A complexidade de Volpi: notas sobre o diálogo do artista com concretistas e
neoconcretistas
I.
Volpi não assinou manifestos, não publicou textos teóricos, pouco se pronunciou
sobre outros artistas e não manteve vínculos fortes com nenhuma vertente
estética da arte brasileira. Era filho de imigrantes italianos2 que tocavam um
pequeno comércio num bairro operário da cidade de São Paulo e muito cedo, aos
12 anos, precisou trabalhar, a princípio como entalhador e encadernador,
posteriormente como pintor-decorador. Essa origem modesta - que o artista
cultivou ao longo de toda sua vida, por meio de hábitos simples e do apego à
casa do Cambuci, então um bairro de classe média baixa no qual viveu até o fim
de seus dias - contribuiu para consolidar a imagem de um pintor quase ingênuo,
afastado tanto das disputas intelectuais e artísticas quanto da sociabilidade
mundana do meio das artes plásticas. Além disso, o próprio Volpi relutava em
aceitar influências ou filiações artísticas3, e não me parece casual que
reconhecesse sobretudo um vínculo com pintores como o medieval Margaritone D'
Arezzo ou Giotto, cujas obras pôde ver detidamente - conta-se que visitou
dezoito vezes a Capela dos Scrovegni, em Pádua - quando de sua única viagem à
Europa, em 1950.
Essa aura de simplicidade contribuiu para que muitos críticos e escritores
sublinhassem a pureza pessoal e artística e a dimensão intuitiva de Volpi.
Mesmo Mário Pedrosa - um crítico formado na tradição marxista, um dos mais
importantes intérpretes de sua obra e curador de sua primeira retrospectiva, em
1957, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - em parte colaborou para
fortalecer essa imagem de singeleza. Em 1957, no catálogo para essa
retrospectiva, escreverá:
Nunca seguramente abriu uma revista de arte estrangeira para estudar
a reprodução de um Picasso, Matisse, Renoir, Van Gogh ou Gauguin. É
que nunca precisou ir buscar nos outros as soluções encontradas não
em si mesmo (não é pretensioso), mas em roda de si, nos seres simples
que o cercam, nas crianças [...], nas coisas e nos afazeres
cotidianos.
Para Pedrosa, Volpi era o "insular do Cambuci"4.
De fato, Volpi não era um teórico ou alguém que clareasse sua concepção visual
por meio de formulações escritas ou debates. Contudo, poucos artistas
brasileiros - independentemente da área de atuação - dispuseram de um meio
cultural tão rico quanto ele, um meio cultural moderno, feito de convivência e
diálogo, e não algo acadêmico e protocolar, ainda que esse ambiente cultural
tivesse muitas limitações. Desconsiderar essa realidade significaria
identificar em sua pintura uma singeleza que sem dúvida rebaixa a complexidade
e os dilemas que ela contém. Se a pintura de Volpi parece solicitar a
aproximação com um temperamento simples e alheio a tensões, seria ilusório ver
aí algo a que se chegou sem mediações ou debate. Volpi, como escreveu o poeta e
crítico de arte Murilo Mendes, "tornou-se anônimo como um pintor medieval"5,
pois de fato sua pintura concentra uma experiência que está além do lirismo
subjetivo. Contudo, como notou o artista e amigo Willys de Castro, ele alcança
esse estatuto "conjugando uma grande dose de experiência e entregando-a,
traduzida, flexionada, aos olhos de quem quer ver"6.
Volpi viveu e produziu muito. Em quase todos os períodos de sua trajetória
encontrou maneiras de estar em contato com obras, discussões, artistas e
intelectuais das mais diversas áreas e o fez com um sentido de pertinência
notável. Não me parece simples acaso que já em 1926 tenha tido a curiosidade de
assistir à conferência de Marinetti no Teatro Cassino Antárctica, em São Paulo.
Se seu aprendizado técnico pode ter se iniciado ainda nos anos de trabalho como
pintor-decorador, já na década de 1930 Volpi se aproxima do grupo Santa Helena,
associação informal de artistas - Francisco Rebolo, Mario Zanini, Manoel
Martins, Humberto Rosa, Fulvio Pennacchi, Aldo Bonadei e Clóvis Graciano ó, em
sua maioria vindos de camadas da população com pouca ou nenhuma tradição
artística, vivendo profissionalmente de atividades ligadas ao artesanato, fosse
a pintura de paredes (Volpi, Rebolo e Zanini), fosse o comércio de carnes
(Pennacchi).
