Vivências para o enfrentamento do HIV entre mulheres infectadas pelo vírus
INTRODUÇÃO
Quando o indivíduo é acometido por uma enfermidade, sua rotina deve ser
reestruturada conforme o novo contexto. Diante da realidade, o homem repensa os
aspectos que envolvem a vida e a morte e precisa desenvolver estratégias de
enfrentamento, principalmente quando se trata de uma doença de evolução
crônica.
Constituído por conjunto de esforços para lidar com as demandas geradas por
situação de estresse, como as ocasionadas a partir do diagnóstico de uma
doença, o enfrentamento se assemelha ao conceito de resiliência, que implica a
superação da dificuldade vivenciada, possibilitando uma ressignificação ou a
construção de novos caminhos em face das adversidades(1). Estratégias de
enfrentamento se fazem necessárias para a construção de novos caminhos,
particularmente quando se vivenciam as peculiaridades de uma infecção como o
HIV, crônica e incurável, ainda envolta em estigma social, abandono e perdas.
De acordo com estimativas mundiais, o número de pessoas vivendo com HIV/AIDS em
2009 situou-se em aproximadamente 33,3 milhões de indivíduos, em comparação com
os 26,2 milhões de pessoas infectadas em 1999. Houve, portanto, um incremento
de 27% de novas infecções na última década. Ademais, como se conclui, mais da
metade dos infectados pelo vírus da AIDS no mundo já é constituída por mulheres
e garotas(2). A realidade brasileira não difere muito da mundial. Embora, a
princípio, a população acometida pela AIDS no país fosse sobretudo masculina, a
proporção entre o sexo masculino e o feminino vem diminuindo ao longo da
história da doença no Brasil e permanece estável desde 2002, com uma proporção
de 1,5: 1, ou seja, de 15 homens para cada 10 mulheres(3).
A infecção pelo HIV incrementou as discussões acerca de questões de gênero e de
direitos reprodutivos. Apesar de as mulheres, nos últimos anos, terem se
emancipado sob muitos aspectos, em uma sociedade ainda predominantemente
machista e patriarcal, sofre até hoje com o preconceito por ser mulher e,
quando acometidas de uma infecção como a AIDS, observa-se maior vivência desse
estigma(4).
Após a infecção, a mulher se defronta com dificuldades pessoais, familiares e
sociais. Vive a angústia do silêncio, ocultando o diagnóstico, na tentativa de
manter a relação conjugal e familiar ou até para ser mãe. Com a revelação do
diagnóstico, elas podem experienciar preconceito, rejeição familiar e mesmo
violência doméstica(5).
Por outro lado, o suporte social cumpre papel importante ao amenizar
consequências negativas de eventos estressantes relacionados a infecção(6) e,
portanto, pode contribuir para o enfrentamento do HIV. Outra questão a ser
considerada é o manejo da doença no país. No Brasil, o programa de saúde
pública voltado para o controle da infecção na população com o HIV demonstra
que suas medidas têm sido capazes de aumentar a sobrevida e melhorar a
qualidade de vida de pessoas infectadas, ajudando-as no estabelecimento de
estratégias de enfrentamento(7).
A discriminação sofrida pela portadora do HIV, o impacto do seu diagnóstico, as
dificuldades no manejo terapêutico do vírus, seus efeitos adversos, as várias
idas aos serviços especializados para o tratamento de uma doença ainda
incurável são algumas considerações que suscitam preocupação. Sendo assim,
indaga-se: quais as motivações e estratégias de enfrentamento de mulheres com
HIV ante a infecção? Como as mulheres reorganizam suas vidas em face da doença?
Pressupõe-se neste estudo que as normas culturais, a existência de redes
sociais bem organizadas, bem como o programa nacional de tratamento gratuito do
HIV implantado no Brasil influenciam as estratégias de enfrentamento da
infecção de mulheres com o HIV/AIDS.
Deste modo, o presente estudo teve como objetivo analisar relatos e situações
vivenciadas por mulheres infectadas pelo HIV, com fins de identificar suas
motivações e estratégias de enfrentamento frente a infecção.
