Avaliação de empresas e probabilidade de negociação com informação privilegiada
no mercado brasileiro de capitais
1. INTRODUÇÃO
Um dos papéis da contabilidade, e da informação dela provinda, é possibilitar a
redução da assimetria de informação entre os diversos agentes econômicos. Esse
fenômeno é reflexo da separação entre a gestão das atividades da empresa e sua
propriedade, abrindo espaço para conflitos de agência (Jensen & Meckling,
1976), em que os agentes internos tentam maximizar a própria utilidade,
acabando por expropriar os ganhos dos agentes externos, com menos acesso às
informações sobre a firma.
Dentre os diferentes problemas derivados da teoria agência, como a expropriação
de riqueza dos agentes externos por parte dos agentes internos, destacam-se
aqueles mais específicos às companhias abertas. Observa-se que a assimetria de
informação pode levar à redução da liquidez no mercado de capitais (Bharath,
Pasquariello & Wu, 2009) e ao aumento do custo do capital próprio das
companhias (Brennan & Subrahmanyam, 1996), o que pode implicar má formação
do preço dos ativos (Fields, Lys & Vicent, 2001) das empresas que têm seus
títulos negociados sob o efeito da assimetria informacional.
Nesse contexto, a base neste estudo é a hipótese de mercado eficiente (HME),
difundida por Fama (1970), em sua forma semiforte, uma vez que tem como base
uma avaliação estruturada em números contábeis. Para isso, pressupõe-se que as
negociações baseadas em informações privilegiadas possam fornecer sinais aos
investidores para suas tomadas de decisões (Grossman & Stiglitz, 1980).
Segundo a HME, as informações publicamente disponíveis são de imediato
incorporadas ao preço da ação (Fama, 1970). Assim, pode-se esperar que as
empresas que tenham ações negociadas sob o impacto de informações privilegiadas
tenham sua avaliação enviesada, pois tais informações podem proporcionar
vantagens a seus portadores, ou insiders, influenciando suas avaliações e
decisões de investimento. Assim, é razoável esperar que as informações
contábeis afetem significativamente a avaliação das companhias(*) (Fama, 1970),
bem como as negociações baseadas em informações privadas (Grossman &
Stiglitz, 1980).
De acordo com Camargos e Barbosa (2003), no mercado brasileiro de capitais há
evidências somente para a forma semiforte da HME. Além disso, Barbedo, Silva e
Leal (2009) alertam que o uso de informação privilegiada na negociação de
ações, também conhecido como insider trading, é uma prática que costuma
acontecer nos países da América Latina e sua ocorrência faz com que o
investidor evite investir nesse mercado ou nesse ativo, com receio de ser
prejudicado na transação. Além desses autores, Martins, Paulo e Albuquerque
(2013) identificaram a probabilidade de terem ocorrido negociações com
informação privilegiada (PIN) no mercado brasileiro de capitais. Esses últimos,
sobretudo, verificaram que há uma relação positiva e significante entre a PIN e
o retorno das ações. Por essa razão, justifica-se a realização de um estudo que
investigue o reflexo dessa assimetria de informação na avaliação de empresas.
Nesse sentido, uma vez que a assimetria de informação pode influenciar a
estimativa do valor de um ativo, causando prejuízos aos demais agentes, que não
aqueles de informação privada, é razoável considerar que os modelos de
avaliação de empresas que não incluem uma estimativa dessa assimetria não
capturem satisfatoriamente os fatores determinantes do valor da firma. Assim,
uma das justificativas para a elaboração desta pesquisa está em contribuir com
os modelos de avaliação de empresas, buscando evidenciar que a assimetria
informacional tem impacto significativo no processo de mensuração do valor das
firmas, devendo ser considerada nesse processo.
Considerando a larga utilização e validação do modelo de avaliação de empresas
de Ohlson (1995) nas literaturas nacional e internacional (Dechow, Hutton &
Sloan, 1999; Lopes, 2001; Swartz, Swartz & Firer, 2006), especialmente na
área de value relevance, neste estudo o objetivo é investigar a influência da
assimetria de informação na avaliação de empresas no mercado brasileiro de
capitais por meio do modelo de Ohlson (1995). Assim, questiona-se qual a
relação entre a assimetria de informação existente na negociação de ações e a
avaliação de empresas no mercado brasileiro de capitais.
Nesse sentido, o trabalho está organizado em cinco seções. Além desta
introdução, na segunda seção apresenta-se uma revisão de literatura que aborda
a HME e os modelos de avaliação de empresas de Ohlson (1995) e de mensuração de
assimetria de informação de Easley, Hvidkjaer e O'Hara (2002). Na terceira, são
apresentados os procedimentos metodológicos, desde a coleta e a análise dos
dados até a operacionalização desses modelos. Na quarta seção, são apresentados
os principais resultados e, na última, as considerações finais do trabalho.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. Hipótese de mercado eficiente e teoria da agência
O papel principal do mercado de capitais é a alocação dos recursos entre os
agentes superavitários e os agentes deficitários (Fama, 1970), ou seja, entre
aqueles que precisam de recursos para seus projetos e aqueles que possuem
capital excedente à procura de investimento. Para que haja essa transferência
de recursos, é necessário que o mercado sinalize se os investidores devem ou
não alocar seus recursos em determinada companhia. Para isso, os preços dos
títulos devem refletir todas as informações sobre as empresas, imediatamente
após sua disponibilização para o público em geral. Quando todas essas
informações disponíveis são absorvidas e refletidas nos preços das ações dessas
firmas, diz-se que o mercado é eficiente.
