Reconhecimento e construção da competência da pessoa com deficiência na
organização em debate
1. Introdução
Progressivamente, a exclusão e a segregação de pessoas com deficiência (PcDs)
cederam espaço à ideia de integração e, atualmente, à de inclusão social. Nesse
novo cenário, a capacidade laborativa desse grupo começa a ser considerada. O
enfoque caminha do modelo médico, em que a deficiência é considerada uma doença
e seu portador deve ser cuidado como um dependente, para o modelo social
(CARVALHO-FREITAS et al., 2005), situação em que se prioriza o olhar sobre a
contribuição que a pessoa pode dar à sociedade, a qual será, por sua vez,
corresponsável por seu desenvolvimento.
Contudo, o direito a uma vida tão plena quanto possível para esses indivíduos
ainda depende da implementação de políticas afirmativas que busquem assegurar
os direitos fundamentais dessas pessoas, dentre eles o direito ao trabalho. A
implementação de tais políticas vem gerando alguns movimentos positivos, seja
no aumento do número de empregos formais, seja pelo fato de levar a sociedade a
debater e posicionar-se sobre o tema. As discussões dividem opiniões: aqueles
que são favoráveis argumentam sobre oportunidades únicas para que as pessoas
com deficiência demonstrem sua real competência; os que são contrários falam de
discriminação reversa e de contratação de profissionais menos qualificados.
Tal debate é acirrado pelo grande número de pessoas que possui alguma
deficiência e por suas dificuldades de inclusão nas organizações, a despeito do
aumento do número de ações afirmativas que amparam esse grupo. No Brasil,
segundo dados do Censo Demográfico realizado em 2000 pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), existem 24,5 milhões de brasileiros com
algum tipo de deficiência. Isso representa 14,5% da população brasileira (NERI
et al., 2003). A maioria dessas pessoas, contudo, permanece como um contingente
pouco aproveitado, cenário que vem sendo justificado, sobretudo, pela falta de
escolaridade e qualificação profissional das PcDs.
O acesso à educação representa, portanto, uma das principais iniciativas para a
inclusão e um grande desafio a ser superado. Desafio porque, no Brasil, as PcDs
sempre estiveram em posição de desvantagem em relação ao restante da população,
já que as oportunidades educacionais ainda estão relacionadas à igualdade
social e à renda. Adicionalmente, existem outras barreiras, como dificuldades
de acessibilidade, severidade da deficiência, protecionismo da família, além
dos aspectos de preconceito, discriminação e estigma, que fazem parte do
cotidiano dessas pessoas e podem influenciar o interesse e a disposição para a
escolarização (SASSAKI, 2006).
Considerando o déficit no nível de educação formal, as principais demandas hoje
estão relacionadas a desenvolver capacidades laborativas básicas da PcD e a
proporcionar vivência e experiência profissionais. No contexto dessas
exigências mínimas, torna-se relevante pensar o desenvolvimento da PcD a partir
da noção de competências que, sob a ótica de Le Boterf (2003), trata da
combinação e mobilização dos recursos existentes para a ação e o alcance dos
resultados esperados pela organização. Nesse debate, encerra-se a principal
contribuição que se pretende dar neste estudo.
O movimento da inclusão social indica que a responsabilidade por esse
desenvolvimento da PcD deve ser assumida por toda a sociedade. Figuram entre os
principais atores as próprias pessoas com deficiência, empresas, governos,
instituições de formação profissional, associações de classe, universidades,
sindicatos e família. A mobilização da sociedade representa o engajamento
desses atores, por meio da demonstração de uma postura ética e de um
compromisso social que implique o sucesso da PcD no mercado de trabalho, o que
significa não só que se garanta a contratação desse profissional, mas também as
condições para seu desenvolvimento profissional e ascensão na carreira. O
desenvolvimento das pessoas com deficiência depende da ação conjunta de
múltiplos atores, daí a importância de considerá-los nos estudos que analisam o
tema.
Diante desse grande desafio, é preciso mudar a forma com que comumente se olha
para a PcD no contexto das relações de trabalho, indo além da caridade ou do
cumprimento das cotas. O ponto de partida é a oferta de emprego; entretanto, as
maiores contribuições para seu crescimento surgem à medida que se concretiza o
círculo virtuoso no trabalho (GIL, 2002), representado pelas possibilidades de
genuíno desenvolvimento pessoal e profissional dessa parcela da população.
Trata-se de um novo olhar sobre a deficiência, que destaca o valor da PcD para
a organização.
Isso posto, neste trabalho tem-se a intenção de analisar experiências de
desenvolvimento de competências e reconhecimento profissional da pessoa com
deficiência já inserida no contexto organizacional, considerando os principais
atores envolvidos nesse processo. Assim, na problemática da pesquisa
questionam-se quais experiências podem ser significativas ou não para a
construção de competências e reconhecimento profissional das pessoas com
deficiência já inseridas no contexto organizacional e quem são os principais
atores que contribuem para esse processo.
O artigo está dividido em cinco seções, além desta introdução: as competências
da PcD e as iniciativas de desenvolvimento profissional; a deficiência, a
inclusão e o desenvolvimento da competência das PcDs; a metodologia de
pesquisa; a análise e a interpretação dos dados; as considerações finais.
2. Competências da PcD e iniciativas de desenvolvimento profissional
Analisar as PcDs nas organizações sob a lente da competência tem por intenção
colocar em debate se os programas formais de desenvolvimento, ou mesmo as
experiências informais a que esses novos atores corporativos estão sendo
expostos no universo empresarial, vêm potencializando a construção de autonomia
e a mobilização de saberes que os habilitem a assumir tarefas cada mais
complexas, a participar em uma rede de atores na empresa, enfim, se esses
programas têm dado força à ação que agregue valor social para as PcDs e valor
econômico para a organização (ZARIFIAN, 2001; LE BOTERF, 2003; FLEURY e FLEURY,
2004). Ao mesmo tempo, significa posicionar o debate da competência em sua
acepção mais política, que entende que as desenvolver, sob a ótica da
corporação, é decidir quem será atendido, como se dará esse processo e quão
ricas e potencializadoras serão essas experiências.
Em relação aos aspectos estruturais que a literatura enfatiza como fundamentais
para a construção da capacidade humana no trabalho, Le Boterf (2003) enfatiza a
disposição de agir de modo pertinente em relação a uma situação específica e a
relevância dos saberes em sua concepção de competências. Em decorrência do
aumento da complexidade das situações de trabalho, espera-se que o profissional
saiba administrar situações como panes, contingências, falhas e mudanças. A
competência pode ser demonstrada a partir da articulação de três eixos:
biografia e socialização do indivíduo; formação profissional (situações da
formação); contexto profissional (experiências e situações profissionais). O
profissionalismo seria representado pela intersecção desses eixos, como
resultado da articulação dos três domínios distintos. Por não estar restrito à
esfera profissional, o modelo de mobilização profissional introduzido pelo
autor representa uma preocupação com a formação integral do indivíduo. Os eixos
fazem parte do repertório de recursos do indivíduo, mas eles, por si sós, não
constituem a competência: "A competência profissional não reside nos
recursos a mobilizar, mas na própria mobilização desses recursos" (LE
BOTERF, 2003, p.50). Trata-se, portanto, de olhar para a experiência em análise
neste estudo a partir dessas considerações.
