Família, pobreza e acesso a programas de transferência de renda nas regiões
metropolitanas brasileiras
Introdução
Muitos estudos analisaram o impacto dos programas de transferência de renda na
redução da desigualdade de renda no país, tendo por referência os resultados da
PNAD 2004. Entre as diversas interpretações, houve certo consenso ao se
atribuir a um conjunto de fatores a participação na redução da desigualdade
observada, entre os quais se destacaram a ampliação dos programas sociais de
transferência de renda, a recuperação do salário mínimo e uma pequena retomada
do emprego assalariado (DEDECCA, 2006; BARROS et al. 2006). Entretanto, o atual
debate sobre a redução das desigualdades de renda evidencia o peso das
transferências de renda (SOARES at. al., 2006; SCHWARTZMAN, 2006), o que
justifica a busca de maior conhecimento dos impactos destas sobre as famílias
beneficiárias.
A proposta deste artigo é identificar o acesso e alguns efeitos da recuperação
econômica e dos programas de transferência de renda sobre os arranjos
domiciliares que apresentam maiores possibilidades de serem pobres,
caracterizados pelas médias de renda domiciliar per capita menores do que a
média regional e pela maior concentração nos decis inferiores de renda. Estes
domicílios apresentam estruturação e composições distintas, bem como vivenciam
diferentes momentos do ciclo de vida familiar, mas são os mais fragilizados
diante da mudança no padrão de emprego por apresentarem composição familiar
desfavorável para a inserção de seus componentes no mercado de trabalho.
Procura-se identificar o acesso aos programas de transferência de renda pelos
domicílios caracterizados por diferentes tipos de arranjos familiares,
considerando sua estruturação e momento do ciclo de vida familiar. Outra
questão a ser investigada é o efeito das transferências de renda sobre a renda
das famílias, buscando-se indicações de redução da desigualdade a partir das
famílias.
Visando tratar tais temas, este artigo é composto por três itens e pelas
considerações finais. O primeiro refere-se ao empobrecimento nas regiões
metropolitanas brasileiras sob o contexto da precarização do trabalho. O
segundo caracteriza os arranjos domiciliares mais vulneráveis ao empobrecimento
e o terceiro aborda o acesso aos programas de transferência de renda e alguns
efeitos sobre os domicílios considerados segundo tipos de arranjos
domiciliares.
O empobrecimento nas regiões metropolitanas brasileiras e os impactos sobre as
famílias
Estudo longitudinal sobre a pobreza no Brasil (trajetória 1970-1999) aponta
redução da proporção dos contingentes mais pobres na área rural - relacionada
aos processos de urbanização e de industrialização -, um comportamento menos
favorável nas áreas urbanas não metropolitanas, bem como a tendência de
metropolização da pobreza (ROCHA, 2003). Nos anos 90, após o período de queda
da proporção de pobres para todas as áreas de residência (1994-1995), como
decorrência temporária do sucesso do plano de estabilização de 1994 (Plano
Real), sucedem-se a continuidade da melhora dos indicadores para as áreas
rurais e a piora para as regiões metropolitanas (ROCHA, 2006). Segundo a
autora, a queda das proporções de pobres e indigentes nas áreas rurais e a
redução da população rural tornaram a pobreza e a indigência no Brasil
crescentemente fenômenos urbanos e metropolitanos.
Entre 1995 e 2003, houve tendência de crescimento da proporção de pobres no
conjunto das regiões metropolitanas brasileiras mais intensa do que para as
áreas rurais e as urbanas (ROCHA, 2006). Além disso, a queda na proporção de
pobres ocorrida em 2004 em todas as áreas de residência foi comparativamente
mais tênue para as nove regiões metropolitanas brasileiras, que incluem as
capitais estaduais para as quais a PNAD-IBGE realiza levantamentos periódicos
(ROCHA, 2006).
O estudo de Rocha mostra ainda que há diferenças entre as regiões
metropolitanas, com comportamento desfavorável mais acentuado para a de São
Paulo, que apresentou evolução adversa da pobreza entre 2003 e 2004. Dessa
maneira, a análise do estrato metropolitano - uma média dos resultados das
regiões metropolitanas brasileiras - evidencia que este é afetado pelo maior
peso relativo da região metropolitana de São Paulo. A autora elenca quatro
fatores explicativos desse resultado: fraca criação de postos de trabalho;
evolução desfavorável do rendimento do trabalho; aumento relativamente forte do
custo de vida dos pobres; e menor impacto positivo dos programas de
transferência de renda com valores fixados com base em parâmetros nacionais
(ROCHA, 2006).
Os dados da PNAD 2006 indicam, segundo Rocha, queda na proporção de pobres na
população brasileira, que passa a ser de 26,9%, e reafirmam as tendências de
concentração da pobreza nas áreas urbanas e metropolitanas. Para as regiões
metropolitanas, em movimento contrário ao verificado na população do país,
ocorreu crescimento da proporção de pobres: de 35,5% para 36,3% da população
destas áreas, entre 2005 e 2006 (Folha de S. Paulo, 19 de setembro de 2007).
