Mudanças recentes no perfil da distribuição ocupacional da população brasileira
Introdução
A distribuição ocupacional brasileira sofreu, nos últimos anos, os reflexos dos
problemas macro e microeconômicos estruturais e conjunturais, pelos quais vem
passando o país, que exigiram políticas públicas restritivas voltadas para a
estabilização. A estas questões se associaram os novos requisitos exigidos para
a contratação da mão-de-obra, tendo em vista os renovados processos produtivos
e organizacionais, bem como os impactos da situação de aumento da
competitividade e mundialização das economias.
A esse respeito, verifica-se que as tecnologias da informação e das
comunicações têm conduzido à industrialização dos serviços, à inovação
organizacional e a novas formas de comercialização de bens e serviços, no que
se refere aos relacionamentos entre produtor e consumidor, acarretando novas
modalidades ou formas modificadas de serviços. Na economia fordista, o modo de
produção prevalecente se caracterizava pela produção em massa de uma longa
série de bens manufaturados. Os mercados eram homogêneos, mais intensamente
dentro de fronteiras nacionais e as regulações keynesianas e os sistemas de
barganha coletiva de salários asseguravam estabilidade e previsibilidade. As
empresas se desenvolviam para grandes corporações através de integração
vertical de produção.
Na atualidade, após a mudança do paradigma fordista para o toyotismo, os modos
de produção se transformaram consideravelmente. Embora ainda permaneçam
economias de escala em algumas produções, a produção em série tende a diminuir.
Já as economias de escopo tornaram-se mais relevantes e os parâmetros de
competição passaram a ser a qualidade e a adaptação à demanda a partir de alta
segmentação de mercado, ou seja, o fornecimento de serviços através da
diferenciação do produto adquire muitas vezes maior peso do que os preços, no
atendimento do mercado. A interação entre serviços e produção manufatureira
tornou-se a força impulsionadora da criação de riqueza (ILLERIS, 1996).
Neste contexto, a inovação e a tecnologia ganham relevância na busca da
melhoria da produtividade e das vantagens competitivas nos serviços, assim como
já impactavam as atividades manufatureiras. A padronização, os ganhos de
produtividade e a automação fazem parte destas transformações industriais, bem
como os impactos resultantes da flexibilidade das instalações e do trabalho,
que permitam a adaptação à crescente personalização da oferta. A mesma
utilização da automação, robótica ou informática feita pelas atividades de
transformação industrial pode ser realizada no setor de serviços. Neste caso, a
informática desempenha um papel-central como matéria-prima dos serviços, cada
vez mais baseados no conhecimento e individualização (TÉBOUL, 2002).
Desde os anos 80 e mais intensamente na década de 90, o processo de aceleração
das mudanças tecnológicas que permitiu a difusão da globalização mundial tornou
necessário que os países se preparassem para o dinamismo das trocas
internacionais que começava a se instaurar. O processo de reestruturação
produtiva que se ampliou primeiramente nos países desenvolvidos, difundindo-se
não tão rapidamente para aqueles em desenvolvimento, resultou e foi resultado
destas transformações tecnológicas, nas condições de mercado então vigentes, e
das características das empresas, que tinham como objetivo restaurar a
competitividade industrial. Uma das conseqüências diretas foi a modernização de
serviços, visando possibilitar aos produtores de todos os setores de atividades
a implementação das trocas internacionais de forma acelerada. Este texto
analisará os impactos do progresso tecnológico e da conseqüente reestruturação
produtiva do período, sobre a reformulação e intensificação das características
da produção de serviços.
Este estudo visou contribuir com subsídios para a análise das transformações
recentes no perfil da estruturação do trabalhador brasileiro, segundo a
segmentação setorial e em grupos específicos de ocupações, em decorrência da
situação estrutural e conjuntural pela qual passou o país desde a década de 90.
São examinadas, inicialmente, questões teóricas sobre as causas da segmentação
do mercado de trabalho na atualidade, tendo em vista a aceleração da inovação
tecnológica e a evolução dos serviços no mundo, que deram origem ao crescente
processo de transformações produtivas das economias e como resultado da
intensificação da transnacionalização das atividades econômicas. Em seqüência,
analisam-se aspectos empíricos relacionados às mudanças estruturais da
distribuição no mercado de trabalho em economias mundiais, procurando situar o
Brasil neste contexto internacional.
Com relação à segmentação do mercado de trabalho brasileiro, a avaliação
empírica prossegue examinando estas transformações do ponto de vista setorial e
de grupos ocupacionais específicos. A partir dos dados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílio ' PNAD e de outras informações do IBGE, para o período de
1990 a 2004, serão examinadas as mudanças nesta segmentação. A análise empírica
incluiu as diferenças regionais na composição e na evolução deste perfil dos
trabalhadores, a partir da elaboração de Índices de Estruturação Ocupacional e
de Quocientes de Diferenciação Regional.
Inovação tecnológica, evolução dos serviços e reestruturação produtiva
O crescimento do setor de serviços e suas implicações sobre a reestruturação
das economias apresentam diferentes impactos sobre as estruturas produtivas, de
acordo com o nível de desenvolvimento econômico das economias, bem como
reflexos na capacidade de aumentar os investimentos em modernização tecnológica
e na qualificação da força de trabalho, a fim de enfrentar as necessidades de
novas tarefas técnicas dos processos modernos de produção e organizacionais.