METODOLOGIA
Para alcançar o objetivo proposto, foi imprescindível utilizar o estudo
descritivo com método de abordagem qualitativa. Pesquisas de cunho qualitativo
preocupam-se em compreender o objeto estudado como único e que representa uma
realidade singular, multidimensional e historicamente situada, buscando-se
investigar diretamente com as pessoas envolvidas questões relativas a situações
da vida humana, conhecer e compreender significados e práticas individuais e
coletivas, focalizando crenças, expectativas, valores, desejos, conhecimentos e
sentimentos(8).
Teve-se como cenário do estudo o Serviço de Assistência Especializada (SAE) do
Hospital São José de Doenças Infecciosas, durante agosto e setembro de 2007.
Integraram o estudo 14 mulheres com diagnóstico de infecção pelo HIV, cujo
critério para escolha foi ter idade igual ou superior a 18 anos, conhecer o
diagnóstico da infecção há mais de seis meses, estar em acompanhamento
ambulatorial e aceitar participar do estudo. O número de participantes foi
determinado pela saturação das informações, ou seja, a repetição dos dados,
além de responder ao objetivo proposto da investigação.
Utilizou-se entrevista semiestruturada audiogravada para a coleta e registro de
dados, conduzida por entrevistadora experiente na captação de dados
qualitativos, com duração média de oitenta minutos. Em decorrência de se ter a
intenção de conduzir uma entrevista livre de preocupações, foi realizada em um
ambiente privativo e explicou-se à participante que ela poderia desistir a
qualquer momento, caso houvesse necessidade ou não mais quisesse participar do
estudo. Por conveniência das mulheres, as entrevistas foram conduzidas no mesmo
dia em que elas tinham consulta médica ou coleta de exames, sendo feitas antes
destes atendimentos.
Para a coleta de dados usou-se como guia um roteiro de entrevista, cujas
questões se baseavam no contexto social, sociodemográfico e de saúde, redes
sociais e apoio financeiro.
Posteriormente à coleta dos discursos das participantes, iniciou-se a análise
dos seus conteúdos. Após escuta minuciosa das falas audiogravadas, procedeu-se
à sua transcrição integral para texto escrito. Os depoimentos foram explorados
por meio de leitura exaustiva de cada uma das transcrições individualmente.
Para o tratamento das informações obtidas, adotou-se análise de conteúdo(9),
realizada em três etapas: 1) Organização e sistematização das ideias
encontradas nas falas transcritas; 2) Exploração do material apreendido por
recorte, agregação e enumeração de trechos correlatos, com vistas a atingir a
representação do conteúdo ou da sua expressão e, por consequência, atingir uma
melhor compreensão do texto obtido; e 3) Tratamento dos resultados, inferência
e interpretação. Obteve-se dessa forma uma categoria geral, Motivações ao
enfrentamento do HIV/AIDS, e subcategorias correlatas: a religiosidade; o
suporte social e familiar; a presença de filhos e a cumplicidade profissional.
Antecipadamente, uma solicitação de apreciação de protocolo de pesquisa foi
submetida ao Sistema Nacional de Ética em Pesquisa (Sisnep) gerando o
Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) sob o nº
0014.0.042.000-07. Após essa certificação, o protocolo foi avaliado e aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital São José de Doenças Infecciosas.
Cumpriram-se os princípios éticos da pesquisa com seres humanos divulgados na
Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil, em especial o
esclarecimento para as participantes do objetivo do estudo. Mediante
concordância de cada uma, registrou-se a anuência no Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido. Para nominar os depoimentos das participantes, atribuiu-se
a letra E seguida do número da entrevista.
RESULTADOS
Entre as 14 mulheres infectadas pelo HIV, as idades variaram de 23 a 41 anos, a
maioria com ensino fundamental incompleto, sem remuneração ou com trabalho
autônomo (apenas uma relatou ser professora e outra afirmou ser empregada
doméstica), cuja renda média era de um salário mínimo (o valor do salário
mínimo vigente na época das entrevistas era de R$ 415,00). Quanto à situação
conjugal, sete eram casadas, três separadas, três solteiras e uma era viúva.
Apenas duas não tinham filhos.
Quanto à descoberta da soropositividade ao HIV, seis souberam do diagnóstico
após episódio de doença, quatro descobriram-se HIV positivo após adoecimento do
parceiro e quatro tiveram teste anti HIV positivo durante o pré-natal.
