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BrBRHUAp0080-21072013000300011

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variedadeBr
ano2013
fonteScielo

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Comprometimento e entrincheiramento na carreira: integrar ou reconstruir os construtos? Uma exploração das relações à luz do desempenho

1. INTRODUÇÃO O contexto de mudança, que anos caracteriza o ambiente em que se inserem as organizações, traz repercussões aos vínculos das pessoas no trabalho.

Especificamente, a aceleração da globalização, os novos meios de comunicação e a pressão gerada pela necessidade de inovação como forma de sobrevivência alteraram os contratos psicológicos entre organizações e seus trabalhadores, pois a garantia do emprego não mais pode ser usada para estimular o comprometimento do empregado (MEYER, ALLEN e TOPOLNYTSKY, 1998). Nesse horizonte competitivo, a vida profissional das pessoas está cada vez menos atrelada a uma única organização, sendo esperado que haja em média cinco mudanças de organização ao longo da evolução de uma carreira (COOPER-HAKIM e VISWESVARAN, 2005).

Diante desse quadro, o comprometimento com a carreira pode fornecer significado e continuidade no trabalho aos indivíduos, nesses tempos em que as organizações tornaram-se fluidas e incapazes de prover estabilidade no emprego (COLARELLI e BISHOP, 1990, apud AYREE, CHAY e CHEW, 1994). O foco na carreira, então, pode aumentar a possibilidade de os indivíduos investirem em suas capacidades e conhecimentos, contribuindo para o aumento de seu desempenho (MEYER, ALLEN e TOPOLNYTSKY, 1998). Com o passar do tempo, os investimentos empregados e os custos de afastamento contribuem para que o indivíduo sinta-se forçado a permanecer na carreira, independentemente de estar ou não satisfeito. Tal quadro, denominado entrincheiramento (CARSON, CARSON e BEDEIAN, 1995), necessita ainda de um maior número de investigações sobre seus antecedentes e consequentes, a exemplo de variáveis objetivas de desempenho (CARSON et al., 1996). Em paralelo, alguns autores têm levantado questionamentos acerca das interfaces do entrincheiramento com o comprometimento com a carreira (BLAU, 2001; SCHEIBLE e BASTOS, 2006). Diversos autores (SULIMAN e ILES, 2000; SNAPE e REDMAN, 2003) ressaltam o desequilíbrio na pesquisa do comprometimento em relação a outros focos além da organização, o que justifica a relevância deste estudo. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo aprofundar o conhecimento sobre o comprometimento das pessoas com sua carreira/ profissão, explorando suas relações com os conceitos de entrincheiramento e desempenho.

A ênfase na carreira, além de oportuna, responde à recomendação de evitar desperdício de esforços em áreas muito estudadas. Tal alerta foi levantado por Medeiros et al. (2002) em sua revisão sobre a pesquisa do comprometimento no Brasil, ao explorar uma área do comprometimento em que existem poucos trabalhos publicados no País. Reporta-se também a uma recomendação adicional dos mesmos autores, ao investigarem a dimensionalidade do construto, além de enfocar a questão do desempenho que é por eles indicada.

1.1. Comprometimento com a carreira Para Blau (2001), carreira representa o padrão de experiências relacionadas ao trabalho de um indivíduo por toda a sua vida. Meyer, Allen e Smith (1993) afirmam ser ocupação o termo mais apropriado, e que se refere a um grupo de pessoas que se considera engajado em algum tipo de trabalho. De acordo com Morrow (1993), o comprometimento com a carreira abrange as seguintes nomenclaturas: comprometimento com a profissão, comprometimento com a ocupação, envolvimento com a carreira, saliência da carreira, profissionalismo, comprometimento afetivo com a ocupação, comprometimento instrumental com a ocupação, comprometimento normativo com a ocupação. Diante das diversas operacionalizações do comprometimento na carreira, Morrow (1993) recomenda que todas essas formas sejam tratadas como um único construto. Cooper-Hakim e Viswesvaran (2005) concluem que o termo comprometimento com a carreira engloba o comprometimento ou a dedicação das pessoas para com sua profissão, carreira, ocupação, pois frequentemente essas definições são vistas como sinônimas. No presente trabalho, é usada essa última conceituação, sendo tratado especificamente o comprometimento com a carreira/ocupação como operacionalizado por Blau (1985), Meyer, Allen e Smith (1993) e Carson e Bedeian (1994).

A operacionalização de Blau (1985) foi considerada por Morrow (1993) como confiável. No entanto, Carson e Bedeian (1994) questionaram aspectos da elaboração da escala, por terem identificado sobreposição entre comprometimento e intenções de deixar a carreira. Diante dessas limitações, Carson e Bedeian (1994) conceituaram o comprometimento com a carreira como "a motivação para trabalhar em uma vocação escolhida", dividindo-o em três componentes: identidade com a carreira, que representa o vínculo emocional; planejamento da carreira, que determina as necessidades de desenvolvimento na carreira bem como objetivos; e resiliência na carreira, que remete à constância na carreira mesmo em face das adversidades.

