A influência da comunicação não verbal no cuidado de enfermagem
PESQUISA
A influência da comunicação não verbal no cuidado de enfermagem
The influence of non-verbal communication in nursing care
La influencia de la comunicación no verbal en la atención de enfermería
Carla Cristina Viana SantosI; Kaneji ShiratoriII
IEnfermeira. Residente em Enfermagem Médico-Cirúrgica da EEAP/UNIRIO,
carlaunirio@bol.com.br
IIEnfermeria. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem Fundamental da
EEAP/UNIRIO
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente estudo é vinculado ao Núcleo de Pesquisa e Experimentação em
Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, da Universidade do Rio de
Janeiro - UNIRIO. Ele teve sua origem a partir de um plano piloto, para o
desenvolvimento de um trabalho monográfico, que versa sobre a temática da
comunicação não verbal na interação da equipe de enfermagem com o cliente.
A problematização da referida pesquisa adveio da experiência por mim vivenciada
durante o ensino clínico da disciplina Atenção a Saúde do Adulto e do Idoso II,
que foi realizada no sexto período do curso de graduação; onde neste contexto,
eu pude prestar os cuidados de enfermagem a um cliente acamado, em uso de tubo
orotraqueal e os membros superiores imobilizados para contenção.
Entretanto, o cliente apesar de toda a dificuldade, tentava utilizar-se da
comunicação verbal, porém nem eu e nem a equipe de enfermagem conseguia
compreender o que ele expressava. Mas através da face e do olhar percebi a
grande angústia que o mesmo sentia, porém não sabia interpretar a informação
que ele emitia, mesmo que sem intencionalidade, pois segundo Cianciarullo
(1)"geralmente não temos consciência de nossa comunicação não verbal. Se
conseguimos ter consciência daquilo que falamos, muito mais difícil é estarmos
conscientes, por exemplo, de nossa expressão facial".
Portanto é possível concluir que através da comunicação não verbal,
transmitimos as mensagens de forma inconsciente, por meio da expressão facial,
da linguagem corporal, das características físicas, da tacesica e da proxêmica.
Desta forma, durante o desenvolvimento do trabalho monográfico e após a leitura
de diversas bibliografias, surgiu o interesse em desenvolver uma pesquisa que
abordasse a comunicação não verbal relacionando-a com a visão dos acadêmicos de
enfermagem.
Visto que diversas literaturas apontam para a necessidade de despertar nos
profissionais de enfermagem o interesse sobre a comunicação não verbal, como um
instrumento a ser utilizado pela equipe de enfermagem, possibilitando a estes,
compreender as mensagens enviadas pelos clientes e assim estabelecer um
relacionamento visando a atender as necessidades básicas dos mesmos.
Neste contexto, consideramos oportuno destacar o objeto de estudo, onde o qual
constitui-se em: O significado da comunicação não verbal sob a ótica dos
graduandos de enfermagem.
A partir da fundamentação adquirida mediante sucessivas leituras sobre o
assunto e após a experiência vivenciada durante o ensino clínico, surgiram
algumas inquietações, as quais constituíram-se nas seguintes questões
norteadoras:
- Qual o significado da comunicação não verbal para os alunos de graduação?
- Como os acadêmicos de enfermagem observam a influência da comunicação não
verbal durante a assistência de enfermagem?
Diante dos questionamentos suscitados com relação à comunicação não verbal sob
o ponto de vista dos acadêmicos de enfermagem, estabelecemos os seguintes
objetivos:
a) Identificar o significado da comunicação não verbal para os acadêmicos de
enfermagem e,
b) Analisar a influência da comunicação não verbal no cuidado de enfermagem sob
a ótica dos acadêmicos de enfermagem.
A relevância desta pesquisa está no fato da mesma contribuir para a ampliação
do conhecimento acerca da comunicação não verbal por parte dos profissionais de
enfermagem, uma vez que estes necessitam estar cientes da importância dessa
forma de comunicação para promoverem uma relação interpessoal com o cliente.
Cabe destacar também a necessidade que existe da aplicação de abordagens de
estratégias de ensinos sobre a comunicação não verbal durante a graduação em
enfermagem, tendo em vista a lacuna existente no meio acadêmico, onde se
observa que na prática existe a dificuldade em se estabelecer uma comunicação
efetiva.
E como afirma Cianciarullo(1), a inabilidade para compreender as mensagens
emitidas pelo cliente, constituem-se em barreiras da comunicação e esta é uma
capacidade que pode ser desenvolvida pelo profissional de saúde, objetivando-se
desta forma, a melhoria da qualidade da assistência a ser prestada.
Para realizarmos uma aproximação com o objeto do estudo, buscamos a
fundamentação teórica para aprofundar os aspectos relativos à comunicação.
