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BrBRCVHe0034-71672016000100156

BrBRCVHe0034-71672016000100156

variedadeBr
ano2016
fonteScielo

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Condições do letramento funcional em saúde de um grupo de idosos diabéticos INTRODUÇÃO Letramento Funcional em Saúde (LFS) significa ter a capacidade de obter, processar e compreender as informações em saúde e serviços básicos, no intuito de tomar decisões apropriadas para a gestão do autocuidado ou em saúde(1-2). O termo "letramento" é um construto relativamente novo no contexto da educação brasileira e mais recente ainda na área da saúde. O descritor universal em ciências da saúde refere-se a health literacy como alfabetização em saúde ou cultura em saúde.

Estudos sobre LFS apontam que ele pode ser um dos caminhos para a promoção da saúde sob diversos aspectos, associados a atributos como: habilidades; capacidade; cognição; competências pessoais; tomada de decisões em saúde; compreensão em saúde; controle da saúde; redução de riscos em saúde; capacidade de ler, de processar as informações em saúde; promover, manter e melhorar a saúde no curso da vida e na interação com o sistema de saúde; extrair significado de qualquer tipo de informação e decisões em saúde que beneficiam a comunidade, relativas a questões como uso de drogas e álcool, prevenção e tratamento de doenças, segurança e prevenção de acidentes, primeiros socorros, emergências; se manter saudável; realizar operações aritméticas que dizem respeito ao controle de medicamentos, horários e dispositivos utilizados no tratamento de alguns agravos à saúde(3-7).

Nesse sentido, promover a saúde significa fornecer às populações condições para que estas sejam capazes de melhorar sua saúde e exercer controle sobre a mesma, como foi preconizado internacionalmente em Ottawa. Assim, para alguns autores, a saúde é concebida como a possibilidade de o indivíduo aproveitar a vida de forma positiva, no sentido do uso de recursos pessoais e sociais, além da capacidade física(8).

Adicionalmente, se pensarmos que a população brasileira envelhece de forma acelerada(9), e com maior possibilidade de uma grande parcela desenvolver uma doença crônica - entre elas, o diabetes mellitus tipo 2 (DM2), exigindo um controle adequado da saúde e o desenvolvimento de habilidades individuais para melhor enfrentamento dos riscos e estratégias de autocuidado - a avaliação do impacto do LFS pode ser um fator que contribua para postergação de incapacidades.

Desse modo, a lacuna identificada sobre o tema na área da saúde justifica a relevância para realizar esta pesquisa. Essa assertiva parte das evidências científicas exploradas em bases de dados nacionais e internacionais sobre LFS, a partir das quais se observou que no Brasil e, especificamente na produção científica da enfermagem, estudos que avaliassem esse aspecto, sobretudo com idosos, ainda pouco se conhecem. No período de 2005 a 2014, encontraram-se apenas dois estudos realizados por enfermeiros no Brasil com idosos (na Região Sul), utilizando um protocolo de avaliação a partir de um modelo canadense e com método de análise qualitativa(10-11).

O LFS é um tema de natureza complexa, multidimensional e de caráter interdisciplinar. Entre essas dimensões, destaca-se o campo da Educação para a Saúde, abrangendo dessa forma dois outros grandes campos de conhecimento: a Educação e a Saúde. No campo da Educação, delimita-se pela convergência dos saberes oriundos, principalmente, da Linguística e da Pedagogia, que estão mais diretamente relacionados aos processos de alfabetização e letramento; e da Saúde, pelos princípios da promoção da saúde, prevenção de doenças e empoderamento dos sujeitos atendidos(12).

Nesse âmbito, o LFS se torna um conceito que descreve a aplicação prática de uma vasta gama de competências cognitivas e não cognitivas na vida real, em vez de uma habilidade única de letramento em um ambiente clínico. LFS saúde, nesta perspectiva, é o resultado da intervenção e não uma variável independente(13).