Motivações para o enfrentamento do HIV/AIDS
A religiosidade
O soropositivo ao HIV busca na religiosidade o conforto e alívio das tensões
advindas do diagnóstico para o enfrentamento da doença. É na figura divina que
o portador encontra forças para superar a doença que não consegue desafiar por
si mesmo. Os depoimentos indicam essa esperança.
"Se não fosse Deus, teria ficado louca." (E2)
"Sempre que o Senhor fala comigo e Ele fala assim: por que tu temes?
Eu sempre estou contigo, com aquela voz tão suave, dá vontade de
chorar[...] Até que o Senhor está me ajudando, por isso que eu estou
aqui te contando." (E9).
A religião também é utilizada como estratégia para compreender o motivo da
infecção e apresenta expectativa para a cura ainda não possível no plano
humano. Dessa forma, o indivíduo HIV positivo encontra razão e força para
superar a doença, até que "um possível milagre" aconteça em sua vida, como se
observa na fala:
"Se foi plano de Deus, tem que seguir, só Ele que vai curar, eu creio
que nem os remédios me sustentam, quem me sustenta é Ele." (E13).
O suporte social e familiar
A ajuda de familiares próximos representa também razão que fortalece e motiva
as mulheres portadoras do vírus para o acompanhamento e tratamento da doença.
Isto decorre sobretudo da necessidade de ter alguém confiável para cuidar dos
filhos na sua ausência durante consultas ou internações. Ademais, significa
aceitação, por parte de pessoas que lhe são caras, da condição sorológica.
"Quando eu não podia, ele dizia: eu vou contigo, quando ele não
podia, eu vinha com a minha cunhada." (E9)
"Em todo caso se Deus me livre eu chegar a adoecer e eu não puder vir
só, qualquer uma das duas irmãs pode vir." (E4).
Muitas vezes, por medo do preconceito, a revelação do diagnóstico restringe-se
a pessoas íntimas. Dessa forma, o auxílio para a mulher HIV positivo limita-se
ao marido ou filhos, que precisam sacrificar dias do trabalho ou de aulas ou
ainda períodos de folga para ajudá-la e garantir o sigilo quanto ao seu estado
sorológico.
"[...] teve uma vez que ficamos internos nós dois [referindo-se a ela
e ao marido] e o filho mais velho ficou cuidando do menor.".(E10)
"A minha menina [filha] a mais velha às vezes faltava aula para me
acompanhar, ela quase ficava reprovada." (E13)
"Mesmo trabalhando ele [o marido] falta o trabalho para ficar comigo,
me acompanhar." (E14).
Neste prisma, a rede social de apoio do HIV positivo é importante para ele não
se sentir sozinho no enfrentamento de uma doença com as peculiaridades do HIV,
marcada por preconceito, abandono e pela finitude da vida. Como observado, o
suporte da família e amigos faz o portador do HIV conviver com a infecção com
mais coragem e continuar sua vida portando uma doença crônica que exige
cuidados como qualquer outra.
"Não deixei de viver, meus amigos não me deixaram e eu não deixei de
ter alguém." (E8).
A presença de filhos
Outra forma de motivação para o tratamento são os filhos. De modo geral, a
mulher sente-se responsável pelo cuidado da sua prole. O isolamento e abandono
da mulher HIV positivo por amigos e familiares também traz por consequência o
isolamento dos seus filhos.
"O que me motiva a fazer o tratamento é a necessidade de estar bem
para cuidar do meu filho." (E7
"Eu vivo por eles [filhos], eles só têm a mim." (E10).
Desde a segunda metade dos anos de 1990, tornou-se rotina na primeira consulta
de pré-natal o aconselhamento para oferta do exame anti-HIV, embora não seja
obrigatório a gestante realizá-lo. No entanto, o aconselhamento pré-teste
motiva a gestante a perceber o risco a que está exposta. Na maioria dos casos,
apesar do impacto do diagnóstico, as gestantes aderem à realização do exame e
posterior acompanhamento e tratamento pelo bem do seu futuro bebê.
"Meu filho é muito importante para mim, por isso iniciei o tratamento
desde o pré-natal." (E8)
A cumplicidade profissional
Por conhecerem sua maior fragilidade, a infecção pelo HIV, os trabalhadores do
ambulatório onde o portador do vírus é atendido lidam cotidianamente com
pessoas ansiosas por partilhar suas dores e angústias, dúvidas e medos.