Como salientado anteriormente, as estruturas produtivas têm se transformado
rapidamente nos países desenvolvidos, desde a crescente industrialização a
partir da década de 30, com o crescimento do processo de urbanização e com a
intensificação da inovação tecnológica. Algumas economias menos desenvolvidas
iniciaram as mesmas transformações estruturais a partir dos anos 50 e outras
apenas recentemente começaram este processo, como se verificou através dos
dados empíricos.
Algumas pesquisas mostram a reestruturação do setor de serviços como
fundamentada na divisão espacial de trabalho, que afeta o número e as
características dos empregos encontrados em diferentes locais (MARSHALL e WOOD,
1995). Esta divisão de trabalho refere-se ao padrão de especialização de
trabalho na produção, desenvolvido ao longo do tempo para assegurar o uso
eficiente do investimento em capital. Distintos países e regiões de um país são
especializados em produtos e setores particulares, que apóiam as formas locais
dominantes de relação capital/trabalho, qualificação da mão-de-obra e padrões
sociais e comunitários (KON, 1995).
Durante as décadas de 50 e 60, a crescente dominância das grandes empresas
manufatureiras, nos países desenvolvidos, moldou os padrões da especialização
industrial regional. Na busca de metas de lucro, estas empresas distribuíram
recursos em uma escala inter-regional ou internacional, procurando novas
oportunidades de explorar o trabalho em diferentes locais. Puderam não apenas
transferir a produção para localizações onde o trabalho era mais barato, mas
também tiveram a tendência a separar vários tipos de trabalho administrativo e
burocrático (inclusive funções de controle e pesquisa) dos trabalhos manuais da
produção. O pano de fundo desta tendência foi a possibilidade de especialização
flexível, que se desenvolveu para enfrentar a persistente crise econômica que
sucedeu o longo boom da economia mundial do período posterior à Segunda Guerra
Mundial.
Dessa forma, durante os anos 70 e particularmente na década seguinte, uma nova
espécie de reestruturação e de divisão internacional do trabalho se
desenvolveu, devido às mudanças tecnológicas baseadas nas formas flexíveis de
organização do trabalho e dos processos produtivos, que necessitavam de uma
mão-de-obra mais qualificada, tendo em vista que o trabalho mais barato e menos
qualificado não mais mostrava vantagens comparativas. Neste sentido, o
movimento de internacionalização do capital, no caminho de investimentos na
produção, começou a procurar economias que oferecessem serviços especializados
mais sofisticados. Como resultado, a maior parte dos países desenvolvidos e em
desenvolvimento está passando por transformações consideráveis na estrutura
produtiva de suas economias, de acordo com a capacidade de oferecer a estes
novos investimentos a infra-estrutura básica para o apoio destas
transformações.
O emprego nas indústrias manufatureiras está declinando devido, principalmente,
a certas formas de reorganização da produção que afetam os níveis de emprego: a
intensificação do trabalho; a racionalização da produção e do investimento; e a
mudança técnica. A reestruturação foi estendida também aos serviços de consumo
privado e ao setor de serviços públicos, adicionalmente aos serviços voltados
ao produtor (MARSHALL e WOOD, 1995; KON, 2004a). Quando são examinadas as
diferenças na representatividade das categorias ocupacionais entre os períodos
das décadas de 70 e 90, observam-se, para todos os países de diferentes níveis
de renda, um decréscimo nas ocupações da agricultura e rurais e um aumento nas
outras categorias. Além disso, o crescimento nas ocupações de serviços é ainda
superior ao das categorias de ocupações industriais e de transportes; em países
de alta renda, a representatividades destas categorias tem diminuído, mostrando
os resultados da reestruturação industrial e da terceirização de serviços, bem
como a mudança na classificação de certos serviços, anteriormente considerados
ocupações manufatureiras, antes das mudanças tecnológicas e organizacionais.
Em resumo, é possível apontar as mudanças significativas pelas quais passaram
as economias avançadas nos anos recentes, incluindo, entre outros aspectos,
particularmente: a internacionalização das atividades econômicas; a
reorganização das firmas dominantes; a integração da indústria manufatureira
com a de serviços; o uso crescente da tecnologia microeletrônica; o aumento da
demanda na indústria por uma força de trabalho mais qualificada, porém com
muitos trabalhos rotineiros sendo eliminados pela mudança tecnológica; a maior
complexidade e volatilidade do consumo; e uma mudança no papel da intervenção
governamental. Estas transformações foram interpretadas como uma modificação da
sociedade fordista baseada na produção e consumo de massa em grande escala,
apoiada pela demanda dos gastos governamentais para o gerenciamento de suas
funções e para a previdência e saúde (principalmente nas nações mais avançadas
em que prevalecia o Welfare State). Como visto, as formas pós-fordistas de
produção emergiram desde os anos 70, quando a indústria passou a utilizar nova
tecnologia e uma força de trabalho mais flexível para responder com maior
rapidez às mudanças do mercado e à competição internacional, encorajadas por
novas formas de governo que se retirava de funções empresariais e restringia
suas funções produtivas (MARSHALL e WOOD, 1995).