Zarifian (2001), por sua vez, propõe uma definição de competências fundamentada
na mudança de comportamento social dos indivíduos em relação ao trabalho e da
dinâmica da organização do trabalho, definindo competência a partir de três
dimensões complementares.
* "A competência é o tomar iniciativa, o assumir responsabilidade do
indivíduo diante de situações profissionais com as quais se depara"
(LE BOTERF, 2003, p.68).
* "A competência é um entendimento prático de situações que se apoia
em conhecimentos adquiridos e os transforma à medida que aumenta a
diversidade das situações" (LE BOTERF, 2003, p.72).
* "A competência é a faculdade de mobilizar redes de atores em torno
das mesmas situações, é a faculdade de fazer com que esses atores
compartilhem as implicações de suas ações, é fazê-los assumir áreas de
corresponsabilidade" (LE BOTERF, 2003, p.74).
Ao introduzir esses elementos em sua definição de competências, Zarifian (2001)
faz alusão à importância da autonomia, da formação de redes e de um ambiente de
trabalho que permita que o profissional assuma responsabilidades por problemas
mais complexos e inéditos. Outro ponto importante que precisa ser evidenciado é
a questão da automobilização das competências: não se pode obrigar um indivíduo
a ser competente; a organização pode solicitar a competência e criar condições
favoráveis para sua manifestação (recursos do meio); entretanto, a manifestação
das competências sempre dependerá da motivação do indivíduo em acioná-las. Aqui
se enfatiza a necessidade de olhar tanto para o ambiente profissional no qual
os indivíduos - no caso, as PcDs - estão inseridos, que pode favorecer, ou não,
a emergência da competência, como a predisposição interna desses sujeitos em
situação de trabalho.
Fleury e Fleury (2004) abordam a questão da competência a partir da noção de
valor agregado, indicando que a articulação entre as competências individuais e
a estratégia do negócio devem gerar valor social para o indivíduo e valor
econômico para a organização, isto é, ambos têm de ser beneficiados no
processo. Apoiados em Le Boterf (2003), Fleury e Fleury (2004, p.30) indicam
que a geração de valor estaria relacionada à mobilização dos múltiplos saberes,
como saber agir, mobilizar, comunicar, aprender, comprometer-se, assumir
responsabilidades e ter visão estratégica. Propõem, então, a seguinte definição
para competência:
* "Um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar,
integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agreguem
valor econômico à organização e valor social ao indivíduo" (FLEURY e
FLEURY, 2004, p.30).
Cheetham e Chivers (1996) e Le Deist e Winterton (2005) propõem uma abordagem
de competências cujo objetivo é integrar diferentes elementos em um modelo de
competências holístico, influenciado pelo contexto e pelo ambiente de trabalho.
Apresentam ainda elementos importantes que até então não estavam sendo
discutidos nos modelos de competência, como ética, valores, responsabilidade
social e cidadania. Ampliam, assim, os aspectos comumente observados nos
estudos na área, motivo pelo qual este modelo serviu de base para o presente
estudo, já que se está tratando do desenvolvimento da competência das PcDs.
Mais especificamente, o modelo de Cheetham e Chivers (1996) inclui quatro
competências-chave inter-relacionadas: conhecimento e competências cognitivas;
competência funcional; competência comportamental e pessoal; competências
éticas e valores. Adicionalmente, fazem parte do modelo as competências
profissionais e algumas competências-chave mais genéricas e que possuem a
capacidade de gerar outras competências, as metacompetências. Por fim, os
autores integram em sua proposta os elementos personalidade e motivação. O
modelo holístico de competência profissional apresentado pelos autores surge a
partir das limitações das abordagens que consideram somente as competências da
pessoa trabalhador - ou da função - trabalho.
Do ponto de vista da discussão sobre competências como movimento político a
serviço de um determinado grupo de interesses, Burgoyne (1993) questiona a que
agendas ele se presta, se é capaz de reformular a ordem social e política
existente, ou simplesmente mantém os padrões estabelecidos sem os questionar. O
objetivo final de um programa de competências pode reduzir-se à padronização e
ao controle, no caso da presente pesquisa, à manutenção das PcDs em posições
que não desafiem o status quo. Nesse mesmo sentido, Graham e Tarbell (2006)
analisam o conteúdo dos programas de competências questionando se o ponto de
vista dos stakeholders, especialmente de profissionais que não estão em
posições de destaque na hierarquia, está sendo contemplado.
O ponto para o qual tanto Burgoyne (1993) como Graham e Tarbell (2006) estão
chamando a atenção é o seguinte: o que ou quem está presente (ou não) nos
modelos de competência e programas de desenvolvimento empresariais reflete
muito mais do que uma decisão técnica. Trata-se também de um posicionamento
político e, portanto, de poder. No âmbito do presente estudo, isso significa
olhar para as experiências das PcDs indo além de uma perspectiva meramente
instrumental, que se limita, por exemplo, a uma descrição de saberes. Cabe
também observar as tensões que favorecem ou impedem o desenvolvimento do
potencial da PcD e seu crescimento na hierarquia da organização. É com esse
olhar crítico que a experiência em questão também tem de ser observada.
3. Deficiência, inclusão e desenvolvimento da competência das PcDs
Historicamente, a deficiência foi definida a partir do modelo médico que
enfatiza as características biológicas do indivíduo e sua incapacidade de
exercer um conjunto de funções e tarefas. Nesse contexto, a escolha daqueles
que podem participar de maneira plena da sociedade é tomada a partir desses
atributos biológicos. Abordagens mais atuais conceituam deficiência como uma
construção social; isso significa que o conceito de deficiência e o lugar do
deficiente na sociedade refletem a forma como determinado grupo social
interpreta o termo (WOODHAMS e DANIELI, 2000). Embora o modelo social seja hoje
amplamente aceito, predominam ainda as definições e os comportamentos que
enfatizam características biológicas dos indivíduos, típicas do modelo médico.
Conceber a deficiência somente como uma característica biológica é
desconsiderar os determinantes sociais que dificultam a inclusão. De acordo com
Omote (1994, p.67),
* "a deficiência não pode ser vista como uma qualidade presente no
organismo da pessoa ou em seu comportamento. Em vez de circunscrever a
deficiência aos limites corporais das pessoas com deficiência, é
necessário incluir as reações de outras pessoas como parte integrante e
crucial do fenômeno, pois são essas reações que, em última instância,
definem alguém como deficiente ou não deficiente. As reações apresentadas
por pessoas comuns em face das deficientes ou das deficiências não são
determinadas única nem necessariamente por características objetivamente
presentes num dado quadro de deficiência, mas dependem bastante da
interpretação, fundamentada em crenças científicas ou não, que se faz
desse quadro".
Omote (1994) alerta para o fato de que uma teoria sobre a deficiência deve ir
além dos aspectos funcionais, buscando entender como as pessoas em geral
trabalham com essas diferenças, já que muitas vezes é o próprio grupo social
que trata como desvantagens algumas diferenças apresentadas por seus
integrantes (SAETA, 2006). Daí a importância de estudar a deficiência a partir
da construção social, considerando as condições sociais que surgem à medida que
esses indivíduos ocupam seu lugar na sociedade, bem como as relações entre as
PcDs e outros membros do grupo social, que os reconhecem e os tratam como
deficientes.