Esse modelo de mercado de capitais, em que as informações são divulgadas
simetricamente para todos os usuários e imediatamente absorvidas pelos preços
das ações das firmas, tem algumas condições para seu funcionamento, quais
sejam: que não existam custos de transação nas negociações; que todas as
informações disponíveis sejam gratuitas para todos os participantes do mercado;
e que todos os investidores concordem com as implicações das informações
correntes nos preços correntes dos ativos (Fama, 1970). Contudo, por ser um
modelo teórico, é de esperar-se que nem todas essas condições sejam satisfeitas
simultaneamente. Sobre isso, Grossman e Stiglitz (1980) argumentam que, se
todas as informações fossem disponibilizadas de forma gratuita, não haveria
incentivos para negociar com informações privilegiadas (pois elas não
existiriam), porque todos os investidores teriam acesso às mesmas informações.
Na literatura de finanças, evidências empíricas ratificam o argumento de
Grossman e Stiglitz (1980), a exemplo de Easley, Kiefer e O'Hara (1997), Easley
et al. (2002), Barbedo et al. (2009) e Martins et al. (2013). Com isso, pode-se
observar que a ocorrência de utilização de informações privadas na negociação
de ações pode proporcionar aos insiders a obtenção de um retorno anormal
(Medeiros & Matsumoto, 2006), ou seja, maior rentabilidade nos negócios com
ações por parte dos investidores que têm acesso privilegiado às informações,
contrariando algumas das condições supracitadas, o que, segundo Fama (1970),
não invalida isoladamente a HME.
No âmbito das negociações de ações no mercado de capitais, nota-se que a
possibilidade de atuar nesses mercados, comprando e vendendo suas participações
nas empresas por meio de títulos mobiliários, tem desvinculado o investidor da
administração das firmas. Isso tem promovido a separação entre a propriedade e
o controle do capital das empresas, o que, segundo Jensen e Meckling (1976),
tem dado espaço à formação de conflitos de interesses entre o principal
(investidor) e o agente (gestor), o que pode fundamentar a existência de
agentes no mercado negociando com informações privadas. Nesse sentido, Jensen e
Meckling (1976) destacam que a relação entre acionistas e gestores de uma
firma, ou mesmo entre seus acionistas majoritários e minoritários, enquadra-se
na definição de uma relação de agência, com problemas associados à separação
entre propriedade e controle, em que um grupo pode tentar obter vantagens para
si com o uso indevido de informações privadas.
Dessa forma, considerando as evidências empíricas existentes, percebe-se que
alguns dos problemas conceituais da HME podem estar relacionados à
desconsideração de pesquisas teóricas e empíricas sobre o equilíbrio das
expectativas racionais em um ambiente de informação assimétrica (Leroy, 1989),
de modo que nesse ambiente um dos pressupostos básicos da HME não pode ser
assumido: todos os investidores concordam com as implicações das informações
correntes nos preços dos ativos, pois alguns investidores têm acesso
privilegiado às informações e outros não. Esse pressuposto não é assumido por
Grossman e Stiglitz (1980), que afirmam que as negociações dos insiders podem
fornecer conteúdo informativo aos demais participantes do mercado de capitais.
Com base nisso, e devido à possibilidade de atuação dos insiders no mercado
brasileiro de capitais, é relevante a análise da relação entre a assimetria de
informação e a avaliação de empresas, tendo em vista que a assimetria de
informação pode afetar a valoração ou precificação das empresas.
2.2. Avaliação de empresas
2.2.1. O modelo de Ohlson (1995)
O processo de avaliação de empresas, na visão de Martins (2006), consiste em
alcançar seu valor justo de mercado, ou seja, aquele que representa, de modo
equilibrado, o potencial econômico de determinada companhia. Para Martelanc,
Pasin e Pereira (2010), esse valor justo também é estabelecido pelo processo de
avaliação e é representado pelo valor potencial de um negócio em função de sua
expectativa de geração de resultados futuros.
Na literatura de finanças, é possível observar a existência de inúmeros modelos
de avaliação de empresas que buscam estimar o valor das companhias. As
diferenças entre esses modelos normalmente consistem na abrangência das
informações que eles utilizam para realizar essa estimativa e em sua
aplicabilidade. Entre os mais comuns, citam-se aqueles baseados em dividendos,
em valor presente dos fluxos de caixa futuros, em múltiplos de mercado e em
informações contábeis.
Entre eles, destaca-se o modelo de avaliação de empresas de Ohlson (1995),
especialmente no que concerne ao value relevance dos números contábeis. A
partir desse modelo, baseado em números contábeis e em outras informações que
não afetam a contabilidade, pesquisadores, profissionais e investidores puderam
ter acesso a uma metodologia de avaliação diferente daquelas apresentadas até
então, citadas anteriormente. Seu principal diferencial foi a abertura de novas
perspectivas para melhorar a predição e a explicação dos retornos das ações
(Bernard, 1995), afora ser mais completo do que os outros modelos clássicos
(Frankel & Lee, 1998), por levar em consideração números contábeis e outras
informações, que não contábeis. No Brasil, essa metodologia foi inicialmente
discutida por Lopes (2001).
O modelo de Ohlson (1995) é suportado por três premissas básicas: valor
presente dos dividendos esperados (present value of expected dividends ' PVED);
lucro limpo (clean surplus relation ' CSR); e um modelo linear que define o
comportamento estocástico dos lucros residuais futuros. O PVED é expresso
conforme a Equação [1].
em que Pt é o valor de mercado da companhia no tempo IMG são os dividendos
líquidos dos aportes de capital no tempo t; Rf é uma taxa livre de risco mais
uma unidade; e IMG é o operador matemático do valor esperado, condicionado
pelas informações no tempo t. Cabe ressaltar que os aportes de capital podem
assumir valores negativos, quando as captações forem maiores que os dividendos
pagos.
