Diagnósticos de Enfermagem identificados em gestantes durante o pré-natal
PESQUISA
Diagnósticos de Enfermagem identificados em gestantes durante o pré-natal
Nursing Diagnoses identified in pregnant patients under prenatal care
Diagnósticos de Enfermería identificados en embarazos durante el prenatal
Sandra Valéria Martins PereiraI; Maria Márcia BachionII
IEnfermeira Obstétrica. Mestre em Enfermagem. Coordenadora dos serviços de
Enfermagem da Maternidade Dr. Adalberto Pereira Silva. Professora e Diretora do
Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário da Unievangélica de
Anápolis-GO
IIDoutora em Enfermagem. Professora Titular da Faculdade de Enfermagem da
Universidade Federal de Goiás
1. INTRODUÇÃO
A gravidez constitui um período do ciclo de vida, que na maioria das vezes
poderia transcorrer sem desvios da saúde, porém envolve em si uma crise
adaptativa caracterizada por complexas transformações fisiológicas, emocionais,
interpessoais e sócio-demográficas, as quais implicam em um potencial de risco
eminente e por isso demanda atenção caráter multidisciplinar de saúde.
No Brasil as taxas de morbi-mortalidade materna e perinatal ainda são
consideradas altas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), sendo na maioria
das vezes associada a intercorrências obstétricas potencialmente evitáveis(1).
Nesse contexto, nas últimas décadas, as políticas públicas na área da saúde
materno-infantil têm se organizado com enfoque na ampliação e melhoria da
qualidade da assistência obstétrica, vista atualmente sob o enfoque da
humaniza-ção do pré-natal, parto e nascimento.
Atualmente a política de humanização do Sistema Único de Saúde (SUS),
intitulada Rede HumanizaSUS(2), alberga em sua essência as diretrizes para
humanização da assistência de saúde no país. Na área obstétrica integra os
princípios dos programas de saúde que fundamentam o processo de mudança do
paradigma de assistência à gestação e ao parto(3-5).
A atuação do enfermeiro nos programas de pré-natal implica seu preparo clínico
para identificação de problemas reais e potenciais da gestante, família e
comunidade, com vistas ao manejo adequado das diversas situações práticas.
A habilidade de raciocínio e julgamento clínico do enfermeiro para diagnosticar
as respostas humanas a problemas de saúde e processos de vida reais ou
potenciais consiste no Diagnóstico de enfermagem. A taxonomia de diagnósticos
de enfermagem reconhecida oficialmente no mundo mais difundida no Brasil é a da
North American Nursing Diagnosis Association (NANDA)(6).
Os problemas de saúde do cliente quando classificados à luz de uma taxonomia
possibilitam a utilização de uma linguagem padronizada para melhor comunicar os
fenômenos de interesse da prática da enfermagem, além de nortear a tomada de
decisão, seleção de intervenções de enfermagem individualizadas, documentação e
avaliação do cuidado.
Vários estudos com foco no diagnóstico de enfermagem em gestantes de baixo e
alto risco, bem como em adolescentes grávidas tem sido desenvolvido(7-10).
Contudo, ainda carecemos de estudos que retratem o ciclo gravídico-puerperal de
forma dinâmica, isto é, em todas as suas fases.
2. OBJETIVO
Objetivamos analisar o perfil de diagnósticos de enfermagem da taxonomia II da
NANDA em mulheres ao longo do período gestacional.
3. PERCURSO METODOLÓGICO
Esta pesquisa é parte de uma dissertação de mestrado(11), que obteve parecer
favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás.
Desenvolvemos um estudo descritivo longitudinal, mediante a realização de 62
consultas de enfermagem(12), fundamentadas no Modelo Conceitual de Orem(13).
A população constou de gestantes de baixo risco cadastradas num Programa de
pré-natal de uma Maternidade Segura credenciada a Rede HumanizaSUS localizada
no interior do estado de Goiás.