No entanto, ainda que a origem do grupo tivesse raízes em estratos sociais
culturalmente modestos, uma série de importantes discussões artísticas
internacionais encontrava ressonância ali. Pennacchi, por exemplo, tinha grande
influência do Novecento italiano7, e Rebolo e Zanini olharam com cuidado a obra
do Carrà do "retorno à ordem". Por outro lado, a tendência italiana oposta, a
pintura florentina desenvolvida por Ardengo Soffici, também encontrou acolhida
pelo grupo8. Na segunda metade da década de 1930, Volpi também irá freqüentar
as reuniões que o pintor Paolo Rossi Osir organizava em seu ateliê e de que
participavam, além dos santelenistas, artistas altamente informados, como o
pintor e escultor ítalo-germânico Ernesto de Fiori (que chega ao Brasil em 1936
e que manteve intensa atividade artística e crítica no país), Lasar Segall
(judeu lituano, formado no meio expressionista alemão e que se fixa em São
Paulo em 1923), Tarsila do Amaral (pertencente à geração dos modernistas de
1922, e que também manteve estreito contato com as vanguardas modernas em
Paris), além do crítico e escritor Sérgio Milliet, do escultor Bruno Giorgi,
entre outros.
Segundo depoimento de Bruno Giorgi à Folha de S. Paulo em 1979, o escultor
leva, em 1937, Mário de Andrade - um dos intelectuais paulistas mais preparados
do período - e Sérgio Milliet ao ateliê de Volpi e ambos "ficaram
maravilhados"9. Posteriormente, em 1944, durante a primeira individual do
pintor, Mário adquire um quadro da mostra - a "Marinha", hoje no acervo do
Instituto de Estudos Brasileiros, da USP - e, no mesmo ano, escreve um artigo
sobre Volpi para a Folha da Manhã, em que fala de temperamento "transbordante"
e de "lirismo voluptuoso"10 em relação a sua pintura. Mesmo que nos
detivéssemos nesse ponto da trajetória de Volpi, seria impossível continuar
falando de alguém alheio aos círculos artísticos e culturais de São Paulo -
certamente cheios de limitações e ainda provincianos - e aos debates que, mesmo
tardiamente, se travavam no Brasil.
Nessas décadas, São Paulo estava longe de ser um pólo artístico moderno. Porém,
Volpi teve oportunidade, entre 1930 e 1947, de ver mostras que trouxeram para
cá obras de quase todos os melhores artistas europeus: Cézanne, Matisse, Dufy,
Picasso, De Chirico, Morandi, Carrà, Albers, Magnelli, Calder, Mario Sironi,
Giovanni Fattori, entre tantos outros11. Mesmo a polêmica exposição de 1917 de
Anita Malfatti foi observada com cuidado pelo pintor. Visitar mostras de arte,
em princípio, pode não significar muita coisa. Poucos artistas brasileiros,
porém, metabolizaram tão produtivamente as experiências estéticas que lhe foram
oferecidas. E a descrição feita por Sérgio Milliet das incursões de Volpi à
Exposição de Arte Francesa, de 1940, ilustra à perfeição o tipo de relação que
o pintor mantinha com os trabalhos que pôde ver. Segundo o escritor, Volpi
enfia-se nos salões durante horas, todos os dias, contemplando e
estudando afinal, nos originais, aquilo tudo que até então amara de
longe [...]. Cézanne sobretudo o comove. [...] O trabalho dos
volumes, a composição, os valores, tudo é analisado em silêncio que
se quebra de quando em quando com um palavrão surdo12.
Se me detive tanto na apresentação dessas informações foi porque realmente me
pareceu necessário desfazer a imagem, acalentada aliás pelo próprio artista, de
um Volpi bom (e talentoso) selvagem13.
II.
A partir de finais dos anos 1940 e na década de 1950 - o período que diz
respeito à questão central deste artigo ó, o pintor manterá um diálogo ainda
mais intenso com obras, artistas e intelectuais profundamente empenhados em
transformar o cenário ainda provinciano do meio artístico paulista e
brasileiro. E um diálogo em que Volpi, por já ter uma obra consolidada - suas
Fachadas surgem no fim da década de 1940 ó, freqüentemente é aproximado de
posições das quais não participara ativamente. Dado seu relativo silêncio e
distância em relação à posição de grupos, ocupará um lugar não muito diferente
daquele do velho Cézanne, que, vivendo meio isolado em Aix-en-Provence, ficará
consideravelmente à mercê das informações e interpretações fornecidas por Emile
Bernard e Maurice Denis, com quem mantinha um contato mais freqüente14.