A Equação [2] define o lucro limpo (CSR), que garante que todas as alterações
nos ativos ou passivos, que não sejam transações entre a entidade e seus
acionistas, devem transitar pelo resultado do exercício.
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm02.jpg]
em que Yt é o patrimônio líquido da entidade no tempo t; Yt-1 é o patrimônio
líquido da entidade no tempo t-1; xt é o lucro do período; e dt são os
dividendos pagos no período.
A expressão matemática da última premissa é definida nas Equações [3a] e [3b].
A dinâmica informacional linear (DIL) é utilizada na predição do lucro
residual, ou anormal, com base no lucro residual do ano corrente mais uma
variável escalar, denominada de outras informações, e um termo de erro.
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm03.jpg]
em que [/img/revistas/rausp/v49n3/a03img01.jpg] é o lucro residual esperado no
futuro; [/img/revistas/rausp/v49n3/a03img03.jpg] é o lucro residual
contemporâneo; vt é uma variável escalar que resume todas as outras informações
que poderão impactar a avaliação da empresa; [/img/revistas/rausp/v49n3/
a03img02.jpg] são as outras informações esperadas para o futuro; e w e y são os
parâmetros de persistência do lucro residual e das outras informações,
respectivamente, fixos e conhecidos, não negativos e menores do que 1.
O lucro residual, como evidenciado nas equações acima, é relevante para a
avaliação das companhias, segundo o modelo de Ohlson (1995), e expresso
conforme a Equação [4].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm04.jpg]
em que [/img/revistas/rausp/v49n3/a03img03.jpg] é lucro residual; xt é o lucro
do período; r é uma taxa de juros livre de riscos; e yt-1 é o patrimônio
líquido do início do período. Com isso, infere-se que o lucro residual é a
diferença entre o lucro do exercício e a remuneração do capital próprio da
entidade, a uma taxa livre de riscos.
A terceira variável considerada nesse modelo, afora lucro residual e patrimônio
líquido, é o que Ohlson (1995) chamou de outras informações que possam afetar
os lucros esperados futuros, sendo representada por vt. A não consideração
dessa variável no modelo reduz seu conteúdo empírico. Para esta pesquisa, foram
utilizadas como outras informações duas proxies de assimetria de informação: a
probabilidade de ocorrência de um evento informacional (α) e a probabilidade de
negociação com informação privilegiada (PIN). Com isso, chega-se ao modelo de
mensuração do valor das empresas (pt) baseado em números contábeis e em outras
informações, proposto por Ohlson (1995), como explicita a Equação [5].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm05.jpg]
em que pt é o valor da empresa com base em seu patrimônio líquido (yt), lucro
anormal ([/img/revistas/rausp/v49n3/a03img03.jpg]) e o efeito das outras
informações (vt) que podem influenciar o lucro e os resultados das firmas no
futuro, sendo α1 e α2 os parâmetros do modelo obtidos por meio das Equações
[5a] e [5b].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm5a.jpg]
em que ω é o parâmetro de persistência do lucro residual, λ é o parâmetro de
persistência de outras informações, ambos definidos pelo meio econômico ou
princípios contábeis, e Rf é uma taxa livre de risco. Ohlson (1995) não deu
muitas informações sobre como obter esses parâmetros de persistência do modelo,
dizendo apenas que eram conhecidos pelo mercado (Ohlson, 2001); porém, Dechow
et al. (1999) utilizaram uma metodologia considerada por Ohlson (2001) como a
melhor para a estimação do modelo.
Dechow et al. (1999) avaliaram o modelo teórico por meio da DIL nas empresas
que negociaram valores mobiliários nos Estados Unidos da América, no período de
1976 a 1995, e encontraram que o parâmetro do resultado anormal (ω) e das
outras informações (λ) foi de 0,62 e 0,32, respectivamente, corroborando o
intervalo teórico proposto por Ohlson (1995). O modelo utilizado, sem a
presença da previsão dos analistas (vt), obteve poder explicativo de 0,40; com
a inclusão da outra variável (outras informações), passou para 0,69, aumentando
seu poder explicativo.
Os achados de Dechow et al. (1999) foram limitados pela taxa livre de risco
(Rf) utilizada de forma idêntica para todas as empresas durante todo o período
analisado (12%), e pela deflação da variável outras informações pelo valor de
mercado, o que faz com que os resultados anormais futuros dependam dos valores
de mercado futuros das empresas. Neste trabalho, além de usar-se uma variável
outras informações diferente da utilizada nos trabalhos anteriores, considera-
se um custo de capital específico para cada ano e utiliza-se como deflator das
variáveis a quantidade de ações, não vinculando os resultados futuros ao valor
de mercado das firmas.
2.3. Mensuração da assimetria de informação: o modelo EHO (2002)
A probabilidade de negociação com informação privilegiada (PIN) é o resultado
da mensuração da assimetria de informação existente no mercado de capitais e
investigada a partir dos dados de microestrutura do mercado, isto é, dados
relativos ao processo e aos efeitos da negociação das ações. A PIN é estimada
por um modelo de negociação sequencial desenvolvido por Easley et al. (2002),
doravante denominado modelo EHO, com base nos trabalhos teóricos de Easley e
O'Hara (1987; 1992). O modelo EHO parte da premissa de que as operações de
compra e venda de ações ocorrem por consequência das decisões tomadas por
negociadores portadores (ou não) de informações privilegiadas para identificar
a assimetria de informação nesse mercado.