Encontra no profissional a figura de alguém que escutaria sua história de vida
sem condenação, por ser aquele em quem confia.
"Adoro conversar com ela, dizer que ela é minha assistente social, é
minha psicóloga, é minha amiga, é uma pessoa que eu confio [...]. É
aquele desabafo, choro muito." (E6).
DISCUSSÃO
Segundo referido, as participantes em sua maioria eram mulheres com baixo grau
de instrução e de renda. Quanto ao diagnóstico, a soropositividade ao HIV ainda
se dá em fases avançadas da infecção, ao adoecerem ou quando a AIDS se
manifesta no parceiro. Pesquisa realizada entre mulheres para analisar a
percepção de vulnerabilidade constatou que a população feminina reconhece os
fatores de vulnerabilidade em outras mulheres, no entanto, não se consideram em
risco para infecção(10). A não percepção do próprio risco para o HIV contribui,
portanto, para a não prevenção e para o diagnóstico tardio.
Conforme os resultados, a religiosidade é um fator que contribui positivamente
para o enfrentamento da infecção pelo HIV e tem se mostrado como um aspecto
capaz de ser intensificado a partir da vivência da soropositividade(1). Afirma-
se que a religiosidade está associada positivamente à maioria dos aspectos
referentes à qualidade de vida e, quando na presença de uma doença crônica, os
domínios da qualidade de vida tendem a piorar, exceto os relacionados à
espiritualidade, religiosidade e crenças pessoais(11).
A figura onipotente de Deus simboliza força sobrenatural no enfrentamento do
HIV e de todas as repercussões do diagnóstico na vida do soropositivo, como a
solidão, os efeitos colaterais dos antirretrovirais e o medo da morte. A
confiança em Deus gera a esperança nem sempre possível de ser proporcionada
pela ciência.
A religião induz a reflexões sobre a vida e a morte, promove a esperança de uma
vida plena após a vida terrestre, marcada por uma infecção geradora de inúmeras
perdas. Perde-se a identidade, a saúde e a esperança. Podendo ser útil na
adaptação psicológica de mulheres convivendo com HIV, a religiosidade/
espiritualidade foi identificada como fator para redução de sintomas
depressivos entre mulheres infectadas(12). No contexto da AIDS, a religiosidade
também tem sido relacionada com a terapêutica medicamentosa. A fé e a oração
são identificadas como fortes facilitadores para adesão ao tratamento,
sugerindo-se que sejam fatores a serem considerados ao adaptar as intervenções
existentes(13). Por isso, deve-se considerar a relação histórica e o
significado profundo entre a religiosidade e a vida humana.
Outro aspecto poderoso para motivar o soropositivo ao se defrontar com o HIV é
o suporte social ao seu dispor no seu dia a dia com a infecção. Pessoas que
recebiam maior disponibilidade do seu suporte social estavam mais satisfeitas e
apresentavam adesão satisfatória ao tratamento da infecção(6).
Como portador de qualquer doença de evolução crônica, o soropositivo ao HIV
requer acompanhamento da infecção, consulta ambulatorial periódica e realização
de exames para detecção precoce de qualquer alteração que ameace seu estado de
saúde. A figura da mulher-mãe surge na sociedade como a principal responsável
pelos cuidados da família e de seus membros(14). Por ser cuidadora do lar e dos
filhos por imposição sociocultural, a mulher sente-se na obrigação de, na sua
ausência, ter alguém que cuide dos seus filhos e da sua casa. Para a mulher HIV
positivo, o auxílio será indispensável pelo menos a cada mês. Ainda em alguma
fase da doença, pode precisar de companhia durante as idas ao ambulatório ou
durante uma internação.
No entanto, o medo de ser descoberta é constante e a portadora do HIV isola-se
do convívio social(15). Poucos são os que conhecem sua infecção e que podem
proporcionar ajuda quando necessária, assegurando-lhe o sigilo do seu estado.