"A comunicação é um ato intrínseco ao existir do ser humano"(1). Assim, como
afirma a autora, o ser humano tem por necessidade comunicar-se, pois o mesmo
vive em um sistema social, onde existe a interdependência entre os homens, a
fim de atingirem um objetivo em comum, tornando o homem um ser sociável.
Comunicação, segundo Stefanelli(2), pode ser entendida como uma troca de
mensagens que exercem influências no comportamento das pessoas envolvidas no
processo da comunicação, e é através da habilidade de comunicar-se que o homem
se relaciona e transmite os seus conhecimentos para o mundo.
A comunicação se dá de duas formas específicas: a_comunicação_verbal e a não
verbal, onde esta terá maior destaque neste estudo.
A comunicação verbal pode ser entendida como sendo aquela que é transmitida
através da linguagem escrita ou falada, por meio dos sons e palavras.
A comunicação não verbal compreende as expressões emitidas pelas atitudes
corporais, que não podem ser transmitidas através de palavras. Esta forma de
comunicação é, em maior parte das vezes, emitida pelo corpo sem que estejamos
conscientes do que estamos emitindo.
A forma de comunicação não verbal ganha importância porque ela pode confirmar
ou negar a mensagem transmitida através da expressão verbal e também pelo fato
desta estar sempre presente, esteja a comunicação verbal sendo emitida ou não;
como assinala Tavelbee(3): "É possível comunicar-se de maneira não verbal sem
utilizar a mensagem verbal, , entretanto, é pouco provável que um indivíduo
possa comunicar-se verbalmente sem utilizar mensagens não verbais"
A comunicação não verbal pode ser expressa de diversas formas, o que cabe aqui
trazer algumas das suas definições realizadas por Hargie et al apud Silva(4),
quanto às classificações:
- CINÉSICA ou LINGUAGEM DO CORPO - "Descreve as posições e a movimentação do
corpo humano que possui significado na comunicação interpessoal, nas diferentes
culturas. A análise cinésica incide sobre todas as partes do corpo,
ressaltando-se que as expressões faciais são bastante utilizadas para
demonstrar sentimentos".
- PROXÊMICA "Estuda o uso humano do espaço para fins de comunicação. Estão
envolvidos aspectos de proximidade consciente ou não de outra pessoa, (...), de
orientação, (...) e de territorialidade".
- PARALINGUAGEM "Estuda os sons produzidos pelo aparelho fonador é usado no
sistema sonoro da língua que está sendo usada (...), a paralinguagem fornece a
emoção do emissor".
- TACESICA "Focaliza o toque em situações de saudação, de despedida, entre
indivíduos de diferentes "status " social e entre sexos opostos".
Desta forma, quando a equipe de enfermagem consegue comunicar-se com o cliente
impossibilitado de expressar-se verbalmente, ela passa a interagir com o mesmo,
possibilitando uma melhor integração Enfermagem cliente, isto é, proporcionando
uma relação social com um indivíduo que muitas vezes está adoecido e fora do
seu ambiente social. Logo ao se estabelecer à comunicação, esta poderá diminuir
o estresse, a angústia, a ansiedade, o medo, a tristeza e a depressão do
cliente que antes não conseguia interagir com os profissionais.
Por isso, mais uma vez torna-se interessante ressaltar a importância da
utilização da comunicação não verbal ser utilizada pela equipe de enfermagem,
uma vez que se objetive cuidar do ser humano de maneira holística, considerando
o cliente como um ser singular, onde os cuidados a serem prestados a ele
deverão ser feitos de forma individualizada e peculiar a cada sujeito, pois
este é um ser humano inserido dentro do contexto bio-psico-social.
2. METODOLOGIA
A metodologia utilizada foi a de um estudo descritivo, no qual a modalidade
metodológica foi à abordagem qualitativa, por entendermos de acordo com Minayo
(5),é uma modalidade que dá ênfase as questões subjetivas da realidade,
preocupando-se com os problemas peculiares do contexto das relações sociais,
onde os dados numéricos não conseguem alcançar a profundidade do fenômeno a ser
pesquisado. Assim como, esta abordagem é a mais cabível ao estudo em questão,
pois buscamos compreender o significado da comunicação não verbal sob o ponto
de vista dos acadêmicos de enfermagem.
Com relação aos sujeitos do estudo, a população alvo foi os graduandos do curso
de enfermagem do quarto período de uma Universidade Pública Federal, localizada
no Estado do Rio de Janeiro, onde a sala de aula da instituição citada
consistiu-se como cenário para a pesquisa.
Dos 52 alunos da turma do quarto período, 85% participou do estudo, os
acadêmicos foram divididos em cinco grupos, de forma aleatória, formando uma
média de oito pessoas por grupo.