O modelo EHO possui uma extensa utilização na literatura internacional (Easley
et al. 2002; Bopp, 2003; Abad & Rubia, 2005; Duarte & Young, 2009;
Albanez, 2008; Mohanram & Rajgopal, 2009). Nele, o ativo negociado tem um
valor no final do dia da negociação, que é representado pela variável V. A
ocorrência de um evento informacional (α) é representada pelo reflexo de um
sinal ψ sobre a variável V. Esse evento informacional pode assumir dois
valores: baixo (L) ou alto (H), com probabilidades δ e 1'δ, respectivamente. O
valor do ativo condicionado ao sinal de baixa indica má notícia e é dado por V;
similarmente, aquele condicionado ao sinal de alta indica boa notícia e é dado
por V. Por outro lado, eventos informacionais podem não ocorrer, indicando que
as novas informações podem não surgir durante o período de negociação.
Caso esse evento informação não ocorra, assume-se que ψ = 0 e que o valor do
ativo pode ser dado por V*=δV+(1-δ)[/img/revistas/rausp/v49n3/v8_barra.jpg].
Assim, a probabilidade de que um evento informacional tenha ocorrido é dada por
α, com 1-α correspondente à probabilidade de que não tenha ocorrido nova
informação nesse período (Easley et al., 1997). Com esse pressuposto, é
possível desenhar a estratégia de negociação do modelo EHO: se um negociador
informado observar um sinal de alta, vai comprar as ações se a cotação atual
estiver abaixo de [/img/revistas/rausp/v49n3/v8_barra.jpg]; se observar um
sinal de baixa, ele vai vender se a cotação estiver acima de V. Já o
comportamento do negociador desinformado é mais complexo, tendo em vista que
negocia apenas com informações públicas e com suas convicções pessoais.
Dessa forma, a estrutura de uma negociação é baseada em quatro parâmetros que
fundamentam a relação entre a informação, quando boa ou má, e sua probabilidade
de influência na negociação. O primeiro parâmetro evidencia a probabilidade de
ocorrência de um evento informacional durante a negociação (α); o segundo
determina o tipo de sinal desse evento (δ para sinal de baixa e 1-δ para sinal
de alta); o terceiro reflete a taxa de chegada de ordens de negociadores
informados (µ); e o último, a taxa de chegada de ordens de negociadores
desinformados (sendo εb a taxa de compradores e εs a de vendedores
desinformados).
Esse modelo permite a utilização de dados observáveis, como o número diário de
compras e vendas de uma ação, para fazer inferências sobre informações de
eventos não observáveis, além da separação dos negócios entre negociadores
informados e desinformados. Para isso, o modelo interpreta o nível normal de
compras e vendas de uma ação como um negócio desinformado e utiliza esses dados
para identificar as taxas de chegada de ordens de compra (εb) e de venda (εs)
de negociadores desinformados. Um volume anormal de compras e vendas é
interpretado como uma negociação baseada em informação e é utilizado para
identificar a chegada de negociadores informados (µ), enquanto o número de dias
em que o volume é anormal é utilizado para identificar a probabilidade de
ocorrência de um evento baseado em informação (α) e a probabilidade de essa
informação ser uma má notícia (δ).
Evidentemente, o risco da ocorrência de negociação baseada em informação
envolve todos esses elementos de forma simultânea, estimados por uma inferência
bayesiana, com probabilidades condicionais dadas pelo teorema de Bayes. Sendo
assim, a probabilidade de negociação com informação privilegiada (PIN) pode ser
estimada por meio da Equação [6].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm06.jpg]
em que α é a probabilidade de ocorrer um evento informacional; µ é a taxa de
chegada de ordens de negociadores informados; εb é a taxa de chegada de ordens
de compradores desinformados; e εs é a taxa de chegada de ordens de vendedores
desinformados.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1. Tipo da pesquisa
Esta é uma pesquisa empírico-analítica, pois analisa-se o problema por meio da
relação de causa entre as variáveis utilizadas no estudo. Quanto ao método, a
pesquisa caracteriza-se, ainda, como sendo hipotético-dedutiva, pois inicia-se
pela percepção de uma lacuna nos conhecimentos, acerca da qual se formula o
problema, e pelo processo de inferência dedutiva testa-se a predição da
ocorrência de fenômenos abrangidos por ele (Marconi & Lakatos, 2009).
3.2. Amostra da pesquisa
Considerando os pressupostos do modelo EHO, definidos da seção 2.3, a amostra
deste estudo foi composta por ações de empresas de capital aberto negociadas na
Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBovespa). Para
sua definição, com vista a evitar o problema de viés de seleção, foram
coletados os volumes intradiários de negociação e as informações financeiras de
todas as ações negociadas durante o ano de 2011, a partir da plataforma de
negociação eletrônica CMA Series 4, do grupo CMA®, e do banco de dados da
Economática®, respectivamente. Apenas após a coleta de todos os dados
necessários, a amostra foi definida, composta por ações ativas e que tenham
apresentado pelo menos um negócio em cada um dos dias de negociação de 2011.
Esse procedimento foi adotado para garantir a robustez das estimativas da PIN
pelo modelo EHO. Com isso, a amostra contou com 198 ações de 178 empresas.
3.3. Coleta e tratamento dos dados
Para a utilização no modelo de Ohlson (1995), foram coletados dados trimestrais
relativos ao patrimônio líquido, ao lucro líquido e ao valor de mercado das
empresas, durante os anos de 2010 e 2011, por meio do banco de dados da
Economática®. Adicionalmente, foram coletados os dados referentes à taxa Selic,
utilizada como proxy para o custo do capital próprio, no site do Banco Central
do Brasil. O valor de mercado, especificamente, foi coletado dois meses após a
data de encerramento das demonstrações contábeis devido ao prazo dado pela
legislação brasileira para a publicação de resultados trimestrais.
