O método mãe-canguru sob o olhar problematizador de uma equipe neonatal
RELATO DE EXPERIÊNCIA
O método mãe-canguru sob o olhar problematizador de uma equipe neonatal
The kangoroo-mother method under the problem-solving look of a neonatal team
El método madre-canguro bajo la mira problematizadora de un equipo neonatal
Roberta CostaI; Marisa MonticelliII
IEnfermeira Obstetra. Coordenadora do Serviço de Enfermagem da Unidade Neonatal
do Hospital Universitário da UFSC, Florianópolis, SC. Mestre em Enfermagem
IIProfessora Adjunto do Departamento de Enfermagem e do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianóplois, SC. Orientadora do estudo
1. INTRODUÇÃO
No contexto atual, existe um movimento em prol da humanização do nascimento que
tem estimulado os profissionais da área a repensarem suas práticas, buscando a
transformação da realidade no dia-a-dia do cuidado.
Segundo o Ministério da Saúde (MS) brasileiro(1), o conceito de atenção
humanizada é amplo e envolve um conjunto de conhecimentos, práticas e atitudes
que visam a promoção do parto e do nascimento saudáveis e a prevenção da morbi-
mortalidade materna e perinatal. Humanizar o atendimento ao recém-nascido (RN)
significa, entre outros, ter segurança técnica da atuação profissional,
eficácia na atenção ao RN, condições hospitalares compatíveis com o período
neonatal, oferta de condições para participação da família do neonato no
processo assistencial, aliados à necessidade da atenção individualizada.
Nessa linha de pensamento, considerando os avanços científico-tecnológicos que
contribuíram para um aumento da expectativa de sobrevivência dos RNs prematuros
e de baixo, o MS lançou a Norma de Atenção Humanizada ao Recém-nascido de Baixo
Peso Método Mãe-Canguru (MMC), por meio da Portaria nº 693 GM/MS(2). O MMC é um
tipo de assistência neonatal que implica contato pele-a-pele precoce entre mãe
e RN de baixo peso, "de forma crescente e pelo tempo que ambos entenderem ser
prazeroso e suficiente, permitindo, dessa forma, uma maior participação dos
pais no cuidado ao seu RN"(3). Essa proposta assistencial envolve uma filosofia
que visa proporcionar ações ditas de humanização, exigindo reflexões e
certamente mudanças de atitude por parte de toda a equipe de saúde. Mesmo com a
implantação deste programa em várias cidades brasileiras que, em tese,
possibilitaria o cuidado mais compartilhado com a família, além da assistência
integralizada e voltada para as necessidades específicas de cada uma dessas
famílias, não existem muitas garantias de que um novo modelo esteja sendo
efetivado, na prática, se não forem conhecidas as motivações que regem as
atitudes de profissionais e clientes envolvidos, e se os componentes da equipe
de saúde não se comprometerem efetivamente na alteração do modelo de atenção
neonatal.
Na unidade neonatal do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa
Catarina (HU/UFSC), campo no qual desenvolvo minha prática profissional como
enfermeira, a proposta de humanização da assistência baseada no MMC passou a
ser desenvolvida a partir de novembro de 2000, quando então, o hospital passou
a ser considerado Centro de Referência da região sul, nesta metodologia.
Ao iniciar minhas atividades profissionais, nesta unidade, comecei a
compartilhar a experiência do nascimento prematuro com RNs, famílias e
principalmente com a equipe de saúde que atua neste ambiente. Aos poucos, no
entanto, algumas inquietações foram surgindo, pois ao mesmo tempo em que
percebia que os profissionais da equipe pareciam bastante comprometidos com a
qualidade da assistência prestada, também observava que as ações, muitas vezes,
eram realizadas de maneira rotineira e pouco refletidas pelo grupo. Com a
introdução do MMC, a equipe foi compelida a mudar seu panorama assistencial,
tendo que rever seus comportamentos e atitudes de "fora para dentro", sendo que
as mudanças foram, de certa forma, impostas à equipe que, por sua vez, foi
incorporando novas rotinas, não tendo espaço e tempo necessários para que
pudesse transformar as ações de maneira consciente e proposital. Além disso, o
MS e também alguns autores ressaltam a importância e grande necessidade de
capacitar a equipe de saúde para aplicar o Método, mas não se fala dos
significados que isso tem para a equipe. Não é avaliada com a equipe de saúde a
aplicabilidade do MMC, as reais possibilidades de implantação desta metodologia
na realidade em que os profissionais estão inseridos, não há momentos previstos
para reflexões da equipe sobre os benefícios e implicações que esta mudança
poderá acarretar.