Meyer, Allen e Smith (1993) introduziram uma abordagem multidimensional do comprometimento ao estender seu modelo desenvolvido no foco organizacional para o foco ocupacional. Segundo os autores, comprometimento é a ligação do indivíduo com sua carreira, que pode ter origem em sentimentos de afeto, interesse ou obrigação. O comprometimento afetivo aborda a identificação e o envolvimento dos indivíduos com suas carreiras. o comprometimento normativo é gerado pelo sentimento do dever e da obrigação moral para com sua carreira.

Por fim, o comprometimento instrumental está ligado ao julgamento do preço a pagar pelo abandono da carreira, que é calculado por meio da relação custo- benefício entre continuar ou romper o vínculo (MEYER, ALLEN e SMITH, 1993). A aplicabilidade desse modelo foi testada em diversas profissões e sancionada por Irving, Coleman e Cooper (1997).

Alguns estudos encontraram correlação fraca e positiva entre o comprometimento com a carreira e o desempenho (CARSON e BEDEIAN, 1994; LEE, CARSWELL e ALLEN, 2000). O comprometimento com a carreira também possui correlação positiva com o comprometimento organizacional e com a busca de desenvolvimento de habilidades, e negativa com a rotatividade e intenções de abandonar a carreira (AYREE, CHAY e CHEW, 1994; LEE, CARSWELL e ALLEN, 2000; SULIMAN e ILES, 2000). Cohen (2003) explica que é esperada a existência de relações entre os diferentes focos do comprometimento.

Irving, Coleman e Cooper (1997) informam que outros pesquisadores (COLARELLI e BISHOP, 1990) encontraram correlação significativa e negativa entre educação e comprometimento com a carreira, indicando que níveis mais altos de educação propiciam mais flexibilidade para mudança de carreira do que treinamentos mais curtos e especializados. Adicionam, ainda, que os homens tendem a apresentar maiores níveis de comprometimento com a carreira do que as mulheres, e reportam não ter encontrado relação entre idade ou nível educacional com comprometimento.

No entanto, Lee, Carswell e Allen (2000) contrapõem esse resultado em sua revisão meta-analítica, pois não encontraram relações entre gênero, estado civil, ou número de dependentes e o comprometimento com a carreira. Além disso, Goulet e Singh (2002) afirmam que existe uma relação positiva com nível educacional e hierarquia (natureza) do cargo. Esses autores também informam correlações positivas e fracas com idade e tempo de permanência na organização.

Isso demonstra a necessidade de estudos que permitam um quadro mais claro de como outras variáveis se relacionam com o comprometimento com a carreira. Essas inconsistências são explicadas por Ellemers e van den Heuvel (1998), ao apontarem que diferenças individuais como gênero, idade, nível educacional, e tempo de permanência na organização não afetam índices de comportamento de maneira sistemática, apresentando variações.

1.2. Entrincheiramento na carreira O entrincheiramento é uma metáfora que remete à continuidade de profissionais em uma carreira porque mudar lhes parece desvantajoso ou inviável. Ficam, assim, protegidos em sua trincheira - a carreira. Para Carson, Carson e Bedeian (1995), o entrincheiramento é um processo de estagnação no qual os indivíduos não se adaptam e não se motivam a encontrar alternativas para seu encaminhamento profissional. Adicionam, ainda, que alguns sintomas do entrincheiramento podem ser: medo de estigma social, visão da idade como fator de limitação das alternativas de carreira, percepção de desequilíbrio na relação custo-benefício da mudança. Esses autores definem o entrincheiramento com três dimensões: investimentos na carreira, dimensão que se refere ao tempo e dinheiro investido na carreira/ profissão em relação à capacitação; custos emocionais, que envolve questões sociais e psicológicas associadas à ruptura de relações interpessoais que uma mudança de carreira traria, falta de alternativas de carreira, que remete à percepção da restrição de novas oportunidades de carreira.

É possível que o entrincheiramento na carreira resulte em diversos padrões de comportamento, de acordo com o grau de satisfação. Carson e Carson (1997) supõem que indivíduos entrincheirados e insatisfeitos buscarão mecanismos de gerenciamento do estresse, como: saída da organização, confrontação verbal, lealdade passiva, ou negligência, que inclui absenteísmo, aumento de erros no trabalho e ineficiência. Por outro lado, profissionais entrincheirados e satisfeitos tenderiam a realizar novos investimentos e a contribuir construtivamente, reduzindo a rotatividade e aumentando a estabilidade da força de trabalho. Em um estudo empírico partindo de um modelo de entrincheiramento na carreira, Carson et al. (1996) encontraram que grupos de profissionais entrincheirados apresentaram altos níveis de comprometimento instrumental, baixa intenção de afastamento e maior estabilidade na carreira em comparação a indivíduos não entrincheirados.

No Brasil, Magalhães (2005) explorou o entrincheiramento em seu estudo sobre personalidades vocacionais e desenvolvimento na vida adulta, encontrando bons índices de confiabilidade e bom ajuste da amostra às três dimensões originalmente propostas. Investigou a generatividade, que se refere ao envolvimento do indivíduo com o bem-estar das próximas gerações. Os resultados de seu estudo indicaram que o entrincheiramento se correlaciona negativamente com generatividade, ao contrário do comprometimento, medido pela escala de Carson e Bedeian (1994), que o faz de maneira positiva. Em trabalho posterior, Magalhães (2008) investigou a relação entre generatividade, entrincheiramento na carreira, comprometimento na carreira (medido com a escala de Carson e Bedeian, 1994) e comprometimento organizacional (medido com a escala de Meyer, Allen e Smith 1993). Observou relações negativas entre a generatividade e a base de continuação do comprometimento organizacional. Essa base, por sua vez, apresentou relações positivas com todos os fatores do entrincheiramento e negativas ou não significativas com os fatores do comprometimento com a carreira.