O custo do capital próprio foi utilizado na estimação do lucro residual
(anormal), conforme a Equação [4]. Além disso, a Selic ainda foi utilizada para
o cálculo dos parâmetros α1 e α2, no modelo de avaliação de empresas de Ohlson
(1995), conforme as Equações [5a] e [5b]. As demais variáveis, bem como a PIN,
foram utilizadas nas Equações [3a], [3b] e [5].
No que diz respeito à estimação dos parâmetros do modelo EHO, foram coletados
os volumes intradiários de negociação das ações integrantes da amostra para
todos os dias nos quais houve negociação durante os quatro trimestres de 2011,
em alta frequência, minuto a minuto. Esse intervalo temporal é consistente com
Easley et al. (1997), que observam que uma janela de negociação de 60 dias já é
suficiente para permitir uma estimativa precisa desses parâmetros. Sendo assim,
foi possível estimar a PIN para cada trimestre, tendo em vista que todos eles
possuem mais de 60 dias de negociação.
No modelo EHO, além de se conhecerem os preços e os volumes de transação de
cada negócio, foi necessário identificar se a transação foi disparada por um
agente comprador ou vendedor. Assim, como não existe, no Brasil, um banco de
dados (inclusive o do CMA) que identifique se os negócios intradiários partiram
de um agente comprador ou vendedor, as transações foram classificadas em compra
ou venda a partir do algoritmo de Lee e Ready (1991). Nesse método, o preço de
fechamento do ativo negociado é comparado à cotação média de compra e venda da
última transação e, se for maior do que essa cotação média, é classificado como
compra; analogamente, se for menor, como venda. Caso haja uma igualdade,
repete-se a classificação da transação anterior.
O método de classificação das negociações em compra e venda, com base no
algoritmo de Lee e Ready (1991), tem sido fortemente debatido na literatura
mais recente. Hwang, Lee, Lim e Park (2013) destacam a inconsistência do
método, o que leva à má classificação da operação, podendo comprometer a
estimação da PIN. Boehmer, Gramming e Theissen (2007) evidenciaram que a má
classificação das operações causa uma subavaliação da PIN e que o viés é mais
evidente com ações de baixa liquidez. Entretanto, esse método tem sido validado
em diversas pesquisas, como as de Lee e Radhakrishna (2000) no exterior, com
indicação de precisão de 93,0%, e, no Brasil, no de Silva (2009), com cerca de
72,0% de acerto.
3.4. Estimação dos parâmetros do modelo EHO
Após a classificação das transações em compras ou vendas pelo algoritmo de Lee
e Ready (1991), foram estimados os parâmetros do modelo EHO (α, µ, δ, εb e εs)
por meio de um modelo de negociação sequencial. Essa estimativa foi feita por
meio da maximização de uma função de máxima verossimilhança condicionada ao
histórico de negociação das ações. Dessa forma, com base no modelo estrutural,
a função de máxima verossimilhança é dada pela Equação [7].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm07.jpg]
em que B e S representam o volume de compras e vendas da ação i em um dia de
negociação t, respectivamente, e θ = (α, μ, δ, εb e εs) é o vetor de
parâmetros. Essa probabilidade é uma combinação de distribuições em que os
resultados das negociações são ponderados pela probabilidade de ser uma boa
notícia +a(1-δ) , uma má notícia +aδe ou de não haver notícia (1-α). Assim, a
imposição de condição de independência em dias de negociação estabelece a
função de verossimilhança por meio de I dias conforme a Equação [8].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm08.jpg]
em que Bi e Si são os dados do negócio para o dia i=1, ... , I e M=((B1, S1),
... , (BI, SI)) é o conjunto de dados. Assim, a maximização de (7) sobre θ, com
base nos dados M, determina a forma de estimar os parâmetros estruturais do
modelo (α, μ, δ, εb e εs).
3.5. O modelo Ohlson (1995)
Com base no modelo de Ohlson (1995), foi incluída a PIN e o α, conforme a
Equação [6], como proxy para a assimetria informacional (AI), avaliando seu
impacto no valor de mercado das empresas. A escolha do modelo ocorreu pelo fato
de ele já ter sido testado no mercado brasileiro de capitais e por possibilitar
a inclusão da assimetria de informação, que impacta a avaliação das empresas
(Grossman & Stiglitz, 1980). Dessa forma, buscou-se avaliar as empresas com
base apenas nos números contábeis, utilizando a Equação [5], porém, com valor 0
(zero) atribuído à variável , com o objetivo de comparar o R2 do modelo sem a
AI, como medida de value relevance, com o R2 obtido com a consideração da AI,
mensurado pela Equação [9].
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03frm09.jpg]
em que p é o valor de mercado da companhia i no tempot; y é o patrimônio
líquido da companhia i no tempo t; xª é o lucro anormal da companhia i no
tempo t; AI são as variáveis que capturam parte das outras informações (PIN ou
α) da companhia i no tempo t; ϕ é o novo vetor de outras informações, visto que
a AI não representa todas as outras informações; ε é o termo de erro da
regressão; e α1 ... 4 são os parâmetros do modelo.
A inclusão da variável δ se deu pelo fato de que a AI não pode ser considerada
como variável que resume todas as outras informações relacionadas à companhia.
Porém, nos testes realizados, apenas o patrimônio líquido, o lucro anormal e a
AI compõem o modelo.
Sendo significativa estaticamente, considera-se que a AI apresenta conteúdo
relevante para a avaliação das companhias. Adicionalmente, se o R2 ajustado com
a proxy para a assimetria da informação for significativamente maior do que o
R2 ajustado sem essa proxy, também se pode considerar que a AI melhora o
conteúdo informativo dos números contábeis, influenciando o processo de
avaliação dos ativos incluídos na amostra. Essa avaliação também ocorre por
meio dos critérios de Akaike e Schwars e do teste de Wald. Esse teste, por sua
vez, é avaliado por meio da estatística F, enquanto os dois outros critérios
são avaliados por meio de sua redução, ou seja, quanto menores os critérios,
maior a qualidade informativa do modelo.