Deve-se considerar que o processo de reestruturação produtiva afetou com mais
intensidade as áreas metropolitanas brasileiras em detrimento das urbanas não
metropolitanas e das rurais, e vem atuando de forma diferenciada entre as
regiões metropolitanas quanto à organização das atividades econômicas. A
reestruturação produtiva intensificada a partir de 1990 elevou o patamar de
desemprego e a precarização das relações de trabalho, com redução do
assalariamento regulamentado e aumento de vinculações menos protegidas, como
trabalho autônomo e assalariamento sem carteira assinada, bem como instauração
de novas formas de contratação.
Tais alterações no mercado de trabalho provocaram, desde o início dos anos 90,
progressiva queda dos rendimentos dos ocupados. Análise do mercado de trabalho
nas regiões metropolitanas mostra redução no rendimento médio real dos
ocupados, entre 1998 e 2005, da ordem de 4,1% ao ano, equivalendo a uma perda
acumulada de 25,6% no período (FUNDAÇÃO SEADE; DIEESE, 2007).1 As perdas mais
intensas ocorreram nas regiões metropolitanas de São Paulo e de Recife, da
ordem de 5,0% e 4,9% ao ano, respectivamente. A queda do rendimento dos
ocupados é apontada por diversos estudos, tais como os de Mendonça e Hoffmann
(2006), Fundação Seade (2007) e Rocha (2006).
Apesar da retomada do crescimento do emprego a partir de 2004 e da elevação do
rendimento dos ocupados, dados da Fundação Seade para essas mesmas regiões
metropolitanas indicam recuperação bastante modesta do crescimento do
rendimento real dos ocupados. Entre 2006 e 2007, o emprego cresceu 3,5% nas
regiões metropolitanas, ao passo que o rendimento médio dos ocupados elevou-se
em 1,3%. Ao retomar a análise a partir de 1998, o estudo mostra, para o período
1998 a 2007, a permanência da queda do rendimento médio real dos ocupados (-
22,6%), concomitante ao crescimento do emprego de 26,3%. Essas tendências são
interpretadas como indicativas de aumento do emprego com remunerações baixas,
inclusive para os assalariados, pois, se para estes é mais acentuado o
crescimento do emprego (34,6%), permanece elevada a queda do rendimento (-
19,8%) para o período (FUNDAÇÃO SEADE; DIEESE, 2007).2
O empobrecimento dos domicílios analisado nos anos 90 e início dos 2000 na
Região Metropolitana de São Paulo, expresso pela queda da renda familiar per
capita (MONTALI, 2006), reflete a queda dos rendimentos do trabalho resultante
da precarização do trabalho e do desemprego recorrente, sob a reestruturação
produtiva e o baixo crescimento econômico até 2004. Constatou-se ainda,
enquanto uma forma de enfrentamento do desemprego e da mudança do padrão do
emprego - que afetou mais fortemente os provedores masculinos e filhos jovens e
possibilitou aumento da participação feminina -, a articulação de rearranjos
familiares de inserção no mercado de trabalho, com maior participação da
cônjuge e da chefe feminina em atividades remuneradas e na provisão familiar.
No caso da Região Metropolitana de São Paulo, estudo longitudinal do final da
década 80 até a primeira metade dos anos 2000 evidenciou que esses rearranjos
familiares de inserção no mercado de trabalho articulados a partir dos anos 90
atenuaram o empobrecimento, porém não impediram a queda da renda domiciliar
(MONTALI, 2004a; 2006).
Este estudo sobre a Região Metropolitana de São Paulo mostra, ainda, que as
atuais tendências de precarização do trabalho e de aumento do desemprego afetam
diferenciadamente os arranjos familiares de inserção no mercado, articulados de
maneiras distintas nos momentos do ciclo de vida familiar, evidenciando maior
fragilização para determinados segmentos sociais nas formas encontradas para
garantir a sobrevivência (MONTALI, 2004a e 2006). Coincidentemente com estes
achados, Schwartzman (2006), utilizando categorias aproximadas, indica os
mesmos tipos de família como os mais freqüentes nos decis inferiores de renda
familiar per capita na análise sobre as famílias brasileiras em 2004. Um dos
objetivos deste estudo, como mencionado, é identificar características dos
arranjos domiciliares mais suscetíveis ao empobrecimento.
Estudo recém divulgado indica tendência de redução da pobreza (famílias com
renda per capita de até ½ salário) nas regiões metropolitanas, a partir de 2003
até 2007, com projeção de queda para 2008 (IPEA, 2008). De forma coincidente
com o apresentado nesse item, embora com metodologia distinta, o estudo do Ipea
mostra que, entre 1995 e 2003, ocorreu elevação na proporção de pobres em
relação ao total da população das regiões metropolitanas: permaneceu pouco
acima de 25% entre 1995 e 1998; voltou a crescer a partir de 1999, quando
passou de 28% nesse ano para 32% em 2003. Essa proporção diminuiu
progressivamente entre 2004 e 2006, passando de 30% para 23,5%. Deve-se
ressaltar que o Ipea adota metodologia distinta daquela utilizada por Rocha
para a definição de pobreza, o que explica algumas diferenças entre os números
destes estudos.3
Os arranjos domiciliares mais vulneráveis ao empobrecimento nas regiões
metropolitanas brasileiras
A composição dos arranjos familiares e o ciclo vital das famílias são
referências fundamentais na presente análise dos grupos de famílias mais
vulneráveis ao empobrecimento nos contextos regionais diferenciados. Não se
ignora, no entanto, a importância de outros fatores, tais como o acesso aos
ativos sociais e econômicos e a ocupações de qualidade.