Scheible e Bastos (2006) também encontraram bom ajuste às três dimensões do entrincheiramento e bons índices de confiabilidade na escala, além de identificarem relações significativas e negativas entre o entrincheiramento e a natureza do cargo ocupado (gerencial/operacional), concluindo que "à medida que os profissionais pesquisados galgam posições menos técnicas e mais gerenciais, eles percebem mais alternativas de carreira, diminuindo seu nível de entrincheiramento" (SCHEIBLE e BASTOS, 2006, p.11). Encontraram, também, relações negativas entre a dimensão custos emocionais e as variáveis demográficas: faixa etária e escolaridade. O comportamento diferenciado dessa dimensão foi observado também por Blau (2001), que atribuiu os resultados encontrados à imprecisão do que seriam esses custos emocionais.

Scheible e Bastos (2006) não encontraram relação entre entrincheiramento e tempo de permanência na organização, ao contrário de pesquisas anteriores (CLEVELAND e SHORE, 1992, apud CARSON, CARSON e BEDEIAN, 1995). O entrincheiramento correlacionou-se de forma significativa e positiva com o comprometimento com a carreira, sendo mais forte a relação com a base instrumental, o que demanda um estudo mais focado na sobreposição entre os dois conceitos e, consequentemente, em suas dimensionalidades. No presente trabalho, propõe-se abordar essa questão.

1.3. Dimensões do comprometimento com a carreira e entrincheiramento As dimensões do comprometimento têm sido palco de diversos estudos. Alguns com abordagem genérica ou com foco na organização (BARBOSA e FARIA, 2000; MEYER e HERSCOVITCH, 2001; RODRIGUES e BASTOS, 2010), outros com foco específico na carreira (MEYER, ALLEN e SMITH, 1993; IRVING, COLEMAN e COOPER, 1997; BLAU, 2001, 2003). A exemplo do que ocorreu com o comprometimento com a organização, o comprometimento com a carreira foi visto inicialmente como um construto unidimensional e, posteriormente, novas operacionalizações conduziram a estruturas multidimensionais.

No caso do modelo multidimensional de Meyer, Allen e Smith (1993), diversos pesquisadores (BLAU, 2001; COHEN, 2003; SCHEIBLE, 2004) apontam para a sobreposição conceitual entre as bases afetiva e normativa, por apresentarem correlações muito altas em diversos trabalhos (COHEN, 2003). Para Cohen (2003), índices acima de 0,70 apontam a existência inequívoca de sobreposição conceitual; índices na faixa de 0,50 são aceitáveis. Outros autores como Morrow (1993) e Bandeira, Marques e Veiga (1999), no entanto, estabelecem o limiar de sobreposição em 0,65.

Blau (2001) levantou diversas questões em relação ao conceito de entrincheiramento proposto por Carson, Carson e Bedeian (1995). Segundo esse autor, o entrincheiramento sobrepõe-se conceitualmente à dimensão instrumental do comprometimento com a ocupação proposto por Meyer, Allen e Smith (1993). Ele argumenta que ambos possuem o mesmo arcabouço teórico, que é o trabalho de Becker (1960) sobre os side bets, ou linhas contínuas de ação. Além disso, como mencionado anteriormente, Blau (2001) defendeu que a tipificação dos custos emocionais é insuficiente, prejudicando o bom entendimento dessa dimensão. Por isso, propôs que essa dimensão fosse incorporada ao fator investimentos na carreira, passando a compor uma nova dimensão, denominada custos acumulados.

Dando prosseguimento a sua pesquisa, Blau (2003) propôs uma visão integrativa dos construtos comprometimento e entrincheiramento, com a adição de uma quarta dimensão para o comprometimento com a carreira. Ele defende, nesse caso, a incorporação do entrincheiramento pela dimensão instrumental, que passaria a ser dividida em custos acumulados e alternativas limitadas. Blau e Holladay (2006) testaram as escalas de Meyer, Allen e Smith (1993) com foco na carreira, considerando as bases afetiva e normativa, e substituíram os itens originais da base instrumental pelas dimensões custos acumulados e falta de alternativas da escala de entrincheiramento validada por Carson, Carson e Bedeian (1995). Os resultados encontrados forneceram suporte a sua hipótese de que os itens de entrincheiramento poderiam substituir a escala do comprometimento instrumental, mas as medidas não foram confrontadas nesse estudo, a fim de atestar sobreposição.

No presente estudo, compartilha-se com Blau (2003) e com Blau e Holladay (2006) a hipótese de sobreposição entre o entrincheiramento e o comprometimento instrumental. Contudo, adota-se uma hipótese contrária àquela apresentada por esses autores quanto à delimitação dos construtos. Enquanto esses autores utilizam a sobreposição como argumento para integrar o entrincheiramento ao comprometimento na carreira, neste trabalho ela será utilizada em favor da desintegração da base instrumental do comprometimento, que passaria a compor o entrincheiramento na carreira. Tal abordagem está suportada nos resultados contrários apresentados pela base instrumental em relação às bases afetiva e normativa. No presente trabalho, essa confrontação será feita ao se relacionar todas as dimensões ao desempenho dos trabalhadores.