Marshall e Wood enfatizam que a crescente proeminência dos serviços e suas
contribuições relevantes e multifacetadas para a mudança estrutural têm como
origem:
a importância da crescente interdependência entre a produção de
bens e de serviços, como já visto, pelo fato de qualquer produto
material ou de serviço ser criado por uma seqüência complexa de
trocas materiais e de serviços, que envolvem fornecedores e
consumidores, incluindo subcontratados e consultores;
o valor da especialização em serviços no capitalismo dos finais do
século 20, que contribui para a manipulação de matérias-primas,
informação, capital e trabalho, em qualquer atividade de produção ou
consumo. Interpretar o mundo tornou-se uma tarefa mais complexa, a
produção de bens e serviços tornou-se mais capital-intensiva e o
papel destes serviços especializados então se intensificou;
a maneira pela qual as qualificações e especializações para
atividades de serviços que estão presentes na força de trabalho
influenciam significativamente os padrões locacionais. A complexidade
e diversidade da moderna especialização em serviços encorajam a
aglomeração, ao menos das funções de alto nível; as funções mais
rotineiras podem ser mais dispersadas, embora controladas de forma
centralizada. Estas tendências têm dominado a evolução das regiões
urbanas nos anos mais recentes, além de influenciarem os padrões da
localização manufatureira, enquanto a especialização em serviços
oferece um conhecimento técnico e material não apenas para os
processos produtivos em constante transformação, mas também para
qualificações organizacionais ou gerenciais (KON, 1994);
a forma pela qual as mudanças técnicas criam novas oportunidades
para a exploração da especialização em serviços.
Como salientado por alguns autores (MILES, 1993; NORMANN, 1991; TÉBOUL, 2002;
KON, 2004a), as tecnologias da informação e das comunicações têm conduzido à
industrialização dos serviços, à inovação organizacional e a novas formas de
comercialização dos serviços, no que se refere aos relacionamentos entre
produtor e consumidor, como, por exemplo, nas atividades bancárias, de venda e
turísticas, via telefone. Resumindo as principais características dos serviços
e da inovação técnica como exemplos da dinâmica da reestruturação dos serviços,
é possível observar alguns aspectos relacionados às transformações na produção
dos serviços, no produto, no consumo e nos mercados.
No entanto, estas características não se aplicam igualmente nos setores
públicos e privados de serviços, devido à natureza específica dos serviços
públicos, por um lado, e aos objetivos diversos de lucro ou de função social,
por outro.
Diferenças na distribuição da força de trabalho entre economias mundiais
Esta forma de reestruturação teve diferentes dinâmicas, nas diversas economias,
dependendo do grau de modernização tecnológica nos processos produtivos e do
correspondente nível de qualificação da força de trabalho. Nos países menos
adiantados, o excedente de trabalho do setor agrícola, que emigrou para áreas
urbanas, freqüentemente tinha baixa qualificação para oferecer e, mesmo quando
o setor moderno de atividades se expandia, as taxas de absorção do trabalho
nestas atividades podiam ser modestas em relação às necessidades da oferta de
trabalho (KON, 1995). Em uma economia urbana em expansão, supõe-se que as
atividades de serviços que estão correlacionadas ao aumento da renda também se
ampliem. Como resultado, outras oportunidades de serviços voltados para o
consumo direto também se expandem de acordo com os multiplicadores de emprego
urbano. Esta expansão de oportunidades de emprego em serviços é considerada um
efeito, mais do que como uma causa, da expansão urbana, o que quer dizer que é
mais sintoma do que causa de desenvolvimento.
Nos mercados de trabalho urbanos dos países em desenvolvimento, a absorção de
mão-de-obra não tem sido capaz de acompanhar o fluxo contínuo de pessoas que
aumenta a oferta de trabalhadores. Desde que os salários no setor moderno são
inflexíveis para baixo, o fluxo de imigrantes continua fundamentado em
expectativas não razoáveis de emprego e os novos entrantes ao mercado de
trabalho urbano, na maior parte das vezes, não comportam as qualificações para
o emprego nos setores mais dinâmicos da economia, como já visto. Assim, à
medida que o excedente de imigrantes se dirige às atividades menos modernas, os
salários médios são deprimidos e estas economias enfrentam um problema contínuo
e crescente de excedente de mão-de-obra e de baixa remuneração.
Como as oportunidades de emprego no setor moderno são mais difíceis, muitos dos
novos imigrantes devem trabalhar em atividades do setor denominado informal, em
condições de sobrevivência (CACCIAMALI e SILVA, 2003; KON, 2004b). Estes
trabalhadores são empregados em circunstâncias que negam as vantagens de um
contrato salarial formal. O fluxo contínuo de novos entrantes neste espaço
informal ' devido não apenas ao excedente de trabalho no setor agrícola, mas
recentemente também ao excedente no setor manufatureiro ' mantém os ganhos
naquele setor próximos à subsistência para a maior parte dos trabalhadores.
Todavia, com o crescimento da economia global, a reestruturação produtiva e a
terceirização que vêm ocorrendo nas grandes empresas oligopolistas, muitos
trabalhadores que se ocupavam nas indústrias manufatureiras, dispensados de
seus empregos nestas firmas, tentam trabalhar por conta própria como autônomos;
além disso, são encontrados também empresários no setor informal, alguns dos
quais mostrando progresso econômico.
Mas as oportunidades, para estes empresários, de crescimento através de
capitalização são limitadas devido à crescente competição, bem como à natureza
de seus empreendimentos. Ainda que exista certo inter-relacionamento entre os
mercados do setor informal e do setor moderno, e parte desta produção informal
seja vendida para empresas formais, o crescimento de muitas empresas informais
é restringido porque sua oferta não seria comercializável além dos limites de
certos distritos menos privilegiados. Uma parte considerável destas atividades
informais é dirigida para os serviços e alguns membros desta força de trabalho
desempenham atividades "invisíveis" ou subterrâneas (underground). Assim, em
países menos avançados, a capacidade de absorção do setor informal de serviços
é muito menos uma função da capitalização do setor do que da capacidade da área
urbana de fornecer subsistência a trabalhadores de serviços domésticos.