A Organização Mundial de Saúde (OMS), por meio da Commission Determinants of Health, identificou o letramento como um dos determinantes sociais da saúde, pois poderá contribuir com a melhoria das habilidades do indivíduo em acessar, compreender, avaliar e comunicar as informações de maneira que possa melhorar a sua saúde, de seus familiares e da comunidade(14).

Além disso, é importante considerar que o LFS forma uma rede complexa de interação com o sistema de saúde, com o sistema educacional, com os fatores sociais e culturais em que o indivíduo está imerso, havendo necessidade de se elevarem os graus de LFS dos indivíduos, tendo em vista os inquéritos revelarem que, tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, um grande número de pessoas iletradas neste contexto específico(15,16).

Na população norte-americana, por exemplo, nove em cada dez adultos têm a possibilidade de manifestar a falta de competência necessária para gerir a própria saúde e prevenir doenças(14). No mesmo sentido, pesquisas têm demonstrado que - no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Austrália e no Canadá - de 20% a 50% da população têm baixa competência em LFS(15).

No Brasil, um estudo foi realizado com uma amostra de idosos na Região Sul, para analisar como esses idosos buscam, compreendem e compartilham as informações de saúde que promovem o autocuidado. Os resultados desse estudo evidenciaram que os idosos tinham interesses ligados a estratégias de prevenção de danos e promoção da saúde, além de preocupação com o trabalho e com a família. A maioria dos participantes referiu não estar suficientemente esclarecida sobre sua condição de saúde e que a compreensão sobre as informações recebidas era restrita e dizia respeito ao diagnóstico e tratamento. Esses resultados conduziram os autores a sugerirem que a identificação da compreensão das informações em saúde poderia apoiar o planejamento, a implementação e o aprimoramento de ações de educação em saúde com idosos nos serviços de atenção básica à saúde(11).

Do ponto de vista teórico, na literatura internacional, encontraram-se alguns modelos que discutem o LFS e apontam os possíveis benefícios à saúde das pessoas com letramento adequado. Entre eles, menciona-se o proposto por Nutbeam (2000)(7). Nesse modelo, o autor considera algumas etapas ligadas entre si para que o indivíduo alcance a melhoria dos resultados por meio de escolhas saudáveis e oportunidades, que incluem: o conhecimento e capacidades individuais prévios (fluência em leitura, habilidades matemáticas); a capacidade de ter a informação, comunicação e educação em saúde adequadas, desenvolvimento de conhecimentos e capacidades; habilidades em negociação e autocontrole; melhoria dos níveis de letramento e mudanças de comportamentos e práticas em saúde; engajamento em ações sociais para saúde e participação em mudanças de normas sociais. Essa sequência de eventos nesse modelo, então, aponta que o LFS é mais que o do indivíduo ser capaz de ler panfletos e fazer apontamentos, mas engloba também a melhoria do acesso às informações em saúde e em suas capacidades de utilizá-las é um processo crítico para emponderá-lo.

Assim, partindo-se do princípio de que a educação em saúde e para a saúde é uma das estratégias utilizadas no cotidiano do processo de trabalho da enfermagem, tem-se como pressuposto deste estudo que os idosos diabéticos assistidos na rede de atenção básica à saúde poderiam ter as competências e habilidades para autogestão em saúde comprometidas pelo baixo LFS, e objetivou-se avaliar o LFS em saúde de um grupo de idosos diabéticos como condicionante para seu autocuidado.

MÉTODO Trata-se de um estudo epidemiológico, seccional e descritivo sobre o LFS de idosos diabéticos assistidos em uma unidade de saúde municipal do SUS na Região Norte do Brasil, Belém (PA), realizado no período de maio a agosto de 2014. Foi avaliada uma amostra de idosos (n = 114). Essa foi obtida da população de referência (N=202) de idosos matriculados na unidade de saúde no período da coleta de dados. Para obtenção dos dados, elaborou-se um instrumento de pesquisa composto por condicionantes sociais e demográficos (sexo, idade, estado de convivência, escolaridade, procedência, renda mensal, compreensão das informações em saúde e hábitos de leitura no cotidiano); saúde (tempo de tratamento, comorbidades, complicações da doença, hábitos nocivos à saúde, como fumo e consumo de álcool). Para avaliação do LFS, optou-se pela aplicação do teste S-TOFHLA, entre outros métodos existentes, pois essa versão foi aplicada e validada no Brasil. OS-TOFHLA, em português, significa Avaliação da Alfabetização em Saúde ou do Letramento, e, neste estudo, seguiram-se as recomendações de estudos realizados no Brasil, nos estados do Ceará e São Paulo (12,17).