1.4. Desempenho Medidas são utilizadas para acompanhar o desempenho do trabalhador. Geralmente, elas são capturadas em processos denominados avaliações de desempenho, que representam a tentativa de tornar objetiva e imparcial a análise da conduta e do resultado geral das tarefas produzidas pelas pessoas. Lucena (1992) caracteriza a avaliação do desempenho por meio dos seguintes componentes básicos: * qualificação profissional - dimensiona a competência requerida pelas expectativas do negócio e pelo tipo de contribuição esperada de cada cargo; * cultura organizacional - alguns indicadores precisam ser dimensionados e confrontados para reconhecer a cultura de uma organização, pois constitui uma das expressões mais utilizadas quando se discute qualquer ação a ser implementada na organização; * estilo gerencial - faz-se necessário por ser o gerente ou o supervisor os responsáveis pela gerência do desempenho; * ambiente externo - dimensiona como fatores ambientais podem afetar o desempenho dos trabalhadores.

Avaliar o desempenho das pessoas no trabalho implica, assim, conhecer a dinâmica comportamental própria de cada um, o trabalho a ser realizado e o ambiente organizacional em que essas ações se passam. Uma das dificuldades, no entanto, está na delimitação da colaboração individual das pessoas para os resultados da organização (BERGAMINI, 1988).

Desempenho tem sido um dos consequentes mais pesquisados do comprometimento com foco na organização, apesar de os valores encontrados até agora estarem longe de comprovar o que o senso comum prega: níveis elevados de comprometimento potencializam melhor desempenho. Isso ocorre porque a relação não é direta, como Riketta (2002) e Scheible (2004) comprovam, uma vez que existem diversas variáveis moderadoras. Meyer, Allen e Topolnytsky (1998) afirmam, ainda, que essa relação varia de acordo com a natureza do comprometimento. Para esses autores, o comprometimento instrumental relaciona-se negativamente com o desempenho, ao contrário do comprometimento afetivo. Ellemers e van den Heuvel (1998) alertam para o fato de que comprometimento não prediz desempenho na tarefa e que a visão do superior hierárquico a respeito do desempenho no contexto é mediada pelas relações existentes entre subordinados e superiores.

Neste trabalho buscou-se investigar também a relação entre os vínculos com a carreira - de comprometimento e entrincheiramento - e o desempenho do trabalhador.

2. METODOLOGIA Na primeira fase deste trabalho, realizou-se uma pesquisa bibliográfica sobre comprometimento no trabalho e desempenho nas organizações. Tal pesquisa viabilizou o conhecimento sobre o estado da arte nos tópicos abordados e opiniões reinantes em diversas correntes de pesquisadores. A partir daí, foi possível estabelecer um arcabouço teórico de referência e identificar instrumentos validados. Na segunda fase, buscou-se testar as hipóteses sobre as relações entre as variáveis estudadas pela aplicação de um questionário, que utilizou instrumentos e indicadores extraídos da primeira fase e da pesquisa documental em avaliações de desempenho conduzidas na organização-alvo. Após coleta e tratamento dos dados, foram elaboradas as análises, interpretações e conclusões.

2.1. Hipóteses Baseada em Blau (2001, 2003), a primeira hipótese assume que o entrincheiramento se correlaciona de forma significativa e positiva com o comprometimento instrumental com a carreira e não se relaciona com comprometimento afetivo. A segunda hipótese, sustentada por Meyer et al.

(1989), Blau (2001, 2003) e Meyer et al. (2002), afirma que entrincheiramento e comprometimento instrumental se relacionam com desempenho de forma negativa. A terceira e última hipótese, apoiada em Blau (2001, 2003), aponta a dimensão falta de alternativas do entrincheiramento como à parte das três dimensões do comprometimento na carreira propostas por Meyer, Allen e Smith (1993) e Meyer e Herscovitch (2001).

2.2. Universo, amostra, instrumentos e procedimentos de coleta de dados A pesquisa foi realizada em uma empresa de tecnologia da informação de âmbito nacional, escolhida devido à possibilidade de acessar pessoas em diferentes localidades. Participaram indivíduos de vários estados, totalizando 217 respondentes, o que corresponde a quase 15% do universo pesquisado. Para aplicação do questionário, foi utilizado um sistema de questionário eletrônico disponibilizado na intranet da organização. Tal procedimento agilizou o processo e ampliou a participação para todas as unidades da empresa e para os colaboradores alocados em clientes. Outra razão para esta tática foi o fato de o questionário ser longo e exigir boa vontade dos respondentes.

O questionário aplicado em março de 2006 dividiu-se em três partes: itens demográficos e funcionais; itens relativos ao comprometimento com a carreira; itens relativos ao entrincheiramento. O segundo grupo consistiu nas escalas: comprometimento com a ocupação - escala de 18 itens proposta e validada por Meyer, Allen e Smith (1993) - com seis itens para cada base; comprometimento com a carreira - escala de sete itens proposta e validada por Blau (1985); comprometimento com a carreira (CCM), de 12 itens, proposta por Carson e Bedeian (1994). O terceiro grupo consistiu na escala entrincheiramento na carreira - composta por 12 itens, proposta e validada por Carson, Carson e Bedeian (1995).