Em um modelo social, entende-se que os problemas daqueles que possuem
necessidades específicas não seriam somente responsabilidade deles próprios,
mas de toda a sociedade. A sociedade, como causadora de desvantagens, é
convidada a eliminar as barreiras que prejudicam o desenvolvimento pessoal,
social, educacional e profissional desses indivíduos (SASSAKI, 2006).
Na percepção de Woodhams e Danieli (2000), o modelo social encara a deficiência
como um construto social que existe em ambientes nos quais as diferenças são
desvalorizadas. O parâmetro de comparação é a relação entre as pessoas com e
sem deficiência, que deve ser equilibrada. Enquanto no modelo médico somente as
experiências negativas da deficiência eram vislumbradas, o modelo social
procura destacar os aspectos positivos na vida de uma pessoa com deficiência.
Adicionalmente, este modelo evidencia a importância das relações sociais,
aspecto que Saeta (2006, p.65) destaca ao apresentar o conceito de construção
social da deficiência:
* "Conjunto de expectativas dirigidas aos grupos e aos indivíduos com
deficiência, expectativas estas que funcionarão como determinantes de
inter-relações estabelecidas e que, com todos os elementos, constituem o
grupo social".
Em outras palavras, em um modelo social, a ênfase está nas interações entre os
diferentes grupos.
A inclusão, um dos elementos do modelo social da deficiência, pode ser descrita
de várias maneiras. Mor Barak (2005, p.149), por exemplo, refere-se à inclusão
como o senso de pertencimento do indivíduo ao grupo:
* "O conceito de inclusão-exclusão no ambiente de trabalho refere-se
ao senso individual de fazer parte do sistema organizacional tanto nos
processos formais, como acesso a informações e canais de tomada de
decisão, quanto aos processos informais, como a parada para o cafezinho e
encontros no almoço em que informações e decisões acontecem
informalmente".
Para Mor Barak (2005), a inclusão reflete a contribuição completa e efetiva da
pessoa com a organização, tendo acesso a todos os canais de informação, assim
como acontece com os indivíduos que pertencem aos grupos majoritários. Esses
conceitos evidenciam a preocupação com práticas existentes em ambientes não
inclusivos, como a não participação de membros dos grupos minoritários em
processos e eventos decisivos para a organização, tais como oportunidades de
trabalho e ascensão de carreira, redes de informação, investimentos em recursos
humanos e tomada de decisão.
Muitos pesquisadores referem-se à inclusão como o processo mais indicado para
atender à necessidade de desenvolvimento das PcDs (GIL, 2002; CARVALHO-FREITAS,
MARQUES e SCHERER,2004; SASSAKI, 2006) e para a construção de uma sociedade
para todos (FOREST e PEARPOINT, 1997; SASSAKI, 2006). Todavia, há que se tomar
cuidado para que esse discurso não se limite a uma perspectiva reducionista, em
que basta ensinar às PcDs habilidades e comportamentos produtivo-adaptativos,
por um lado, e garantir o acesso a serviços e recursos comunitários, por outro,
para que o processo automaticamente ocorra.
Considerando que o discurso da deficiência e inclusão pode enfatizar aspectos
diversos, a tônica deste estudo está na deficiência como construção social e na
inclusão a partir de interações sociais e possibilidades de desenvolvimento dos
indivíduos na corporação. Isso significa que a inclusão plena é caracterizada
por um conjunto de ações e processos que precisam ser legitimados e aceitos por
toda a organização. Nesse sentido, Gil (2002) defende a construção do que chama
de "círculo virtuoso da inclusão das pessoas com deficiência", que
engloba a contratação de mais PcDs, segundo seu potencial de trabalho e a
integração delas com os demais empregados e outros stakeholders da empresa, bem
como o investimento em sua formação e qualificação.
Essa nova abordagem traria uma série de consequências positivas, dentre as
quais Gil (2002) destaca os benefícios específicos para as pessoas com
deficiência, como melhor formação e maior empregabilidade e remuneração, e os
benefícios para as empresas, como ganhos comerciais, melhoria na imagem e
capacidade para o desenvolvimento de novos produtos e processos. Trata-se de um
círculo virtuoso porque todos ganham e todos trabalham para aumentar esses
benefícios. Contudo, até que ponto podem ser observadas experiências
empresariais que caminhem nessa direção?
4. Metodologia de pesquisa
A estratégia metodológica deste trabalho foi o estudo de caso qualitativo, já
que se procurou analisar um fenômeno em profundidade, recorrendo a múltiplas
fontes de evidências (entrevistas, observação participante e análise
documental), construídas no contato direto e intensivo dos pesquisadores no
ambiente em estudo. É importante pontuar o cuidado e considerar as críticas
usuais ao uso do estudo de caso (GODOY, 2006), especialmente no que se refere a
tomá-lo como mera ilustração, ou reduzi-lo a si mesmo, o que não permitiria
traçar implicações teóricas de maior alcance.
O objeto de estudo neste trabalho são as experiências de desenvolvimento de
competência e reconhecimento profissional de um grupo de pessoas com
deficiência já inserido em uma indústria farmacêutica, aqui identificada como
Farma, considerando-se os atores envolvidos nesse processo (gestor, área de
recursos humanos, sindicato e organização não governamental - ONG). A Farma é
uma empresa multinacional de grande porte, com sede no estado de São Paulo, que
desenvolveu um programa para inclusão e desenvolvimento pessoal e profissional
desses colaboradores. Esse programa possui um escopo bastante amplo, pois
inclui desde o processo de escolha desses profissionais, avaliação de
desempenho, elaboração de planos de desenvolvimento individual e atividades
contínuas de qualificação, até reuniões individuais e periódicas de
acompanhamento. Os critérios de seleção da organização foram: a maturidade do
programa de desenvolvimento de competências das PcDs; o estreito relacionamento
que a organização mantém com atores externos (ONG, sindicato) para inclusão de
PcDs; o fato de a indústria farmacêutica ser uma das que mais vêm cumprindo as
cotas exigidas por lei; o amplo acesso dos pesquisadores ao campo de pesquisa.
Embora a pesquisa tenha sido conduzida em uma única organização, foram
entrevistadas PcDs de diferentes áreas da Farma e também atores externos à
empresa que colaboram com o processo de desenvolvimento de competências dos
profissionais com deficiência que nela atuam. No total, foram realizadas 17
entrevistas semiestruturadas, com roteiro aberto, elaborado a partir do
referencial teórico. A seguir, apresenta-se uma breve descrição dos atores e os
critérios de seleção dos entrevistados.
* Pessoas com deficiência- foram entrevistadas dez PcDs que atuam na
organização objeto de estudo. O critério de seleção dos sujeitos foi a
participação nos cursos de qualificação promovidos pela empresa a partir
de outubro de 2008. A idade das PcDs entrevistadas variava entre 18 e 39
anos, com média de 27,8 anos. Em relação à deficiência, dos dez
entrevistados, oito possuem deficiências congênitas e, dois, deficiências
adquiridas ao longo da vida. Predomina a deficiência física, seguida da
visual e auditiva. Todas as PcDs que participaram do estudo cursaram a
educação fundamental regular e concluíram o ensino médio na rede pública
de ensino.