Para inclusão na pesquisa, era necessário que os idosos estivessem em tratamento para diabetes tipo II, possuíssem pelo menos 1 ano de escolaridade, que conseguissem ler o Cartão de Jaeger em nível 20/40, considerado normal para uma visão periférica com ou sem lentes corretoras ou óculos. E também que ouvissem o sussurro (Teste de Whisper) dos lados direito e esquerdo do canal auricular pelo teste do sussurro e conseguissem pontuação adequada no Mini-Cog (18), que avalia a memória imediata associada ao Teste do Desenho do Relógio (TDR), este último que avalia as funções executiva, visuoespacial e motora fina. Os testes foram utilizados para avaliação multidimensional rápida, conforme recomenda o Ministério da Saúde(19). Foram aplicados com o objetivo de minimizar os possíveis confundimentos, como recomenda o teste original, que podem surgir por alterações nas funções visual, auditiva, cognitiva ou motora e interferir no resultado final. Nesse caso, como avaliaram-se somente pessoas idosas, as mesmas poderiam apresentar as alterações funcionais próprias do envelhecimento.

Sobre o teste específico do LFS (S-TOFHLA)(17), este é composto por dois subtestes: um avalia a compreensão textual; e o outro, a matemática ou numeramento. O subteste para compreensão textual é constituído de frases sobre o preparo de um exame do trato gastrointestinal rotineiro de saúde (raio X de estômago), direitos e responsabilidades em relação ao sistema de saúde e tomada de decisões sobre a própria saúde. Essas frases contêm 36 lacunas, em que o participante deverá escolher entre quatro palavras alternativas que darão sentido à frase, existindo somente uma possibilidade de resposta. Esse subteste de compreensão textual deverá ser executado em 7 minutos; ao passo que a parte de compreensão matemática, em 10 minutos, como recomenda o teste após validação no Brasil. Porém, o examinador não avisa sobre esse tempo ao examinado e, quando atinge-se o período determinado, o teste é recolhido. Além disso, nesse estudo, o tamanho da fonte do texto que compõeS-TOFHLA foi impressa em tamanho 14, para facilitar a acessibilidade visual e melhorar a leitura pelos idosos.

As questões relacionadas à matemática (numeramento) dizem respeito a situações vivenciadas em saúde, que envolvem marcação de uma consulta, atenção e cálculo, como horário de tomada de medicações, o resultado de um teste laboratorial para glicemia, bem como dosagem de medicação. O examinador entrega um cartão ao examinado e faz a pergunta sobre o que consta no cartão, simulando o cartão de consulta, rótulos de medicamentos e receituários, comumente usados pelos usuários da atenção básica em saúde. Para pontuação geral do teste, cada resposta certa na compreensão textual equivale a 2 pontos e, para o subteste de numeramento, a 7 pontos, obtendo-se um total de 100 pontos. O escore do teste é classificado como "Inadequado", "Marginal ou Limítrofe" e "Adequado", conforme a pontuação obtida, ou seja, de 0-55, 56-66 e 67-100, respectivamente.

A análise dos dados foi realizada pelo software SPSS (versão 20.0), considerando-se o nível α = 5% e p valor 0,05. Foram feitas análises univariadas, bivariadas e descritas as proporções, média, desvio-padrão e aplicado o Teste do Qui-quadrado de Pearson para verificar a independência entre as variáveis. A pesquisa obedeceu a todos os princípios éticos em pesquisa com seres humanos conforme a Resolução MS/466/2012 e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UEPA.