Os indicadores de desempenho foram obtidos por meio dos resultados da avaliação de desempenho conduzida pela organização-alvo, e concluída em julho de 2006.

Foram obtidos dois indicadores de desempenho: o primeiro autorrelatado e o segundo relatado pelo supervisor. As avaliações ocorrem semestralmente (em janeiro e julho) e estão inseridas no processo de gestão de pessoas. A utilização de dados secundários está justificada na confiabilidade esperada, visto que os números obtidos são resultado de um processo organizacional controlado. Foi assumido que, apesar de eventuais problemas, faltas, inconsistências que possam existir com o sistema de avaliação de desempenho, os indicadores dela obtidos são válidos e permitem distinguir os trabalhadores com desempenho superior daqueles que apresentam desempenho inferior.

2.3. Tratamento e análise dos dados Os dados foram analisados e tratados para verificar a presença de questionários incompletos (missing values), identificar e retirar questionários que não se encaixavam (outliers) por alguma razão. Todos os questionários que não possuíam os dados de desempenho completos foram retirados, reduzindo o tamanho da amostra. Todas as questões respondidas nas escalas receberam um valor de um a sete, referente à escala tipo Likert. Os itens negativos das escalas foram invertidos.

Foi analisada a consistência interna das escalas (e subescalas) utilizadas, bem como verificada a validade dos fatores delas extraídos pela análise da confiabilidade, que calcula a consistência interna do instrumento e permite avaliar as propriedades psicométricas das escalas e dos itens que as compõem, pelo cálculo do coeficiente Alpha de Cronbach para cada dimensão. Esse coeficiente compara a variação total da escala com as variâncias dos itens individuais. Escalas que apresentam este coeficiente acima de 0,60 são consideradas consistentes (MALHOTRA, 1996). A normalidade da amostra para as variáveis pesquisadas foi testada. Apenas as variáveis relativas ao comprometimento afetivo não apresentaram normalidade, de acordo com o teste de Shapiro-Wilk. Dessa forma, aplicou-se a análise de correlação de Pearson como uma forma de avaliar a relação entre as variáveis estudadas.

As variáveis que compõem as escalas de comprometimento e entrincheiramento foram tratadas com a técnica de análise fatorial, utilizando-se o método Maximun Likehood e rotação oblíqua Promax, conforme recomendado por Fabrigar et al. (1999), no intuito de verificar a dimensionalidade dos conceitos estudados.

Para verificar se os dados da amostra se ajustavam ao modelo fatorial, foi realizado o teste de esfericidade de Bartlett e da medida de adequação da amostra de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), a fim de atestar que a análise fatorial poderia ser utilizada com sucesso para a amostra coletada. O teste de Bartlett aponta a homogeneidade do nível de correlação entre as variáveis. Quanto maior o índice e quanto menor a significância, maior a correlação. A significância deve ser menor do que 0,05. Idealmente, a KMO deve ficar acima de ou igual a 0,70. Porém, é aceita a partir de 0,50. Níveis abaixo desse patamar indicam que a amostra não deve ser utilizada para análise fatorial (BANDEIRA, MARQUES e VEIGA, 1999).

3. RESULTADOS A análise das características pessoais nos dados coletados revela a predominância de pessoas do sexo masculino (75%), jovens, solteiros e sem dependentes (58,5%). O nível de escolaridade é alto (67,3% com curso superior completo). A maioria dos participantes (59,8%) trabalha em Salvador. A distribuição por tempo de casa é equilibrada e predominam os indivíduos que exercem ocupações de nível operacional (78,3%).

3.1. Confiabilidade das escalas utilizadas Todas as escalas utilizadas apresentaram bons níveis de confiabilidade (acima de 0,6), conforme demonstrado na Tabela_1. O índice de confiabilidade mais alto foi o encontrado para a subescala falta de alternativas de carreira do entrincheiramento (CARSON, CARSON e BEDEIAN, 1995). Ao compará-los com os índices de confiabilidade encontrados nos trabalhos originais e no estudo de Scheible (2004), observa-se que os índices foram ainda mais favoráveis nesta aplicação.

3.2. Relações entre entrincheiramento e comprometimento com a carreira/ocupação Inicialmente, buscou-se estabelecer as relações entre as variáveis referentes ao comprometimento e ao entrincheiramento. Na Tabela_2, estão apresentados os resultados obtidos. O entrincheiramento apresenta alta correlação com o comprometimento instrumental, o que comprova parcialmente a primeira hipótese.

Embora a relação positiva com a base afetiva não tenha sido prevista, o coeficiente é menor em comparação aos encontrados para as demais bases. Foram verificadas também correlações significativas entre o entrincheiramento e os demais tipos de comprometimento, sendo mais fracos com aqueles advindos de base afetiva, negando parcialmente a primeira hipótese. O comprometimento instrumental apresentou relações significativas e fracas com aqueles que advêm da base afetiva, exceção feita ao comprometimento medido com a escala de Carson e Bedeian (1994). Foi encontrada correlação entre a base instrumental e a base normativa. Na dimensão afetiva, constatou-se sobreposição entre as escalas de Blau (1985) e Meyer et al. (1993) (r= 0,973), bem como entre a escala afetiva de Meyer et al. (1993) e a escala de Carson e Bedeian (1994), que apresentou correlação superior a 0,7. O comprometimento afetivo medido pela escala de Blau apresentou forte correlação com o medido pela escala de Carson e Bedeian, sugerindo que também sobreposição. Além disso, a dimensão normativa apresentou fortes relações com a dimensão afetiva em todas as escalas utilizadas.