Porém, após a intensificação da globalização das economias principalmente desde
os finais dos anos 80, estas indústrias apresentam maiores vantagens de
realocarem suas atividades em economias modernas, onde são encontrados força de
trabalho mais qualificada e outros serviços complementares sofisticados. Em
muitos casos, empresas de serviços tornam-se multinacionais e transnacionais, e
os países hospedeiros menos desenvolvidos apresentam benefícios porque certos
serviços auxiliares às empresas fornecem elos que tornam possível a existência
de muitas instalações manufatureiras.
No âmbito doméstico das economias, as mudanças locacionais refletem o crescente
dualismo da força de trabalho, desde que os investimentos nas manufaturas se
moveram seja para áreas onde são disponíveis os escassos trabalhadores mais
qualificados administrativos e burocratas (white-collar), seja para áreas de
baixos salários e alto desemprego, onde pode ser recrutada uma força de
trabalho semiqualificada, para desempenhar principalmente atividades rotineiras
da produção em plantas das filiais.
A Tabela_1 apresenta as mudanças na distribuição setorial da força de trabalho
de países de vários níveis de desenvolvimento, na década de 90, de acordo com a
classificação do Banco Mundial para a determinação dos níveis de
desenvolvimento. Observa-se, para os países de Baixa Renda, que a concentração
considerável de trabalhadores no setor Primário (Agropecuário e atividades
afins), no início do período, sofreu considerável transformação com a emigração
de mão-de-obra para os setores do Terciário (Comércio e Serviços), durante a
década, com a diminuição relativa também do setor Secundário. O mesmo movimento
verificou-se entre países de Renda Média Baixa, porém com maior intensidade da
emigração de trabalhadores oriundos do setor industrial. O aumento do setor
Terciário nestes países se deu particularmente em atividades de baixa relação
capital/trabalho voltadas para consumo pessoal dos indivíduos (KON, 2006).
Estas mudanças estruturais resultaram da difusão do processo de mundialização
econômica e da dispersão do processo de produção em vários países, através da
transnacionalização das indústrias e serviços.
Embora o mesmo direcionamento das mudanças estruturais em direção ao aumento do
setor Terciário tenha se verificado também para os países de Renda Média Alta e
Renda Alta, a qualidade dos serviços criados nestes dois últimos grupos é
consideravelmente diferenciada dos anteriores. Isto se verifica porque englobam
serviços modernos em que a relação capital/trabalho é superior e que se
destinam mais intensamente ao consumo das empresas e à infra-estrutura de
Transportes e Telecomunicações, característicos de economias de aglomeração
(KON, 2006).
Observe-se que estes dados informam a distribuição entre os setores de
atividade, porém não revelam a segmentação ocupacional segundo grupos de
ocupações que apresentam comportamento e características diversas das
setoriais, tendo em vista diferentes formas de agregação das variáveis. Os
grupos ocupacionais podem ser encontrados em diferentes setores, como, por
exemplo, as ocupações de profissionais liberais e técnicas, as gerenciais, as
administrativas e de serviços, e se distribuem por todos os setores mencionados
na Tabela_1. Dessa forma, não existe comparabilidade entre as informações da
distribuição da força de trabalho segundo setores, com os resultados segundo
grupos ocupacionais, conforme apresentados na Tabela_2, que analisa as
transformações na representatividade de grupos ocupacionais específicos no
período de 1989 a 2001.
Como é possível inferir a partir da Tabela_2, observa-se que, aos diversos
níveis de desenvolvimento econômico das economias, são associadas condições
específicas de composição da estrutura ocupacional, o que é resultado das
características das respectivas estruturas produtivas, sejam mais
especializadas no setor agrícola ou nos setores urbanos, e também de acordo com
diferentes graus de progresso tecnológico nos processos produtivos.
Observa-se que, à medida que aumenta o nível relativo de renda per capitados
países, decresce a concentração de trabalhadores nas ocupações rurais ou outras
que exigem menor nível de qualificação e de produtividade. Paralelamente, é
crescente a participação de grupos ocupacionais representados pela mão-de-obra
mais qualificada, como de profissionais liberais e técnicos e as
administrativas, bem como nas ocupações industriais e de transportes.
Por outro lado, observa-se que a representatividade das ocupações de serviços
cresce à medida que aumentam os processos de modernização. Embora o percentual
de trabalhadores em categorias ocupacionais mais qualificadas de funções
profissionais, técnicas e gerenciais seja também mais elevado nos países com
rendas per capita superiores, verifica-se que nestes países as reformulações ou
a chamada "reengenharia" (downsizing) nas estruturas organizacionais na década
de 90, com o intuito de enfrentar os custos crescentes, resultou na diminuição
da representatividade de ocupações administrativas, da mesma forma que o avanço
tecnológico resultou em maiores investimentos capital-intensivos, diminuindo
postos de trabalho e aumentando a relação capital/trabalho das ocupações
industriais e de transportes.
Já outras informações sobre serviços mostram a criação de funções ocupacionais
de serviços não existentes anteriormente, conforme cresce a modernização nos
anos 90, ou seja, em torno de 21% nos países de Renda Baixa, 25,5% nos de Renda
Média Baixa, 37% nos de Renda Média Alta e 49% nos de Renda Alta (KON, 2004a).
Salienta-se que as repercussões do processo de modernização das economias
também tiveram impactos nestes países de menor renda per capita, no período de
modernização da década de 90, pois, como mostra a Tabela_2, em 2001, a
representatividade de trabalhadores nas ocupações agrícolas apresentou queda,
enquanto os grupos ocupacionais de maior escolaridade e qualificação
mencionados anteriormente registraram participação consideravelmente maior,
acima de 10%.