Os arranjos familiares que apresentam maiores fragilidades para garantir a
sobrevivência, sendo mais vulneráveis ao empobrecimento, apresentam
características semelhantes nas regiões metropolitanas brasileiras. Quanto à
composição, são assim identificados os arranjos domiciliares nucleados pelo
casal com idades de até 34 anos com filhos e/ou parentes, aqueles em que o
casal tem idades entre 34 e 49 anos, também com a presença de filhos e/ou
parentes, e as famílias chefiadas por mulher com a presença de filhos e/ou
parentes. Estes arranjos domiciliares apresentam composições distintas,
vivenciam momentos diferentes do ciclo de vida familiar, mas têm em comum
composição desfavorável para a inserção de seus componentes no mercado de
trabalho ou em atividades de geração de renda, por abrigarem crianças e
adolescentes ou idosos, expressa nas taxas de geração de renda comparativamente
mais baixas. Apresentam rendimentos médios familiares per capita inferiores aos
demais arranjos domiciliares e abaixo da média regional (Tabela_1), possuem as
mais elevadas concentrações entre os decis inferiores de renda familiar per
capita (Tabela_2) e registram menores taxas de geração de renda (Tabela_3).
As características de composição destes domicílios nas áreas metropolitanas
brasileiras e o momento do ciclo vital dos arranjos familiares mais vulneráveis
ao empobrecimento são os seguintes: no primeiro grupo - identificado pelo casal
com idades de até 34 anos com filhos e parentes -, quase a totalidade dos
filhos tem menos de 14 anos, remetendo à etapa inicial do ciclo de vida
familiar, quando se dá a maior parte dos nascimentos; no segundo arranjo
domiciliar referido - casal com idade entre 34 e 49 anos, correspondendo à
etapa de consolidação -, com presença de filhos e/ou parentes, os filhos
dividem-se entre menores e maiores de 14 anos; nos arranjos domiciliares
chefiados por mulher com a presença de filhos e/ou parentes, cerca de um terço
dos filhos tem menos de 14 anos, um terço apresenta idades entre 14 e 24 e um
terço está acima de 24 anos.4 A despeito das especificidades de cada arranjo
domiciliar, todos incluem crianças e adolescentes e os dois últimos contam com
jovens entre seus componentes.
Os dois primeiros tipos de arranjos domiciliares demandam investimentos e
atenção em educação e saúde e a manutenção da família recai sobre os
componentes adultos, ou seja, o casal, pois os parentes constituem menos de 10%
dos componentes, sendo cerca de metade destes menores de 18 anos. No caso das
chefes femininas sem cônjuge e com presença de filhos, há especificidades na
composição familiar relacionadas aos momentos do ciclo de vida familiar a que
correspondem. Há a presença de idosos, porém é recorrente a presença de filhos
crianças e adolescentes (22% dos componentes), bem como a de parentes menores
de 18 anos (11% dos componentes), sugerindo, em muitos casos, família extensa.
A presença de jovens entre 18 e 24 anos (10% dos componentes no arranjo
domiciliar chefe feminina sem cônjuge) constitui, especialmente entre os grupos
de menor escolaridade, um agravante para as condições de sobrevivência desses
domicílios, considerando-se a crise do emprego jovem verificada a partir da
década de 90.
Arriagada (2007, p. 237), em estudo sobre as famílias latino-americanas em
zonas urbanas, indica, de forma semelhante, maior incidência da pobreza nos
lares monoparentais com chefia feminina e entre as famílias nucleares com
filhos nas etapas do ciclo de vida familiar relacionadas à expansão e
consolidação. Nesse estudo, a autora relaciona estruturas familiares e etapas
do ciclo de vida familiar com a incidência da pobreza e de bem-estar.
A maior vulnerabilidade à pobreza é evidenciada no tipo de arranjo domiciliar
caracterizado pelo casal mais jovem com filhos, cujo rendimento familiar per
capitamédio, em 2004, correspondia a cerca de 59% da média do rendimento
familiar per capita do respectivo agrupamento de região metropolitana segundo
grandes regiões brasileiras. Esse percentual é levemente maior nas regiões
metropolitanas do Norte (64%) e do Nordeste (61%), que, comparativamente,
apresentam os menores valores médios per capita regionais (Tabela_1).
Observa-se para esse grupo de domicílios, em 2006, aumento da diferença em
relação tanto às médias regionais quanto ao total metropolitano, como se pode
constatar na Tabela_1. Os domicílios caracterizados por arranjos nucleados pelo
casal mais jovem, de até 34 anos, com a presença de filhos passaram a
apresentar, em 2006, renda familiar per capita cerca de 57% da média regional
metropolitana. O aumento da distância em relação à renda média deve-se ao
crescimento da renda per capita média metropolitana mais intenso do que o
experimentado pelos domicílios dos casais mais jovens com filhos e/ou parentes.