Sensibilizada por essa conjuntura, conduzi então uma prática educativa visando
criar espaços dialógicos para refletir com a equipe neonatal do HU/UFSC sobre
as potencialidades do MMC na qualidade da assistência ao RN e família.
Refletir sobre a experiência vivida e sobre os significados desta, para os
profissionais que compõem a equipe, implica em voltar a atenção ao modo como
essas pessoas "pensam" a sua prática, inseridas nesta filosofia de humanização
da assistência neonatal. Neste sentido, utilizei os princípios teóricos da
Pedagogia Libertadora(4-6) e da metodologia problematizadora(7,8) para nortear
o trabalho.
2. METODOLOGIA
O estudo foi desenvolvido na unidade neonatal do HU/UFSC. Os sujeitos
participantes foram os integrantes da equipe de saúde, que demonstraram
interesse em refletir sobre a compreensão do MMC enquanto proposta de
atendimento implantada em sua realidade. A utilização da metodologia
problematizadora, com a aplicação do Arco de Charles Maguerez(8), caracterizou-
se como caminho metodológico para a operacionalização da proposta. Para tanto,
realizei junto com a equipe neonatal alguns encontros visando proporcionar ao
grupo, a oportunidade de socializar suas idéias e experiências, refletindo
criticamente sobre a realidade do MMC. O projeto foi submetido e aprovado pelo
Comitê de Ética da Instituição e os profissionais participantes manifestaram
por escrito o consentimento informado. Além disso, foram respeitados todos os
aspectos envolvidos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(9).
A prática educativa foi desenvolvida no período de outubro de 2004 a maio de
2005, sendo que, no total, foram realizados doze encontros. Esses encontros
foram sistematicamente planejados e operacionalizados por meio de um processo
educativo/reflexivo, orientado pelos pressupostos teóricos freirianos(4-6),
tendo suas dinâmicas desenvolvidas a partir de oficinas participativas(10,11),
englobando três etapas: "acolhimento", "atividade central" e "auto-avaliação".
A "Atividade central" (2ª etapa) foi considerada durante todo o percurso como a
etapa principal da prática educativa. Esta etapa central era desenvolvida, por
sua vez, em cinco fases(8): a primeira, denominada observação da realidade,
consistia na sensibilização dos profissionais para expressarem suas percepções
pessoais, fazendo uma primeira leitura da realidade e identificando os
problemas a serem analisados; na segunda, eram apontados os pontos-chave dos
problemas levantados, buscando o entendimento das razões dos problemas, à luz
das crenças e valores da equipe em relação ao MMC; na terceira, aprofundavam-se
os conhecimentos acerca dos determinantes dos problemas levantados, passando
então a teorizá-los. Todos os problemas explorados nos encontros iam se
constituindo como temas geradores de discussões e reflexões para
instrumentalizar os profissionais a uma compreensão crítica da realidade; na
quarta fase passava-se à formulação de hipóteses para os problemas. As
hipóteses de solução formuladas nasciam de uma construção coletiva, refletindo
o resultado do processo reflexivo. Logo em seguida, partíamos então para o
levantamento das possibilidades de intervenção na realidade, ou seja, nesta
fase esperava-se que os membros da equipe estivessem sensibilizados para um
novo olhar no desenvolvimento do MMC.
O número de participantes em cada encontro variou de quatro a dez, englobando
uma psicóloga, uma assistente social, duas médicas neonatologistas, três
enfermeiras, seis técnicas de enfermagem, quatro auxiliares de enfermagem, uma
fonoaudióloga e uma estagiária de psicologia. Durante a prática educativa os
registros dos encontros foram efetuados em um diário de campo que continha a
descrição das ações do grupo, acompanhada de aproximações teóricas.