Foram selecionadas de 11 gestantes de baixo risco, maiores de 18 anos (cinco
primíparas e seis multíparas), que compuseram uma amostra por conveniência, com
idade gestacional entre 10-36 semanas, distribuídas em quotas (três do
primeiro, quatro do segundo e quatro do terceiro trimestre de gestação), que
foram abordadas no ambulatório de pré-natal, após a manifestação do
consentimento informado, conforme os preceitos éticos da Resolução nº 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde(14), bem como da avaliação do risco gestacional.
Elaboramos um roteiro semi-estruturado de coleta de dados, baseado no Modelo do
autocuidado(13), nos parâmetros do exame obstétrico(15-17), na Classificação
dos Resultados de Enfermagem-NOC(18) e nas diretrizes das políticas de
humanização do pré-natal, parto e nascimento(2), bem como em nossa experiência
na área. Tais instrumentos constituíram-se em protocolos de Consulta de
enfermagem.
A coleta de dados foi realizada no período de janeiro a julho de 2004. As
participantes foram acompanhadas durante o período pré-natal, que oscilou
conforme sua idade gestacional.
A técnica utilizada para coleta de dados foi o exame clínico apoiado em
entrevista semi-estruturada, observação participante e medidas biofisiológicas.
Os dados obtidos foram registrados (papel e caneta) nos referidos protocolos de
consulta de enfermagem.
O processo de julgamento clínico dos dados de cada cliente culminou com a
rotulação do diagnóstico segundo a taxonomia II da NANDA(6). Os componentes das
declarações diagnósticas - conceito diagnóstico, características definidoras e
fatores relacionados foram analisados segundo a propedêutica obstétrica(16,17).
4. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
Ao longo do acompanhamento pré-natal foram identificados vinte e cinco
diferentes Diagnósticos de Enfermagem, que estão dispostos no Quadro_1 e
discutidos a seguir.
Risco para infecção(DST-AIDS e tétano puerperal e neonatal) relacionado com
conhecimento insuficiente para evitar a exposição a patógenos.
Duas gestantes primigestas (2º e 3º trimestre), não haviam recebido a dose
imunizante contra o tétano devido à falta de conhecimento sobre a importância
dessa vacina para mãe e filho.
Todas as gestantes (11) relataram não fazer uso do preservativo durante as
relações sexuais, alegando a não concordância e repreensão dos companheiros,
que atribuíam a esse cuidado o sinônimo de desconfiança e desamor.
Percebemos assim, que o uso do preservativo é visto pelo homem como
desnecessário e um empecilho para plenitude do amor. A proble-mática relativa
ao risco de doenças sexualmente transmissíveis e síndrome da imunodeficiência
humana adquirida e infecções do trato urinário geralmente está associada à
dificuldade de acesso ao serviço de atendimento ginecológico e obstétrico de
qualidade, prejudicando consideravelmente a assistência à saúde reprodutiva.
Nesse sentido, a responsabilidade dos serviços de saúde e especial-mente dos
programas de pré-natal é complexa e suscita acompanha-mento multidisciplinar
pelo fato de que nesse âmbito, os problemas e riscos à saúde estão diretamente
relacionados à cultura e condição de vida da população.
Risco para infecção (colo de útero) relacionado com conhecimento insuficiente
para evitar exposição a patógenos, defesas primárias inadequadas devido à
presença de secreção e mudança de PH vaginal.
Uma grande multípara do primeiro trimestre queixou-se da presença de prurido e
corrimento vaginal, relatando nunca ter realizado o exame colpocitológico. Uma
gestante do terceiro trimestre queixou a presença de corrimento fétido e
amarelado, explicando que há mais de um ano não realiza o exame
colpocitológico.
Integridade tissular prejudicada (colo de útero) relacionada com déficit de
conhecimento e a agentes irritantes evidenciado por mucosa uterina lesada.
Uma gestante do terceiro trimestre apresentou ao exame gine-cológico a cérvix
uterina hiperemiada com pontos de erosão rasa e secreção amarelada espessa de
odor forte.