Verificou-se crescimento do rendimento familiar per capita, entre 2004 e 2006,
para todos os tipos de arranjos familiares, porém estes e os domicílios
nucleados pela chefe feminina sem cônjuge, exatamente os caracterizados como
mais vulneráveis ao empobrecimento, apresentaram aumento inferior ao da média
regional metropolitana, reproduzindo a desigualdade de renda entre os
domicílios.
Os arranjos chefiados por mulher com presença de filhos e parentes constituem o
segundo grupo na escala entre os mais vulneráveis à pobreza. Em 2004, o
rendimento médio per capita dos domicílios com esse arranjo representava cerca
de 81% daquele referente ao total das regiões metropolitanas, passando para
cerca de 78% em 2006. Repete-se aqui o fato de essa proporção ser mais elevada
nas regiões metropolitanas do Norte e do Nordeste, que apresentam valores de
rendimentos mais baixos na comparação como os dois outros agrupamentos de
regiões.
O terceiro tipo de arranjo domiciliar mais vulnerável ao empobrecimento é
caracterizado pelo casal com idades entre 34 e 49 anos com filhos e parentes.
Embora se encontrem entre aqueles com rendimento familiar per capita médio mais
baixo, esses domicílios ficaram muito próximos da média regional metropolitana
em 2004, cerca de 93%, mantendo-se de forma semelhante em 2006.
Diferente do esperado, não ocorre redução da distância entre os rendimentos per
capita médios dos arranjos domiciliares e a média regional, como indicativo de
uma pequena redução da desigualdade entre os diferentes arranjos em um contexto
metropolitano de arrefecimento da queda da renda domiciliar e de expansão dos
programas de transferência de renda. No conjunto das regiões metropolitanas
brasileiras, houve pequena elevação nas médias per capita de rendimento por
tipo de arranjo domiciliar, segundo configurações familiares - nucleadas por
casais ou chefes sem cônjuges - associadas aos momentos do ciclo vital. No
entanto, a elevação do rendimento familiar per capita é distinta entre os tipos
de arranjos domiciliares e menor do que o crescimento regional para dois dos
tipos de arranjos entre os identificados como mais vulneráveis ao
empobrecimento (casais de até 34 anos e casais de 35 a 49 anos, ambos com
filhos e parentes). No caso dos arranjos domiciliares nucleados por chefes
femininas sem cônjuge e com filhos, o aumento do rendimento domiciliar per
capita é semelhante ao observado para a média regional metropolitana (Tabela_1
e Gráfico_1).
Os arranjos domiciliares identificados como mais vulneráveis ao empobrecimento,
além de possuírem os níveis mais baixos de rendimentos familiares per capita,
também apresentam maior concentração nos decis inferiores de renda domiciliar.
Uma das evidências desse fato é o cotejamento entre as proporções de arranjos
domiciliares por tipologia e sua distribuição por decis de renda (Tabela_2). Em
conjunto, os três tipos de arranjos domiciliares mais vulneráveis
correspondiam, em 2004 e 2006, a cerca de 58% dos domicílios das regiões
metropolitanas brasileiras, no entanto, representavam 71% dos domicílios abaixo
do valor do 5º decil da distribuição de renda domiciliar per capita
metropolitana, que identifica os 50% mais pobres.
Considerando-se o conjunto dos domicílios metropolitanos nesse período, cerca
de 44% encontravam-se abaixo do 5º decil da distribuição de renda domiciliar
per capitadas regiões metropolitanas brasileiras, ou seja, entre os 50% mais
pobres. Em ambos os anos analisados, as concentrações apresentadas por cada um
dos três tipos de arranjos domiciliares mais vulneráveis ao empobrecimento
situavam-se acima dessa proporção média. Em 2006, estavam abaixo do valor do 5º
decil cerca de 67% dos domicílios dos casais jovens, de até 34 anos com filhos,
52% dos domicílios com chefe feminina sem cônjuge e com a presença de filhos e
49% dos casais entre 35 e 45 anos, com filhos (Tabela_2).
Outra característica dos grupos domiciliares mais vulneráveis ao empobrecimento
é apresentarem taxas de geração de renda comparativamente menores do que as dos
demais tipos de arranjos domiciliares e de maneira bastante semelhante entre os
agrupamentos de regiões metropolitanas brasileiras (Tabela_3). É interessante
observar que há uma gradação com menores taxas na RM do Norte, crescendo para
as do Nordeste, do Sudeste e as do Sul.
Entre os tipos de arranjo domiciliar mais vulneráveis ao empobrecimento,
aqueles dos casais jovens com filhos apresentam a menor taxa de geração de
renda, nos quais cerca de 40% dos componentes maiores de dez anos aportavam
renda para o grupo domiciliar, em 2004, e 41%, em 2006; entre os arranjos
domiciliares dos casais de 35 a 49 anos com filhos, cerca de 47% dos
componentes geravam renda, em 2004, e 49%, em 2006. Nos domicílios chefiados
por mulher com a presença de filhos, essas proporções eram de cerca de 55% e
58% nos dois anos, evidenciando o empenho do grupo para a provisão familiar.