Seria cansativo enumerar todos os contatos e experiências por que o pintor
passa no período. Não custa, porém, ressaltar a importância dos seis meses de
viagem pela Itália e França, dedicando-se sobretudo a observar o que conhecia
apenas por reproduções; a estreita relação que mantém com o psicanalista,
crítico e poeta Theon Spanudis a partir de 195115; a aproximação com os
artistas concretos que, liderados por Waldemar Cordeiro - que escreve sobre
Volpi ao menos desde 1950 ó, assinarão, em 1952, o Manifesto Ruptura e que
depois incorporarão outros artistas ao grupo; o convívio, a partir de 1953, com
artistas construtivistas menos ortodoxos, como Willys de Castro e Barsotti e,
posteriormente, também com os poetas concretistas Décio Pignatari, Augusto e
Haroldo de Campos; o contato com Mário Pedrosa a partir da segunda metade da
década, entre tantos outros. No final da década de 1950, a casa do Cambuci
torna-se um verdadeiro ponto de encontro, do qual Volpi sem dúvida tirará
proveito, além de também partilhar sua experiência com os mais jovens. Na
década de 1960, mesmo artistas e intelectuais como Ungaretti e Roman Jakobson
irão visitá-lo em seu ateliê, o que não deixa de evidenciar que Volpi não era
apenas uma avis rara a ser exibida exoticamente aos europeus civilizados, e sim
alguém de que seus pares mais cultos se orgulhavam. Na mesma proporção,
aumentam as possibilidades de ver um maior número de obras de arte de
qualidade, e para isso a criação do Masp, em 1947, e da Bienal de São Paulo, em
1951, contribuirá decisivamente. Até hoje, a segunda edição da Bienal é
considerada uma das mais importantes mostras de arte moderna de todos os
tempos16.
A trajetória artística de Volpi costuma ser considerada como um movimento
razoavelmente orgânico, sem grandes rupturas ou saltos. Contudo, acredito que
os trabalhos de sua chamada fase concreta - um período difícil de determinar
dada a não datação das obras pelo artista, mas que envolve aproximadamente três
anos da segunda metade da década de 1950, período em que, tudo leva a crer,
também pintou quadros com soluções diversas - consistem no conjunto de obras
com a mais acentuada mudança de sua carreira17. E isso, a meu ver, torna
evidente que Volpi, ao menos por uns poucos anos, realmente dispôs-se a pôr de
lado alguns aspectos marcantes de sua pintura anterior.
Algumas transformações, nesses trabalhos, saltam aos olhos. O pintor abandona
as cores mais "lavadas" e abertas de seus trabalhos anteriores e passa a tirar
proveito da opacidade da têmpera - Volpi não adotará as tintas industriais dos
concretos - para criar superfícies homogêneas e de cores mais intensas. Os dois
trabalhos apresentados na I Exposição Nacional de Arte Concreta, de 1956 - da
qual participa como artista convidado ó, são construídos com um tom de vermelho
dificilmente encontrado nas telas anteriores ou posteriores do artista. Também
as irregularidades tão características de suas Fachadas, as configurações meio
rústicas a insistir na origem manual das formas, dão lugar a linhas
rigorosamente retas e a formas geométricas estritas. Muitas vezes - mas há aí
diferenças que abordarei mais adiante ó, as figuras delineadas com rigor
estabelecem entre si uma relação dinâmica que parecem remeter ao Manifesto
Ruptura, quando reivindica uma arte "dotada de princípios claros e
inteligentes", "considerando-a um meio de conhecimento deduzível de conceitos",
que busquem a "renovação dos valores essenciais da arte visual (espaço-tempo,
movimento e matéria)"18. Seja como for, indiscutivelmente as pinturas desse
período revelam uma relação mais evidente entre as formas e seus
desdobramentos.
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Numa das telas da exposição concreta (Composição concreta branca e vermelha,
1955, 54 x 100 cm, da coleção Rose e Alfredo Setúbal), essa busca de uma
dinâmica clara que unifique os elementos em jogo se mostra acentuadamente. A
extensão de vermelho nas margens do quadro se vê interrompida pela trama xadrez
que a organiza sutilmente, pela progressiva incorporação da superfície vermelha
à grade regular, em que se sucedem quadrados vermelhos e brancos. As duas
diagonais externas (à esquerda e à direita) desencadeiam um movimento que rompe
a pacífica sucessão de quadrados brancos e vermelhos, criando triângulos que
dinamizam a composição e criam novos eixos de leitura, sobretudo se
considerarmos que a posição dos triângulos brancos e vermelhos inverte-se dos
dois lados, intensificando a impressão de dinâmica do conjunto. Daquelas duas
diagonais partem novas diagonais (mais internas) que, dado o número ímpar de
quadrados que compõem a obra (onze "casas"), movem-se paralelamente, em lugar
de se encontrarem. Esse descompasso faz com que, no centro geométrico da tela,
surja um paralelogramo, combinação meio tensionada dos triângulos que foram
criados pelo seccionamento dos quadrados centrais. Essa figura, que por sua
centralidade e diferença formal adquire uma visibilidade acentuada, funcionará
também como uma espécie de síntese do movimento que dinamizou aquele xadrez
estático, já que surge como a única forma que, ao ocupar dois quadrados,
conteria a chave (o "conceito" a partir do qual o trabalho se deduz) de
elucidação dos demais procedimentos: o seccionamento diagonal de um quadrado.