3. A AÇÃO-REFLEXÃO-AÇÃO DO GRUPO
Quando iniciei a prática educativa, os participantes foram convidados e
estimulados a olharem para a sua realidade de trabalho, refletindo sobre o MMC.
No primeiro encontro, ao concentrarem suas atenções para o problema, os
profissionais levantaram o fato das mães não estarem realizando a posição
canguru. A primeira impressão das pessoas presentes, foi a de que as
dificuldades para efetivação do contato pele-a-pele (primeiro problema
diagnosticado pelo grupo) não estavam relacionadas com aqueles profissionais
ali presentes, e sim, com as próprias mães que, aos olhos da equipe, não faziam
a posição canguru, por múltiplos e variados motivos. Como principal estratégia
para resolução do problema, foi levantada a necessidade de motivar as mães a
permanecerem maior tempo na unidade e realizarem a posição canguru. Ou seja, se
o problema estava "com as mães", a mudança de atitude deveria partir delas, e
não dos profissionais. Naquele momento inicial o grupo ainda não havia tomado
consciência de que ele poderia ser o principal responsável pela transformação
da realidade.
No segundo encontro, após intensos diálogos, constatou-se que o problema não
estava "fora" do grupo de profissionais. Como co-integrantes da atenção à saúde
neonatal, também eram responsáveis e "incluídos", seja nos benefícios
promovidos ou nas lacunas e fragilidades existentes. Vislumbraram naquele
encontro, a importância da participação de todos os profissionais da equipe.
Inconformados, expressaram a necessidade de valorizar a opinião de todos; ou
seja, tanto dos que estavam participando das reflexões no grupo, quanto dos que
ainda não haviam se engajado na proposta que, naquele momento, estava começando
a ser um espaço interessante de aprendizagens e permutas. Interpretei, naquele
momento, que havia uma forte necessidade de trocas entre os membros da equipe e
uma convergência de interesses que oferecia terreno fértil para que os
participantes percebessem que ao conhecer a opinião de todos (e de cada um)
sobre o MMC, poderiam envolver mais pessoas, e quem sabe, toda a equipe, na
reflexão sobre a prática desenvolvida na unidade neonatal.
No terceiro encontro, o grupo compartilhou conhecimentos e exteriorizou algumas
potencialidades e fragilidades da implementação do MMC em sua realidade.
Enquanto vislumbravam as potencialidades pude perceber que os profissionais, em
sua maioria, reconhecem, validam e valorizam o MMC enquanto política de atenção
neonatal. Entretanto, constatam igualmente que, no cotidiano da assistência,
ainda enfrentam algumas barreiras no desenvolvimento integral da proposta, tais
como o fato de alguns profissionais ainda não "aceitarem" inteiramente a
proposta, deixando de reconhecê-la como um projeto de cunho interdisciplinar e
que tenha real impacto na qualidade global da assistência neonatal.
Outra dificuldade interposta trata da falta de "sensibilização" de alguns
profissionais para colocar em prática o Método. Nesta perspectiva inclui-se
desde questões relacionadas à sensibilização para realizar o acolhimento às
mães/famílias dos prematuros que entram na unidade e optam pelo desenvolvimento
do canguru, até a explícita verbalização de dificuldades no sentido de envolver
os pais no dia-a-dia da unidade. A tais fragilidades, os profissionais
participantes da prática educativa adicionam também a necessidade de área
física adequada para que RNs, famílias e profissionais possam desfrutar com
conforto e qualidade do contexto cuidativo. O fato da mãe precisar permanecer
afastada do lar por períodos relativamente longos e quase contínuos também são
incluídos como questões a serem debatidas, visando estratégias de resolução, já
que os profissionais vêem nisso uma causa social impeditiva para a qualidade do
desenvolvimento do canguru no contexto hospitalar.