Neste sentido, os países de Renda Baixa são grandemente concentradores de
trabalhadores no setor primário, onde se localizavam, em 1989, cerca de 57% da
força de trabalho. As ocupações que exigem maior qualificação representadas por
profissionais liberais e técnicos, nesse ano, tinham participação pouco
significativa (de 3% a 4%), enquanto as industriais e de transportes e as de
serviços, embora representadas respectivamente por mais de 17% e de 10% dos
trabalhadores, eram caracterizadas por baixo nível de escolaridade e de
produtividade.
Os países de Renda Média Baixa apresentam distribuição ocupacional e
modificações estruturais, no período analisado, similares à dos de menor renda,
porém a participação das ocupações que exigem menor qualificação é
relativamente menor e, em contrapartida, as ocupações de maior qualificação são
relativamente mais representativas.
Com relação à mencionada reestruturação entre grupos ocupacionais, quando se
observam as diferenças de representatividade das categorias ocupacionais entre
os períodos, o decréscimo mais importante e muito significativo é encontrado
nas ocupações de agricultura e rurais, para todos os países de vários níveis de
desenvolvimento (devido à modernização dos processos produtivos ou à
capitalização como já observado). Isto é contra-balançado por aumentos
inferiores nas demais categorias. Além disso, o aumento nas ocupações de
serviços é ainda maior do que nas ocupações ditas industriais (do setor
secundário) e de transportes. Nos países de Renda Alta e de Renda Média Alta, a
representatividade deste grupo ocupacional também decresceu, revelando os
impactos ocorridos sobre a estrutura ocupacional como resultado da
reestruturação industrial, terceirização de atividades de serviços e mudança na
classificação de certos serviços (que eram anteriormente considerados
categorias de ocupações industriais antes que as mudanças tecnológicas e
organizacionais ocorressem).
Embora muitos países em desenvolvimento tenham mais de 50% de sua população
economicamente ativa em atividades de serviços, o papel positivo dos serviços
no processo de desenvolvimento ainda é discutido. Alguns pesquisadores
acreditam que apenas se forem abertas oportunidades de emprego nos setores
modernos e os salários médios se elevarem, à medida que a renda cresce e o
mercado interno é encorajado, novos setores de atividades e novas ocupações de
serviços serão introduzidas internamente, o que dará início à criação das
inter-relações usufruídas pelas economias das nações desenvolvidas.
Por outro lado, como já visto, os papéis dos serviços e das atividades
secundárias na economia estão se tornando crescentemente interdependentes, o
que quer dizer que o relacionamento tradicional entre as manufaturas e os
serviços, em que as primeiras demandam insumos e os segundos os fornecem, não
mais se mantém para uma parte importante dos dois setores. Em certas indústrias
manufatureiras, a divisão entre a produção e os serviços é difícil de ser
estabelecida. Por exemplo, na manufatura que utiliza equipamentos de
processamento de dados, os insumos de serviços (software) não só são
necessários para tornar operacional o processo produtivo, como também têm uma
grande influência sobre o sucesso do produto no mercado.
Outro exemplo pode ser mencionado na produção de jornais, em que o componente
de serviços de propaganda tornou-se a maior fonte de renda e o produto tem que
competir com outros meios de divulgação (mídia), tais como televisão e rádio. A
competição surge entre as empresas de produção e de serviços, à medida que a
diversificação e o consumo permitem a penetração em mercados tradicionalmente
pertencentes às demais áreas. Além disso, algumas atividades mais sofisticadas
de serviços, tais como transportes, serviços de distribuição de bens e
financeiros, estão se tornando crescentemente capital-intensivas, como as
indústrias produtoras de bens.
Em suma, o crescimento do setor de serviços e suas implicações sobre a
reestruturação das economias apresentam diferentes impactos sobre as estruturas
produtivas, de acordo com o nível de desenvolvimento econômico das economias e
a capacidade de aumentar os investimentos na modernização tecnológica e na
qualificação da força de trabalho. Estas condições são prementes para que as
empresas consigam enfrentar as necessidades de novas tarefas técnicas dos
processos modernos de produção e organizacionais.
As estruturas produtivas têm se transformado rapidamente nos países
desenvolvidos, desde a crescente industrialização a partir da década de 30, com
o crescimento do processo de urbanização e a intensificação da inovação
tecnológica. Algumas economias menos desenvolvidas iniciaram as mesmas
transformações estruturais a partir dos anos 50 e outras apenas recentemente
começaram este processo, como se verificou a partir dos dados empíricos.
Algumas pesquisas mostram a reestruturação do setor de serviços como
fundamentada na divisão espacial de trabalho que afeta o número e as
características dos empregos encontrados em diferentes locais (MARSHALL e WOOD,
1995; KON, 2004a). Esta divisão de trabalho refere-se ao padrão de
especialização de trabalho na produção, desenvolvido através do tempo para
assegurar o uso eficiente do investimento em capital. Distintos países e
regiões de um país são especializados em produtos e setores particulares, que
apóiam as formas locais dominantes de relação capital/trabalho, qualificação da
mão-de-obra e padrões sociais e comunitários.