No intuito de aprofundar a investigação, foram averiguadas as relações das dimensões do entrincheiramento com os tipos de comprometimento estudados. Os resultados, apresentados na Tabela_3, demonstram que a relação do entrincheiramento com o comprometimento instrumental é dada predominantemente pelos investimentos na carreira (r= 0,664). Uma vez que a relação da base instrumental com custos emocionais é mais fraca (r= 0,371), é possível afirmar que o alto coeficiente encontrado entre essa base e custos acumulados (r= 0,607) é influenciado pela presença do conteúdo de investimentos na carreira.

Os custos emocionais apresentam relação mais forte com o comprometimento normativo, o que leva a pensar que esses custos emocionais são mais vistos como emoção do que como custo material nesta amostra. As relações altas e significativas dessa dimensão com o comprometimento afetivo, medido pela escala de Blau (r= 0,457), e com a dimensão identificação com a carreira (r= 0,404) reforçam essa conclusão. Esses resultados são congruentes com a fragilidade apontada por Blau (2003) para esse fator (custos emocionais). A falta de alternativas não apresentou correlação significativa com a base afetiva, apenas correlações fracas com as bases instrumental (r= 0,361) e normativa (r= 0,216).

3.3. Relações entre entrincheiramento e comprometimento com a carreira/ocupação com o desempenho A pesquisa documental revelou que o processo de avaliação do desempenho utilizado na organização estudada possui um caráter eminentemente subjetivo, enfocando tanto o contexto como as tarefas. É bidirecional (avaliador - > avaliado e avaliado -> avaliador) e possui dois padrões de questionários: um voltado para o nível gerencial, outro para o nível operacional. Esse é um fator limitante, que pode implicar inadequação da medida para perfis intermediários. A avaliação de desempenho nessa organização é também utilizada para estabelecer recompensas extrínsecas, como promoções e ganhos salariais. O desempenho futuro é negociado em termos subjetivos, o que dificulta seu acompanhamento. Apenas colaboradores com mais de 60 dias na empresa são avaliados.

Consiste em um sistema disponibilizado na intranet (rede interna), o que lhe permite um caráter assíncrono, dividindo-se em três partes: uma referente aos aspectos técnicos, outra aos aspectos comportamentais, e uma terceira referente à abertura do empregado para novos desafios. Essa última parte não é objeto de julgamento em termos de resultado objetivo (nota), tendo apenas caráter investigativo para o direcionamento da carreira. Os itens de avaliação recebem duas respostas, que consistem em notas de 0 a 10: uma respondida pelo avaliador, outra pelo avaliado. Esses itens possuem pesos específicos dados pela organização e pelo avaliador, e diferem de acordo com a natureza do cargo ocupado, se gerencial ou operacional. As respostas de ambos são discutidas em uma interação presencial. Ao final, dois indicadores são computados, um autorrelatado pelo avaliado, outro pelo avaliador, referentes aos mesmos itens, com a média ponderada das respostas, que são utilizados neste trabalho como medição do desempenho. As relações entre desempenho, entrincheiramento e comprometimento obtidas estão apresentadas na Tabela_4.

Foi encontrada relação significativa e negativa entre desempenho e entrincheiramento (r=-0,211). Essa relação apresenta a mesma natureza daquela esperada no caso do comprometimento instrumental e comprova parcialmente a segunda hipótese. Em estudo com foco na organização, Meyer et al. (1989) e Meyer et al. (2002) apontaram que a base instrumental do comprometimento trazia relações negativas com o desempenho. Esse mesmo quadro delineia-se com os resultados obtidos neste estudo com foco na carreira, mostrando que o entrincheiramento produz efeitos ainda mais contundentes. A relação positiva e fraca do comprometimento afetivo encontrada está de acordo com Ellemers e van den Heuvel (1998), que sustentam não ser o comprometimento com a carreira um preditor confiável para o desempenho das pessoas, pois existem diversos mediadores e moderadores dessa relação.

É importante ressaltar a natureza negativa da relação entre o desempenho relatado pelo superior e o comprometimento ou entrincheiramento com a carreira, exceção feita ao uso da escala de Carson e Bedeian (1994), pois indivíduos que planejam suas carreiras tendem a ter melhor avaliação de seus supervisores.

Esse achado sugere que os indivíduos cujo foco principal de comprometimento é a carreira obtêm medidas de desempenho menores à medida que seus superiores hierárquicos percebem essa inclinação. O mesmo resultado foi encontrado em Scheible (2004), sugerindo que, nessa tão procurada relação, além da natureza da base, importa quem mede o desempenho. A natureza das relações entre os tipos de comprometimento e o desempenho autorrelatado também é digna de nota, pois ela também se apresenta negativa nas relações com o entrincheiramento e com a base instrumental. com as bases afetiva e normativa existe relação de natureza positiva. Essa constatação fortalece os estudos que se referem à importância da natureza do comprometimento para suas relações com desempenho, a exemplo do clássico trabalho de Meyer et al. (1989) e Riketta (2002).