* Recursos humanos (RH) - foi entrevistada a gerente responsável pelo
programa de inclusão de pessoas com deficiência. Atuando na área de
Recursos Humanos, a psicóloga é a principal responsável no RH por
recrutamento, seleção, treinamento e acompanhamento dos profissionais com
deficiência que atuam na Farma.
* Gestores - foram selecionados para entrevista gestores que atuam em
diferentes áreas da empresa e que estavam há pelo menos um ano
gerenciando uma das PcDs que participou do estudo. Trata-se de um quadro
de gestores relativamente jovem, com idade entre 29 e 35 anos. Enquanto a
área de Recursos Humanos trabalha com a definição e a implantação dos
processos e ferramentas de desenvolvimento, os gestores avaliam o reflexo
das experiências de desenvolvimento para o dia a dia dos profissionais.
* Associação parceira - entrevistou-se o representante da Associação para
Valorização e Promoção de Excepcionais (Avape), principal entidade
parceira da Farma na implantação de programas de qualificação para as
PcDs inseridas na organização. Essa profissional, formada em Psicologia,
com especialização em desenvolvimento organizacional, atua na Associação
há 14 anos, sendo uma das responsáveis pelos programas de qualificação da
Associação.
* Sindicato - foi um ator considerado em virtude dos inúmeros trabalhos
desenvolvidos em parceria com indústrias do segmento farmacêutico.
Entrevistou-se o responsável pelo programa de inclusão no sindicado da
indústria farmacêutica, Sindusfarma. Esse profissional é a principal
interface da indústria com a Superintendência Regional do Trabalho e
Emprego no Estado de São Paulo, atuando em etapas importantes do
processo, como negociações estratégicas e controle do preenchimento das
cotas na indústria.
Em relação à estratégia de observação participante, acompanhou-se a dinâmica
das atividades de desenvolvimento destinadas às PcDs. Na terceira e última
fonte de investigação, a análise documental, consideraram-se as avaliações dos
treinamentos oferecidos pela Avape realizadas ao fim de cada módulo e as
apostilas de todos os treinamentos ministrados pela Associação. Também foram
analisados os documentos produzidos e publicados pelo Sindicato que detalham
aspectos importantes sobre a inclusão de PcDs na indústria farmacêutica e o
acordo que originou o programa de inclusão da indústria.
Considerando a quantidade de fontes utilizadas neste estudo, a natureza verbal
de grande parte do material coletado e o volume de textos obtidos durante o
projeto para a análise dos dados, recorreu-se à proposta de interpretação de
dados qualitativos de Flores (1994). Para tanto, estabeleceu-se um conjunto de
metacategorias, categorias e subcategorias, que foram analisadas,
primeiramente, de maneira isolada, para, em seguida, serem cruzadas, tendo em
vista que cinco diferentes atores compõem o estudo (PcD, Gestor, RH, Avape e
Sindicato). As metacategorias foram agrupadas de acordo com a similaridade dos
temas, conforme se observa na figura_1.
5. Análise e interpretação dos dados
A seção de análise e interpretação dos dados foi didaticamente estruturada de
acordo com a figura_1, para facilitar a compreensão dos achados de pesquisa.
Assim, parte-se da trajetória profissional das PcDs e finaliza-se com a
contribuição dos atores externos.
5.1. Trajetória de formação das PcDs antes da Farma
No que tange à trajetória de formação das PcDs, as narrativas indicam que os
entrevistados possuem percursos de vida sofridos, repletos de barreiras e
dificuldades pessoais e profissionais. No grupo de entrevistados, todos são
oriundos de classe social menos favorecida, dado que confirma a informação de
Neri et al. (2003) sobre a menor renda média das PcDs em comparação às das
pessoas que não possuem deficiência. Tal fato influenciou negativamente o
processo de desenvolvimento desses profissionais, pois muitos precisaram
lançar-se no mercado de trabalho de forma prematura para contribuir com a renda
familiar. Em consequência, menos tempo do que o necessário foi dedicado aos
estudos, além do fato de que as PcDs dispunham de pouco ou nenhum recurso para
investimento em qualificação. Uma das soluções encontradas por aqueles
profissionais com interesse em seu autodesenvolvimento foi realizar cursos de
curta duração oferecidos por organizações não governamentais. Os cursos
normalmente são gratuitos ou têm custo simbólico, para que as limitações
financeiras não sejam empecilho para sua realização.
Com algumas desistências ao longo do percurso, todas as PcDs que participaram
da pesquisa aqui relatada concluíram o ensino médio em escolas públicas e
regulares de ensino. Esse feito é motivo de orgulho para a maioria dos
entrevistados, uma vez que lhes permitiu a participação em atividades regulares
de ensino, sem lançar mão de estigma de invalidez ou isolamento que permeia o
tratamento da deficiência ao longo da história, embora, nos relatos, se pôde
constatar que não houve adequação por parte das escolas quanto à forma de
atendimento em decorrência do tipo da deficiência, o que prejudicou, muitas
vezes, o aproveitamento escolar, conforme indica o relato das PcDs abaixo.
* "Lá [na escola pública] eu não tinha suporte nenhum, todas as
matérias eram passadas na lousa e eu tinha dificuldades de escrever,
perdia matéria" (PcD9 - deficiente física - paralisia cerebral).
* "Estudei em uma escola normal, fiz, concluí o ensino médio em escola
normal. Tanto é que eu repeti várias vezes. Muitas vezes foi porque eu
não acompanhava a aula. Eu tenho dificuldades para ver a uma certa
distância, um certo tamanho de fonte, o que está escrito ou ler livros,
essas coisas. E eu ia repetindo, às vezes eu repetia, às vezes eu ficava
de recuperação" (PcD2 - deficiente visual - baixa visão).
As experiências de trabalho anteriores à Farma também apresentam, de maneira
geral, baixo grau de complexidade. Muitos dos entrevistados trabalharam na
informalidade ou exerceram atividades operacionais em empresas, com pouca ou
nenhuma margem de escolha do tipo de trabalho exercido, como observado no
relato a seguir.
* "Sempre trabalhei em produção [...] mas era muito barulhento, eu
tive que sair. E aí eu vi que eu não queria mais trabalhar com
produção" (PcD5 - deficiente auditiva - bilateral parcial).
Mesmo as PcDs que tiveram a oportunidade de trabalhar em grandes organizações
não destacaram esses ambientes como locais que desenvolviam plenamente sua
capacidade de trabalho. Nesse sentido, nem sempre a vivência em uma grande
corporação significa que esse profissional, pelo simples fato de estar inserido
nesse contexto, terá oportunidade de desenvolver suas potencialidades. Ao
contrário, os relatos indicam que situações fora do contexto organizacional
foram as mais enriquecedoras nessa trajetória, a exemplo de experiências como
dar aulas ou atuar como voluntário em organizações não governamentais.