A reestruturação produtiva no Brasil: mudanças setoriais
A reestruturação da distribuição do trabalho no Brasil retrata os aspectos
considerados na seção anterior, para os países de Renda Média Alta, nível em
que se enquadra o país. Ao lado de um parque industrial diversificado, que na
década de 90 perdeu o dinamismo dos anos 70, a grande concentração de
trabalhadores se agrupa em ocupações de serviços e o aumento relativo de
pessoal ocupado verificou-se tanto em ocupações mais modernas (profissionais e
técnicas, gerenciais e administrativas), quanto naquelas menos avançadas em
relação à exigência de conhecimentos tecnológicos e com menor relação capital/
trabalho.
Se no período de maior crescimento industrial do final da década de 70 até 1980
as atividades manufatureiras e da construção civil absorviam de forma mais
significativa a mão-de-obra liberada pelas atividades rurais, em toda a década
de 80 o aumento de trabalhadores no setor de serviços esteve consideravelmente
acima do verificado no setor manufatureiro. Nos anos 90, a produtividade teve
um comportamento positivo nos setores Agropecuário e Secundário, com maior
intensidade no primeiro, embora a população ocupada neste último mostrasse
taxas anuais negativas, ou seja, diminuição de postos de trabalho disponíveis.
No entanto, no setor Terciário da economia, a absorção de trabalhadores se deu
a taxas anuais superiores às observadas nos demais setores, mas o produto por
trabalhador apresentou decréscimo, o que significa que os postos de trabalho
gerados se revestiram de baixa remuneração e qualidade.
O exame da Tabela_3 e dos Gráficos_1 e 2 revela que a diminuição da população
ocupada no setor rural ocorreu a partir da absorção mais intensa de
trabalhadores no setor de serviços que em 1990 já absorvia mais da metade da
mão-de-obra brasileira. Porém, regionalmente, verificam-se diferenças na
direção do aumento do contingente de trabalhadores de serviços.
No entanto, no período mais recente, observa-se que o decréscimo de postos de
trabalho na indústria teve repercussões importantes na composição do produto,
uma vez que, em 1999, a representatividade dos trabalhadores neste setor
decresceu para menos de 20%. Porém, em 2005, já se verificou recuperação desta
participação, em detrimento de trabalhadores na Agropecuária, cuja
representatividade se moveu em sentido contrário, ou seja, mostrou elevação e
diminuição para quase 21% neste último ano pesquisado. Também o setor Terciário
absorveu parte do aumento da força de trabalho não incorporada na indústria,
chegando a uma participação de mais de 5% do total de trabalhadores em 2004.
A análise das mudanças estruturais na divisão do trabalho brasileira, nos anos
mais recentes, requer uma visualização da década econômica anterior, para
melhor avaliação da intensidade da reestruturação. Em seqüência são analisados
indicadores do crescimento da população ocupada e do produto por trabalhador,
em períodos de forte crise da década de 80, até o início do novo século.
O exame do produto do trabalhador como indicador da produtividade setorial,
para o Brasil, retratado na Tabela_4 e nos Gráficos_2 e 3, permite verificar
que as taxas médias anuais de crescimento da produtividade no setor de
serviços, que corresponde ao setor mais absorvedor da mão-de-obra no país,
estiveram sempre abaixo da média global do país, em quase todo o período (com
exceção da década de 70), o que confirma as constatações de que, apesar das
taxas consideráveis de aumento de trabalhadores ' que em períodos recessivos ou
de menor nível de atividades ultrapassam consideravelmente as do setor
Secundário ', o produto gerado cresceu menos que proporcionalmente, em virtude
de o setor Terciário brasileiro absorver parcela representativa de ocupados com
baixa qualificação, em ocupações de menor remuneração e pouca intensidade de
capital. Haja vista que nos anos posteriores a partir de 1984, em que se
observou certa retomada nas atividades econômicas em relação ao período de
crise do início da década de 80, a produtividade dos serviços apresentou maior
taxa de decréscimo, embora os demais setores também tenham registrado queda
deste indicador.
Dessa forma, é necessário salientar que as transformações setoriais relevantes
que vêm ocorrendo no país e caracterizaram uma reestruturação produtiva
considerável foram iniciadas desde os primeiros meados da década de 50 até o
final da de 70. Nos anos 80, as constantes situações de crise econômica por que
passou o país retardaram a continuidade das transformações, o que contribuiu
para o crescimento da defasagem de desenvolvimento entre o Brasil e outras
economias que se encontravam na mesma situação de emergência, como alguns
países asiáticos. A continuidade de crescimento do setor de serviços no país,
desde os períodos econômicos conturbados, deveu-se mais à possibilidade de o
setor absorver indivíduos que não encontraram oportunidades nos demais setores,
do que à busca da modernização econômica.
Na década de 90, observa-se a retomada do crescimento da produtividade
setorial, particularmente no setor Primário, em que a modernização foi
relativamente mais intensa e as taxas anuais de crescimento da população
ocupada se elevaram acima de 2%, contrariando a tendência tradicional de queda.
No setor Secundário, o crescimento da produtividade se deu às custas da
absorção da mão-de-obra, que se dirigiu ao setor Terciário informal,
resultando, como conseqüência, decréscimo considerável da produtividade deste
setor. A tendência de redução da produtividade se intensificou
consideravelmente a partir do final do século 20 até 2005, desde que o aumento
da população ocupada em todos os setores verificou-se com elevação da
informalidade e baixo crescimento do PIB.
As transformações na distribuição ocupacional
A Tabela_5 e o Gráfico_4 retratam, para períodos temporais selecionados de 1990
a 2005, a distribuição de ocupados em grupos ocupacionais específicos. Em todo
o período, as ocupações da produção direta de bens e serviços concentraram o
maior número de trabalhadores. No entanto, esta representatividade, que em 1990
era de 52,4%, veio decrescendo até 2005, quando situou-se em 48,2%, em
decorrência de certo grau de modernização nos processos produtivos, que
diminuiu os postos de trabalho nestes grupos ocupacionais.