Foi realizada a distribuição de folhas de papel ofício e revistas objetivando-
se o desenvolvimento da dinâmica da sensibilidade, e desta forma, foi
solicitado aos graduandos que eles expressassem através da escrita e/ou da
técnica de corte e colagem as respostas para duas questões abordadas:
- O que você entende por comunicação não verbal?
- Qual a influência da comunicação não verbal durante os cuidados de
Enfermagem?
O grupo de discussão temática foi dividido em subgrupos, mantendo a mesma
temática em questão para todos os grupos, essa divisão tem por finalidade
facilitar a análise da temática única proposta para todos os grupos.
3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
Da apreciação dos dados coletados verificamos que todos os sujeitos dos cinco
grupos pesquisados identificaram o significado da comunicação não verbal
através da forma simbólica como pode ser observado no quadro abaixo.
Através deste quadro percebemos que os graduandos de enfermagem identificam a
comunicação não verbal como símbolos que retratam o comportamento humano
durante o processo comunicativo.
Os sujeitos desta pesquisa enfatizaram os símbolos não verbais como pode ser
observado no caso dos Sinais e símbolos (apontado por quatro grupos dos cinco
totais), utilizados no cotidiano de uma relação interpessoal, assim como a
Expressão facial (apontado por quatro grupos dos cinco grupos totais), que está
presente a todos os instantes nas relações humanas.
Entretanto cabe destacar outros símbolos que os graduando utilizaram para
identificar a comunicação não verbal e que são poucos citados nas literaturas,
como: A vestimenta que a pessoa venha a utilizar, onde esta pode ser traduzida
em aparência, sendo ela considerada o tipo de imagem que a mesma deseja
transmitir aos demais sujeitos sociais para o estabelecimento das relações; e o
outro símbolo que foi ressaltado pelos grupos e que também pode ser utilizado
pelo ser humano para expressão de suas necessidade foi expressão artística. Os
grupos consideraram a música e a pintura, onde eles, os sujeitos deste estudo
acreditam que o artista pode estabelecer a comunicação não verbal para exprimir
o pensamento e os sentimentos de uma situação vivenciada pelo artista, sendo
esta eternizada através dos tempos como pode ser observado no enigmático
sorriso de Moraliza.
E contrapondo-se a alguns autores como: Sales(6) e Stefanelli(2); que afirma
ser a tacésica o meio que mais utilizamos para nos comunicarmos com os
clientes, assim como um dos métodos mais importantes. Foram poucos os
graduandos que citaram esse método de comunicação não verbal, o que talvez pode
ser explicado pelo fato destes acadêmicos não ter tido ainda o contato com o
cliente hospitalizado.
Ao indagarmos aos graduandos sobre o entendimento dos mesmos sobre comunicação
não verbal, foi possível extrair do material produzido através da dinâmica da
sensibilidade, o significado da comunicação não verbal assim como os
sentimentos que esses símbolos podem exprimir sob a ótica dos acadêmicos de
enfermagem do quarto período.
Desta forma, acreditamos ser importante listar no quadro abaixo os sentimentos
destacado pelos discentes.
Observamos neste quadro uma equivalência entre os sentimentos que foram
destacados pelos grupos e que são expressos pela comunicação não verbal; assim
buscamos para esta análise pautarmo-nos na classificação apresentada por Knapp
apud Silva(4) na qual categoriza e descreve cada expressão facial dos diversos
sentimentos:
- Afetividade/ Felicidade: "fixação do olhar, com pupila dilatada, olhar
brilhante, endireitamento do nariz",
- Medo/Insegurança: "pálpebras fechadas rapidamente ou abrindo-se
excessivamente, expressão séria e rígida, franzimento dos lábios",
- Dor: "choro, olhos fechados, rugas na testa, lábios comprimidos, aumento da
rigidez facial, comissura da boca para baixo e suor frio",
- Tristeza: "comissura da boca voltada para baixo, sobrancelhas oblíquos, olhar
cabisbaixo, choro".e
- Ansiedade/Angústia: "suor na região frontal, palidez, rugas na fronte,
mordiscar os lábios ou cutícula".
Verificamos neste contexto que para a comunicação ser utilizada como um
instrumento básico dos cuidados de enfermagem, faz-se necessário que o
enfermeiro identifique os diversos meios que os clientes possam utilizar para
comunicarem-se de forma não verbal e principalmente que saiba correlacionar o
significado de cada método, para que se estabeleça o processo comunicativo.