5.2. O significado do desenvolvimento profissional
Não existe consenso entre os entrevistados sobre o conceito de desenvolvimento
profissional. De certa forma, todos atrelam o tema à aquisição de algum tipo de
atributo, evolução profissional ou melhoria do desempenho. Mesmo assim, abordam
questões importantes que remetem ao conceito de desenvolvimento proposto por
Dutra (2001, p.46): "[...] a capacidade de assumir atribuições e
responsabilidades em níveis crescentes de complexidade". Cada ator
entrevistado apresenta elementos que considera significativos para que um
indivíduo demonstre tal evolução. As PcDs definem desenvolvimento como a
aquisição de atributos; já os gestores relacionam o termo à superação das
barreiras da deficiência. A representante do RH, por sua vez, entende que o
desenvolvimento é representado pela ascensão profissional da pessoa, enquanto o
sindicato atrela o desenvolvimento à capacitação profissional. Por fim, a
representante da Avape define o desenvolvimento como a capacidade de adquirir
habilidades e competências, independentemente de se possuir ou não algum tipo
de deficiência.
A compreensão sobre o significado de desenvolvimento é fundamental, já que
embute o movimento que se fará em direção à sua promoção. O contexto que
permeia a contratação de PcDs e a adoção de práticas de desenvolvimento é a
necessidade do cumprimento das exigências legais. As cotas passam a ser a porta
de entrada das pessoas com deficiência na organização, sem as quais
dificilmente existiriam tantas oportunidades profissionais.
5.3. Práticas formais de desenvolvimento da Farma
A obrigatoriedade imposta pelo governo quanto ao preenchimento de vagas para as
PcDs desencadeou, por outro lado, um problema estrutural de falta de
profissionais qualificados para ocupar os postos de trabalho. Como essas
pessoas foram excluídas durante muito tempo do sistema produtivo, não houve
ações institucionais coletivas para a capacitação des-
se grupo, tampouco condições sociais que motivassem a PcD para um projeto de
autodesenvolvimento. Os prejuízos não tar-
daram a surgir: as empresas começaram a fazer contratações desesperadas e
malfeitas pela insuficiência de profissionais que possuem competências para o
trabalho. Essa também foi a experiência da Farma que, ao contratar PcDs sem a
qua-
lificação mínima exigida pela empresa, optou por adotar algumas práticas de
desenvolvimento formais e informais pa-
ra esse público.
Entre as práticas formais, destaca-se o programa de aperfeiçoamento de cinco
módulos com cursos de curta duração, incluindo: desenvolvimento pessoal e
profissional; comunicação e expressão; informática básica; rotinas
administrativas; e atendimento ao cliente. Adicionalmente, existem reuniões de
acompanhamento com PcDs e gestores, promovidas pela área de Recursos Humanos a
cada três meses. Primeiramente, são realizadas conversas individuais com cada
gestor responsável pelo profissional com deficiência, para, depois, serem
feitas as reuniões com cada PcD, trabalho considerado importante pelos
gestores, de acordo com o relato:
* "Mas eu acho que o RH tem que atuar mesmo, porque às vezes eles têm
dificuldade, como qualquer profissional, às vezes, têm dificuldade de
conversar com a sua gestão, com o seu superior, e o RH é essa porta
aberta mesmo" (Gestor 4 - líder da PcD1).
Por último, as PcDs participam do processo regular de avaliação de competências
e desempenho promovido pela Farma. Esse processo faz parte dos pilares de
desenvolvimento de pessoas da organização e contempla o processo de avaliação
de competências, elaboração de um plano de desenvolvimento individual e
estabelecimento de metas individuais. O gestor comenta sobre a imparcialidade
nesse processo de avaliação:
* "Você tem que pensar em um todo, na pessoa como profissional,
verificar quais são as suas limitações profissionais, e não limitações
físicas ou qual for ela. Ela é importante, ela tem que ser levada em
conta, mas não é só isso. Uma pessoa [com deficiência] tem um objetivo
como qualquer outra pessoa tem" (Gestor 3 - líder da PcD10 -
deficiente físico - membros com deformidade congênita).
Ainda em relação às práticas, a experiência de trabalho na Farma despertou nas
PcDs sujeitos desta pesquisa o interesse pela continuidade dos estudos. Cinco
dos dez profissionais pesquisados iniciaram cursos de ensino superior após a
entrada na Farma, alguns deles com bolsas subsidiadas pela empresa. Nesse caso,
houve uma contribuição da empresa para o desenvolvimento desses profissionais,
uma vez que, tal qual afirma Saeta (2006, p.63):
* "É frequentando o curso na universidade que as pessoas com
deficiência, em sua maioria, começam a formular sua consciência de
cidadãos e a exercê-la".
O ponto de atenção é observar se a empresa terá condições de suprir as
expectativas de evolução profissional despertada nesses profissionais. Após a
conclusão do curso, as PcDs seguramente almejam uma ascensão profissional. Até
o momento, nenhuma delas avançou significativamente na hierarquia da empresa
depois de formadas.
O principal parâmetro utilizado pela empresa para definir grande parte das
práticas formais foi a deficiência. A empresa partiu do pressuposto de que
todas as PcDs contratadas necessitavam da qualificação básica, fato que não era
aplicável à totalidade dos profissionais, visto que alguns já haviam cursado o
ensino superior e/ou adquirido experiência de trabalho em grandes organizações.
PcDs com ensino superior completo foram obrigadas a cursar programas de
computação básica, já que o critério para participar do treinamento era a
deficiência e não a formação. A análise dos documentos de avaliação dos
treinamentos confirma esse comportamento. Os índices de satisfação com as
atividades realizadas foram positivos e as PcDs relatam ter adquirido uma série
de saberes teóricos, operacionais e do meio. Entretanto, os comentários gerais
acerca das atividades sugerem que haveria maior aproveitamento dos treinamentos
caso houvesse um nivelamento das turmas a partir da etapa de conhecimento e da
área de atuação de cada profissional:
* "O que é bom para o pessoal do marketing, talvez não seja bom para a
gente, entendeu?" (PcD10 - deficiente físico - membros com
deformidade congênita).
Adicionalmente, algumas PcDs indicaram nessas avaliações que o grupo não
deveria participar de atividades específicas para profissionais com deficiência
e, sim, dos treinamentos regulares dos quais participam os demais funcionários:
* "Às vezes parece que está sendo dado um tratamento muito
diferenciado para este público [PcDs], quando, na verdade, eles deveriam
estar cada vez mais inseridos na organização como qualquer outro
funcionário" (Gestor 2 - líder da PcD9 - deficiente física -
paralisia cerebral).
Quando se trata de treinamentos relativos à qualificação técnica ou à
preparação para o trabalho, é preciso escolher ações baseadas no estágio de
qualificação de cada pessoa, que pode ser adaptado de acordo com a função.
Nesse caso, os programas formais estavam a serviço da manutenção do status quo
da PcD, bem distante da busca por reconhecimento e da construção da competência
desses profissionais.