Observamos que o exame colpocitológico e o de urina tipo I não têm sido
realizados nos serviços de pré-natal, conforme as orientações do Ministério da
Saúde, que preconiza que a realização do exame de urina tipo I no primeiro e
terceiro trimestre de gravidez e do colpocitológico como rotina nos casos de
intervalos maiores de um ano. Porém na prática, a uranálise tem sido realizada
apenas com enfoque curativo quando já está instalado algum tipo de transtorno
urinário.
Déficit do autocuidado para banho e higiene relacionado com prejuízo músculo-
esquelético evidenciado por incapacidade de lavar parte inferior do corpo.
Todas as gestantes no decorrer segundo (7) e do terceiro trimestre (11)
verbalizaram dificuldade para flexionar diferentes partes do corpo, com
progressivo esforço para tomar banho sozinhas.
Dor aguda (membros inferiores, pelve, região inguinal e lombar)relacionada a
agentes biológicos e psicológicos evidenciada por verbalização, gestos
protetores, distúrbios do sono, comportamento expressivo.
Nove gestantes (81,8 %) queixaram dor nos membros inferiores, pelve, região
lombo-sacra e inguinal bilateral, em diferentes graus no decorrer do segundo e
terceiro trimestre. Esta proporção é maior do que a encontrada no estudo de
Ferreira e Nakano(19), que identificaram a presença de a dor lombar entre 49 a
71% das gestantes. Segundo estas autoras, a dor interfere nas atividades da
vida diária, na capacidade de trabalho, contribuindo para insônia, sentimento
de incapacidade, insegurança e medo das mulheres de não poder cuidar do filho,
principalmente pelo comprometimento da marcha e diminuição da destreza
corporal.
A dor aguda contínua freqüentemente apresentada pela gestante está relacionada
ao aumento do estrogênio e a presença da relaxina ovariana que induzem ao
relaxamento dos tecidos conjuntivos e colágeno, induzindo a maior mobilidade
das articulações que associado ao aumento do útero e das dimensões pélvicas
provocam a separação da sínfise púbica, diástase dos músculos retos abdominais
e instabilidade das articulações sacro-ilíacas.
Todas essa adaptações posturais associadas ao aumento do peso corporal, a
distensão abdominal e diminuição do tônus muscular levam ao deslocamento do
centro da gravidade para frente, a acentuada lordose lombossacral com
conseqüente curvatura compensatória da região cervicodorsal e compressão dos
nervos pélvicos, provocando o andar gingado, o desconforto músculo-esquelético
e a dificuldade para caminhar característicos do terceiro trimestre de gravidez
(16,17).
Padrão do sono perturbadoevidenciado por queixas verbais de não se sentir
descansada.
Uma gestante do primeiro e duas do segundo trimestre verbalizaram inquietude,
vontade de conversar e pensamentos ruminantes que pareciam estar relacionados à
preocupação em tentar dormir e com o medo da insônia.
Todas gestantes no terceiro trimestre queixaram de ortopnéia, dor inguinal,
cãibras, posição desconfortável, nictúria, pensamentos ruminantes e descanso
noturno insatisfatório que comumente estão relacionados às adaptações do
organismo materno ao terceiro trimestre de gravidez(16).
Intolerância a atividade percebida (gestante) relacionada com desequilíbrio
entre a oferta e a demanda de oxigênio evidenciado por verbalização de fadiga,
fraqueza, desconforto e dispnéia de esforço.
Todas s gestantes apresentaram intolerância atividade de forma gradual ao longo
do terceiro trimestre, sendo que oito delas mostraram sinais e sintomas de
intolerância leve, duas de intolerância moderada e uma de intolerância
acentuada.
A intolerância a atividade é diagnóstico de enfermagem freqüentemente
evidenciado em gestantes no último trimestre de gravidez. Nesse contexto, o
enfermeiro deve ser capaz de reconhecê-lo como uma resposta do organismo
materno à gravidez, na possibilidade de interpretá-lo erroneamente como uma
cardiopatia crônica(16).
