Percepções de portadores de diabetes sobre a doença: contribuições da
Enfermagem
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O objeto deste estudo diz respeito às percepções dos portadores de diabetes
sobre a importância dos cuidados orientados pelos enfermeiros do Programa de
Assistência ao Portador de Diabetes do HUJBB. O interesse pelo objeto de estudo
surgiu após a oportunidade de conhecer o Programa de Diabetes do Hospital
Universitário João de Barros Barreto (HUJBB) e observar o grande número de
pacientes atendidos diariamente. Esse fato nos chamou a atenção para buscar
avaliar se os pacientes atendidos conseguiam absorver as informações oferecidas
pela equipe de enfermagem, visto que tais pacientes fazem uso do serviço destes
profissionais permanentemente e o entendimento das informações prestadas
influencia diretamente no sucesso do tratamento.
O diabete melito é um distúrbio crônico que afeta o metabolismo dos
carboidratos, das gorduras e das proteínas. Um aspecto característico do
diabete melito é a hiperglicemia, que constitui um reflexo da deterioração na
utilização dos carboidratos (glicose) em virtude de uma resposta defeituosa ou
deficiente à secreção de insulina(1).
Em consequência das complicações crônicas, os diabéticos apresentam, em
comparação à população não diabética, elevada morbidade e mortalidade duas a
três vezes maiores, com redução na expectativa de vida (2). Esta evolução
indesejada pode ser amenizada com ações educativas voltadas para prevenção de
agravos e manutenção da qualidade de vida.
Partindo desta ideia propomos o tema para analisar se as informações oferecidas
aos diabéticos do Programa do HUJBB estão sendo assimiladas com sucesso,
focalizando o compromisso do paciente com o tratamento e a ação da enfermagem
na educação em saúde como forma de prevenção e promoção da saúde. Ressaltamos
que, ao proporcionar orientações a este paciente, também promovemos prevenção,
pois estimulamos um disseminador de informações; e que o aumento de diabéticos
poderia ser amenizado ou parcialmente evitado pelo diagnóstico e tratamento
precoce da doença e de suas complicações.
OBJETIVO
Descrever a percepção dos usuários a respeito do diabete melito e as
implicações dessas percepções para as ações desenvolvidas pelos profissionais
da enfermagem no Programa de Assistência ao Portador de Diabetes do HUJBB.
METODOLOGIA
Tratou-se de um estudo descritivo exploratório, realizado mediante abordagem
qualitativa. Esta escolha ocorreu visto que foram os métodos que melhor
atenderam os objetivos da pesquisa e que permitiram apreensão das opiniões e
motivações expressas pelos participantes.
A pesquisa descritiva procura descobrir, com a precisão possível, a frequência
com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão com os outros, sua natureza e
características, correlacionando fatos ou fenômenos sem manipulá-lo(3). Alguns
autores concordam com tal afirmativa, destacando que a pesquisa descritiva
objetiva conhecer e interpretar a realidade, por meio da observação, descrição,
classificação e interpretação de fenômenos, sem nela interferir para modificá-
la(4). As pesquisas exploratórias visam proporcionar uma visão geral de um
determinado fato, do tipo aproximativo(5).
A pesquisa qualitativa costuma ser direcionada ao longo de seu desenvolvimento,
além disso, não busca enumerar e/ou medir os eventos estudados, seu foco de
interesse é amplo e parte de uma perspectiva diferenciada da adotada pelo
método quantitativo. Dela faz parte a obtenção de dados descritivos mediante
contato direto e interativo do pesquisador com a situação objeto de estudo. Nas
pesquisas qualitativas é frequente que o pesquisador procure entender os
fenômenos segundo a perspectiva dos participantes da situação estudada e, a
partir daí situe sua interpretação dos fenômenos estudados(6).
A pesquisa foi desenvolvida no Hospital Universitário João de Barros Barreto
(HUJBB), localizado no município de Belém do Pará. É uma instituição da
Universidade Federal do Pará (UFPA) e tem como missão prestar assistência à
saúde da população, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), como também atuar
na área de Ensino e Pesquisa e na geração e sistematização de conhecimentos. É
referência regional em Pneumologia, Infectologia e Endocrinologia e Diabetes, e
Referência Nacional em AIDS. A residência médica em endocrinologia proporcionou
o surgimento de pesquisas e com isso ocorreu à criação do Programa de
Assistência ao Portador de Diabetes, onde os usuários são atendidos por uma
equipe multiprofissional.