5.4. Experiências informais de aprendizagem e o papel do gestor nesse processo
Por um lado, as experiências informais foram repetidamente citadas como formas
efetivas para construção e desenvolvimento de competências, tanto por parte das
PcDs como da responsável pelo RH e dos gestores, o que já era de se esperar,
dado que a literatura sobre aprendizagem e competências, nos últimos anos,
enfatiza sumariamente o valor das ações não formais (BITENCOURT, 2004;
ANTONELLO, 2006). Por outro lado, a análise das experiências informais
vivenciadas pelas PcDs que fizeram parte deste estudo revela a dicotomia entre
avanços e retrocessos na construção e no desenvolvimento de competências desses
indivíduos a partir dessas práticas informais. Ao mesmo tempo em que são
oferecidas oportunidades diversificadas de aprendizado que acontecem em
diferentes esferas da organização e contam com o suporte, ainda que não
estruturado, do gestor, tais experiências por si não têm sido suficientes para
garantir o reconhecimento da competência, seja por uma questão da empresa, que
ainda não vê as PcDs como candidatas a posições de maior prestígio e
complexidade na organização, seja por falhas da própria PcD que, em algumas
situações, inclusive, demonstra pouca iniciativa para o autodesenvolvimento.
Dentre as vivências mais valorizadas pelas PcDs e pelos gestores, destacam-se:
* Aprendizagem na ação - apresentações em público; participação em comitês
(Cipa, grêmios recreativos, comitê de ergonomia, voluntariado);
participação em projetos específicos complementares à sua área
tradicional de atuação/função.
* Aprendizagem baseada no trabalho - assumir novas atividades; atender a
clientes e fornecedores; cobrir férias; contatar outros setores; utilizar
sistemas de tecnologia da informação.
* Aprendizagem com pessoas- relacionar-se com profissionais além daqueles
diretamente vinculados a sua função; observar outras pessoas trabalhando;
coaching.
* Aprendizagem com os erros - aprender com os próprios erros e receber
feedback.
* Aprendizagem fortuita - atuar em uma grande empresa e interagir
informalmente com colegas e superiores.
Embora tais vivências tenham sido consideradas importantes para o
desenvolvimento de competências no trabalho, os aprendizados apresentados não
vão muito além dos requisitos básicos solicitados aos profissionais nos
estágios iniciais de carreira: comunicar-se, agir segundo as regras sociais do
espaço organizacional, relacionamento interpessoal e, mais do que tudo,
compreender o universo corporativo:
* "Eu acho que o grande aprendizado que ele teve foi de entender este
universo da grande empresa, como funciona esta máquina, como as pessoas
trabalham aqui, como as coisas se relacionam para que nós possamos
entregar o nosso produto" (Gestor 1 - líder da PcD6 - deficiente
física - monoparesia).
Dentre os membros da organização, o gestor da PcD é a pessoa que mais a auxilia
naquilo que diz respeito às experiências informais, seja proporcionando a
oportunidade para que tal experiência aconteça, seja orientando os subordinados
sobre as aprendizagens decorrentes dessas experiências. A despeito de seu papel
de orientar o desenvolvimento intelectual da PcD, facilitar a inclusão e
promover a capacidade laborativa desses profissionais, o que se observa é, por
vezes, uma discriminação reversa. Os relatos indicam demasiada atenção e zelo
dedicados à PcD em comparação aos profissionais que não possuem deficiência. Os
gestores afirmam que, muito embora cobrem igualmente a entrega por resultados,
oferecem um suporte diferenciado para aqueles que possuem deficiência, conforme
fala do Gestor 1:
* "Os portadores do meu time sempre foram tratados e cobrados da mesma
maneira, como qualquer outro colaborador".
É importante que os responsáveis pela inclusão e pelo desenvolvimento
profissional da PcD olhem com reservas essas condutas e orientem os gestores,
já que elas podem ter o efeito contrário ao que se pretende, despertando,
inclusive, animosidades ou problemas de relacionamento na equipe.
5.5. Os saberes que sustentam a construção das competências
Com base nas práticas de desenvolvimento formal e experiências informais de
aprendizagem, foram levantados os saberes que sustentam a construção das
competências das PcDs ao longo da trajetória de desenvolvimento. Enquanto a
metacategoria anterior abordou como as PcDs aprenderam, esta procurou entender
o que foi aprendido. Para fins de metodologia, os resultados foram
categorizados utilizando-se como referência a definição dos saberes proposta
por Le Boterf (2003), que inclui: saberes teóricos, saberes do meio, saberes
procedurais, saber fazer operacionais, saber fazer experienciais, saber fazer
sociais ou relacionais, saber fazer cognitivos e aptidões ou qualidades. A
separação por saberes é puramente didática.
Os relatos dos entrevistados sugerem que houve a aquisição de uma grande
variedade de saberes, com destaque para os do meio, procedurais, operacionais e
saber fazer sociais e relacionais.
Os saberes do meio ajudam o profissional a entender o ambiente onde está
inserido e adaptar-se a ele. Referem-se a códigos da grande empresa, postura
profissional, estrutura, processos organizacionais e vestimenta adequada.
* "Como a gente se vestir, aos poucos a gente está pegando alguma
coisa, que lá [na empresa anterior] você trabalhava de uniforme, aqui
não. Então tem muitas coisas que você tem que ir aos poucos
encaixando" (PcD4 - deficiente física - nanismo).
* "É bonito ser assim. É melhor se vestir assim. É bonito você falar
baixo, é bonito você falar com mais educação, falar devagar. Aí você vai
tomando isso para você, sozinha. Ninguém precisa te forçar, entendeu? É
assim, eu fui vendo mesmo. Mas eu ainda estou aprendendo. Tenho que mudar
muito ainda" (PcD5 - deficiente auditiva - bilateral parcial).
O grupo de saberes procedurais, por sua vez, está relacionado ao entendimento
de métodos, técnicas e procedimentos da organização. Quanto ao grupo de PcDs
entrevistado, destacam-se saberes relativos a procedimentos departamentais,
financeiros, interdepartamentais e rotinas administrativas. No que se refere
aos saberes operacionais, o que emerge das entrevistas são os aprendizados
relativos a como proceder ou operar, tais como: atividades administrativas do
departamento, condutas para atendimento de clientes, como executar as tarefas
específicas da função, como elaborar relatórios e documentos, como implantar
sistemas de qualidade, como usar terminais informatizados e organização.
Tratam-se de componentes importantes para a demonstração da capacidade de
entrega do profissional, conforme indica o relato:
* "Como eu tenho dificuldades de escrever, eu tento fazer muitas
coisas com o computador, pois eu sou mais rápida, achei o curso [de
informática] muito bom e estou fazendo o meu trabalho mais rápido"
(PcD9 - deficiente física - paralisia cerebral).