As adaptações do organismo materno inerentes aos aparelhos cardiovascular e
respiratório têm por finalidade proteger o funcionamento do organismo da mulher
e preencher as demandas de oxigênio do feto. Assim, devido ao aumento do volume
sanguíneo circulante e do débito cardíaco, observa-se entre a 14ª e 20ª semanas
de gestação, uma discreta hipertrofia da área cardíaca, aumento da freqüência
cardíaca de 10 a 15 batimentos por minuto. A freqüência respiratória aumenta
aproximadamente duas inspirações por minuto, a respiração é predominantemente
torácica com aspecto ofegante e de cansaço(16,17).
Incontinência urinária por pressãorelacionada com pressão intra-abdominal alta
devido ao útero gravídico evidenciada por relato de urgência urinária e
freqüência urinária a intervalos menores do que uma hora.
Todas gestantes no terceiro trimestre verbalizaram urgência urinária e nictúria
que estava relacionada ao peso do útero e sua pressão sobre a bexiga no final
da gravidez.
Em decorrência da pressão progressiva do útero sobre a bexiga, o trígono
vesical sofre estiramento fazendo surgir o quadro de incontinência urinária de
esforço sensivelmente piorado no decorre do terceiro trimestre de gestação(16).
Constipação relacionada com motilidade diminuída do trato gastrintestinal
secundária a gravidez e atividade física insuficiente evidenciado por
verbalização de mudanças no padrão intestinal, dor na passagem das fezes e
frequência diminuída.
Duas gestantes queixaram "ressecamento" que persistiu ao longo do segundo e
terceiro trimestre.
O aumento da progesterona e das prostaciclinas induz a hipotonia da musculatura
lisa do trato digestivo e diminuição do peristaltismo intestinal, que é um
fator predisponente a constipação(16,17).
Conhecimento deficienterelacionado à falta de acesso a conhecimentos adequados
evidenciado por verbalização de dúvidas e falta de conhecimento sobre assuntos
diversos.
O conhecimento deficiente foi identificado em todas as gestantes no decorrer de
todo período gestacional conforme podemos evidenciar em alguns fragmentos de
falas:
[...] Quero saber mais sobre anticoncepcional, porque o médico disse
que meu útero está sujo [...] (L.A.S.).
[...] dizem que o toque dói demais! Estou com medo[...](L.A.S.).
[...] minha barriga endurece, muitas vezes por dia, é assim mesmo?
[...].
[...] sinto cãibras nas pernas, bem na batata, sempre à noite. Dói
demais!. É normal? [...] (V.C.S).
[...] ainda não sei que jeito que amamenta, não! [...](L.A.S.).
[...] não sei que tanto pode engordar, por isso faço regime [...].
(H.CO.).
[...] tô muito cansada, muita falta de ar, parece que o coração está
acelerado. Você acha isso normal? Eu não sei, dizem que é [...]
(L.A.S.).
[...] está saindo uma aguinha do meu peito, é assim mesmo, né?[...]
ele não tem bico. Será que vai atrapalhar eu amamentar ele? [...]
(V.V.T).
[...] eu sei sim, da vacina contra tétano. Só que dói absurdo! Credo!
Você acha que tem mesmo que tomar a terceira dose? [...](L.A.S.).
A identificação dos déficits de conhecimento permite planejar o esclarecimento
e aconselhamento das gestantes e, por conseguinte o atendimento do Passo 1 do
Projeto maternidade segura: " garantir informação sobre saúde reprodutiva e
direitos da mulher"(2). Nesse sentido, ara garantia da qualidade do atendimento
em obstetrícia, devemos ter uma atitude de acolhimento com a gestante,
escutando suas dúvidas, desejos e necessidades, o que é de fundamental
importância para humanização da assistência(2).
Risco para amamentação ineficaz relacionado com déficit do conhecimento e
anomalia do peito.