Em geral, ela recorre à cumplicidade familiar. Por solidariedade ou por medo de
descobrirem a soropositividade de um dos seus membros, a família contribui para
a omissão do diagnóstico, já que o HIV denunciaria comportamento socialmente
inaceitável do familiar. Em estudo sobre vivência de estigma e enfrentamento do
HIV, é sugerida a formação de grupos familiares para o enfrentamento coletivo
dos problemas surgidos após o diagnóstico e como fontes de suporte social ao
portador do vírus(4).
Estudo aponta ainda que, em muitas ocasiões as mulheres com HIV vivenciam a
separação e a viuvez, tornando-se as únicas responsáveis pela criação dos
filhos(4). Sozinhas diante da infecção e, em alguns contextos, da infecção dos
próprios filhos, a mulher HIV positivo encontra na prole seu reconforto, seu
apoio e seu motivo para cuidar de si mesma, com vistas a melhor cuidar dos
filhos, que com ela vivem a solidão, o estigma, o abandono.
É comum observar-se intensa preocupação e responsabilidade de mães HIV positivo
em relação aos filhos. Mulheres infectadas pelo vírus, após o diagnóstico,
tentam manter uma identidade materna positiva para que os filhos guardem delas
uma lembrança positiva(16).
No presente estudo, estes são citados sempre como motivo para viver, para
cuidar de si e buscar tratamento adequado, principalmente quando o diagnóstico
se dá durante o pré-natal. A infecção da mulher pelo HIV é sugerida como fator
determinante para a construção de forte apego materno ao seu filho(17).
Uma criança vinda neste contexto passa a representar a possibilidade da
continuidade da vida através da prole, pois ainda não existe cura definitiva
para AIDS, apenas o seu controle. Com isso, a mulher preocupa-se com seu estado
de saúde, porque dela depende seu filho. Detentor de um enfoque gerador de
vida, a maternidade motiva mães com HIV à busca de qualidade de vida e à adesão
ao tratamento, com fins de melhor cuidar dos seus filhos(18).
De acordo com o abordado também nesta pesquisa, o atendimento ao portador do
HIV nos centros assistenciais influencia a forma como o soropositivo enfrenta a
infecção. Contudo, o que parece ser determinante são os aspectos subjetivos
inerentes à assistência prestada.
Mediante uma relação de confiança e cumplicidade, o HIV positivo espera de quem
o atende a compreensão da complexidade que é conviver com o HIV/AIDS.
Identifica-se o acolhimento e apoio profissional como determinante para a
confidencialidade da mulher com o vírus e, muitas vezes, para essa mulher, a
relação com o profissional que a atende é comparada a vínculos familiares(19).
Em contrapartida, afirma-se que, diante dos desafios do portador do HIV,
particularmente da fragilidade ante a infecção, assistir indivíduos com o vírus
faz emergir em profissionais que os atendem o desejo de ajudar, de se
solidarizar.
Tal fato foi percebido em muitas entrevistadas que, apesar da distância e da
dificuldade financeira, preferiam a assistência do serviço especializado ao
qual estão habituadas a recorrerem a outros locais de atendimento em saúde,
mesmo os próximos da sua residência. Falar do seu diagnóstico é expor sua
fragilidade, e o portador do HIV, sobremodo a mulher soropositivo, somente
expõe sua condição quando está firmada a confiança(20).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No percurso da terceira década do início dos casos de AIDS, são visíveis as
dificuldades das mulheres ao enfrentarem a infecção pelo HIV. Nos relatos
evidenciaram-se as diferentes estratégias para se viver e driblar
cotidianamente a doença.
Contudo, a presença da esperança em algo sobrenatural como a religiosidade
revelou-se como alento para o enfrentamento positivo, aliada à perseverança no
tratamento com vistas a sobreviver para poder cuidar dos filhos, mesmo ante a
impossibilidade de cura.
Outro fato na vida das mulheres é a participação efetiva da família como apoio
na perspectiva do cuidado indispensável para as idas aos serviços e para os
cuidados com os filhos ainda dependentes. Enfim, as mulheres perseveram em
busca de novas alternativas e possibilidades para enfrentarem a doença e
sobreviverem dignamente.
Com este estudo espera-se despertar nos profissionais de saúde um olhar
diferenciado em relação às mulheres portadoras de HIV no intuito de compreender
a presença de um ser humano carente de uma relação amiga. Desta forma, elas
poderão ter um cuidado mais humanizado, além de estimularem os familiares no
processo de cuidado.