RESULTADOS De acordo com as variáveis analisadas sobre os condicionantes sociais e demográficos estratificadas pelo resultado do teste de LFS, observou-se que a maioria dos idosos participantes do estudo era do sexo feminino, correspondendo a 64,0% da amostra. Estavam na faixa etária mais nova, ou, seja, entre 60 e 69 anos, cuja média de idade foi de 67,4 anos; eram casados em sua maioria; tinham um meio de provento mensal e residiam majoritariamente na capital; e 62,4% declararam ter entre 1 e 4 anos de escolaridade. Quanto à compreensão das informações em saúde, 50,0% revelaram compreendê-las, assim como terem o hábito de leitura, porém, quando comparadas pelo resultado do teste de LFS, as variáveis que mostraram interdependência foram a "escolaridade" e os "hábitos de leitura" com p valor ( 0,05), conforme os resultados descritos na Tabela_1.

Tabela 1 Características dos idosos que participaram do estudo, estratificados pelos níveis de letramento funcional em saúde, Belém, Pará, Brasil, 2014 (N = 114)  Letramento Funcional em Saúde* Total Inadequado Marginal Adequado Valor de Características (N = (n = 84 ) (n = 12) (n = 18) p* 114) n (%) n (%) n (%) n (%) Idade - média (DP) 67,4 (± 5,28) Faixa etária (em anos) 60-69 49 (58,3) 9 (75,0) 17 (94,4) 0,53 70-79 32 (38,1) 3 (25,0) 1 (5,6) 80-89 3 (3,6) 0 (0,0) (0,0) Sexo Feminino 73 51 (60,7) 6 (50,0) 16 (64,0) (88,9) 0,44 Masculino 41 33 (39,3) 6 (50,0) 2 (11,1) (36,0) Estado de Convivência Casado 63 47 (56,0) 6 (50,0) 10 (55,3) (55,6) Solteiro/Viúvo/Divorciado 51 37 (44,0) 6 (50,0) 8 (44,4) 0,92 (44,7) Procedência Belém 68 45 (53,6) 9 (75,0) 14 (59,6) (77,8) 0,23 Fora de Belém 46 39 (46,5) 3 (25,0) 4 (22,2) (40,4) Renda Mensal Sim 102 77 (91,7) 10 15 (89,5) (83,3) (83,3) 0,44 Não 12 7(8,3) 2 (16,7) 3 (16,7) (10,5) Escolaridade (em anos) 1 a 4 71 59 (70,2) 6 (50,0) 6 (50,0) (62,3) 5 a 8 30 22 (26,2) 5 (41,7) 3 (16,7) 0,00 (26,3) + de 9 13 3 (3,6) 1 (8,3) 9 (50,0) (11,4) Compreensão das orientações em saúde Sim 80 57 (67,9) 8 (66,7) 15 (70,2) (83,3) Às vezes 32 27 (32,1) 3 (25,0) 2 (11,1) 0,06 (28,1) Não 2 (1,7) 0 (0,0) 1 (8,3) 1 (5,6) Hábito de leitura Sim 58 35 (41,7) 9 (75,0) 14 (50,9) (77,8) Às vezes 42 35 (41,7) 3 (25,0) 4 (22,2) 0,01 (36,8) Não 14 14 (16,7) 0 (0,0) 0 (0,0) (12,3) No que se refere aos condicionantes da saúde dos idosos do estudo, além do diabetes, a maioria deles informou ter outras doenças associadas, sobretudo a hipertensão arterial, declarada por cerca de 64,0%. Além disso, eram doentes de longa data, e mais de 60% relataram não ter sofrido nenhuma complicação advinda do processo de evolução da doença até o momento. Outros fatores também considerados importantes no estudo e que podem implicar nas condições de saúde foram os hábitos nocivos de vida, como fumo e ingestão de álcool, como descritos na Tabela_2.