3.4. Explorando as dimensões do entrincheiramento e do comprometimento com a carreira/ocupação Diante do quadro de sobreposição que havia sido iden-tificado por Blau (2001, 2003), buscou-se aprofundar a investigação dos dois construtos.

Inicialmente, foi realizada análise fatorial exploratória que extraiu oito dimensões dos itens das escalas utilizadas neste estudo. O KMO obtido foi 0,870, classificando a amostra como meritória. O teste de Bartlett confirmou a adequação da amostra (chi square=6090,569; df=1170;sig= 0,000). No entanto, a análise do gráfico screeplot, bem como das cargas na matriz de fatores, revelou que esse número poderia ser reduzido. Assim, foi conduzida análise fatorial confirmatória com quatro dimensões (afetiva, normativa, instrumental+custos acumulados, falta de alternativas) partindo dos resultados obtidos em Blau (2003). O modelo proposto obteve um bom ajuste, conforme revelou o teste (chi- square=2097,489; df=986, sig= 0,000).

Os itens da escala de Blau (1985) e da escala de comprometimento afetivo de Meyer, Allen e Smith (1993) foram aglutinados como pertencentes à mesma dimensão (afetiva). Os itens referentes à subescala de investimentos na carreira do entrincheiramento aglutinaram-se com o comprometimento instrumental como pertencentes à mesma dimensão (instrumental). A dimensão normativa apresenta alguma sobreposição com a afetiva, que foi documentada em diversos estudos, a exemplo de Morrow (1993), e também em alguns itens com a instrumental. Em relação aos achados de Blau (2003), a diferença está nos custos emocionais que, no modelo integrativo testado pelo autor, foi incluída na dimensão instrumental, e neste trabalho aglutinou-se à dimensão normativa. A razão para tal pode estar nos problemas apontados por Blau (2003) para essa subescala, como a falta de especificação dos tipos de custos emocionais envolvidos, como foi feito na subescala de investimentos. Além disso, não pode ser descartado que a tradução para o português possa ter agravado esse quadro.

O resultado para o item 9 da subescala de resiliência de Carson e Bedeian (1994) - os custos associados com a carreira parecem altos - apresentou uma carga negativa na dimensão normativa e positiva na afetiva, merecendo investigação futura. A falta de alternativas de carreiras correspondeu à quarta dimensão, separada das demais, comprovando a terceira hipótese, conforme mostra a Tabela_5.

3.5. Revisão das relações das variáveis estudadas Após o estudo das variáveis do entrincheiramento e do comprometimento, foram gerados novos indicadores a partir dos itens que formam uma determinada dimensão, e calculadas novamente as correlações deles com desempenho. Os resultados encontrados estão listados na Tabela_6.

Esses resultados demonstram que a falta de alternativas de carreira apresenta relação negativa e significativa com o desempenho (r=-0,269) na amostra estudada. Isso sugere que os indivíduos que não percebem alternativas para sua carreira tendem a ter um desempenho pior até do que aqueles que possuem comprometimento instrumental com a carreira, segundo a avaliação do superior hierárquico. A natureza das relações da base instrumental e da falta de alternativas com desempenho coincide, apontando para maior aproximação entre esses dois fatores.

4. DISCUSSÃO A análise fatorial apresentada anteriormente sugere, à primeira vista, que a dimensão falta de alternativas do entrincheiramento seria uma quarta dimensão do comprometimento. Esse ponto de vista é defendido por Blau (2003). No entanto, questiona-se: seria a ausência de alternativas uma base para que os indivíduos se sintam comprometidos com sua carreira? Não estaríamos incorrendo no que Osigweh (1989) caracteriza como "esticamento de conceito"? Para esse autor, tal fenômeno ocorre nas ciências organizacionais quando conceitos são estendidos para aumentar sua aplicabilidade, ou explicar mais fenômenos empíricos. Não seria mais razoável pensar-se que a falta de alternativas contribui para que as pessoas se sintam aprisionadas (entrincheiradas) em suas carreiras? Outro ponto de discussão refere-se à base instrumental, que apresenta comportamento diverso do das demais bases do comprometimento. Especificamente em relação ao desempenho, essa diferença foi observada em estudos com foco na organização (MEYER et al., 1989; MEYER et al., 2002; RIKETTA, 2002) e no presente estudo. Será que, em vez de propor a integração, não se deveria reconstruir o pensamento hegemônico sobre o comprometimento que atualmente inclui bases antagônicas? Considerando que a base instrumental tem sido apontada como a antítese da base afetiva, não seria mais razoável pensar em sua integração ao construto do entrincheiramento, uma vez que sobreposição clara entre ela e a dimensão investimentos na carreira? Bedeian (2002) aponta a necessidade de realizar comparações do entrincheiramento com outros construtos. Nesse sentido, a comparação com o desempenho revela que sua natureza é oposta ao esperado para o comprometimento de base afetiva e coincidente com o comprometimento de base instrumental. Isso reforça a sugestão de integração dessa última ao entrincheiramento, tornando- o bidimensional: uma dimensão instrumental, referente aos investimentos na carreira (ou percepção de sacrifício), e uma dimensão de falta de alternativas.