Nos demais arranjos domiciliares, essa taxa é bastante superior e a taxa de
geração de renda para a média das famílias metropolitanas era da ordem de 53%,
em 2004, e de 56%, em 2006 (Tabela_3).
Ainda que essa diferenciação nas taxas de geração de renda menos elevadas para
os domicílios mais vulneráveis ao empobrecimento se mantenha em 2006, observa-
se um aumento de 2,6 pontos percentuais nas taxas, considerando-se o total dos
domicílios metropolitanos. A elevação da taxa de geração de renda reflete a
expansão do emprego, bem como o acesso a programas de transferência de renda e
apresenta variações distintas entre os agrupamentos de regiões metropolitanas.
Entre os arranjos domiciliares mais vulneráveis ao empobrecimento, aqueles de
casais jovens com filhos e de casais de até 34 anos com filhos apresentaram, no
período, crescimento da taxa de geração de renda menor do que a média dos
domicílios metropolitanos. No caso das famílias com chefia feminina sem a
presença de cônjuge, a taxa de geração de renda aproximou-se da média regional
e o crescimento verificado entre 2004 e 2006 foi próximo da média
metropolitana. Entretanto, a análise da qualidade da ocupação indica, para os
domicílios com esse arranjo, proporção mais elevada de ocupações precárias
(51,2% em 2006), enquanto a média nos domicílios metropolitanos era de 46,8%
(MONTALI, 2008). As características dos componentes desse arranjo domiciliar,
apresentadas no primeiro item deste artigo, condicionam suas possibilidades da
inserção no mercado de trabalho.
O acesso aos programas de transferência de renda e os arranjos domiciliares
No decorrer da década de 2000, entre as políticas de combate à pobreza,
ampliouse a cobertura daquelas de transferência de renda. Os programas desta
natureza apresentaram abrangência incipiente em 2000, com predominância de
programas municipais, que passaram a ser implementados a partir de 1995,5 além
de dois programas federais: o Beneficio de Prestação Continuada (BPC) e o
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), instituídos em 1996. No
decorrer dos anos 2000, aumentou a cobertura dos programas de transferência de
renda com a ampliação da implementação destes dois programas federais e, a
partir de 2001, com a implementação dos programas Bolsa-Escola e Bolsa-
Alimentação e, na seqüência, os programas Auxílio-Gás, em 2002, e o Cartão
Alimentação, em 2003. A partir de outubro de 2003, com a implementação do
Programa Bolsa-Família, que unifica quatro programas de transferência e
gradativamente amplia a cobertura, aumentou o acesso a esse tipo de programa de
combate à pobreza pelos domicílios com rendimentos mais baixos.6
Concomitante à ampliação desse tipo de política de combate à pobreza, assistese
à emergência da família como referência nas políticas de transferência de renda
no país. A relevância da família como referência para as políticas sociais vem
sendo explicitada a partir de 1993, com a instituição da Loas (Lei Orgânica da
Assistência Social),7 quando a família passou a ter centralidade para concepção
e implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos, como um dos
princípios da Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, MPAS/SAS, 1999,
p.66).
A centralidade da família para os programas sociais é reafirmada nas diretrizes
da atual gestão federal, através da Política Nacional de Assistência Social.8 É
também explicitada no Programa Bolsa-Família, que se propõe a atingir a
totalidade das famílias pobres, diferenciando-se dos programas anteriores, ao
eleger a família como unidade do programa, o que significa ter o conjunto dos
componentes como público-alvo e não mais cada um isoladamente, propondo a
articulação de programas sociais que visam a superação da pobreza, o resgate da
cidadania e a inserção social (FONSECA; COHN, 2004).
Tomando como referência os grupos de arranjos domiciliares mais vulneráveis ao
empobrecimento, investiga-se aqui o acesso destes aos programas de
transferência de renda. Para tanto, utilizou-se um recurso enquanto
aproximação, a partir dos microdados da PNAD 2006 - IBGE. A estimativa do
acesso dos domicílios metropolitanos a benefícios de transferência de renda foi
calculada a partir da variável V1273 (Outros rendimentos recebidos na semana de
referência), que inclui o rendimento mensal recebido de programa governamental
de transferência de renda e também os juros de aplicações financeiras. Visando
estimar os benefícios oriundos das transferências de renda, utilizou-se a
referida variável, adotando como critério a exclusão dos domicílios com
rendimentos superiores ao 8º decil de rendimento familiar per capita, ou seja,
o 9º e o 10º decis, que correspondem a R$ 705,28, em 2004, e a R$ 800,00, em
2006 (em valores de 2006),9 tendo por suposto reduzir a interferência de
rendimentos oriundos de juros de aplicações financeiras que também estão
incluídos na variável utilizada.