As reflexões sobre os saberes adquiridos indicam que não adianta o sujeito só
aprender os conhecimentos básicos para sua rotina de trabalho sem compreender
como suas atividades estão interconectadas com a cadeia produtiva. Entender a
complexidade da função, assim como o universo da indústria farmacêutica, é
importante para que as PcDs desenvolvam uma visão holística de seu trabalho. As
análises do grupo estudado não sinalizam um grande avanço nesse sentido, já que
não houve movimento algum da organização que apontasse para um projeto de
desenvolvimento que incorporasse preocupações dessa ordem. Os relatos do grupo
que participou deste estudo revelam que existe dificuldade de ultrapassar a
barreira dos saberes teóricos e operacionais. Pouco foi observada a aquisição
dos saberes cognitivos e/ou outros saberes que indiquem maior grau de autonomia
e facilidade para resolução de problemas e tomada de decisão, o que compromete
sobremaneira as possibilidades de desenvolvimento de competências. Entre as
poucas evidências de desenvolvimento, tem-se o relato do Gestor 4:
* "Ela está criando mais segurança de interagir com as pessoas e
resolver os problemas, e depois ela vem e reporta. Então, assim, aquela
maior confiança, confiança em si e trabalhar bem com o time, eu acho que
ela tem desenvolvido bem isso nos últimos tempos" (Gestor 4 - líder
da PcD1 - deficiente física - nanismo).
5.6. A participação de atores externos à organização
A inclusão das pessoas com deficiência nas organizações e o seu desenvolvimento
profissional são apoiados por atores externos representados por organizações
não governamentais e pelo sindicato das indústrias farmacêuticas. De maneira
geral, esses atores propõem-se a auxiliar a entrada e a permanência de PcDs no
mercado de trabalho. A partir da análise documental e das entrevistas
realizadas com os participantes deste estudo, verificou-se que a contribuição
desses atores acontece de quatro diferentes formas: pactos coletivos que apoiam
a inclusão de PcDs; reabilitação profissional; auxílio para recrutamento e
seleção de profissionais com deficiência; desenvolvimento e aplicação de
programas de qualificação profissional.
Alguns pontos de atenção devem ser traçados em relação à participação desses
atores no processo de desenvolvimento das pessoas com deficiência. Entidades
tidas como especialistas no trato da PcD ainda não possuem alto grau de
especialidade para as ações que facilitam a inclusão dessas pessoas no contexto
organizacional, segundo relato dos entrevistados. De acordo com a responsável
pelo programa de inclusão na Farma, algumas empresas de recrutamento e seleção
especialistas no trabalho com PcDs deixaram de levantar questões que podem ser
consideradas simples antes de enviar candidatos à Farma, como descrever o que a
pessoa consegue ou não fazer, quais adaptações precisam ser feitas no ambiente
de trabalho, ou mesmo avaliar se a empresa contratante tem condições e
interesse de realizar tais adaptações. O critério para envio ou não de um
candidato era puramente ter alguma deficiência.
Segundo a associação parceira nos programas de qualificação, os instrutores dos
treinamentos são selecionados a partir de seu conhecimento técnico na
disciplina que será ministrada, conforme relata a representante da Avape:
* "Porque na verdade você não encontra esse público, esta mão de obra
preparada no mercado. Você encontra um bom professor de informática, você
encontra um bom professor na área de call center".
Todos os instrutores da entidade passam por um treinamento prévio; contudo,
muitas vezes essa preparação não é suficiente para que aprenda a lidar com
alunos de todos os tipos de deficiência. No fim das contas, a capacidade para
conduzir a turma será adquirida com a experiência prática, por tentativa e
erro.
Um ponto adicional de atenção são as ações de comunicação dessas organizações.
Como muitas não profissionalizaram sua forma de gestão ou não dispõem de
recursos financeiros para investir em divulgação, a oferta de serviços não
chega às PcDs e suas famílias. Algumas das PcDs entrevistadas relataram tomar
conhecimento dessas ONGs somente na fase adulta, quando, por iniciativa
própria, decidiram procurar ajuda para tratamento da deficiência ou inserção no
mercado de trabalho.
Em relação à defesa dos direitos da PcD, o Sindicato das Indústrias
Farmacêuticas desempenhou um papel importante no novo cenário, por desenhar um
programa que favorece a contratação e o desenvolvimento profissional das PcDs
entre as empresas da indústria, além de aprovar pactos coletivos que incentivam
e regulam a inclusão das PcDs nas organizações e controlar o número de
contratações na indústria.
A partir da análise dos dados deste trabalho, pode-se dizer que a associação
parceira para os programas de qualificação e o sindicato, dois importantes
atores do programa de inclusão da Farma, não mantêm tipo algum de diálogo. A
Farma atua, de certo modo, como intermediária desses atores, o que não
representa uma construção coletiva de conhecimento em que todos estão na mesa
discutindo os dilemas e as possibilidades para a inclusão das PcDs. Essa
situação contrasta com a ideia de Neri et al.(2003), que acreditam que um
movimento de ação social deva acontecer por meio da pressão, da negociação e do
engajamento de todos os atores da sociedade. Os planos, programas e projetos
que defendem os interesses das PcDs deveriam ser apresentados de forma
integrada por esses agentes.
Essas dificuldades não significam, contudo, que o trabalho desenvolvido por
esse grupo de atores não seja importante. As dificuldades existem, falta
articulação entre eles e o serviço oferecido está longe do ideal. Entretanto,
tem-se aí uma oportunidade que pode ser potencializada a favor da PcD. Um
diálogo reflexivo, conjunto, pode ser um caminho para o reconhecimento e a
construção da competência dos indivíduos inseridos na indústria farmacêutica.
6. Considerações finais
Para responder à temática que desencadeou a pesquisa - que experiências são
significativas para o desenvolvimento da competência das PcDs - e discutir
possíveis implicações para organizações que almejam incluir e promover o
desenvolvimento de pessoas com deficiência, procurou-se representar
graficamente, na figura_2, os elementos centrais que emergiram a partir do
estudo do caso da Farma. Os elementos apresentados surgiram a partir da análise
dos dados da pesquisa e de sua correlação com a literatura apresentada. De
forma alguma deve-se tomar essa figura como modelo ou como tentativa de
prescrição, mas como um corpo de elementos que podem servir para reflexão na
configuração de experiências de desenvolvimento de PcDs.
A partir da análise dos dados do estudo de caso, podem-se destacar três pilares
significativos para a construção da competência da PcD: as iniciativas do
ambiente de desenvolvimento organizacional; a trajetória individual da PcD; as
ações de agentes externos à organização. Cada um desses pilares é suportado por
elementos específicos que favorecem a construção da competência, alguns deles
já presentes na experiência da Farma, outros identificados como oportunidades
de melhoria no processo dessa organização.
Considerando que as competências não podem ser desenvolvidas independentemente
do contexto (SANDBERG, 2000), lançou-se mão do conceito de contexto de
trabalho, por entender-se que o ambiente em que a pessoa trabalha pode
influenciar a segurança do indivíduo e suas competências (CHEETHAM e CHIVERS,
1996). De forma complementar à importância do contexto de trabalho, tem-se o
contexto social que está relacionado à construção social da deficiência (OMOTE,
1994), a qual, conforme apontado neste artigo, exerce particular importância
para a pessoa com deficiência à medida que ela ocupa diferentes papéis na
sociedade.