Em relação aos custos emocionais, os resultados encontrados neste estudo diferem daqueles apresentados por Blau (2003). Ainda assim, a fragilidade dos itens dessa escala, conforme apontada pelo autor, é comprovada pela disparidade dos resultados. Essa constatação responde à demanda de Bedeian (2002) por estudos com foco nessa questão. Dessa forma, são sugeridos dois caminhos possíveis: retirar esses itens ou reconstruir a escala especificando os custos emocionais.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS No presente estudo pretendeu-se contribuir para o desenvolvimento de pesquisas sobre vínculos com a carreira, a partir da reflexão sobre as propostas de delimitação entre os conceitos de comprometimento e entrincheiramento. Para tal, exploraram-se as relações entre o entrincheiramento e o comprometimento com a carreira e o desempenho, respondendo às preocupações de Goulet e Singh (2002) de que a pesquisa sobre comprometimento no trabalho tem focado mais em consequentes de cunho negativo, como turnover ou intenção de saída. Colaborou- se, ainda, para o entendimento de como esses vínculos podem ser considerados para prever o comportamento nas organizações.

A primeira hipótese previa relações positivas entre o entrincheiramento e o comprometimento instrumental, como de fato foi verificado, e negativas entre a base afetiva e esses vínculos, que não foram confirmadas. Tal resultado é uma evidência de sobreposição entre o entrincheiramento e o comprometimento instrumental, e um indicador de que esse tipo de vínculo pode coexistir com aquele de natureza afetiva.

A segunda hipótese previa relações negativas e significativas entre o desempenho e os vínculos de entrincheiramento e o comprometimento instrumental.

Foram encontradas relações negativas e significativas entre o desempenho relatado pelo superior e o vínculo de entrincheiramento, mas não houve relação significativa com a base instrumental. Também foram fracas ou não significativas as relações encontradas entre comprometimento com a carreira e desempenho. Esse mesmo resultado foi encontrado em Scheible (2004) e sugere que os indivíduos cujo foco principal de comprometimento é a carreira tendem a ser avaliados de forma negativa por seus superiores hierárquicos. Esses resultados coadunam, ainda, os estudos que atribuem à natureza do comprometimento o tipo de relação estabelecida com o desempenho. Diante dessas diferenças, foi questionado se o comprometimento de base instrumental deve fazer parte do comprometimento ou se deve ser integrado ao entrincheiramento.

Por fim, a análise da dimensionalidade do comprometimento com a carreira atestou a sobreposição da dimensão investimentos na carreira do entrincheiramento com a base instrumental do comprometimento com a carreira. a dimensão custos emocionais sobrepôs-se à base normativa. A dimensão falta de alternativas de carreira, conforme previsto pela terceira hipótese do estudo, representou algo à parte do comprometimento com a carreira.

Os resultados encontrados apontam para uma relação negativa dessa dimensão com o desempenho conforme avaliado pelo superior hierárquico. Dessa forma, levanta- se a possibilidade de reconstrução da abordagem multidimensional do comprometimento com a carreira. Propõe-se reformular o entrincheiramento a partir da integração da base instrumental, ficando o comprometimento apenas com os aspectos afetivos e normativos. O objetivo dessa proposta é separar o querer (gostar) do precisar (ter de), delimitando comprometimento como algo positivo ao retirar os aspectos que lhe conferiam caráter negativo. A dimensionalidade do entrincheiramento na carreira, a princípio baseada em duas vertentes, permanece em aberto em função da necessidade de mais estudos sobre custos emocionais.

Existem algumas limitações neste trabalho que precisam ser apontadas. Uma delas diz respeito ao perfil dos respondentes, que é muito homogêneo por abranger trabalhadores com alto nível de escolaridade. Embora o desempenho dos trabalhadores tenha sido aferido a partir de medidas quantitativas, a subjetividade envolvida no processo permite que variáveis não mensuradas - como empatia, conflitos etc. - atuem como intervenientes nas relações encontradas entre os vínculos investigados e o desempenho. Nesse caso, a possibilidade de considerar o desempenho autorrelatado e aquele avaliado pelo superior foi uma forma de monitorar essa limitação. A ferramenta estatística utilizada, o SPSS, também impôs limitações, pois não possui recursos mais avançados para a realização de uma análise fatorial mais sofisticada, não sendo possível obter índices de ajuste do modelo mais precisos. A falta de sincronismo entre a coleta dos indicadores de desempenho e as demais variáveis resultou em diminuição relevante da amostra ao examinar esses dois aspectos.

Apesar dessas limitações e do fato de ser um estudo de caso, este trabalho abre possibilidade para continuação da pesquisa sobre o comprometimento com a carreira e o entrincheiramento no Brasil. Um ponto forte é que foram utilizadas medidas diversas para o mesmo conceito, o que possibilitou uma análise comparativa. Trabalhos futuros podem partir dos questionamentos levantados e pesquisar as relações do comprometimento e do entrincheiramento com outros antecedentes e consequentes, bem como abordar outros focos, a exemplo da organização. Outras amostras precisam ser coletadas para validar os resultados obtidos, bem como definir se os custos emocionais devem ser revisados ou eliminados.


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