Isto pode ser confirmado pelo aumento gradativo da participação de ocupações
técnicas e científicas, que incluem profissionais liberais e outros ocupados
mais qualificados. Por outro lado, a modernização produtiva no período também
apresentou a característica da diminuição de níveis hierárquicos gerenciais e
administrativos nas empresas. Esta perda originou-se da implementação de novos
modelos gerenciais aplicados no país, a denominada "reengenharia" (downsizing).
O resultado desta redução de representatividade, de 1990 a 2005, foi de quase
18% em relação ao total dos ocupados.
Apesar do período de poucos investimentos, os postos de trabalho da Indústria
da Construção Civil também aumentaram, porém grande parte alocava-se em
autoconstrução ou atividades informais. Por outro lado, observa-se aumento
significativo, em 2001, da representatividade de trabalhadores no grupo do
Comércio, particularmente correspondendo a atividades voltadas para consumo
pessoal e de baixa relação capital/trabalho, porém com nova redução em 2005,
como decorrência da constante situação de contenção econômica e baixos
investimentos durante os anos seguintes.
A evolução anual da representatividade dos trabalhadores nos vários grupos
ocupacionais é apresentada no Gráfico_5, para períodos selecionados entre 1990
e 2004. Observa-se, inicialmente, que no total do período a maior taxa de
crescimento de trabalhadores ocorreu para as ocupações do Comércio (16,3%), as
técnicas, científicas e assemelhadas (9,8%), o grupo de Outras ocupações (9,9%)
e os Transportes e Comunicações (7,8%). Note-se que, nestes grupos, existe uma
heterogeneidade de processos produtivos de maior ou menor relação capital/
trabalho, não sendo possível, a partir destes dados, a observação de alguma
relação direta entre o aumento da absorção e o grau de modernização das
ocupações.
Nos dois primeiros períodos analisados, de 1990-1996 e de 1996-2001, as
transformações estruturais foram menores. As mudanças mais consideráveis
ocorreram de 2001 a 2004, quando se ressalta a queda de 4% nas ocupações da
Indústria de Transformação e a elevação muito significativa em Transportes e
Comunicações e da categoria Outras ocupações.
As transformações regionais na distribuição do pessoal ocupado
Embora na seção anterior tenha sido verificada a existência de mudanças
estruturais significativas da representatividade de ocupações, segundo grupos
selecionados, o exame das diferenças regionais nesta distribuição mostra que
não aconteceram transformações na concentração regional, como verificado na
Tabela_6 e no Gráfico_6.
Em todo o período, as mudanças foram muito pouco significativas, podendo-se
considerar que a mesma representatividade regional se repetiu, mostrando que
cerca de 43% da população ocupada concentrou-se na Região Sudeste e 28% no
Nordeste. Apenas no Norte foi verificado crescimento na participação, passando
de 3,3% em 1990 para 7,4% em 2005.
O aspecto qualitativo do trabalho nas diferentes regiões pode ser avaliado,
para o período recente, na Tabela_7 e Gráfico_7, que revelam a participação dos
ocupados com carteira de trabalho assinada e sua evolução, segundo a região.
Observa-se que, em 1992, as divergências foram muito significativas, pois no
Nordeste e no Norte urbano apenas 11,3% e 13,4% dos ocupados, respectivamente,
tinham registro em carteira, enquanto no Sudeste a representatividade era
superior a 27%. A tendência para o período posterior foi de crescimento desta
participação em todas as regiões. As pesquisas da Região Norte incluíram, pela
primeira vez em 2004, o levantamento para a zona rural. Dessa forma, a perda da
representatividade observada através das informações de 2005 deve-se a esta
inclusão e não há possibilidade de comparação com a série anterior. De qualquer
maneira, a representatividade dos ocupados com carteira em todas as regiões
continua consideravelmente baixa em relação à condição necessária de proteção
ao trabalhador.
A Tabela_8 permite a avaliação do grau de diferenciação regional na
representatividade dos trabalhadores com carteira assinada, tendo como base a
média do país. Os indicadores acima e abaixo da unidade representam
respectivamente situações melhores e piores em relação à média nacional.
A Região Sudeste mostra um grau de superioridade em torno de 29% em 2005 em
relação à média brasileira, enquanto o Nordeste e o Norte situam-se,
respectivamente, em torno de 46% e 40% abaixo desta média e o Sul mostra um
diferencial superior considerável de mais de 14%. O aumento da
representatividade de trabalhadores com carteira assinada não significou uma
convergência do grau de desenvolvimento entre as regiões.
Para detalhar as diferenças na estruturação ocupacional entre as Unidades da
Federação, foi elaborado um indicador que recebeu a denominação de Índice
Regional de Estruturação Ocupacional (Ireo), visando representar o grau de
modernidade ou atraso da estrutura regional. O Ireo é definido como:
Ireo = åR [ (POij x p1) x (POij x p2) ] / POR, onde:
R = UF; PO = número de pessoas ocupadas; i = grupos de anos de estudo; j =
faixas de rendimentos médios; p1 = participação da população ocupada na faixa
de rendimentos médios; p2 = participação da população ocupada no grupo de anos
de estudo; POR = população ocupada total da região.
Os resultados são interpretados de modo que os índices superiores significam
estruturas ocupacionais mais desenvolvidas, compostas por um maior percentual
de trabalhadores com maior nível de escolaridade e maiores rendimentos médios.