No quarto encontro, realizou-se uma reflexão sobre a implementação da primeira
etapa do MMC. Os participantes concluíram que a simples implantação do Método,
como forma de atenção humanizada ao RN e sua família, não dá total garantia do
incremento na qualidade do atendimento e sim, que há a necessidade de mudanças
de atitudes dos profissionais, a fim de lutar para a integralidade do
desenvolvimento do projeto como um todo. Refletiu-se sobre a necessidade de que
o profissional da equipe seja estimulado a reconhecer as características
individuais de cada RN e família, para atuar de maneira particularizada, assim
como é fundamental, na prática do dia-a-dia, que sejam encontradas estratégias
apropriadas para a valorização das precauções adotadas com relação ao excesso
de ruídos e iluminação, a preocupação na organização das atividades de rotina e
do manejo com o RN, o apoio e acompanhamento da família, como também a ênfase
na participação dos pais nos cuidados com seu filho. A valorização destas
mudanças de atitude e a reflexão sobre os benefícios desta prática contribuirão
para uma assistência qualitativamente diferenciada.
Na quinta oficina os profissionais discutiram sobre o trabalho em equipe, já
que interpretam a proposta de implementação do MMC como sendo um projeto que
deve ser coletivo, quer dizer, uma filosofia e uma prática que, além de serem
indissociáveis, não devem prescindir da atuação de uma "equipe" no seu sentido
mais complexo, em que existam interesses coletivos, complementação de
disciplinas e conhecimentos e, além disso, o compromisso conjunto de reflexão
continuada de todos os integrantes em direção ao ajuste benéfico entre teoria e
prática, ao debate crítico que possa levar às mudanças almejadas; enfim,
congregar esforços em direção à validação do projeto e ao enfrentamento de suas
contradições e conflitos.
Neste encontro, o foco de diálogo concentrou-se na promoção da integralidade
das ações dos profissionais da equipe,uma vez que os integrantes concordam que
é fundamental a formação de uma equipe multiprofissional que conheça toda a
extensão do Método, que atue de maneira harmoniosa e sincrônica para que a
proposta de atenção humanizada não sofra descontinuidades.
Ao continuar no processo de desvelamento da realidade, no sexto encontro, pude
evidenciar que os profissionais reconhecem que o sujeito do cuidado vem sendo
ampliado, suplantando a atenção específica ao RN prematuro, tão somente, porém
envolvendo a família e suas interações. Assim, reconhecem que não basta apenas
atender as necessidades do bebê internado, mas é fundamental que todos os
profissionais entendam e resignifiquem as diferentes maneiras que a família
utiliza para enfrentar este processo, buscando ajudá-los na sua superação e
trabalhando para o fortalecimento do vínculo afetivo RN/família.
Nesta linha de pensamento, no sétimo encontro, foi aprofundado o debate em
torno da presença da mãe/família na unidade neonatal e a participação dos
mesmos nos cuidados com o RN. Durante aquele encontro, os diálogos mantidos
levaram ao entendimento da necessidade dos profissionais realizarem um
acolhimento adequado às famílias que têm o filho prematuro internado, uma vez
que a introdução dos pais neste ambiente, pode ser determinante no processo de
hospitalização do RN prematuro e no desenvolvimento do MMC.
No oitavo encontro, ao perceberem que o diálogo propicia a exteriorização de
valores e conceitos, os profissionais conseguiram refletir sobre vários temas
que desagradam ou dificultam a prática durante o desenvolvimento da segunda
etapa do MMC, ou seja, o momento em que a família passa a sentir-se parte da
equipe de cuidado, entre eles a presença constante da mãe na unidade neonatal,
a dificuldade de cuidar da díade mãe-bebê, o fato de a mãe passar a assumir os
cuidados do filho e a explícita percepção de que esta etapa gera nos
profissionais a sensação de perda do papel de cuidador. Ao exteriorizarem estes
fatores, os profissionais revelaram a necessidade de uma melhor discussão da
equipe sobre a mudança do paradigma neonatal, isto é, o cuidado centrado na
família.