E para atendermos ao segundo objetivo criamos duas categorias de análise a
partir das respostas apresentadas pelos graduandos de enfermagem ao
questionamento: Qual a influência da comunicação não verbal durante os cuidados
de enfermagem? A seguir destacamos as duas categorias:
a) Habilidade e aprimoramento profissional
Esta categoria de análise significa a visão que os alunos possuem acerca da
influência exercida pela comunicação não verbal no cuidado de enfermagem, na
medida que identificam a necessidade de se aguçar a sensibilidade e aprofundar
o conhecimento através do aprimoramento profissional.
Tal condição pode ser observada nos conteúdos expressados pelos alunos e
apresentados a seguir:
"Ajuda a aprimorara a percepção do profissional de enfermagem diante das
necessidades do paciente. Aumenta a sensibilidade, para perceber a expressão
facial que pode estar exprimindo felicidade, satisfação pessoal e sensação de
dor" (Grupo 3).
"A partir do momento que nós enfermeiros soubermos interpretar os gestos e a
expressão facial do paciente, a comunicação não verbal perderá o seu papel numa
consulta de enfermagem. A fala nem sempre exprime um sentimento verdadeiro, já
a expressão de uma pessoa nunca mente" (Grupo 4).
As expressões enunciadas podem ser subsidiadas em autores como Silva(4), que
aconselha às instituições hospitalares para observarem o grau de percepção dos
enfermeiros no que se refere à comunicação não verbal.
A assertiva apresentada é também corroborada por Cianciarullo(1), quando
menciona a qualidade da assistência de enfermagem relacionada à habilidade de
ouvir, ver, sentir e compreender. Desta forma, acordamos com as autoras por
entendermos que esta habilidade em perceber de forma mais aproximada as
necessidades expressadas pelos clientes irão aprimorara cada vez mais os
cuidados de enfermagem.
b) Aproximação Enfermeiro-Cliente
Esta compreende a segunda categoria de análise, ela traz em sua essência a
questão da Proxêmica, ou seja, da aproximação dos corpos dos sujeitos que
participam de uma relação interpessoal. Os graduandos destacaram esse fator
como sendo a principal influência que a comunicação não verbal pode ocasionar
durante os cuidados de enfermagem, posto que a aproximação EnfermeiroCliente,
justifica-se devido à necessidade do estabelecimento de uma comunicação e do
relacionamento interpessoal, objetivando a melhoria da qualidade da assistência
a ser prestada ao cliente.
"É indispensável ao enfermeiro um maior contato com seu cliente, independente
do tipo de comunicação que ele exerça. Simples gestos significam muito para
pessoas que em um determinado momento não conseguem dizer claramente aquilo que
deseja" (Grupo 2).
O Grupo 5, utilizou-se de alguns recortes de palavras para formar frases como
as que seguem: "Ombro amigo", "Um raio de vida", "Guerra solitária", "Você não
precisa ser igual a todo mundo" e "Outro passo na luta contra as frustrações".
Através desses recortes, é possível compreender que este grupo destacou o
profissional de enfermagem como sendo o "Amigo" mais próximo do enfermo,
ajudando a este último a enfrentar os momentos difíceis da enfermidade,
principalmente quando a doença prejudica de alguma forma a expressão verbal.
O apontamento destacado pelos graduandos encontra respaldo em Daniel(7), que
afirma que a comunicação durante os cuidados de enfermagem compreende o
relacionamento entre o Enfermeiro e o Cliente. E destaca que este
relacionamento faz parte do processo terapêutico que visa a manutenção e a
melhoria da qualidade da assistência de enfermagem.
Desta forma corroboramos com os sujeitos desta pesquisa, pois entendemos que a
necessidade de compreender a expressão não verbal emitida pelo cliente, reforça
a aproximação da equipe de enfermagem com os clientes. E ao realizar essa
aproximação o Enfermeiro se acerca das reais necessidades do enfermo e facilita
desta maneira a elaboração de um plano terapêutico, objetivando a realização de
um cuidado abrangente e sistematizado.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através desta pesquisa é possível concluir que os graduandos de enfermagem
identificam a importância e a influência da comunicação não verbal durante a
prestação dos cuidados de enfermagem.
Entretanto algumas pesquisas apontam para a necessidade em se ampliar o
conhecimento da comunicação não verbal, principalmente a necessidade da
aplicação de abordagens de estratégias de ensino para a implementação do
cuidado de enfermagem, visto que se observa na prática a falha do processo
comunicativo. E este fato por sua vez constitui-se como barreiras para a
aplicação dos planos de cuidados.
Assim, concluímos que a deficiência na compreensão da comunicação não verbal
por parte da enfermagem esteja no momento da aplicação da correlação teórico-
prático. Portanto ressaltamos que o profissional de enfermagem deve ser
capacitado para decodificar as expressões não verbais emitidas pelos clientes,
bem como ser capaz de utilizar essa forma de comunicação para estabelecer a
relação inter-pessoal e melhorar assim a qualidade dos cuidados de enfermagem.