Cinco gestantes eram primíparas, sem experiência alguma com amamentação, as
quais demonstraram inúmeras dúvidas sobre o manejo adequado da lactação natural
e exclusiva ao seio. As outras seis, eram multíparas, com experiência prévia em
amamentação e praticamente não apresentavam dúvidas sobre aleitamento natural e
mostravam-se dispostas a amamentar seus filhos.
Uma gestante do terceiro trimestre apresentava mamilos invertidos, além de
muitas dúvidas a respeito do manejo e preparo para lactação.
Risco para lesão fetal relacionado exposição a agentes químicos (nicotina).
Algumas gestantes (uma do primeiro, duas do segundo e duas do terceiro
trimestre) relataram que foram fumantes e que já haviam deixado o vício. Uma
delas relatou estar muito nervosa com a falta do cigarro. Outra afirmou que
estava fazendo tudo pela saúde do bebê. E finalmente uma outra desabafou:
"[...] não adianta mentir! Fumei mais de dez anos e estou tentando
parar[...]" (V. P. L).
A diminuição da perfusão placentária decorrente do tabagismo é um dos
principais fatores etiológicos do retardo do crescimento fetal, trabalho de
parto prematuro, rompimento prematuro das membranas, placenta prévia,
descolamento prematuro de placenta e óbito fetal e a morbimortalidade perinatal
e infantil(16,17).
Dor (punho) relacionada com agentes físicos e biológicos evidenciado por
verbalização e esfrega do local.
Duas gestantes no decorrer do segundo e terceiro trimestre queixaram dor nas
articulações das falanges e no punho, além de formigamento local. A retenção
hídrica da gravidez leva á compressão das estruturas neuromotoras do antebraço
desencadeando a síndrome do punho do carpo(16).
Eliminação urinária prejudicada relacionada com infecção do trato urinário
evidenciado por disúria.
Três gestantes (uma de cada trimestre gestacional), queixaram de urina escura e
disúria, apresentando leucocitose e flora intensa na uranálise tipo I. O
aumento da volêmia materna, a diminuição da resistência vascular e do tônus
muscular liso, levam a discreta hidornefrose e ao aumento do diâmetro dos
ureteres, que associado ao retorno venoso periférico diminuído (membros
inferiores) levam à estase urinária(17), o que predispõe a gestante às
infecções urinárias(16,17).
Outro fenômeno interessante é que a instalação da glicosúria e aminoacidúria
comuns na gestação normal devido ao aumento da taxa de filtração glomerular,
aumentam a adesividade de microorganismo às glicoproteínas do trato urinário,
bem como a virulência desses, que juntamente com a hidronefrose gestacional
predispõe às infecções urinária altas por a Escherichia coli, Klebsiella,
Enterobacter, Proteus, Enterococcus faecalis e Estreptococo tipo B e outros,
sendo que a leucocitúria pode estar associada a infecção por chlamydia(17).
Campo de energia perturbadorelacionado à gestação evidenciado por palavras.
Uma gestante do primeiro trimestre queixou de enjôo persistente, dor de cabeça,
fraqueza e esmorecimento. Três gestantes do terceiro trimestre queixaram
dificuldade para dormir, intolerância a atividade, cansaço, medo do parto,
fraqueza e esmorecimento.
Acreditamos que as mudanças hormonais do início da gravidez causam desconforto,
sensação de mal estar e fraqueza denotando falta de energia. Por outro lado, o
esmorecimento referido pelas gestantes do terceiro trimestre parece estar
relacionado aos desconfortos tais como: má qualidade de sono, dor, intolerância
atividade que acarretam descontentamento que somado a longa espera e ansiedade
pela hora do parto acabam por determinar o distúrbio no fluxo de energia da
pessoa.
Risco para lesão (fetal e materna)relacionado com hipóxia tecidual da placenta
secundária a hipertensão arterial moderada
Três gestantes apresentaram níveis tensionais de aproximadamente 150 x 100mmHg
no identificado no segundo trimestre, que perdurou sob controle terapêutico da
pressão arterial, ganho ponderal, avaliação de edema, volume de diurese e
cefaléia pulsátil até ocasião do parto.