Participaram do estudo 32 indivíduos. Como critérios de inclusão, selecionamos
usuários do Programa de Assistência ao Portador de Diabetes do HUJBB que fazem
acompanhamento contínuo com a enfermagem e que concordaram em integrar este
estudo.
Quanto ao aspecto ético, a proposta do estudo foi aprovada pelo Comitê de Ética
em Pesquisa do Hospital Universitário João de Barros Barreto, sob o Protocolo
nº 1858/10 e foram observados os princípios éticos da pesquisa, obedecendo à
Resolução nº 196/96 (CNS), respeitando o rigor da pesquisa científica como a
preservação do anonimato dos pacientes participantes da pesquisa.
Os dados foram coletados após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do
Hospital Universitário João de Barros Barreto. A coleta foi realizada por meio
da abordagem de autorrelato com as respostas dos participantes às perguntas
colocadas pelo pesquisador, como em uma entrevista. Utilizou-se, ainda, um
formulário contendo questões relativas aos objetivos que se pretendia alcançar
(7).
A pesquisa foi realizada com os pacientes no hospital, utilizando-se uma
linguagem clara e compreensível, buscando informar esses pacientes a respeito
da prevenção de agravos e importância da atenção prestada pela equipe de
enfermagem.
Antes da entrevista tomamos conhecimento dos pacientes regularmente
matriculados no programa e depois entrevistamos tais pacientes em suas
consultas de rotina. Ressaltamos que todos receberam orientação a respeito do
estudo e ficaram livres para aceitar ou recusar a sua participação na
entrevista.
Para proceder à análise do material coletado utilizamos a técnica de análise de
conteúdo temática, que hoje é cada vez mais empregada para análise de material
qualitativo obtido através de entrevistas de pesquisa(8).
A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações
visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens, a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção destas mensagens(9).
Para o tratamento dos dados foi utilizada a técnica da análise temática, que se
baseia em operações de desmembramento do texto em unidades, ou seja, descobrir
os diferentes núcleos de sentido que constituem a comunicação, e
posteriormente, realizar o seu reagrupamento em classes ou categorias(9).
Na exploração do material, tem-se o período mais duradouro: a etapa da
codificação, na qual são feitos recortes em unidades de contexto e de registro;
e a fase da categorização, no qual os requisitos para uma boa categoria são a
exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade e fidelidade e
produtividade. Já a última fase, do tratamento e inferência à interpretação,
permite que os conteúdos recolhidos se constituam em análises reflexivas, em
observações individuais e gerais das entrevistas(9).
Assim, dentro do discurso dos usuários do Programa de Diabetes foram observadas
as seguintes temáticas: A. Controle do diabetes: a enfermagem na
automonitorização da glicemia; B. O diabético e a enfermagem: uma interação
para o autocuidado; C. Consulta de enfermagem ao diabético: a intervenção no
processo saúde-doença; D. Diabetes e suas complicações: o medo repercutido na
perda de funções.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A. Controle do diabetes: a enfermagem na automonitorização da glicemia
Nesta categoria observou-se que os depoentes necessitam fazer a
automonitorização domiciliar, o que significa mudança na sua rotina diária e
para que haja um bom andamento nesse processo, a enfermagem deve ensinar as
praticas de automonitorização.
[...] Fui orientada pela enfermeira a furar o dedo, tirar a gota de
sangue, colocar na fita e anotar o resultado (M1).
[...] Serve para fazer o acompanhamento e controlar o diabetes. Pegar
informações para tratar (M16).
Observou-se que os sujeitos ao falarem sobre o controle da glicose, referiram
terem sidos orientados pela enfermeira do programa a usarem o glicosímetro e
ressaltaram que esta técnica é de suma importância para o controle da doença.
Observamos com isso que os sujeitos conseguem compreender que a
automonitorização da glicemia é importante para fazer o controle de sua doença.
Avaliamos que esta prática de orientação ao usuário realizada pela enfermagem é
extremamente importante, pois esta monitorização está intimamente relacionada
com o bem estar do paciente em decorrência da diabetes ser uma patologia
crônica que precisa ser constantemente monitorada para prevenir possíveis
agravos.