Tabela 2 Distribuição dos condicionantes da saúde dos idosos que participaram do estudo, estratificados pelo letramento funcional em saúde, Belém, Pará, Brasil, 2014 (N= 114)  Letramento Funcional em Saúde* Condicionantes da saúde Total Inadequado Marginal Adequado Valor de p* (N = 114) (n = 84 ) (n = 12) (n = 18) n n (%) n (%) n (%) Comorbidades associadas Nenhuma 17 16 (19,0) 1 (8,3) 0 (0,0) Hipertensão 73 51 (60,7) 8 (66,7) 14 (77,8) Dores articulares 10 6 (7,1) 2 (16,7) 2 (11,0) 0,65 Osteoporose 9 7 (8,3) 1 (8,3) 1 (5,6) Doenças cardíacas 2 2 (2,4) 0 (0,0) 0 (0,0) Outras 3 2 (2,4) 0 (0,0) 1 (5,6) Complicações pelo diabetes Nenhuma 75 52 (61,9) 6 (50,0) 17 (94,4) Visual 19 16 (19,0) 2 (16,7) 1 (5,6) Renal 12 11 (13,1) 1 (8,3) 0 (0,0) Sensibilidade plantar 4 3 (3,6) 1 (8,3) 0 (0,0) 0,01 Amputação de membros 2 2 (2,4) 0 (0,0) 0 (0,0) Úlcera plantar 1 0 (0,0) 1 (8,3) 0 (0,0) Complicações associadas 1 0 (0,0) 1 (8,3) 0 (0,0) Hábito de fumar ou Ex- Fumante Não 59 43 (51,2) 5 (41,7) 11 (61,1) 0,56 Sim 55 41 (48,8) 7 (58,3) 7 (38,9) Consumo de Álcool Não 94 72 (85,7) 9(75,0) 13 (72,2) 0,30 Sim 20 12 (14,3) 3 (25,0) 5 (27,8) Notas: DM (diabetes mellitus); *Teste aplicado χ2; valor de p 0,05 De acordo com o teste realizado neste estudo (Tabela_3), as condições de LFS em cerca de 73,7% mostraram-se inadequadas e a média geral alcançada foi de 44,4 pontos. Porém, quando analisada a compreensão numérica contida na segunda parte do teste, cerca de 52,6% dos idosos conseguiram compreender e responder as perguntas, como mostrado na Tabela_4.

Tabela 3 Distribuição do Letramento Funcional em Saúde dos idosos que participaram do estudo, Belém, Pará, Brasil, 2014 (N = 114)  Letramento Funcional em Saúde f % Inadequado 84 73,7 Marginal 12 10,5 Adequado 18 15,8 Total 114 100,0 Nota: média de pontos no teste global (compreensão textual e numérica) = 44,4 (DP± 19,34).

Tabela 4 Proporções das respostas sobre a compreensão numérica entre os idosos que participaram do estudo, Belém, Pará, Brasil, 2014 (N = 114)  Letramento Numérico f % Acertou as quatro perguntas 60 52,6 Acertou entre 2 a 3 perguntas 53 46,5 Não acertou qualquer questão 1 0,9 Total 114 100,00 Nota: Perguntas: 1. data da próxima consulta; 2. taxa glicêmica normal; 3.

horário da medicação considerando o horário do almoço; 4. cálculo do horário de uma medicação a cada 6 horas.

DISCUSSÃO Os condicionantes sociais e demográficos são considerados como uma das dimensões para se compreender o LFS(5). Neste estudo, as mulheres idosas compuseram a maior proporção da amostra avaliada, e esse perfil está em consonância com a projeção brasileira da população de mulheres idosas, que, em 2013, correspondia a 55,5%(9).

Sobre o desempenho do LFS segundo o sexo, neste estudo não apresentou diferença, mas se contrapõe com estudo realizado no Ceará, em 506 usuários do Sistema Único de Saúde na Atenção Básica, em que os participantes foram selecionados por estrato de idade(12). Em outro estudo, realizado nos EUA, utilizando o mesmo teste, também não houve diferença nos níveis de LFS quando comparado o desempenho entre homens e mulheres idosas(20). Contudo, de se destacar que no estudo brasileiro(12) nem todos os participantes eram idosos.