4. RESULTADOS
4.1. Assimetria de informação no mercado acionário brasileiro
Por meio do modelo EHO, foi estimada a PIN para as ações das empresas
analisadas durante o ano de 2011, cujas estatísticas são apresentadas na Tabela
1. De acordo com os resultados, pode-se verificar que, durante esse período, a
probabilidade média de ocorrência de eventos informacionais (α) durante a
negociação das ações analisadas foi de aproximadamente 53,0%. Ademais, nota-se
que há, em média, 50,8% de chances de esses eventos informacionais possuírem um
sinal negativo, ou seja, indicarem más notícias (contra 49,2% de indicarem boas
notícias). Com base nisso, foi possível inferir uma PIN de 22,9% para essas
ações, demonstrando que há indícios de utilização de informação privilegiada na
negociação das ações analisadas.
A PIN média encontrada neste estudo é, por sua vez, condizente com a PIN média
de 23,9% estimada por Bopp (2003) para os American Depositary Receipt (ADR) de
empresas brasileiras negociados na New York Stock Exchange (NYSE), ratificando
a suposição do referido autor de que há evidências de assimetria de informação
no mercado acionário brasileiro. Por outro lado, ela é superior às evidências
de Barbedo et al. (2009) para 48 ações negociadas na BM&FBovespa, cuja PIN
média foi de 12,5%. Durante o período investigado, a menor PIN apresentada por
uma ação foi de 0,0%, sugerindo que não houve negociação com informação
privilegiada com essa ação durante esse trimestre, enquanto a maior PIN foi de
cerca de 67,4%, sugerindo que a maior parte dos negócios realizados com essa
ação, durante esse trimestre, foram baseadas em informação privilegiada.
Tomando como base a média, comparando-se os valores máximo, mínimo e o desvio
padrão, pôde-se perceber que a amostra relativa à probabilidade de utilização
de informações privilegiadas é heterogênea, visto que existe grande amplitude
entre os valores máximo e mínimo, e um desvio padrão relativamente alto. Isso
pode ser ocasionado pelo fato de que as informações privilegiadas podem ter
ocorrido, no período, para algumas empresas e para outras não, bem como em
algumas empresas os insiders podem ter tido menos motivações para utilizar
essas informações do que em outras.
Em se tratando das taxas de chegada de ordens de negociação, nota-se que a taxa
média de chegada de ordens de transação de negociadores informados (µ) foi de
aproximadamente 69,8, enquanto a taxa média de chegada de ordens de compradores
desinformados (εb) foi de 72,7 e a taxa média de chegada de ordens de
vendedores desinformados (εs) foi de 71,1. Esses valores indicam que, em dias
de negociação em que surgem eventos informacionais, o mercado é composto em sua
maioria por agentes informados. Por outro lado, em dias de negociação em que
não surgem eventos informacionais, o mercado apresentava um equilíbrio entre o
número de compradores e de vendedores sem informação privada, o que pode ser
considerado uma situação ideal para o bom funcionamento do mercado de capitais
(Easley et al., 2002).
4.2. Estatísticas descritivas do modelo de Ohlson (1995)
Na Tabela_2, evidenciam-se as estatísticas descritivas da amostra combinada
para os quatro trimestres de 2011, composta pelas 178 empresas da amostra.
Durante o período analisado, percebe-se que o lucro residual (LR) médio é
negativo, em torno de R$ 0,64, o que indica que, em média, as empresas não
criaram valor, remunerando o capital próprio com base na Selic, fato que é
corroborado pela mediana que indica que a maioria das empresas também não criou
valor, visto que ela foi negativa. O PL por ação foi, em média, positivo,
corroborando o trabalho de Cioffi e Famá (2010). A PIN média foi de 25,0%,
quando calculada a média em relação a cada empresa. Já quando estimada para o
período todo, ela foi de 22,9%. O baixo valor do lucro residual se dá pelo fato
de que as companhias da amostra não geraram lucros suficientes para cobrir o
custo do capital próprio. Sobre o LR, é importante notar que algumas companhias
geraram altos LR, o que pode ser observado diretamente por meio do desvio
padrão maior do que a média e dos valores máximo e mínimo. Isso implica dizer
que algumas companhias geraram lucros residuais anormais, o que é uma
importante informação ao mercado e possível fonte para informações
privilegiadas.
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A análise da correlação de Pearson, conforme evidenciada na Tabela_3, mostra
que o lucro residual está relacionado com o valor de mercado da companhia, como
deveria ser, conforme a estrutura de avaliação que Ohlson (1995) propõe. Em
contrapartida ao resultado anteriormente citado, a PIN mostrou-se
correlacionada com o valor de mercado da companhia, mesmo ao nível de
significância de 10%. Outro resultado que deve ser destacado com base na
correlação, é que a PIN é negativamente correlacionada com o LR. Com relação ao
α, que representa a probabilidade de surgimento de evento informacional, a
correlação de Pearson evidenciou que essa medida está positivamente
correlacionada com as demais medidas utilizadas nesta pesquisa.
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03tab03.jpg]
4.3. Análise do value relevance da assimetria informacional
Para testar a inclusão das variáveis proxies para assimetria da informação no
modelo de Ohlson (1995) e analisar sua influência no poder explicativo desse
modelo, foram feitas três estimações, uma do modelo sem a variável AI (PIN ou
α) e outra com a inclusão dessas variáveis, avaliando os três modelos pelo R2
ajustado e pelos critérios de Akaike e Schwars. (Tabela_4).