Um outro trabalho do mesmo período (anteriormente pertencente à Coleção Adolpho
Leirner, 116 x 73 cm, hoje na coleção do Museu de Belas Artes, Houston) joga
com três linhas de triângulos idênticos, dispostos na vertical. As linhas da
direita e do centro, em amarelo, dispõem-se de maneira idêntica. A linha da
esquerda também começa com um triângulo amarelo e, depois, prossegue com uma
sucessão de triângulos verdes, dispostos em direções alternadas. A tela oferece
uma dinâmica menos forte e menos clara que a do quadro anterior. Nem por isso
escapa a certos procedimentos construtivos. O único triângulo amarelo à
esquerda parece sugerir a simples continuidade da disposição que vigora nas
outras duas linhas. E seu desdobramento irregular e em cor diversa procura
tornar evidente como a inserção e desdobramento alternados de formas idênticas
criam percepções e dinâmicas distintas - e aqui a influência de Albers pode ter
sido decisiva ó, que inclusive contribuem para dar às outras duas linhas de
triângulos uma aparência mais complexa, pois elas parecem evitar a disposição
simétrica dos triângulos verdes, mais dinâmica, porém mais clássica.
Se aproximarmos esses trabalhos de Volpi de uma obra de Waldermar Cordeiro
presente na mesma I Exposição Concreta, de fato as telas do pintor revelam
diferenças significativas em relação àquelas do principal impulsionador do
movimento concreto em São Paulo. Na obra Idéia visível (40 cm de diâmetro,
coleção particular), o uso por Cordeiro do plexiglass já é um indicador seguro
de suas intenções. A transparência do suporte, acentuada por um anteparo preto
colocado por trás, ajuda realmente a tornar visível a idéia do artista, que de
certo modo se resume a recusar a simples reiteração concêntrica dos diversos
círculos, construindo figuras que, em sua excentricidade, produzem a impressão
de que aquele desequilíbrio conduzirá a uma dinâmica dos círculos, desencadeada
pela falta de balanceamento entre eles. Sob a influência do último
construtivismo - Max Bill e a Escola de Ulm, quando sob sua influência ó,
muitos dos trabalhos da mostra primam por tornar transparente o processo que
engendraria a forma final dos trabalhos, pois à arte de uma época industrial
não caberia operar com as antigas noções de intuição, inspiração ou
genialidade. E embora, já em 1956, seja possível encontrar uma maior busca de
racionalidade e de unidade formal entre os concretos de São Paulo, Aluísio
Carvão, César Oiticica, Hélio Oiticica, Franz Weissmann (sobretudo em
Composição com semicírculos, de 1953) e Ivan Serpa - artistas trabalhando no
Rio de Janeiro - muitas vezes incidem em procedimentos semelhantes19.
A ruptura entre concretos e neoconcretos - posteriormente caracterizada como
uma oposição entre paulistas e cariocas, o que conduz não apenas a uma certa
competição provinciana como oculta maiores complexidades, pois Theon Spanudis
assinará o manifesto neoconcreto, e Willys de Castro e Barsotti sempre estarão
mais próximos das posições neoconcretas, sem falar que poucos artistas, dos
dois lados, eram realmente paulistas ou cariocas - se formaliza com a
publicação do manifesto neoconcreto, em 22 de março de 1959, no "Suplemento
Dominical" do Jornal do Brasil, e com a I Exposição Neoconcreta, do mesmo
período. Contudo, mesmo durante as duas versões da I Exposição Nacional de Arte
Concreta (fins de 1956 no MAM-SP e começo de 1957 no Ministério da Educação e
da Saúde, no Rio de Janeiro), algumas divergências entre os dois grupos já se
faziam notar. Ferreira Gullar20 e Mário Pedrosa21, com dois dias de diferença e
ainda no mês da exposição no Rio, tornam claras algumas distinções entre os
dois grupos. Embora Gullar escreva num tom mais polêmico que o de Pedrosa, os
argumentos vão na mesma direção: enquanto os paulistas seriam mais teóricos,
mais próximos da idéia e da dinâmica visual, lidando com formas simplificadas e
evitando alusões subjetivas, os cariocas se inclinariam mais para o empírico,
para o sensual e subjetivo, encarando a pintura como cor e matéria e não apenas
como jogo óptico realizado a partir de cores duras e formas fortes.
A discussão em torno das polêmicas entre concretos e neoconcretos extrapola o
objetivo deste ensaio22. O que importa ressaltar é que, segundo todas as
evidências, na segunda metade da década de 1950, Volpi parece mover-se entre
influências de ambos os grupos, sempre com soluções singulares. Um trabalho de
fins da década (da coleção Adolpho Leirner, atualmente na coleção do Museu de
Belas Artes, Houston, 70 x 70 cm) realmente aponta para direções diversas das
dos dois quadros analisados antes.
De saída, Volpi parece armar um jogo que corresponda a expectativas
concretistas. A fatura continua homogênea, as linhas perfeitamente retas e, em
razão de a base do triângulo à esquerda e do polígono irregular em marrom
(embaixo) terem a mesma medida, tem-se a impressão que o triângulo à esquerda
servirá de matriz para um desdobramento formal caro às obras concretistas. Se
traçarmos uma linha unindo o ângulo superior esquerdo do polígono marrom (o que
toca o limite da tela ao alto) a seu ângulo inferior direito, obteremos de fato
um triângulo idêntico ao da esquerda. Ou seja, sugere-se o acionamento de uma
dinâmica formal razoavelmente lógica, que logo a seguir se frustra, dado que a
irregularidade da faixa marrom impossibilita o prosseguimento daquele processo.