Minha interpretação sobre aquele encontro foi a da existência de alguns
aspectos ainda pouco revelados no cotidiano da assistência e que perpassam,
inclusive, por um profundo conflito em relação aos papéis a serem
desempenhados. A segunda etapa do MMC traz uma relação de forças, onde o
profissional ainda tem dificuldade em estabelecer uma relação de
horizontalidade com os pais. As políticas de saúde, atualmente, propõem uma
relação de parceria entre profissionais e usuários e, neste sentido, acredito
ser fundamental que as pessoas envolvidas, possam dialogar sobre este aspecto,
de modo a superar esta barreira ainda pouco explícita de disputa de papéis,
caminhando então em direção a uma perspectiva mais integrativa e de parceria
entre pais e profissionais.
Ao refletirem sobre o ambiente da unidade neonatal, no nono encontro, os
profissionais reconheceram-se como parte integrante da solução dos problemas
ali existentes, principalmente ao levantarem a necessidade do desenvolvimento
da competência técnica para garantir segurança no atendimento ao RN e sua
família. Além disso, destacaram também a importância da sensibilidade como um
elemento contributivo e indispensável no desenvolvimento da assistência
neonatal. Os participantes daquele encontro refletiram que uma das maiores
contribuições da proposta de implantação do MMC nas unidades neonatais, do
ponto de vista da capacitação para o cuidado, é a de romper com a visão
fragmentária e pontual do atendimento neonatal. Para a superação desse
entendimento, indicaram a importância de que os profissionais desenvolvam
habilidades para conhecer as particularidades de cada família que vivencia o
processo de hospitalização.
Ao problematizar a implementação do MMC na realidade da unidade neonatal, os
participantes expressam, no décimo encontro, que a mesma provoca mudanças na
forma de atendimento prestado ao RN e sua família. Como potencialidades do
Método e mudanças positivas naquele cenário, destacam a inserção da família na
unidade neonatal e também as mudanças comportamentais e ambientais, como a
redução da luminosidade e dos ruídos, a diminuição e organização dos
procedimentos intervencionistas, a introdução de medidas para redução da dor no
RN, propiciando um cuidado individualizado, integral e sensível. Apesar de
constatarem a importância e as vantagens do Método, os profissionais inferiram,
durante aquele encontro, que é absolutamente indispensável oportunizar espaços
para o diálogo entre os membros da equipe, no sentido que seja conquistado o
hábito de refletir sobre suas ações, de modo coletivo, garantindo assim que as
mudanças ocorram de modo crítico, comprometido e participativo.
Ao buscar hipóteses de soluções para os problemas levantados, os profissionais
perceberam que, por meio do cuidado individualizado e da educação contínua
(questionando o que antes era "inquestionável" e mantendo fóruns de discussão
sistemáticos), poderiam melhorar a qualidade da assistência prestada aos RNs e
suas famílias. Naquele décimo primeiro encontro tornou-se possível compreender
que os profissionais já se envolviam, de modo participativo, em torno da
singularização do cuidado a cada prematuro e sua família.
Ao avaliar a prática educativa, no último encontro, os profissionais
reconheceram a importância da educação continuada no contexto da unidade
neonatal, como forma de repensar conceitos, valores e práticas que se encontram
envoltas na política de atenção ao neonato e sua família, durante o
desenvolvimento do MMC. Neste sentido, os participantes percebem que já não são
os mesmos do início deste estudo e que, aos poucos, constatam mudanças em sua
forma de agir e pensar. Além disso, avaliam que tais mudanças estão
contribuindo para transformar a realidade do cenário neonatal. A partir desse
entendimento descobrem, agora de forma consciente, crítica e criativa, que a
educação e o cuidado estão intimamente ligados, e que, a cada nova convivência
com os RNs e suas famílias, se está ensinando e aprendendo, num movimento
constante e espiralado que contribui para revigorar e fortalecer a filosofia e
a prática do MMC.
Percebe-se ainda que a educação problematizadora permitiu aos envolvidos
visualizarem e recriarem sobre a prática já rotinizada do seu existir,
viabilizando novos caminhos para olharem para si mesmos, enquanto profissionais
comprometidos com a qualidade da assistência e, ao se conhecerem e reconhecerem
os demais profissionais, passam a revalorizar também as relações com as demais
pessoas envolvidas e com a própria realidade da qual fazem parte.