Risco para nutrição desequilibrada: mais do que as necessidades
corporaisrelacionado à ingestão de alimentos sólidos no final do dia e peso
acima da linha de base no início da gestação e disfunção dos padrões
alimentares.
De acordo com os dados obtidos no cartão de três gestantes do terceiro
trimestre, haviam iniciado a gravidez com peso acima de 70 quilos, que é
considerado indesejável, pois o peso acima do percentil 90 da tabela de peso
versus altura adotada pelo Ministério da Saúde para controle do ganho ponderal
na gravidez constitui risco de obesidade durante a gestação(20). Além disso,
duas delas declararam apetite insaciável e hábito de comer durante a noite.
Crescimento desproporcional da gestanterelacionado com comportamentos
alimentares mal adaptados, apetite insaciável e nutrição materna evidenciado
por peso acima do percentil 90 da curva de ganho ponderal da gestante.
Quatro gestantes do terceiro trimestre, sendo que duas delas apresentaram
apenas desvio leve em relação ao percentil 90 da curva de ganho ponderal da
gestante adotada pelo Ministério da Saúde(20), enquanto as outras duas
apresentaram desvio acentuado dos referidos parâmetros.
A diminuição dos níveis de glicose e ao aumento das gorduras do organismo
materno, com conseqüente aumento do balanço energético são responsáveis pelo
aumento da sede e apetite que persistem durante toda a gestação(16). O ganho de
peso além do normal (6-16kg) é bastante comum na gravidez e deve ser
acompanhado com cautela, pois pode acarretar sérios danos à gestante. Pode ser
indício de diferentes transtornos: edema, gestação múltipla, doença
hipertensiva específica da gestação (DHEG), obesidade pré-existente, o que
implica na maior probabilidade de fetos macrosômicos, desproporção
cefalopélvica, trauma no parto, hipertensão, diabetes e incidência dobrada de
malformações congênitas(16,17,20).
Náusea relacionada com irritação do trato gastrintestinal evidenciada por
verbalização de enjôo.
Três gestantes do primeiro e duas do segundo trimestre queixaram náuseas de
diferente intensidade e freqüência.
O aumento da progesterona leva a diminuição da motilidade do trato digestivo.
Dessa forma, a diminuição do tônus gástrico, provoca o relaxamento e aumenta o
tempo de esvaziamento do estômago que associado ao relaxamento do cárdia
justifica a tendência às náuseas e refluxo gastresofágico(16).
Nutrição desequilibrada: para menos que as necessidades corporais relacionada a
incapacidade para ingerir ou digerir ou absorver nutrientes devido a fatores
biológicos, psicológicos ou econômicos evidenciado por verbalização de consumo
de alimentos menos do que o recomendado no dia.
Três gestantes apresentaram o peso de 39, 40 e 42 quilos, considerados abaixo
do percentil 25 da tabela de ganho ponderal da gestante(19), sendo que se
queixaram de enjôo, sialorréia e aversão ao cheiro da comida. A ingestão de
alimentos pode estar prejudicada pelos enjôos, sialorréia, pirose, plenitude
gástrica e hiperemese, que na maioria das vezes desencadeia a perda de peso. O
baixo peso constitui um fator de risco para gestante, pode induzir ao parto
prematuro, risco para crescimento intrauterino retardado e recém-nascido
pequeno para idade gestacional PIG(16,17).
Uma gestante do terceiro trimestre apresentou o Risco de nutrição alterada para
menos que as necessidades corporaisrelacionado com fatores psicológicos.
Relatou que tinha muito medo de engordar e ter complicações com a gravidez.
Explicou que não sabia o peso ideal e nem o que podia comer.
Membrana mucosa oral prejudicada relacionada com alterações dos níveis
hormonais evidenciada por hiperemia e hiperplasia gengival e presença de
epúlide.