Em relação aos elementos que fazem parte do ambiente de desenvolvimento
organizacional, foram identificados como importantes práticas formais e
informais, aquisição de saberes, relações de trabalho, cuidado com a
deficiência, socialização, preparação dos gestores, incentivo ao
autodesenvolvimento e quebra de barreiras atitudinais e arquitetônicas. A
maioria das práticas seguirá o processo comum válido para todos os
profissionais da organização; outras demandarão algumas ações pontuais que
atendam às necessidades das PcDs. A atenção às especificidades da deficiência
deve ser observada pela empresa, pois o desenvolvimento de competências pode
ser alavancado com o cuidado aos aspectos que representam uma limitação para a
PcD inserida na organização. No caso da Farma houve, dentre as principais
ações, a recomendação para a utilização dos benefícios do plano de saúde,
especialmente fonoaudiólogos, fisioterapeutas e psicólogos, bem como o
financiamento de equipamentos para a compra de próteses e aparelhos auditivos.
Ainda em relação ao ambiente de desenvolvimento organizacional, a atenção às
relações no ambiente de trabalho, às experiências de socialização, ao processo
de preparação dos gestores e à quebra de barreiras atitudinais e arquitetônicas
é importante para a inclusão na empresa e depende do conjunto de profissionais
que convive com as PcDs. O preconceito e as diferenças existem, a organização
precisa reconhecê-los e minimizá-los tanto quanto possível para avançar no
processo de inclusão e reconhecimento dos profissionais com deficiência. A
sensibilização do conjunto de membros da organização poderia ser um primeiro
passo para facilitar esse processo, pois não só o gestor que atua com a PcD em
sua equipe tem de ser objeto de atenção. O segundo pilar da figura representa a
trajetória individual da pessoa com deficiência. Seus elementos incluem as
características individuais do sujeito e tratam de questões como autoestima,
motivação, personalidade e tipo de deficiência, aspectos importantes para o
desenvolvimento de competências (CHEETHAM e CHIVERS, 1996). Em alguns casos, a
PcD precisa quebrar os preconceitos e estereótipos que cria sobre si mesma a
partir de suas características individuais para aumentar sua empregabilidade
(FREEDMAN e KELLER, 1981). A trajetória de vida dessas pessoas deve ser
considerada, uma vez que o histórico educacional, familiar e profissional
exerce influência na forma como os indivíduos entendem seu processo de
desenvolvimento e exercem suas potencialidades. Para competir em condições de
igualdade com aqueles que não possuem deficiência, a PcD precisará incrementar
seu histórico educacional e profissional. Não menos importante é o histórico
familiar, no sentido de como a família convive com a deficiência e incentiva a
PcD. Situações de protecionismo exagerado podem gerar dependência, insegurança
e até configurar-se como uma barreira para a evolução profissional:
* "Então uma coisa que eu sempre cobro da minha mãe é que a minha mãe
nunca deixou eu ir em um zoológico, nunca tive uma bicicleta [...] porque
a minha mãe achava que se eu andasse de bicicleta ia quebrar a perna, se
eu fosse no zoológico alguém ia me empurrar e me machucar. Para o
parquinho, educação física eu não fazia, que a minha mãe ia lá na escola
para eu não fazer. [...] Então eu acho que essa insegurança veio um pouco
da infância, não de agora, mas da infância" (PcD4 - deficiente
física - nanismo).
O último pilar está relacionado ao papel exercido pelos agentes externos à
organização na construção e no desenvolvimento da PcD. Atualmente, esses
agentes já possuem um papel de suporte que contribui com o propósito de criar
meios para o cumprimento de ações afirmativas, como a lei das cotas.
Entretanto, para que a participação desses agentes agregue valor às PcDs e às
empresas, é necessário que haja maior profissionalização dos serviços
oferecidos e melhor entendimento das especificidades das PcDs. Adicionalmente,
para que tanto as PcDs quanto as empresas possam usufruir dos serviços
oferecidos por esses agentes no momento adequado, é necessário aprimorar o
marketing institucional de tais organizações. Por último, os resultados dos
esforços dos agentes externos na inclusão da pessoa com deficiência no contexto
organizacional podem ganhar maior relevância à medida que acontecem a
articulação e o diálogo competente entre todos os envolvidos com a inclusão.
A partir da análise integrada dos elementos apresentados na figura_2, verifica-
se que a construção da competência depende, sobretudo, da qualidade da
interação entre os vários elementos de cada um dos pilares de desenvolvimento e
da diversidade de experiências a que as PcDs serão expostas na organização. A
reflexão das PcDs e dos diferentes atores organizacionais que fazem parte do
processo de inclusão acerca dessas experiências impulsionará o desenvolvimento
de competências. A partir do momento em que a pessoa entrega resultados, começa
a constituir-se um ambiente favorável ao reconhecimento desse profissional, por
meio da percepção de valor social e econômico agregado (FLEURY e FLEURY, 2004),
pela ampliação do escopo de atuação na organização (DUTRA, 2001), pela
demonstração de autonomia para realização das atividades (ZARIFIAN, 2001) ou
pela ascensão profissional.
Tomando-se agora a experiência em estudo do ponto de vista das críticas
estabelecidas por Burgoyne (1993) e Graham e Tarbell (2006), que entendem o
movimento de competências na dimensão do poder, cabe ainda um questionamento:
até que ponto o processo de desenvolvimento das PcDs tem de se dar por uma via
diferenciada daquela que atende aos demais profissionais da empresa? Não há uma
resposta simples aqui. Se, de um lado, corre-se o risco de produzir um efeito
contrário ao que se deseja, segregando e isolando ainda mais esse grupo de
profissionais, por outro, introduzi-las em uma grande organização, com toda sua
complexidade - especialmente no caso das PcDs advindas de classes sociais menos
favorecidas, que tiveram acesso limitado a educação, cultura e tecnologia, isto
é, sem preparo mínimo - pode ser tão devastador quanto as isolar em programas à
parte do conjunto de ações de desenvolvimento da organização. Nesse caso,
talvez se possa encontrar alguma justificativa de iniciativas específicas para
PcDs em uma fase bem inicial ou quando a preocupação está voltada para questões
muito básicas (computação, etiqueta, vestimenta etc.).
Observando as iniciativas de desenvolvimento da Farma (treinamento, coaching,
participação em projetos, suporte financeiro para tratamento da deficiência,
custeio de cursos de graduação etc.), pode-se dizer que, por um lado, foram
promovidas ações diversificadas e específicas para garantir a inclusão adequada
da PcD no contexto organizacional. Os programas foram em parte convenientes
para o momento de sua implementação, sobretudo por permitir o nivelamento
conceitual básico dos participantes dos processos de inclusão da Farma. Por
outro lado, PcDs que já tinham um alto grau de qualificação foram submetidas a
treinamentos básicos pelo simples fato de serem deficientes. A continuidade das
ações exige um enfoque nos déficits e nos potenciais de cada PcD. Se a inclusão
e a proposta de desenvolvimento de competências tiverem sucesso, com o tempo
essa diferenciação tende a desaparecer.
Competência depende de reconhecimento, pelo próprio indivíduo e pelos outros
(LE BOTERF, 2003); cabe perguntar, no entanto, o que está sendo reconhecido: a
capacidade das PcDs de adaptarem-se às regras sociais do ambiente empresarial e
às funções mais operacionais da empresa? Da mesma forma, pode-se perguntar de
que construção de competências se está tratando. Os programas empresariais não
podem furtar-se a esses questionamentos.