Entre os condicionantes avaliados nesta pesquisa, ressalta-se ainda o baixo nível de escolaridade, ou seja, mais de 60% tinham até 4 anos de estudo, o que se mostrou influenciando o desempenho do LFS alcançado pelos idosos (p = 0,00).

Essa realidade parece impactar no envelhecimento e na saúde, como demonstrado numa pesquisa brasileira que alerta para os seguintes dados: 49% da população idosa é considerada analfabeta funcional, e, desse total, 23% dos pesquisados declaram não saber ler e escrever, 22% dos idosos consideram a leitura e a escrita atividades penosas, seja por deficiência no aprendizado, problemas de saúde, ou ambos os motivos(21).

Os idosos deste estudo apresentavam dificuldade quando precisavam ler toda a frase, compreendê-la dentro de seu contexto e identificar qual palavra completava seu sentido, bem como, ao mesmo tempo, ter o entendimento de qual a relação com a sequência do texto. Sobre essa questão, vale salientar, segundo o inquérito brasileiro(22)(INAF, 2012) e também levantamentos internacionais, que as pessoas que não completaram até o quinto ano do ensino fundamental são consideradas analfabetas funcionais. E, de acordo com esse mesmo inquérito, esperava-se que os grupos que concluíssem o ensino fundamental tivessem domínio das habilidades básicas de alfabetismo. Outro trabalho evidenciou que nem sempre o grau de escolaridade garante o nível de habilidade de alfabetismo esperado(22).

No Brasil, quanto ao Indicador de Analfabetismo Funcional (INAF)(22), este classificou a população brasileira em duas categorias: Analfabetos Funcionais e os Alfabetizados Funcionalmente. Como Analfabetos Funcionais foram agrupados os analfabetos absolutos e rudimentares; e aqueles com nível básico e pleno de alfabetização, como Alfabetizados Funcionalmente. Isso significa dizer que a classificação no nível básico ao sujeito a capacidade de ler e compreender textos de média extensão; localizar informações, mesmo que seja necessário realizar pequenas inferências; ler números na casa dos milhões; resolver problemas envolvendo uma sequência simples de operações e ter noção de proporcionalidade. Porém, essas pessoas apresentam limitações quando têm de resolver operações envolvendo maior número de elementos, etapas ou relações.

No que concerne aos que possuem nível pleno de alfabetização, segundo o INAF (22), são aqueles com habilidades para compreensão/interpretação de situações usuais, porque conseguem ler textos mais longos; analisar/relacionar as partes dos textos; comparar e avaliar as informações; distinguir fatos de opiniões; realizar inferências/sínteses; resolver problemas de matemática que exigem maior planejamento/controle; compreender percentuais/proporções/cálculo de área; interpretar tabelas de dupla entrada, mapas e gráficos(22).

Na presente investigação, os idosos que poderiam ser classificados na categoria de Alfabetizados Funcionalmente foram aqueles que apresentaram letramento adequado e que referiram ter hábito de leitura, mas esses representaram uma proporção menor em relação àqueles classificados com letramento inadequado (p = 0,01).

Sobre as condições de saúde autorreferidas pelos idosos, todos os selecionados deveriam estar em controle para o DM2. Esse agravo, segundo a literatura, é de natureza crônica multissistêmica e traz como uma das principais implicações várias alterações micro e macrovasculares, responsáveis pelas altas taxas de morbidade e mortalidade(23). Nesse aspecto, tanto as complicações micro como as macrovasculares associadas com DM2 são reduzidas significativamente através do controle glicêmico vigilante, lipídios e controle da Hipertensão Arterial (HA) (24). Sobre a habilidade para realizar esse controle, destaca-se que o baixo LFS pode dificultar esse nível de compreensão e ser um dos fatores complicadores que pode interferir no controle da glicemia e maximizar as repercussões da progressão da doença.