Assim, a área em marrom tende mais a mostrar-se como uma força que rompe a
estabilidade do quadrado da tela - não por acaso ela se aproxima mais de um
retângulo - do que como uma dinamização de suas potencialidades. Além disso, o
fato de a faixa alargar-se ao subir reforça esse movimento. Caso ela se
dispusesse em sentido inverso ó estreitando-se à medida que subisse ó, seria
inevitável percebê-la como perspectivação de uma superfície, com o que a
impressão de uma área agindo sobre outra área se anularia por completo, já que
ambas se converteriam em virtualidades.
Da maneira como se estende, a faixa marrom não está livre de ambigüidades: pode
mesmo sugerir uma lâmina que se apóia sobre a superfície da tela. Mas, por
estar solidamente pousada na base do quadro, a ilusão se desfaz. No conjunto da
obra predomina um desequilíbrio - e não uma dinâmica ó que nasce da relação
instável entre a faixa marrom e o campo da tela, o que intensifica ainda mais
sua presença enquanto força que age sobre uma área homogênea, complexificando-
a.
Talvez a maioria das pinturas de Volpi influenciadas pelo construtivismo se
aproxime mais da estética concretista. Contudo, vários outros trabalhos
apresentam soluções próximas à descrita acima, bem mais afeitas às preocupações
dos neoconcretistas. O quadro pertencente à coleção Raquel Arnaud (de final da
década de 1950, com 69 x 103,2 cm) também opera nessa direção. Da esquerda para
a direita, temos um triângulo pintado num vermelho meio fosco, um "trapézio" em
vermelho mais intenso - que para ser de fato um trapézio precisaria incorporar
o triângulo - e um triângulo branco.
Nessa tela a relação entre as cores desempenha um papel mais importante do que
na tela analisada antes. A intromissão do triângulo à esquerda na área do
"trapézio" parece ganhar um novo estatuto ao conquistar uma cor mais intensa,
que confere uma realidade intensa à forma que se desdobra a seguir. No entanto,
ironicamente, essa forma se vê limitada em sua expansão por um outro triângulo,
o branco. Novamente Volpi atua frustrando a expectativa de uma dinâmica formal
plena. Os três ângulos mais ativos - o central do primeiro triângulo e os dois
ângulos que se encontram na parte inferior direita do quadro ó, que conduzem o
olhar, conspiram para estabelecer entre si uma relação de continuidade, em que
a direção apontada pelo anterior se intensifique no seguinte. Mas o resultado
final é uma espécie de soma zero, uma região (o ângulo inferior direito do
quadro) em que o jogo de forças cessa.
III.
Como apontei anteriormente, tudo leva a crer que Volpi pintou ao mesmo tempo
telas em estilos algo diversos: algumas mais próximas de concretos e
neoconcretos, outras mais ligadas a sua produção anterior. Contudo, resta
entender por que, no final da década de 1950, ele praticamente põe de lado
aquela maneira mais clara de articular os elementos formais dos trabalhos e
reata com elementos que sua obra anterior havia ressaltado: a gestualidade
contida, a ênfase na dimensão artesanal da pintura, as cores esmaecidas e
reticentes, as freqüentes passagens tonais entre diferentes regiões de uma
tela. E a compreensão desse reatamento com sua obra anterior ó e que conduzirá
a um dos períodos mais fecundos do artista, a década de 1960 ó também precisa
levar em consideração em que medida aquela experiência com formas fortes e
claramente articuladas modificou sua produção posterior.
Desde Maliévitch, o construtivismo - afinal, o suprematismo talvez seja a
primeira manifestação explícita do construtivismo - pretendia-se uma arte
associada ao desenvolvimento tecnológico, uma forma de expressão que estivesse
à altura dos novos desafios:
Não podemos utilizar os navios em que viajavam os sarracenos; da
mesma maneira devemos, na arte, buscar as formas que correspondam à
vida contemporânea. O aspecto técnico de nosso tempo não faz senão
progredir, e no entanto tenta-se fazer a arte retroceder cada vez
mais23.
A relação clara e explícita entre os elementos de uma pintura ou escultura
mimetizaria - criticamente, não resta dúvida24 - a articulação entre os
elementos técnicos, bem como sua intervenção clara na natureza. Em sua última
fase - sobretudo com Max Bill ó, essa preocupação construtivista conduzirá a
uma reivindicação de clareza formal que chegará às raias de converter a
estrutura da obra de arte num processo reversível, em que caberia ao observador
refazer os procedimentos empregados na construção de uma pintura ou escultura.