Constatou-se ser ainda bastante modesto o acesso dos domicílios das metrópoles
brasileiras a programas de transferência de renda. Cerca de 9% deles tinham
acesso a pelo menos um programa dessa natureza por ocasião do levantamento
feito pela PNAD-IBGE, em 2004, e pouco mais de 11%, em 2006. Percentual este
insuficiente mesmo para atender aos domicílios com rendimento familiar per
capita situado nos dois decis inferiores de renda, que perfazem 15,2% dos
domicílios metropolitanos nos dois momentos, conforme indicado no item anterior
(Tabela_2).10
Para o total dos domicílios brasileiros, 18,3% receberam em 2006 transferência
de renda de programa social do governo (IBGE, 2008, Tabela_1.2.3). Existem
diferenças regionais na distribuição dos domicílios brasileiros com acesso a
tais programas governamentais e as maiores proporções são encontradas nas
regiões Nordeste (35,9%) e Norte (24,6%), seguidas pelo Centro-Oeste (18%), Sul
(10,4%) e Sudeste (10,3%).
Ainda que insuficiente para as regiões metropolitanas brasileiras, o acesso à
transferência de renda de programa social do governo mostra-se bem focalizado,
pois cerca de 91% dos domicílios metropolitanos beneficiários encontravam-se
entre os 50% mais pobres em 2004 e 2006 (Tabela_4). A focalização dos programas
sociais de transferência de renda é evidenciada também nas proporções mais
elevadas do que a média no acesso dos domicílios caracterizados anteriormente
como arranjos mais vulneráveis ao empobrecimento.
Considerando o conjunto dos domicílios metropolitanos segundo decis de renda
familiar per capita, foram encontradas semelhanças em 2004 e 2006 nas
proporções daqueles com acesso a programas governamentais de transferência de
renda entre os decis inferiores de renda familiar per capita. Tinham acesso a
algum tipo desses programas cerca de 27% dos 10% de do micílios mais pobres, em
torno de 53% dos 20% mais pobres e cerca de 91% dos 50% mais pobres (Tabela_4).
Acima do 5º decil, apenas 9% dos domicílios tinham acesso a tais programas e
estão situados nos 6º, 7º e 8º decis, indicando a focalização nos estratos de
renda mais baixos.
Um detalhamento da análise evidencia a manutenção, em 2004 e 2006, das maiores
concentrações de domicílios beneficiários entre aqueles identificados como mais
vulneráveis ao empobrecimento. Para os 10% mais pobres com acesso a programas
de transferência de renda, em 2006, pouco mais que um quarto correspondia a
casais jovens com filhos, um quarto era de casais na etapa de consolidação da
família e um terço compunha-se de famílias chefiadas por mulher sem a presença
de cônjuge.
Entre os arranjos domiciliares que evidenciam maiores fragilidades, destacam-se
aqueles caracterizados pelos casais de até 34 anos, com filhos e parentes, que
também apresentavam as maiores proporções (cerca de 94%, em 2004, e 95%, em
2006) com acesso a algum programa de transferência de renda nos estratos abaixo
do 5º decil de renda domiciliar per capita metropolitana - correspondentes aos
50% mais pobres. Cerca de 59% dos domicílios deste tipo, com acesso,
encontravam-se abaixo do 2º decil, ou seja, entre os 20% mais pobres (Tabela
4).
O segundo grupo com maior acesso entre os 50% mais pobres corresponde aos
domicílios chefiados por mulher sem cônjuge e com presença de filhos e/ou
parentes, exatamente o segundo arranjo domiciliar identificado por esse estudo
como um dos mais vulneráveis ao empobrecimento, entre os quais cerca de 94%
tinham acesso a renda de transferência governamental, em 2006 (Tabela_4).
O terceiro grupo com maior acesso entre os 50% mais pobres é composto por
domicílios nucleados pelo casal com idades entre 35 e 49 anos com a presença de
filhos e/ou parentes, da ordem de 93% em 2006 (Tabela_4).
Considerando-se o conjunto dos tipos de arranjos domiciliares, fica evidente a
focalização nos três tipos apontados como mais vulneráveis ao empobrecimento em
ambos os períodos - casal de até 34 anos com filhos e parentes, casal entre 34
e 49 anos com filhos e parentes e chefe feminina sem cônjuge com filhos e
parentes -, que juntos perfazem mais de 80% dos domicílios com acesso a algum
programa de transferência de renda, tanto se considerados os 10% mais pobres ou
os 20% mais pobres, como os 50% mais pobres (Tabela_4).
O acesso aos programas governamentais de transferência de renda pelos
domicílios caracterizados por arranjos mais vulneráveis ao empobrecimento
indica, ao mesmo tempo, a confirmação dessa vulnerabilidade ao empobrecimento,
como a focalização dos programas nos domicílios mais pobres.
A análise do impacto dos valores transferidos por tais programas sociais sobre
o rendimento familiar per capita dos domicílios com acesso explicita dois
aspectos. O primeiro refere-se ao maior peso das transferências para os
domicílios situados no primeiro decil de renda familiar per capita e à redução
gradual do mesmo a partir do segundo decil (Tabela_5). No caso dos domicílios
de casais de até 34 anos com filhos e de casais de 35 a 49 anos com a presença
de filhos, os percentuais de transferências sobre a renda per capita domiciliar
são mais relevantes para aqueles situados nos três decis inferiores de renda.