Além disso, além do diabetes, os participantes do estudo também referiram outras morbidades, o que os deixa ainda mais vulneráveis a outras complicações orgânicas. Tendo-se em conta essa variável, observou-se que mais de 64% deles apresentaram, juntamente com DM2, a hipertensão arterial (HA). Este agravo, tal qual o DM2, é uma doença altamente prevalente entre idosos e determinante de morbimortalidade elevada nessa população(25); no Brasil, a prevalência estimada é de cerca de 65%, podendo chegar aos 80% entre as mulheres idosas. Assim, rastrear também a HA entre os indivíduos de uma população, segundo alguns pesquisadores, tem entre outros objetivos o de estratificar o risco da doença cardiovascular global, além das lesões em outros órgãos-alvo, acometendo, por exemplo, a função renal, que pode também estar comprometida quando associada com a evolução da doença diabética(26).

O baixo LFS também mostrou-se associado com algumas complicações clínicas presentes pela doença diabética em uma parcela dos idosos. Sobre esse aspecto, observou-se em cerca de 38,1% dos participantes (p = 0,01), e, entre essas complicações, a mais prevalente foi aquela relacionada com a função visual.

Sobre esse âmbito, em estudo com idosos norte-americanos, relacionando as variáveis "Inadequado, LFS" e "diabetes", houve uma associação estatística com a retinopatia diabética. Além disso, foi avaliado também com o controle da glicemia, estando intimamente implicado com as alterações microvasculares(27).

Muito embora, no estudo aqui apresentado, não se tenha especificado qual o problema visual, essa correspondência poderá servir de alerta aos serviços de saúde como saúde pública, pois essa complicação é muito usual na evolução da doença e poderá impactar sobremaneira na capacidade do idoso de ler corretamente o nome dos medicamentos, horários e outras recomendações sobre o controle de sua saúde, sobretudo o controle da glicemia.

A literatura ainda chama a atenção para queixas de borramento visual, o que na população idosa é subvalorizado, ou seja, é considerado como uma condição natural entre as alterações visuais comuns no envelhecimento. Mas esse sintoma clínico, associado com as alterações do DM2, contribui para o declínio funcional, aumentando o risco de quedas(23).

Outro fator complicador da doença encontrado neste estudo foi a presença da doença renal em 21,4% dos participantes, estando associado com o baixo LFS (p = 0,01). Esse resultado também chama a atenção, pois, quando o idoso tem dificuldade para leitura e compreensão para o seu autocuidado em relação ao controle da glicemia, existe a possibilidade de ocorrerem manifestações clínicas importantes, porque, ao aumentarem muito os níveis plasmáticos de glicose, poderá haver desidratação, poliúria, polidipsia e perda de peso(23).

Nesse contexto ainda, vale a pena salientar as demais complicações que foram relatadas no estudo pelos participantes. Muito embora tenham sido encontradas em menor proporção, merecem ser mencionadas devido ao grande impacto que podem causar nas atividades cotidianas do idoso: a sensibilidade plantar; amputações de membros que se apresentaram isoladas ou associadas, mas que estão intimamente relacionadas com as alterações vasculares no curso da doença e podem evoluir para o aneurisma aórtico, isquemia aguda dos membros ou gangrena (23). Além disso, os participantes que informaram apresentar essas complicações tiveram baixo desempenho no teste de LFS.

Globalmente, o desempenho no teste de LFS aplicado neste estudo foi "Inadequado" ou "Marginal" e, se considerarmos a adição entre esses dois escores, tem-se que 84,0% da amostra que participou do estudo teve dificuldade em compreender uma situação em saúde escrita. Esse fato pode predizer um impacto considerável no autogoverno não somente da saúde, mas em outras situações da vida dessas pessoas. Em estudo que avaliou 312 pessoas na cidade de São Paulo, sobre LFS, os autores observaram que, entre os idosos, estes atingiram uma taxa de baixo LFS que chegou a 51,6%(28).