[/img/revistas/rausp/v49n3/a03tab04.jpg]
Na Tabela_4, os três modelos foram analisados e todas as variáveis contábeis
apresentaram-se significantes, ao nível de 1%, indicando que o conteúdo
informativo sobre o lucro residual persistente (LR) e o patrimônio líquido (PL)
possuem value relevance no processo de avaliação das empresas que compõem a
amostra deste estudo, conforme o modelo 1 (sem a variável AI). Quando se
observam as variáveis adicionais dos modelos 2 (com a PIN) e 3 (com o α),
apenas a variável α (a probabilidade de surgimento de evento informacional)
apresenta-se value relevant, ao nível de 1%.
Quanto à adição de conteúdo informativo por parte de α, pode-se considerar que
ele contribui com o incremento de value relevance ao modelo de avaliação de
empresas de Ohlson (1995), aumentando seu poder explicativo (R2 ajustado passou
de 0,445 para 0,457; aproximadamente, 2,5%). Esse incremento ainda pode ser
atestado por meio dos critérios informacionais de Akaike e Schwars, pois
diminuíram com a inclusão da variável α, aumentando a qualidade do modelo.
Adicionalmente, controlando a relação entre os segmentos de governança
corporativa no qual as empresas estão listadas, pôde-se constatar que apenas as
dummies relativas aos segmentos nível 1 e nível 2 apresentaram-se com
significância estatística, evidenciando que a segmentação das empresas pelos
níveis de governança auxilia sua avaliação. Dessa forma, optou-se por analisar
os segmentos de governança corporativa de forma separada, estimando os mesmos
modelos (1, 2 e 3) para os segmentos nível 1, nível 2, novo mercado e o
tradicional. Barbedo et al. (2009), que avaliaram a probabilidade de
negociações com informações privilegiadas de forma comparativa entre os índices
de governança corporativa, afirmam que a liquidez do nível 1 e do mercado
tradicional são semelhantes, assim como a liquidez do nível 2 e do novo
mercado. Sendo assim, na Tabela_5 são apresentados esses pares de segmentos
diferenciados de governança corporativa, para facilitar a comparação em relação
à liquidez.
Teoricamente, o mercado tradicional possui quantidade e/ou qualidade
informacional mais baixa e maior chance de ocorrerem expropriações da riqueza
dos investidores. Em decorrência, é de esperar-se que a probabilidade de
ocorrerem eventos com informações privilegiadas (α) e a probabilidade de esses
eventos gerarem negociações com essas informações (PIN) possuam conteúdos
informativos mais relevantes no mercado tradicional do que nos demais, uma vez
que o volume de informações divulgadas pelas companhias listadas nesse segmento
tende a ser menor, de modo que a atuação de agentes com informações
privilegiadas possa sinalizar novas informações ao mercado, segundo a teoria de
Grossman e Stiglitz (1980), e como têm demonstrado alguns estudos empíricos
(Jaffe, 1974; Aslan, Easley, Hvidkjaer & O'Hara, 2011; Lei & Wang,
2012; Tavakoli, McMillan & McKnight, 2012).
Dessa forma, era de esperar-se que o conteúdo informativo adicional das proxies
para assimetria informacional fosse mais relevante no mercado tradicional e
menos relevante no novo mercado, uma vez que as empresas listadas nesse
segmento utilizam práticas diferenciadas de governança corporativa, fornecendo
mais informações do que as listadas no primeiro grupo.
Quando se comparam os resultados do nível 1 com o tradicional, pode-se perceber
que, de fato (Tabela_5), as proxies utilizadas para a assimetria informacional
têm conteúdo informativo mais relevante no mercado tradicional, o que é
demonstrado por meio dos coeficientes e de sua significância estatística. No
nível 1, nenhuma proxy apresentou value relevance, enquanto no tradicional a
variável α (probabilidade de surgimento de evento informacional) apresentou
value relevance, aumentando o poder explicativo do modelo 1 em aproximadamente
10,32%. Já no nível 2 e no novo mercado, a variável α também se mostrou
estatisticamente significativa, com sinal positivo, indicando que a assimetria
informacional adiciona conteúdo informativo relevante ao processo de avaliação
das empresas.
Contudo, confirmando o que era esperado inicialmente, o conteúdo informativo
adicional da assimetria informacional é mais evidente no mercado tradicional,
aumentando o ajustamento do modelo em 10,32% (de 0,309 para 0,341), enquanto o
R2 ajustado do nível 2 e do novo mercado aumentou aproximadamente 1,60% (de
0,700 para 0,711) e 1,71% (de 0,497 para 0,505), respectivamente.
Adicionalmente, observa-se que as informações contábeis contidas nas amostras
do nível 1, do nível 2 e do novo mercado explicam melhor as variações no valor
de mercado das companhias desses segmentos do que as informações das companhias
que fazem parte do mercado tradicional. No modelo 1, as amostras com as
empresas listadas nos segmentos diferenciados de governança, N1, N2 e NM,
tiveram um R2 ajustado, respectivamente, de 0,536, 0,701 e 0,497, enquanto o
referido coeficiente da amostra do mercado tradicional foi de 0,309. Assim,
esses resultados sugerem que, as informações contábeis têm maior conteúdo
informacional nas empresas que possuem as melhores práticas de governança
corporativa.