Sabe-se que esta prática é essencial para dar direcionamento no tratamento,
pois, de acordo com os valores obtidos, serão traçados novas condutas a
respeito de medicações, alimentação e atividades físicas. É através desses
valores, que o enfermeiro avalia se o tratamento está surtindo efeito e se o
paciente aderiu a ele. Esta ação é bem visualizada pela enfermagem, pois são os
profissionais que possuem um maior convívio com o paciente e servem de "ponte"
para encaminhar, se necessário, o usuário para uma nova avaliação médica.
A monitorização da glicemia consiste em verificar seus valores com auxilio de
um aparelho chamado glicosímetro, realizando uma punção digital. Sua finalidade
é direcionar a terapêutica no sentido de obter e manter a glicemia o mais
próximo possível da normalidade, em condições especiais ou na rotina diária,
sempre com segurança. Os resultados da glicemia permitem compreender a
interação entre medicação, atividade física e alimentação e a variabilidade
glicêmica decorrente delas. Possibilitam identificar os sinais de hipo e
hiperglicemia e prevenção das mesmas, diminuindo consideravelmente o risco de
cetoacidose; conhecer a resposta glicemia alimentar e aos exercícios físicos
(10).
O monitoramento domiciliar da glicemia é um dos sete comportamentos para o
autocuidado reconhecido pela AAED (American Association of Diabetes Educators)
e é uma das mais importantes ações dentro do tratamento do DM(10).
As recomendações para o controle domiciliar do diabético incluem
automonitorização: da glicemia capilar, insulina, alterações dietéticas e
realização de atividades físicas, a fim de manter os níveis glicêmicos. Assim,
capacitar e dar suporte à pessoa diabética para o autocontrole domiciliar é uma
responsabilidade conferida aos profissionais de saúde(11).
B. O diabético e a enfermagem: uma interação para o autocuidado
Nesta categoria observou-se a relação da enfermagem em educar o paciente para
que ele adquira conhecimentos que o ajudarão no seu autocuidado diário, isso
implicar em uma mudança de hábitos na vida desses pacientes, tais mudanças leva
tempo e acima de tudo o comprometimento do diabético com o seu tratamento,
visando o seu bem estar. Dessa forma observamos também o comprometimento da
Enfermagem em disseminar ensinamentos e orientações que levem o usuário do
programa a ter o autocuidado consigo, promovendo com isso uma melhor qualidade
de vida.
[...] Acho importante porque a enfermeira me orienta a controlar o
diabetes e fala também as coisas que eu não posso comer (M2).
[...] Gosto muito de assistir as palestra da enfermeira. Ela me
orienta sobre a insulina, uso do aparelho para verificar a glicose, o
cuidado aos meus pés (M15).
O autocuidado é uma prática em que o paciente adquire informações que o
ajudarão a cuidar de sua saúde, ele ganha com isso uma maior autonomia sobre a
sua saúde, pois, ao adquirir conhecimento, ele irá desenvolver atividades
diárias que trarão benefícios a si próprio. Com atitudes simples como verificar
os pés, cuidados com os ferimentos, reeducação alimentar, o mesmo evitará
possíveis complicações a sua saúde. O paciente passa a ter uma constante
autovigilância sobre o seu corpo e sua saúde.
Os pacientes entrevistados mostraram-se conhecedores de sua patologia e dos
agravos que a mesma pode trazer. A maioria pratica o autocuidado, tendo em
vista o seu bem estar, e objetivam com isso evitar um possível agravo a sua
saúde. A enfermagem tem se relacionado bem com os usuários do Programa, onde a
principal meta alcançada é a adesão dos pacientes no seu tratamento diário o
que ocorre na maior parte do tempo em seu domicilio. Dessa forma, os pacientes
estão sendo bem orientados no seu autocuidado, sendo usuários conscientes,
orientados e autônomos.
Sensibilizar os diabéticos para compreender essa necessidade de alterações
pessoais no estilo de vida é papel fundamental dos profissionais envolvidos com
o tratamento do diabetes. Adotar uma postura de decidir junto com o paciente,
quais medidas são mais pertinentes e passíveis de execução, por meio de um
processo colaborativo e não essencialmente prescritivo, encoraja-os a assumirem
a responsabilidade de seu próprio controle e acredita-se, que somente assim as
mudanças possam se concretizar(10).