Não por acaso a fita de Moebius se tornou quase um emblema desse raciocínio. E
basta observar um trabalho como Unidade tripartida - tão influente na arte
brasileira ó, de Max Bill, para se ter uma idéia da extensão dessa concepção de
forma, bem como dos problemas que sua reversibilidade, transparência e
linearidade implicam.
Para Volpi - observando o conjunto de sua obra ó, seria praticamente impossível
assimilar com profundidade esses pressupostos, por mais que eles tenham tido
importância em sua formação. Sua pintura realiza uma crítica à sociedade
capitalista e à industrialização, mas voltando-se para uma noção de trabalho
muito mais próxima do artesanato do que da formalização rigorosa conduzida
pelos processos técnicos, industriais e mecânicos25. Sua maneira de configurar
e aproximar os seres depende de uma experiência prolongada, por meio da qual se
constitua um conhecimento que possibilite formalizar materiais e coisas sem
violentar sua consistência natural, sua resistência à ação dos procedimentos
técnicos. Idealmente, para Volpi as formas teriam algo do desgaste natural das
coisas, como ocorre com os degraus de uma velha escada, que com o uso se tornam
corroídos e côncavos, e isso se revela na configuração vacilante de seus
motivos, que não deve jamais - a não ser em momentos de exceção, como na fase
concreta - cingir em demasia a matéria que lhes dá corpo.
Do mesmo modo, a relação entre as formas deve obedecer a princípios
semelhantes. Nos melhores momentos de sua pintura, ao menos a partir de fins da
década de 1940, será um tonalismo muito sutil que tornará possível o
relacionamento entre os vários elementos de um quadro. E nesse aspecto poucos
artistas foram mais decisivos para Volpi que Morandi26. A proximidade entre os
tons fará com que certas regiões da tela se unam sem produzir a impressão de
que foram submetidas a uma estrutura anterior a elas. Ainda que essa estrutura
preexista, como ocorre com as complexas tramas de bandeirinhas que povoam
muitos de seus trabalhos da década de 1960. Trata-se de encontrar afinidades
serenas entre os elementos e não de impô-las. E, para que esse movimento se
cumpra a contento, a maneira tão peculiar e sutil com que Volpi lida com a
têmpera desempenha um papel fundamental na organização dos quadros. A
gestualidade tímida do artista não guarda nenhuma relação com uma
expressividade que revele drama subjetivo. Sua função decisiva consiste em
contribuir para a eficácia do tonalismo. Na medida em que, no "interior" de
cada motivo, as cores não se constituem de maneira cabal - como ocorreria se
tivessem uma textura homogênea, chapada ó, revolvendo-se continuamente à
procura de sua identidade, elas tendem naturalmente a extravasar seus contornos
e se aproximar das áreas fronteiriças, com o que as transições tonais se
cumprem à perfeição.
Penso que seja essa a razão para algumas sérias dificuldades que Volpi encontra
ao trabalhar com cores mais chapadas, seja na fase concreta, seja em trabalhos
posteriores ou anteriores a ela. Movendo-se num território pouco familiar à sua
sensibilidade, o pintor muitas vezes não consegue transpor os limites de uma
relação figura e fundo tradicional. Acredito que nos trabalhos analisados
anteriormente - em que procurei sublinhar relações entre sua produção e as
discussões de concretos e neoconcretos - o artista supera essas dificuldades,
ora por soluções mais dinâmicas, ora por caminhos menos legíveis, que envolviam
novas e instigantes saídas. Em geral, porém, domina as telas uma certa rigidez,
o que a meu ver reduz a força dos trabalhos. Parece-me indiscutível contudo que
a experiência de Volpi com as discussões levantadas por concretos e
neoconcretos contribuiu para suas novas articulações formais, ainda que com
soluções bem distantes daquelas encontradas pelos artistas dos dois grupos.
Volpi é quase invariavelmente considerado um grande colorista. Não há dúvida de
que as cores têm um papel importante em suas telas. Caracterizar um artista, a
um só tempo, como tonalista e colorista constitui quase um paradoxo. Junto a
Morandi, Matisse esteve entre os pintores modernos que Volpi mais admirava. Na
pintura de Matisse as cores têm uma função estruturante inegável. São elas que
afirmam e ordenam a superfície dos quadros, por mais que a unidade estabelecida
por elas venha a ser problematizada pela multiplicidade introduzida por
arabescos e padronagens. Na pintura de Volpi raramente esse movimento se
consolida. Por vezes, algumas cores conquistam maior autonomia e se afirmam com
força na superfície da tela. Mas logo a sua timidez e a força do movimento
tonal relativizam a intensidade daqueles instantes de afirmação.
Para a estética construtivista, a ênfase nas superfícies de cor impessoais se
justificava pela busca de uma arte que se afastasse dos subjetivismos e de seu
apego aos caprichos individuais. De um ponto de vista perceptivo, tratava-se de
encontrar uma forma sensível de expressar um presente simultaneamente anônimo e
repleto de novas possibilidades, um tempo em que nos víssemos livres das
amarras da tradição e abertos a horizontes inexplorados, tornados possíveis
pelos desenvolvimentos técnicos e pela potencialização das capacidades humanas.
