relação ao ambiente.

[...] era muito ruim, péssimo, pior impossível, porque você estámal, bom eu tinha amania de dizer estou indo para oabate, porquê realmente tu sai de casachega aqui aquele ambiente terrível com quatro sofás, assim aTV na tua frente umas revistas antigas do teu lado uma pessoapior que você do teu lado, émuito mal feito, deveria ser assimum ambiente saudável com música ambiental, flores, folhagens vida dentro dele enão é,de tu chegar no ambiente efalar das mesmascoisas (Diamante).

O ambiente é uma função de equilíbrio entre as interações internas e externas.

Isso é evidenciada nas falas a seguir(5).

[...] as pessoaschegavam eperguntavam: tu estábem mesmotem certeza?Eu não sei seera coisa de estarem preocupadas mesmoou por querer cochichar, podia estar pior (Diamante).

[...] dias dessesuma mulher medisse: Ai como tu estábem! É estou bem graças aDeus. É pelo menos de rosto [...] (Madrepérola).

5 Considerações finais Baseado no estudo da percepção/interação das pacientes portadoras de câncer de mama e nas suas expectativas quanto ao seu tratamento, chegamos às seguintes considerações: - durante as entrevistas, observamos que cada paciente reagia diante dos questionamentos a sua própria maneira. Elas, em sua totalidade, demonstraram ansiedade antes e durante as entrevistas por reviverem experiências pessoais, familiares difíceis, porém, na medida em que evoluía o diálogo, o nível da ansiedade diminuía; - percebemos, a importância da imagem corporal para a mulher, quando esta se refere a sua mama, porque interfere diretamente na sua feminilidade e sexualidade, influindo no grau de satisfação de seu corpo e tornando o seu relacionamento conjugal insatisfatório; notamos que a mulher com câncer de mama vivência uma situação de estresse intensa, pois esta afeta tanto o corpo na sua dimensão física, psíquica e espiritual, ocasionando o desequilíbrio do seu self; - observamos que, quando ocorre a interação/transação com outras mulheres que tem o mesmo diagnóstico e compartilham suas vivências, sentimentos e experiências, a mulher começa a perceber que ela é semelhante a outra, inclusive com as mesmas angústias, receios, medos; - constatamos que a família pode ser considerada como um suporte emocional importante para o enfrentamento do câncer de mama e que, quando isto não ocorre, surgem sentimentos de frustração e tristeza; - sentimos que o ambiente, é requisito fundamental para que a paciente possa se integrar e fazer com que aconteçam as interações e transação do cuidado.


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