A inclusão de uma proxy para assimetria de informação baseada em métricas de
mercado melhora o poder explicativo do modelo de avaliação da firma do mercado
tradicional (R2 ajustado = 0,341), porém, ainda fica muito abaixo dos
parâmetros estimados para os demais segmentos do mercado (todos com R2 ajustado
acima de 0,5). Ainda é importante ressaltar que ambos os parâmetros de
persistência estimados (apesar de só um ter apresentado significância
estatística) estão dentro do intervalo teórico proposto por Ohlson (1995),
sendo não negativos e menores que uma unidade.
Os resultados desta pesquisa estão em consonância com o que estabelece a teoria
de Grossman e Stiglitz (1980) de que as informações privilegiadas possuem
conteúdo informativo adicional relevante para a tomada de decisão dos
investidores, uma vez que foi constatado um aumento significativo de value
relevance nos modelos, por meio do R2 ajustado, principalmente com relação ao
mercado tradicional.
Dentre as implicações desses resultados para o mercado de capitais, pode-se
destacar que os fatos relevantes ainda não divulgados são utilizados pelos
agentes informados do mercado, haja vista a alta PIN encontrada. Como há
evidências da utilização de informações privadas diretamente pelos agentes
informados e indiretamente pelos agentes não informados (significância do α nos
modelos analisados), os participantes do mercado podem traçar estratégias de
investimentos baseadas nos movimentos anormais, que podem ser resultado da
utilização de inside information.
A utilização de inside information, indiretamente, para a tomada de decisão dos
investidores outsiders não é uma estratégia nova, visto que há evidências sobre
o conteúdo informativo das negociações dos insiders desde a década de 1960,
pelo menos. Rogoff (1964) encontrou que, em média, seis meses após a negociação
do insider, essa operação poderia render retornos até 9,5% superiores à média
do mercado, o que não corrobora Wu (1963), que não encontrou significância
estatística nas negociações dos insiders, porém com base em apenas um mês. Como
o presente artigo utilizou dados trimestrais, as evidências aqui apresentadas
corroboram o que foi encontrado por Rogoff (1964) e Jaffe (1974), o que pode
indicar que os insiders negociam com base em informações privadas antecipando
as divulgações de fatos relevantes nos meses posteriores, fazendo com que os
preços das ações reflitam essas informações antecipadamente, conforme Grossman
e Stiglitz (1980).
Outra implicação que se deve destacar está relacionada aos níveis diferenciados
de governança corporativa, que objetivam assegurar maior transparência às
atividades da empresa de modo a proteger as partes interessadas (Shleifer &
Vishny, 1997), desse modo a assimetria informacional deverá ser reduzida
conforme a melhoria das boas práticas de governança corporativa.
Sobre a assimetria informacional, os resultados apontam para um impacto maior
no R2 ajustado do modelo da amostra do mercado tradicional, com empresas que
não têm práticas diferenciadas de governança corporativa, após a inclusão do α.
Essa situação também é influenciada pelo maior poder explicativo das variáveis
contábeis nos níveis mais altos de governança corporativa. Esse resultado
corrobora o trabalho de Malacrida e Yamamoto (2006), que encontraram que as
práticas diferenciadas de evidenciação causam diferenças na volatilidade dos
preços das ações, o que é resultado da assimetria informacional (Halov &
Heider, 2011).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente trabalho, o objetivo foi averiguar a influência da assimetria
informacional na avaliação de empresas do mercado brasileiro de capitais por
meio do modelo de Ohlson (1995). Como resultado, observaram-se evidências de
utilização de informação privilegiada na negociação de ativos no mercado
brasileiro de capitais, na margem de 22,9%, indicando haver assimetria de
informação entre os participantes desse mercado. Sendo assim, buscou-se inserir
a assimetria no processo de avaliação de empresas no mercado brasileiro com o
objetivo de verificar se ela influencia a valoração dessas firmas.
Os resultados deste estudo indicam que a assimetria informacional tem maior
conteúdo informativo adicional na avaliação das empresas listadas no mercado
tradicional do que nos segmentos de governança corporativa diferenciada, o que
é justificado pelo maior volume de informações reportadas exigidas pelas firmas
que participam desses segmentos. Esse resultado, apesar de ter sido relevante
somente com a inclusão da proxy para a probabilidade de surgimento de evento
informacional (α), e não com a PIN, apresenta evidências que comprovam a teoria
de Grossman e Stiglitz (1980), segundo a qual os preços dos ativos com risco
são mais informativos na medida em que as informações privilegiadas estão sendo
utilizadas.
A assimetria de informação é um tema largamente investigado na literatura
internacional. No Brasil, é reduzido o estudo dessa assimetria no mercado de
capitais, principalmente em se tratando da utilização de um modelo para
mensurá-la. Dessa forma, a principal contribuição deste estudo é a utilização
de um método de mercado (o modelo EHO) no Brasil, apresentando evidências
empíricas sobre a existência de negociação com informação privilegiada nesse
mercado, tendo por base um conjunto de informações em alta frequência, minuto a
minuto, sobre as próprias negociações dessas ações. Outra importante
contribuição é a utilização dessa assimetria mensurada na análise do valor das
empresas por meio de um modelo de avaliação de empresas largamente utilizado,
que é o modelo de Ohlson.
Como principais implicações para os participantes do mercado, destacam-se as
seguintes: há uma alta probabilidade de negociação com informações
privilegiadas; e a geração de informações ainda não divulgadas formalmente é
utilizada, de forma indireta, pelos participantes do mercado, à medida que são
divulgadas pelas negociações dos insiders. Com base nisso, os investidores
podem, à medida que percebem movimentos anormais, traçar estratégias baseadas
nesse volume de negociações, fato já explorado desde a década de 1960 (Rogoff,
1964; Jaffe, 1974).
Por fim, destaca-se que os resultados encontrados são limitados à amostra
analisada e à utilização da taxa Selic trimestral como proxy para o custo do
capital próprio.