Na prática assistencial, deparamo-nos com o impacto que o DM tem sobre a saúde
da população e com a dificuldade de adesão dos seus acometidos aos
comportamentos preventivos. Nessa perspectiva, o enfermeiro, enquanto
profissional de saúde engajado na assistência ao diabético, deve programar
novas práticas de cuidado capazes de promover a saúde dos diabéticos, já que a
adesão ao tratamento e o autocuidado são pontos frágeis da educação em saúde e
que, portanto, merecem ser refletidos profundamente(12).
Observa-se, dessa forma, o quanto é válido manter o diabético atento à
importância da adesão ao tratamento por meio de educação continuada. Para
tanto, precisa-se considerá-lo como um ser humano com suas crenças e como essas
podem influenciar no modo como se cuida com o diabetes. Definimos crença como o
resultado do domínio da experiência, constituindo-se de convicções não fundadas
racionalmente e que modelam a conduta cotidiana. Fica claro então que, para
orientarmos e estimularmos o autocuidado aos diabéticos, precisamos conhecer
suas crenças e, além disso, fazê-lo conhecer como podem ser decisivas na forma
como aprendem a se cuidar - componente cognitivo; decidem sobre como se cuidar
- componente afetivo; e passam a se cuidar - componente comportamental(13).
Utilizar os comportamentos de autocuidado na avaliação dos resultados
educacionais a curto, médio e longo prazo deve ser o principal objetivo da
enfermagem, para que seja monitorado o grau de conhecimento desses pacientes a
cerca da prática desses autocuidados, pois sabemos que a diabete é uma doença
crônica e precisa ser controlada continuamente. A enfermagem promove
informações e ações educativas de suma importância para que o diabético se
comprometa com sua saúde, e mais do que aprender ele irá colocar tudo em
prática no seu dia a dia, observamos que a maioria dos entrevistados adquiriu
bons hábitos após a consulta com o enfermeiro, dando mérito a esse profissional
que o ensinou e orientou como fazer os seus cuidados diários.
C. Consulta de enfermagem ao diabético: a intervenção no processo saúde-doença
Nesta categoria observou-se a importância da assistência de enfermagem em
ajudar o paciente a enfrentar a doença e adquirir um suporte profissional para
ajudá-lo no melhoramento de sua qualidade de vida. Dessa forma observamos que o
usuário absorveu que o trabalho da enfermagem é de extrema importância para dar
seguimento no seu tratamento e proporcionar condições que favoreçam a boa
qualidade do seu dia-a-dia.
[...] Antes de ter o Programa eu vivia jogado e com o Programa a
gente encontra a equipe especializada (M8).
[...] Para a pessoa ser constantemente orientada, porque o diabetes é
uma doença ingrata e temos que ser orientados (M6).
A enfermagem é uma profissão que se constrói na relação de confiança com o
paciente. Esta profissão visualiza o paciente holisticamente, pois sabemos que
o ser humano não deve ser visto apenas com um olhar, mas com visão
biopsicossocial. Nas falas destacadas acima podemos perceber que os
entrevistados expuseram claramente o seu bem estar em ser acompanhado pela
equipe do Programa de Diabetes, e podemos também perceber que os usuários não
enxergam apenas a sua doença, mas também o seu bem estar em ser acompanhado e
tratado. Podemos visualizar tal fato na fala do entrevistado M8 que afirmou
viver jogado e agora tem uma equipe especializada. Isto nos reporta que o
usuário do programa possui uma percepção de amparo e cuidado por sua saúde e
também por sua doença como relata os demais entrevistados ao referirem
acompanhamento para controle e tratamento.
Deste modo, podemos perceber que o diabético do programa encontra-se
familiarizado com a enfermagem e que tal situação reflete no bem estar físico e
emocional, que muito ajuda em seu tratamento visto que a doença crônica faz a
pessoa ficar dependente do tratamento.
O conceito de promoção da saúde aponta para uma visão holística do processo
saúde-doença e da forma de intervir nesse processo. Nesse sentido, a abordagem
multiprofissional do indivíduo diabético remete a essa visão holística,
reconhecendo a complexidade do seu sistema psíquico e somático que, por isso,
necessita de informações complementares dos profissionais de saúde sobre o
controle, a prevenção e as complicações da sua doença(14).