Volpi também procura um anonimato, mas não no presente e na impessoalidade
industrial. A impessoalidade que se depreende de suas telas encontra suas
fontes no mesmo tempo lento com que suas formas se mostram. A semelhança de
suas cores com a aparência dos afrescos que ele tanto apreciava revela seu
interesse pela criação de experiências que evoquem um tempo longamente
sedimentado27. E por isso as telas precisam pôr à mostra sua origem artesanal,
pois é nesse trabalho transmitido pela experiência e incorporado pela prática -
uma tradição que se perde no tempo e que apaga os vestígios das
individualidades - que Volpi deposita todas suas esperanças. A história que
surge em suas obras desconfia da disponibilidade de um presente que precisa pôr
entre parênteses o passado para realizar suas esperanças.
A figura pública meio franciscana que Volpi ajudou a construir reforçava uma
dimensão simbólica que está nas suas obras. O eterno cigarro de palha, os
tamancos, os trajes simples, a produção manual de chassis e tintas, os inúmeros
filhos de criação, a casinha simples da rua Gama Cerqueira, a disposição para
ajudar os necessitados ó tudo isso falava a favor de uma vida conduzida o mais
longe possível do mundo do comércio, do lucro e dos interesses egoístas. Como
os sutilíssimos artesãos que suas telas pressupõem, ele seria uma espécie de
último grande representante de uma nobre linhagem em extinção, e seus trabalhos
consistem no elogio e na afirmação dessa história remota e digna. O que a
persona de Volpi oculta - e por isso me foi necessário começar por discuti-la -
é que o artista chegou a essas soluções por uma incorporação muito peculiar de
toda a tradição moderna. Elas não se projetaram dele espontaneamente, como se
fossem sua sombra. E cabe entender por que a experiência social brasileira
conspirou contra uma arte afirmativa e diferenciada, como a de seus pares
europeus e norte-americanos.
Acredito que, à sua maneira, Volpi estava pondo em xeque o otimismo que a
industrialização trouxe ao Brasil, sobretudo a partir dos anos 1950, e que de
alguma forma encontrava ressonância também nas obras de concretos e
neoconcretos e em várias outras produções artísticas e intelectuais do período.
Se Volpi teve influência dos movimentos construtivistas brasileiros, por outro
lado posteriormente influenciou importantes artistas que participaram daqueles
movimentos. Penso ser praticamente impossível considerar os Bólides de pigmento
de Hélio Oiticica sem pensar nessas telas que mal ocultam os pigmentos que as
compuseram28. Amílcar de Castro julgava Volpi o maior artista brasileiro e
acredito que suas esculturas de corte e deslocamento devem muito às passagens
tonais do pintor29. E a lista poderia ir longe: as dobras dos Bichos de Lygia
Clark, o Cubocor de Aluísio Carvão, certos desdobramentos das esculturas de
Weissmann, as xilogravuras Tecelares de Lygia Pape e suas implicações, ao mesmo
tempo, manuais e geométricas etc. Esses desdobramentos indicam que as questões
presentes na pintura de Volpi respondiam a interrogações nada superficiais a
respeito do Brasil, de suas possibilidades e impossibilidades.
Tudo indica que, para Volpi, a ordenação social existente no Brasil não teria
como responder à altura aos desafios que a industrialização, a urbanização e a
competição trariam. À complexidade que nasceria com o desenvolvimento
capitalista do país, ele responde com uma outra complexidade, fruto de
experiências individuais sofisticadas, mas de uma natureza totalmente diversa.
Volpi se recusa a entrar num jogo de diferenciação e conflito inevitável nessa
nova forma de sociabilidade. E isso me parece tão representativo da cultura
brasileira que a discussão de sua obra - sem simplificações ou rebaixamentos -
ainda tem muito a nos ensinar30.
[1] Este texto foi realizado a pedido do International Center for the Arts of
the Americas at the Museum of Fine Arts, Houston, no quadro dos debates que
essa instituição vem realizando em torno da Coleção Adolpho Leirner, por ela
adquirida. Agradeço a Mari Carmen Ramírez e a Ana Maria Belluzzo pelo convite.
[2] Volpi nasceu em Lucca, Itália, em 14 de abril de 1896. Chega ao Brasil em
outubro de 1898.
[3] Quanto a essa questão, ver o ensaio "Volpi 2006. Nenhum subterfúgio ou
estratégia", de Olívio Tavares de Araújo. In: Volpi - a música da cor. São
Paulo: MAM-SP, 2006.
[4] Pedrosa, Mário. "Volpi, 1924-1957". In: Arantes, Otília (org.). Acadêmicos
e modernos. São Paulo: Edusp, 1998, pp. 264, 268 (Originalmente publicado no
catálogo da exposição retrospectiva do MAM-RJ, em junho de 1957).