Uma gestante apresentou hiperemia da gengiva e epúlide no decorrer do segundo e
terceiro trimestre. O aumento do estrogênio aumenta a vascularização das
estruturas moles da cavidade oral indu-zindo a hiperemia, hiperplasia,
sangramento da gengiva e epúlide(16,17).
Integridade da pele prejudicada relacionada com estado metabólico alterado
(gravidez).
Duas gestantes do segundo trimestre apresentavam eritema pruriginoso não
inflamatório e hemangioma dos membros superiores. Uma gestante do terceiro
trimestre apresentava eritema e vesículas na região inguinal bilateral.
O aumento dos níveis de estrogênio e progesterona e distensão mecânica do
sistema tegumentar predispõe ao aparecimento de angiomas na face, membros
superiores e tórax, aumenta a resposta alérgica e conseqüentemente o
aparecimento de eritemas e prurido. Além disso, o aumento dos esteróides
placentários no final da gravidez induz o aumento de bile no fígado ocasionando
prurido gravídico com ou sem icterícia(16).
Comportamento de busca de saúde percebido (na gravidez) evidenciado por desejo
expresso e observado de maior controle sobre as práticas de saúde e de buscar
um nível mais elevado de saúde.
Observamos que as clientes apresentaram esse tipo de comportamento. Muitas
delas verbalizaram a mudança de hábitos tais como: não tingir mais os cabelos,
deixar de bronzear, parar de fumar, adoção de um maior tempo de repouso diário,
mudança de atividade por temerem que o excesso de esforço físico prejudicasse o
bebê. A maioria delas demonstrou preocupação com o controle do peso.
Quatro gestantes descreveram o autocuidado com a pele (aplicação óleo de
amêndoas, uso de filtro solar, na tentativa de prevenir o melasma facial e as
manchas hipercrômicas nos antebraços e braços). Todas as gestantes estavam
usando roupas largas e leves e roupa íntima limpa e adequada, inclusive o
sutiã.
5. CONCLUSÕES
O elenco de diagnósticos de enfermagem identificados durante esta pesquisa
denota tanto respostas do organismo frente às especificidades da gestação, como
déficits de autocuidado. Ambos apontam para a necessidade da atuação de uma
equipe interdisciplinar e de atendimento mediante atividades individuais e
grupais, necessitando de ações integradas de profissionais qualificados nesta
área.
Esta pesquisa nos fez refletir sobre os padrões mínimos preconizados nas
políticas de atendimento à mulher no pré-natal. Acreditamos que os mesmos não
oferecem as condições necessárias ao profissional para o preparo e
acompanhamento da mulher no ciclo gravídico, no desenvolvimento de um
atendimento de enfermagem que supra as suas reais necessidades, nas dimensões
biopsicossociais.
No atual modelo de saúde, as consultas de enfermeiros (assim como de
psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais) e a modalidade de atendimento
grupal não são remuneradas pelo SUS. Ainda que o discurso atual dos gestores de
saúde seja na direção do atendimento de caráter multiprofissional e
interdisciplinar, o SISprénatal enfatiza a realização da consulta médica.
Chamamos atenção para a valorização da prática da consulta de enfermagem e
todas as prerrogativas nela implícitas, como diagnosticar e prescrever ações de
competência da profissão, para alcançar os resultados pelos quais a enfermagem
é responsável. Investigar as respostas do organismo materno a gestação e os
problemas reais ou potenciais, na maioria das vezes solicita a aproximação do
enfermeiro com a pessoa da gestante em dimensões mais subjetivas aumentando a
interação, desenvolvendo a confiança, aumentando a credibilidade da enfermagem
e gerando bases para a assistência mais humanizada e de melhor qualidade.
Diante de tais observações consideramos que as diretrizes dos programas de
saúde nessa área precisam ser repensadas e reestruturadas para que possam ser
realmente condizentes com as reais necessidades dos usuários dos serviços de
saúde.