Em 2003, foi implementada a consulta de enfermagem ao paciente diabético, numa
abordagem psicossocial, levando em consideração uma atuação voltada à
ampliação, tentando alçá-la à abordagem da pessoa, suas interações consigo, com
o outro, com o contexto, enfim, com tudo que está fora, porém não separado dela
mesma, incluindo as expressões de saúde-doença(15).
A abordagem psicossocial é bastante válida, principalmente para os
profissionais que querem promover a autonomia das pessoas e que acreditam que
ainda é possível melhorar a qualidade de vida das pessoas, mesmo quando essas
já têm uma doença crônica(15).
Ao analisar a fala do entrevistado M6 observamos que ele define o diabete como
uma doença ingrata. Com isso podemos perceber, que este paciente necessita de
uma orientação um pouco mais voltada para as suas particularidades, pois
sabemos que a percepção de cada pessoa a respeito de sua doença é muito
diversificada.
Há necessidade de sabermos mais sobre a experiência individual do diabético, o
ambiente físico e social, a influência da cultura na definição da doença e as
atitudes para com ela(16).
Quando se faz referência ao processo educativo para o controle do diabetes,
fala-se da importância de se adotar estratégias, cujas ações devem ter caráter
participativo tanto do indivíduo quanto de sua família. Sabe-se que as ações
educativas influenciam o estilo de vida, melhoram a relação profissional-
indivíduo e os ambientes social e físico. Além disso, a educação em saúde, como
uma prática social, baseada no diálogo, ou seja, na troca de saberes, favorece
a compreensão dessa relação no processo saúde-doença e, respectivamente, o
intercâmbio entre o saber científico e o popular(17).
A abordagem psicossocial é bastante valida, principalmente para os
profissionais que querem promover a autonomia das pessoas e que acreditam que
ainda é possível melhorar a qualidade de vida das pessoas, mesmo quando estas
já têm uma doença crônica. Deste modo ao se ampliar a abordagem da pessoa com
diabetes leva em consideração, não somente os aspectos clínicos, tão fortemente
estudados, mas também os aspectos psicossociais que constituem muitas vezes,
determinante do processo saúde doença(15).
Sendo assim, ressalta-se a importância do enfermeiro visualizar holisticamente
estes pacientes, para que as consultas de enfermagem possam dirigir um
tratamento que vise amenizar os desconfortos da doença e prevenir possíveis
agravos o que gera promoção da saúde.
D. Diabetes e suas complicações: o medo repercutido na perda de funções
Observa-se nesse tópico o medo que o paciente diabético tem de perder alguma
função, ou mesmo de perder uma parte do seu corpo, por conta das complicações
do diabete. O paciente começa a se cuidar impulsionado pelo medo de perder sua
saúde e até mesmo ficar mutilado, dessa forma o medo obriga o paciente ao
autocuidado.
[...] Problema no rim, cegueira, feridas que dão na perna, perda de
dedo, pé e perna (M21).
[...] Posso ficar cega, perder um braço ou uma perna, posso ficar
doente (M2).
O paciente com diabetes tem uma percepção que a doença agora faz parte do seu
mundo e necessita conhecer os controles necessários para manter uma boa
qualidade de vida, mas alguns relutam em abandonar hábitos adquiridos num
passado sem a doença. O que o motiva à mudança desses hábitos é o medo das
complicações que o diabete pode trazer para sua vida. Eles têm medo de ficar
limitados, dependentes de alguém ou de algo; assim sendo, algumas pessoas
expressaram claramente seu temor por uma amputação, por uma cegueira, pela
possibilidade de perder sua capacidade de ir e vir, de cuidar de si mesma. A
verbalização da perda não apenas como impossibilidade inerente à condição
humana, mas potencializada pelas possíveis complicações da Diabetes está
presente em algumas falas.
[...] A enfermeira trata a gente bem, com carinho. Ela orienta a
gente e não briga com a gente (M23).