A Tabela_9 apresenta estes resultados classificados em ordem decrescente, com
base no ano de 2002. Como era esperado, os maiores indicadores são verificados
para as regiões do Distrito Federal, São Paulo e Rio de Janeiro e os menores em
Alagoas, Maranhão e Piauí. Uma observação importante está no comportamento
temporal destes indicadores, com melhora considerável em todas as regiões entre
1990 e 1996, porém, em 2002, as estruturações sofreram perda de qualidade,
conforme apresentado na Tabela.
A Tabela_10 mostra os Quocientes de Diferenciação Regional da Estruturação
Ocupacional (QREO), que permitem avaliar o grau de intensidade de diferenciação
entre as estruturações ocupacionais, tendo como base a média do país. Este
quociente é calculado através da relação:
QREO = IreoR / IreoBR, onde R = UF e BR = Brasil.
A média brasileira é representada pelo quociente igual à unidade e os
resultados acima e abaixo de 1 significam os graus de intensidade
respectivamente superiores ou inferiores à média. Observe-se, inicialmente, que
o Distrito Federal apresenta a estruturação mais vantajosa, correspondente a
melhores salários e níveis de escolaridade, que se situam quase 130% acima da
média em 2002. Os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro mostram também
considerável intensidade acima da base do país, em cerca de mais de 50% e 40%,
respectivamente. Acima da média brasileira situam-se poucas regiões, além das
citadas, ou seja, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. Para efeito
analítico, os quocientes foram agrupados em quatro níveis: (a) Alto, com
indicadores entre 0 e 30% superiores à média, englobando as regiões acima
mencionadas; (b) Médio Alto, cujas intensidades situam-se entre 0,1% e 20%
abaixo da média; (c) Médio Baixo, com resultados entre 21% e 40% abaixo da
média, incluindo os Estados do Amazonas, Pará, Rio Grande do Norte e Sergipe; e
(d) Baixo, com indicadores entre 41% e 70% abaixo, agrupando os demais Estados
do Nordeste e o Tocantins.
Dessa forma, observou-se que os Estados que pertencem a cada um dos quatro
níveis acima determinados são os mesmos correspondentes a quatro grupos
hierarquizados de forma decrescente, tendo como base a variável renda per
capita, mostrando a forte relação entre o nível de estruturação ocupacional e o
nível de desenvolvimento regional (KON, 2004).
Considerações finais
O processo de aceleração das mudanças tecnológicas no mundo que permitiu a
difusão da globalização mundial ' ocorrida desde os anos 80 e mais intensamente
na década de 90 ' tornou necessário que os países se preparassem para o
dinamismo das trocas internacionais que começava a se instaurar. O processo de
reestruturação produtiva que se ampliou primeiramente nos países desenvolvidos,
difundindo-se não tão rapidamente para os em desenvolvimento, resultou e foi
resultado destas transformações tecnológicas, nas condições de mercado então
vigentes e nas características das empresas, que tinham como objetivo restaurar
a competitividade industrial.
No caso específico do Brasil, além de enfrentar os impactos destas
transformações mundiais, a distribuição ocupacional sofreu, nos últimos anos,
os reflexos dos problemas macro e microeconômicos estruturais e conjunturais
pelos quais vem passando o país, que exigiram políticas públicas restritivas
voltadas para a estabilização. A estas questões associaram-se os novos
requisitos exigidos para a contratação da mão-de-obra, tendo em vista os
renovados processos produtivos e organizacionais, bem como os impactos da
situação de aumento da competitividade e mundialização das economias.
Este estudo visou contribuir com subsídios para a análise recente das
transformações no perfil da distribuição ocupacional do trabalhador brasileiro,
segundo a segmentação setorial e grupos ocupacionais específicos. Os resultados
empíricos apontam para as constatações iniciais de que o Brasil apresenta
evolução semelhante aos demais países do grupo classificado pelo Banco Mundial
como de Renda Média Alta, no que se refere à tendência à reestruturação
ocupacional relacionada às taxas relativamente mais elevadas de crescimento de
trabalhadores no setor Terciário, quando comparados a países de Renda Alta
(KON, 2004), porém com características qualitativamente diferentes destes
últimos, tendo em vista menor modernização e produtividade.
Desde os últimos anos da década de 90, a população brasileira ocupada nos
setores Primário e Secundário vem decrescendo anualmente, e a elevação
considerável de trabalhadores no setor Terciário vem se dando em taxas
superiores às do produto setorial gerado, resultando em decrescente
produtividade do trabalho. Por sua vez, a distribuição de trabalhadores em
ocupações específicas no país também veio sofrendo mudanças consideráveis, a
partir dos anos 90. Estas favoreceram maior concentração de trabalhadores em
ocupações de Transportes e Comunicações e naquelas técnicas, científicas e
assemelhadas, que apresentam trabalhadores mais qualificados e melhores
condições de trabalho, mas também da Construção Civil e de Outras ocupações
(pessoais, sociais, etc.), que têm um caráter global de baixa relação capital/
trabalho e baixa remuneração. Estas transformações refletem as mudanças
organizacionais traduzidas na reengenharia (diminuição de trabalhadores
administrativos), mas também decréscimo no setor da Indústria de Transformação,
em um período atribulado da conjuntura nacional.
Apesar destas transformações ocupacionais constatadas, a análise das mudanças
regionais na distribuição do trabalho revela que, entre as regiões, não houve
alterações significativas, permanecendo as consideráveis disparidades regionais
em todo o período. Dessa forma, as mudanças estruturais foram intra e não
inter-regionais.