A transformação da realidade é um processo lento e que requer estímulos diários
para que se concretize. Na aplicação à realidade, como resultado desses
encontros, o que se percebe são pequenas mudanças de atitudes por parte dos
profissionais que participaram deste grupo de reflexão e que aos poucos acabam
por sensibilizar os demais profissionais da equipe. As hipóteses de solução
elaboradas pelo grupo vêm sendo planejadas e, de forma parcimoniosa, estão
sendo aplicadas à realidade, no ritmo que o próprio grupo determina. Sabemos
que este é um processo contínuo, que exige envolvimento dos profissionais e que
deve ser revitalizado a cada dia.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao refletir sobre o MMC, os profissionais de saúde presentes nos encontros
revelam que o Método é eficiente na busca da qualidade da assistência prestada
ao RN, pois proporciona um cuidado individualizado, aliado à tecnologia e à
sensibilidade. O MMC favorece a entrada dos pais na unidade neonatal, promove o
acolhimento da família, ampliando o foco do nosso cuidado para além do RN. Os
profissionais são impulsionados a modificar certas atitudes, no sentido de
reduzir os estímulos comportamentais e ambientais. Além disso, é necessária a
promoção da integralidade das ações dos profissionais da equipe para que esta
proposta de atenção não sofra descontinuidades. É verdade que muitas destas
intervenções ainda ocorrem de maneira pouco refletida. Apesar do MS orientar
sobre a necessidade destas mudanças, pouco tem sido feito para garantir que na
prática diária isto ocorra. De outro ângulo, contudo, os profissionais discutem
que ainda existem alguns fatores que dificultam o desenvolvimento do Método na
sua integralidade. Percebe-se uma resistência e certo "desinteresse"
manifestado pela pouca credibilidade que alguns profissionais atribuem ao MMC,
sendo que algumas vezes as dificuldades surgem em função do cuidado ainda estar
muito focado no RN, prejudicando a inserção da família na unidade neonatal e
reduzindo a participação efetiva dos pais no cuidado ao seu filho. Por perceber
estes aspectos em minha prática diária na unidade neonatal, certifico-me da
necessidade de realizar trabalhos como estes e, quiçá, estendê-los a outras
equipes de saúde neonatal.
Ao desenvolver esta prática foi possível a certificação de que a educação deve
permear toda a prática assistencial. É através da relação dialógica que a
equipe de saúde compartilha suas crenças, valores, conhecimentos e
experiências, promovendo uma reflexão crítica da realidade e possibilitando a
transformação de suas práticas diárias. Certamente que este processo ainda não
findou; como as discussões sobre esta nova proposta governamental ainda são
poucas e ocorrem de modo pontual, é fundamental a manutenção de espaços
democráticos, onde as questões do dia-a-dia podem ser melhor debatidas. Para
que isso ocorra, é preciso ampliar as discussões e informações nos espaços de
trabalho, permitindo e provocando a participação de todos os envolvidos, para
que os trabalhadores não fiquem à margem das discussões.
As facetas desveladas na experiência vivenciada com os profissionais da equipe
neonatal lançam rumos a outros caminhos, que poderão estimular investigações no
sentido de modificar e melhorar a compreensão do cuidado ao RN e sua família.
Tem-se consciência de que o caminho a ser trilhado na busca de uma assistência
de qualidade ainda é árduo. Diante dessa premissa, não se pretendeu, com este
estudo, apresentar soluções, pois se entende que, à medida que novas vivências
vão surgindo, novos modos de pensar e agir também vão acontecendo.
A cada novo encontro, os profissionais envolvidos já não eram mais os mesmos, a
realidade que se apresenta de alguma forma já foi modificada, seja pela forma
de pensar ou de agir das pessoas. É este processo que se procurou cultivar com
esta "experiência"; despertar nos profissionais a necessidade de espaços
dialógicos para que a equipe neonatal possa continuar refletindo sobre a
assistência prestada, para possibilitar uma nova realidade, um cuidado mais
integral, seguro, individualizado e sensível ao recém-nascido prematuro e sua
família.