No que tange à enfermagem, o enfermeiro deve ver o paciente de uma forma
holística não apenas como uma pessoa que está doente, mas atentar como essa
pessoa está reagindo e enfrentando essa patologia crônica com que terá que
conviver no seu cotidiano. A enfermagem deve avaliar e dar suporte emocional a
esse usuário, visto que para êxito no tratamento o paciente precisa estar com a
diabete controlada, necessita se sentir saudável e com uma boa qualidade de
vida, longe de medos, mas esclarecido sobre sua patologia e como o mesmo pode
ajudar no seu tratamento.
O medo nada mais é que a falta de confiança que o tratamento não tenha efeito
sobre sua doença, visto que se os usuários do Programa ao cuidarem muito bem de
sua saúde, não deverão temer essas complicações, pois os mesmos estarão
prevenindo-as. Esse medo é consequência do "sentir-se doente" e ter que
conviver com uma doença crônica para o resto de sua vida. Faz-se extremamente
necessário a atuação da enfermagem em tratar esse medo do paciente criando
vínculos de amizade com esse usuário, onde o paciente veja o enfermeiro não
como alguém que o amedronta e o obriga a se cuidar, mas como um facilitador de
conhecimento que promoverá o autocuidado, ele está ali para esclarecer dúvidas,
para ajudar e não amedrontar.
O enfermeiro deve atentar para o modo como esse paciente expressa a situação
existencial concreta do ser doente, vinculada à historicidade própria da doença
de cada um, visto serem pessoas de hábitos e costumes diferentes. No processo
ensino-aprendizagem há obstáculos, tanto cognitivos como emocionais, que
precisam ser compreendidos e trabalhados pela enfermagem.
O grande número de investigações relacionadas aos doentes de diabete tem
permitido a continuidade dos programas de cuidado à doença. Entretanto, os
resultados não têm sido favoráveis devido às complicações surgidas. Assim, é
importante dar continuidade aos estudos de forma a atingir melhores condições
de vida para estes doentes, considerando que a enfermidade se relaciona a
sentimentos negativos, como choque, revolta e tristeza(18).
A medicina sozinha não consegue dar conta de ajudar no controle da doença para
que não haja complicações, pois além de exames e medicamentos, é necessário
dieta, exercícios físicos e um equilíbrio emocional, visto que estes aspectos
influem diretamente sobre a doença(19).
A doença psicossomática é qualquer alteração somática (física) decorrente de
sofrimentos psíquicos, diferentemente da somatopsíquica que é qualquer
alteração psíquica decorrente de sofrimento físico, por exemplo, os efeitos
psíquicos sofridos pelo indivíduo que possui uma enfermidade crônica ou uma
debilidade física. Sendo assim o diabetes mellitus pode ser considerado tanto
uma doença psicossomática quanto somatopsíquica(20).
A doença psicossomática surge em decorrência do modo como o indivíduo vivencia
as emoções. As emoções (medo, ira, amor) são situações novas frente às quais o
organismo se desequilibra e se prepara para descarregá-las através dos músculos
voluntários do corpo. Porém, muitas vezes, as emoções não são descarregadas,
expressas, talvez pela imposição da sociedade para reprimi-las. Quando as
emoções não são expressas através de nossos músculos voluntários, elas
descarregam-se em nossos músculos involuntários, como o estômago, intestino,
coração e vasos sanguíneos, podendo desencadear a doença psicossomática(20).
O diabético transporta o emocional (medo de sofrer) para o soma (não permitir a
entrada do açúcar, simbolicamente do amor). Isso também pode ser observado na
alteração da glicemia. Quando o diabético vive uma tensão emocional há um
aumento de glicemia, assim quando o diabético fica tenso permite menos ainda
que o açúcar (doce) entre na célula. O emocional é constituído por aspectos
mais profundos internamente e inconscientes, que podem impedir um bom controle
da doença se esta não for internamente aceita(21). Acredita que o diabetes será
enfrentado diferentemente por cada indivíduo, pois dependerá da estrutura
psíquica ou organização mental de cada um(22).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa buscou conhecer e descrever a percepção dos usuários do Programa de
Diabetes do HUJBB a respeito da significância do profissional enfermeiro dentro
do Programa, identificando-se que, para tais usuários, a enfermagem contribui
positivamente para a manutenção de sua saúde e da sua qualidade de vida, ao
ensiná-lo para o autocuidado.