No caso dos domicílios das chefes femininas sem a presença de cônjuge e com
filhos e/ou parentes, embora com menor intensidade que no primeiro decil, a
proporção das transferências sobre a renda per capita é relevante em
praticamente todos os decis de renda.
O segundo aspecto refere-se ao fato de que as proporções da renda oriunda das
transferências monetárias são mais importantes no primeiro e no quinto decis de
renda dos domicílios com acesso. Merece ressalvar o peso do valor das
transferências de renda para os domicílios unipessoais femininos e masculinos
no primeiro e no quinto decis. O programa Bolsa-Família ampliou o benefício
para famílias pobres sem filhos e possivelmente foi incorporado um maior número
de domicílios em situação de indigência, aumentando o impacto das
transferências nos domicílios unipessoais femininos e masculinos no primeiro
decil de renda familiar per capita, com importante peso na renda domiciliar
(Tabela_5). A concentração no quinto decil indica o acesso desses domicílios ao
Benefício de Prestação Continuada (BPC), cujo valor é um salário mínimo. O
corte de renda do quinto decil é bastante próximo do valor do salário mínimo em
2004 e 2006, conforme observado na nota 10 deste texto.
É interessante observar como o acesso a programas de transferência está
relacionado à composição dos domicílios e aos distintos arranjos domiciliares
associados a ciclos vitais da família (Tabela_6). Observa-se que o Beneficio de
Prestação Continuada, que atende deficientes e principalmente idosos em
situação de risco, apresenta peso maior entre as famílias unipessoais
(caracterizadas por idosos), entre os arranjos nucleados pelos casais de 50
anos com filhos e/ou parentes, bem como para os casais sem filhos residentes,
entre os quais uma parcela importante é composta por idosos. Representa ainda
cerca de 15% dos benefícios a que têm acesso os domicílios com chefia feminina
sem a presença de cônjuge, lembrando-se que, nestes, 55% das chefes têm 50 anos
ou mais. Nos demais arranjos familiares é pouco expressiva sua participação
(Tabela_6).
Por sua vez, o programa Bolsa-Família apresenta peso importante entre os
programas de transferência de renda, abrangendo cerca de 74% dos domicílios
metropolitanos com acesso. É mais elevado o acesso ao Bolsa-Família pelos três
tipos de arranjos identificados como mais vulneráveis ao empobrecimento, que
contam em sua composição familiar com parcela importante de crianças,
adolescentes e jovens, ou seja, os tipos de arranjo domiciliar: casal de até 34
anos com filhos e/ou parentes; casal entre 34 e 49 anos com filhos e/ou
parentes; e chefe feminina sem cônjuge, com filhos e parentes. Entre estes,
observa-se também maior acesso ao PETI (Programa de Erradicação do Trabalho
Infantil) (Tabela_6).
Para finalizar estas considerações acerca dos programas de transferência de
renda e sobre a situação social, cabe retomar a questão dos efeitos destes
sobre a redução dos domicílios com renda zero. Outro aspecto a se considerar é
se houve aumento da proporção de domicílios com rendimento per capita nas
faixas até três salários mínimos (Tabela_7).
Constatou-se que houve pequena redução de domicílios com renda zero nesse
período. Embora pequena em pontos percentuais para a média dos domicílios
metropolitanos (0,5 ponto percentual), essa diminuição foi mais expressiva
naqueles mais vulneráveis ao empobrecimento e nos domicílios unipessoais
femininos e masculinos (Tabela_7).
Considerando-se os arranjos mais suscetíveis ao empobrecimento, suas
características de composição domiciliar e fase do ciclo de vida familiar,
verifica-se, entre 2004 e 2006, redução na proporção dos domicílios sem
rendimento entre os arranjos casal de até 34 anos com filhos e parentes (0,7
ponto percentual), casal entre 34 e 49 anos com filhos e parentes (0,3 ponto
percentual) e chefe feminina sem cônjuge, com filhos e parentes (0,5 ponto
percentual). Como especificidades, observa-se crescimento nas proporções dos
domicílios com rendimento per capita nas categorias até meio e um salário
mínimo. Na faixa entre um e um e meio salário mínimo, com a exceção dos
domicílios nucleados pela chefe feminina sem cônjuge, que se mantiveram em
15,7%, não houve aumento na proporção daqueles com maior indicação de
vulnerabilidade ao empobrecimento; pelo contrário, reduziramse aqueles
compostos pelo casal de até 34 anos, com filhos e/ou parentes. Nestes casos em
que os domicílios apresentam rendimentos mais baixos, ao que parece, as
transferências de renda e as condições do mercado de trabalho favorecem menores
possibilidades de superação de condições precárias.