Por outro lado, neste estudo, nas questões que envolveram conhecimento e habilidades matemáticas, como cálculo de horário de medicações, taxa de glicemia, cerca de 52,6% dos idosos conseguiram acertar todas as quatro perguntas. Esse resultado talvez seja explicado pelo fato de que o entrevistador faz a pergunta ao idoso sobre o que consta no cartão, e isso talvez ajude a melhorar seu nível de compreensão. Ainda sobre essas habilidades e controle da doença diabética, estudo com (n = 383) diabéticos (DM2) demonstrou que um pior controle da glicemia estava relacionado com os baixos níveis da matemática ou numeramento entre os participantes(29). Mas, mesmo assim, fica visível pelos resultados deste estudo que a compreensão textual se mostrou mais comprometida segundo o teste que foi aplicado, sugerindo que a forma como as informações escritas são entregues aos usuários no serviço de Saúde podem não ser bem compreendidas por eles, ou estarem escritas de uma maneira que exige escolaridade mais alta, ou também podem conter vocábulos que dificultem o entendimento.

Nesse âmbito, alguns estudos relatam que os profissionais de saúde devem ficar alertas em identificar o LFS em usuários que apresentem comportamentos inadequados no cotidiano da assistência quando: não preencherem os formulários corretamente; faltarem às consultas com frequência; não forem aderentes ao tratamento; não realizarem os exames quando solicitados ou quando se pede para levar as informações escritas para serem lidas em casa; apresentarem confusão com nome e horários de medicamentos, podendo estar essas situações associadas à dificuldade de compreensão das informações pelo baixo LFS e essa condição não se identificar somente pela autodeclaração. Além disso, na população que apresenta maiores chances de ter baixo LFS, destacam-se os idosos, aqueles que recebem baixos salários, desempregados, pessoas com baixa escolaridade, déficit cognitivo, auditivo e visual, grupos étnicos minoritários e imigrantes(29-30).

Em estudo brasileiro(10,12)sobre o LFS, os pesquisadores recomendam sua avaliação na atenção básica de saúde e a possibilidade de sua inclusão na agenda das políticas públicas, para fortalecer as ações de promoção da saúde, similarmente ao que ocorre em países desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Austrália, entre outros.

Ainda que tenham sido tomados todos os cuidados no desenvolvimento metodológico do estudo, ainda encontraram-se limitações quanto a generalização dos resultados por tratar-se de um estudo transversal. Além disso, os possíveis vieses de confundimentos - como a acuidade visual, auditiva, motora e cognitiva, algumas limitações - ainda precisam ser consideradas nessa avaliação e podem ter concorrido para o alcance deste resultado, entre eles o próprio teste aplicado no estudo não ser específico para a população idosa.

CONCLUSÃO O baixo LFS entre os idosos avaliados neste estudo foi inadequado e se manteve associado estatisticamente com o nível de escolaridade. Segundo os indicadores nacionais de alfabetização, esta amostra foi considerada analfabeta funcional, e este pode ter sido um dos principais fatores condicionantes da habilidade de ler e compreender as informações em saúde, tanto textuais como numéricas.

Infere-se, também, que atitudes preventivas por parte dos integrantes deste estudo, como revisão anual de sua função visual, poderiam contribuir para melhorar sua condição de leitura, entendimento das informações em saúde escritas, e, dessa forma, oportunizar aos idosos mais independência nas atividades da vida diária. Por outro lado, sobre esse aspecto, é importante ressaltar que nem sempre existe a garantia de acesso a esses especialistas na rede da atenção básica, e isso pode servir como uma barreira para que esses idosos consigam melhorar sua funcionalidade visual e, consequentemente, aprimorem a tomada de decisões sobre sua saúde.

Sobre os modos de avaliação do LFS em idosos, os estudos encontrados na literatura brasileira não apresentam um consenso, talvez devido à insuficiência de produção científica na área. Entretanto, o desafio que se apresenta a partir deste estudo diz respeito às estratégias voltadas ao aumento do LFS dessa população, por causa da tendência demográfica no Brasil e do impacto que o baixo LFS pode causar negativamente sobre o autocuidado e a autogestão da saúde.

Como citar este artigo: Santos MIPO, Portella MR. Conditions of functional health literacy of an elderly diabetics group. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016;69(1):144-52.


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