Dentro das análises realizadas, observamos que o enfermeiro está diretamente
ligado com o controle do diabetes, a partir do momento que realiza os cuidados
e orientações da automonitorização da doença. Isto mostra que cabe à enfermagem
ensinar os pacientes a praticarem esta monitorização, pois encontramos também o
enfermeiro interagindo com os usuários e facilitando assim o seu autocuidado,
que em se tratando de pacientes crônicos deve ser focado continuamente.
Observamos também que a consulta de enfermagem possui uma grande importância
para os usuários, pois estes passaram a conviver melhor com a doença a partir
do momento que criaram vínculos com o enfermeiro que continuamente promove
ações que melhoram a qualidade de vida em função de trabalharem no processo
saúde-doença. Logo, tal vínculo foi explicito quando observamos o medo dos
pacientes em relação às perdas ocasionadas por agravos, o que nos reportou que
estes pacientes conseguiram absorver as possíveis consequências que podem
ocorrer caso eles não assumam as responsabilidades do seu tratamento.
O enfermeiro é o profissional que serve como uma seta planejadora de ações,
pois atende o usuário de maneira individualizada, avaliando-o e encaminhando-
o a outros profissionais quando necessário. Compreendemos que o enfermeiro é
visto como um amigo e facilitador no autocuidado dos pacientes, pois a maioria
dos entrevistados colocou que as "orientações e ensinamentos" feitos pelo
enfermeiro foram fundamentais para o aprendizado na realização do cuidado de
si.
Do total de entrevistados, 97% consideram a consulta com o enfermeiro
importante e de grande valia, pois, por meio da consulta, tiveram uma melhora
significativa nas suas vidas; 100% referiu que o papel do enfermeiro é ensinar
e orientar no seu autocuidado. Entre as ações de autocuidado estão a
monitorização do diabetes, com verificação periódica da glicemia, uso de
insulina, cuidados com os pés, cuidados com ferimentos, a reeducação alimentar,
os agravos e complicações ocasionados pela diabetes.
Entre o déficit de conhecimento, está a importância de esse usuário ir ao
oftalmologista regularmente, visto que a diabetes pode levar a cegueira.
Ressalte-se que 50% dos entrevistados relataram não terem sido orientados sobre
a importância de ir ao oftalmologista; os outros 50% foram orientados sobre a
importância e vão regulamente ao oftalmologista. Dessa forma fica um tema a ser
trabalhando mais pela equipe de enfermagem do programa sobre os cuidados que os
pacientes com diabetes devem ter com sua visão. Cerca de 60% não foram
orientados sobre a importância de usar calçados adequados, e 37% informarão
terem sido orientados e fazem o uso de sapados adequados.
A maioria dos usuários está absorvendo e realizando as orientações que são
repassadas pelo profissional enfermeiro, alguns relatam que sentem saudades das
palestras que anteriormente eram feitas pela enfermeira do Programa, hoje os
cuidados e orientações são individualizados feitos durante as Consultas da
enfermeira. Uma vez que é de extrema importância à educação em saúde feita por
estes profissionais fica mais uma sugestão sobre a volta das ações educativas
em grupos, onde há uma troca de saber de um usuário com outro.
Os dados obtidos nessa investigação mostraram que o processo educativo
oferecido pelo Programa de Diabetes do HUJBB, durante a Consulta de Enfermagem
teve repercussão na dinâmica do usuário, ampliando os seus conhecimentos em
relação ao tratamento e controle da diabetes. As falas obtidas possibilitaram
compreender que o paciente constituiu um elemento que expande o conhecimento
acerca da diabetes no seu cotidiano e este passou a exercer mais adequadamente
seu papel no seu autocuidado. A ampliação do aprendizado pode favorecer a
aquisição de hábitos saudáveis na vida desse diabético. Desse modo,
compreendemos que a educação em diabetes deve estar centrada na significância
que o enfermeiro exerce na equipe multidisciplinar dentro do programa e na vida
desses usuários. Quando o paciente encontra essa rede de apoio na Enfermagem,
há uma maior efetividade no processo educativo.
Dentro dos objetivos propostos concluímos que os usuários do Programa de
Assistência aos Portadores de Diabetes do HUJBB possuem uma boa percepção a
respeito dos cuidados repassados pela equipe de enfermagem, isto nos reforça a
importância do trabalho destes enfermeiros como educadores da saúde com intuito
de promover uma melhor qualidade de vida para esses usuários.