A redução da proporção de domicílios com renda zero, nas regiões metropolitanas
brasileiras, pode ser tomada como uma evidência de impactos de programas de
transferência de renda. Observou-se tal redução com intensidade semelhante em
todos os agrupamentos de áreas metropolitanas segundo as grandes regiões, com
exceção daquelas da Região Sul, onde esse decréscimo apresentou menor
intensidade. Evidencia-se variação positiva, entre 2004 e 2006, apenas para as
faixas de rendimento domiciliar per capita entre meio e um salário mínimo, que
apresentam, respectivamente, elevação em 4 e 4,6 pontos percentuais. Esses
movimentos evidenciam redução da indigência, porém com pequeno impacto na
diminuição da pobreza. Interpretação semelhante é sugerida também por outros
pesquisadores (BARROS, et al., 2006).
Na presente análise comparativa dos dados da PNAD 2004 e 2006, esta
interpretação de redução da indigência com pequeno impacto na queda da pobreza
é respaldada pelo contexto de precarização do trabalho e de permanência de
elevado desemprego metropolitano no período analisado - apesar da tendência de
arrefecimento -, além do crescimento da economia pouco intenso até 2006. Ainda
que tenha ocorrido, nesse período, elevação do emprego e do emprego
regulamentado, é pequena a recuperação da renda dos ocupados, como evidenciado
na primeira parte do artigo, e muito pequena a elevação da renda familiar per
capitanas regiões metropolitanas.
Considerações finais
A presente análise indica, por um lado, a focalização dos programas de
transferência de renda nos domicílios mais pobres e nos grupos de domicílios
que, por vivenciarem momentos distintos do ciclo vital familiar, abrigam
crianças e adolescentes ou idosos, muitas vezes apresentando condições menos
favoráveis para articular a sobrevivência.
Por outro lado, constatou-se redução nos domicílios com rendimento zero em
todos os agrupamentos de regiões metropolitanas analisados, que, embora
pequena, foi mais expressiva nos domicílios identificados como mais suscetíveis
ao empobrecimento, bem como em domicílios unipessoais femininos e masculinos.
A redução da proporção de domicílios com renda zero, nas regiões metropolitanas
brasileiras, é assumida por nós como uma evidência de impactos de programas de
transferência de renda. Já a concomitante variação positiva entre 2004 e 2006
apenas para as faixas de rendimento domiciliar per capita entre meio e um
salário mínimo é interpretada como indício de redução da indigência, porém com
pequeno impacto na diminuição da pobreza.
A hipótese de que o acesso aos programas de transferência de renda e o contexto
de retomada do emprego poderiam promover redução da desigualdade de rendimentos
para os grupos de domicílios identificados neste estudo como mais vulneráveis
ao empobrecimento não se confirma. Um dos indícios é de movimento inverso, pois
se, por um lado, houve pequena elevação no rendimento familiar per capitanas
regiões metropolitanas brasileiras no período analisado, por outro, essa
elevação é distinta entre os tipos de arranjos domiciliares e ocorreu de forma
desfavorável em relação aos três tipos de família identificados como mais
vulneráveis ao empobrecimento, reproduzindo a desigualdade de renda entre os
domicílios.
A taxa de geração de renda comparativamente menos elevada dos arranjos
domiciliares identificados como mais vulneráveis ao empobrecimento apresentou,
no período analisado, crescimento menor do que a média dos domicílios
metropolitanos. No caso dos domicílios com chefia feminina sem a presença de
cônjuge, embora se verifique redução da taxa de desemprego, soma-se a proporção
mais elevada que a média de ocupações precárias, indicando para esse conjunto
de arranjos domiciliares as condições mais desfavoráveis para inserção no
mercado.
Dessa maneira, entre os arranjos mais suscetíveis ao empobrecimento, tendo
presentes as características de composição domiciliar e fase do ciclo de vida
familiar - casal de até 34 anos com filhos e parentes, casal entre 34 e 49 anos
com filhos e parentes e chefe feminina sem cônjuge, com filhos e parentes -,
são evidentes a redução na proporção dos domicílios sem rendimento e o
crescimento daqueles com rendimento per capita nas categorias até meio e um
salário mínimo. Na faixa superior não se observou aumento na proporção destes
domicílios. Ao que parece, nestes casos em que os domicílios apresentam
rendimentos mais baixos, as transferências de renda e as condições do mercado
de trabalho não favorecem possibilidades de superação da condição de pobreza.
Há indícios de que os programas sociais vêm afetando positivamente as famílias
nos estratos mais baixos de rendimento familiar per capita, reduzindo a
condição de indigência. No entanto, em 2004 e 2006, permaneceu pequena a
atuação destes programas de transferência de renda nas regiões metropolitanas
brasileiras, onde está concentrada grande parte da população classificada como
pobre pelos estudiosos do tema.
Em decorrência desse fato e da concentração de importante parcela da população
brasileira nestas regiões, há necessidade de investimentos maciços nas regiões
metropolitanas brasileiras para promover alguma mitigação da pobreza nesses
espaços. Essa observação é feita explicitando-se que, além da necessidade da
elevação do montante do benefício para atender aos custos mais elevados da vida
metropolitana, é fundamental a implementação de programas complementares de
geração de renda, de capacitação dos jovens para o mercado de trabalho e de
iniciativas para a redução de desigualdades de gênero e raça no acesso ao
trabalho e nos rendimentos auferidos pelo trabalho.