[5] Mendes, Murilo. "Depoimento". In: Amaral, Aracy A. (org.). Alfredo Volpi:
pintura (1914-1972). Rio de Janeiro: MAM-RJ, out.-nov. 1972, p. 40 (Publicado
originalmente no catálogo da exposição na Casa do Brasil, Roma, 1963).
[6] Castro, Willys de. "Volpi pinta vôlpis". In: idem, p. 39 - os itálicos são
meus (Publicado originalmente no catálogo da exposição na Galeria São Luís, São
Paulo, set. 1960).
[7] Sobre essa questão, ver o ensaio de Chiarelli, Tadeu. "Sobre a experiência
brasileira de Fulvio Pennacchi". In: Pennacchi - 100 anos. São Paulo:
Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2006.
[8] Mammì, Lorenzo. Volpi. São Paulo: CosacNaify, 1999, pp. 15-16.
[9] Citado na excelente cronologia do livro de Sônia Salzstein. Volpi. Rio de
Janeiro: Sílvia Roesler/Campos Gerais, 2000.
[10] Ver Mammì, op. cit., p. 25.
[11] Para um levantamento mais detalhado dessas exposições, ver a cronologia do
livro de Sônia Salzstein e de Lorenzo Mammì, ambos já citados.
[12] Milliet, Sérgio. "Alfredo Volpi". In: Fora de forma. São Paulo: Anchieta,
1942, p. 135.
[13] Eleonore Koch, a única pintora que Volpi, à sua maneira, aceitou como
aluna, a partir de 1952-53, e que conviveu de perto com ele, afirma que o
pintor costumava visitar com assiduidade as exposições da cidade nos fins de
semana, que adorava discutir sobre os trabalhos dos outros artistas e que era
rigoroso mesmo na apreciação das obras de amigos. Depoimento a Fernanda Pitta
em 23/09/2007.
[14] Ver Shiff, Richard. Cézanne et la fin de l'impressionisme. Trad. Jean-
François Allain. Paris: Flammarion, 1995. Ver principalmente os capítulos 12 e
13.
[15] Theon Spanudis (1915-1986) nasceu numa família grega em Esmirna, na
Turquia. Forma-se em psiquiatria e psicanálise em Viena e muda-se para o Brasil
em 1950, onde trabalha como psicanalista didata até fins da década, quando
abandona a clínica. Posteriormente aproxima-se da filosofia de Heidegger. Foi
também um dos primeiros tradutores de Kaváfis no país. A partir de 1951,
Spanudis se torna o principal apoiador de Volpi, comprando por vários anos boa
parte de sua produção e escrevendo sobre sua pintura. Tinha também grande
influência sobre os colecionadores paulistanos, o que ajudou a colocar o
trabalho de Volpi em várias dessas coleções.
[16] Entre os participantes estrangeiros, destacavam-se: Klee (65 obras),
Kokoschka (9 obras), Ensor (29 obras), Calder (45 obras), Baziotes (5 obras),
De Kooning (8 obras), Motherwell (5 obras), Braque (9 obras), Robert Delaunay
(5 obras), Duchamp (1 obra, Os jogadores de xadrez), Léger (7 obras), Picasso
(10 obras, mais uma sala especial com 51 obras, aí incluída Guernica), Brancusi
(1 obra), Laurens (9 obras), Soulages (5 obras), Stael (5 obras), Henry Moore
(69 obras), Mondrian (20 obras, incluindo uma das versões do Boogie-Woogie),
Karel Appel (5 obras), exposição do Futurismo (5 obras de Balla, 10 de
Boccioni, 5 de Carrà, 5 de Sironi, 3 de Soffici, entre outros), Morandi (29
obras), Munch (69 obras), Torres-García (4 obras), entre outros menos
importantes e sem considerar a notável mostra de arquitetura moderna.
[17] Para uma visão razoavelmente diferente da relação de Volpi com concretos e
neoconcretos, ver os ensaios de Lorenzo Mammì (op. cit.) e Sônia Salzstein (op.
cit.).
[18] Ruptura, manifesto assinado, em 1952, por Charroux, Cordeiro, Geraldo de
Barros, Fejer, Haar, Sacilotto e Wladyslaw. (Republicado em: Belluzzo, Ana
Maria (org.). Waldemar Cordeiro, uma aventura da razão. São Paulo: MAC-USP,
1986, p. 59).
[19] Para uma visão abrangente da I Exposição Nacional de Arte Concreta, ver o
importante catálogo concreta´56, a raiz da forma. São Paulo: MAM-SP, 2006.
[20] "O grupo de São Paulo". Jornal do Brasil, "Suplemento Dominical", 17/02/
1957.
[21] "Paulistas e cariocas". Jornal do Brasil, 19/02/1957.
[22] Uma das melhores discussões em torno dessas questões está em Brito,
Ronaldo. Neoconcretismo - vértice e ruptura do projeto construtivo brasileiro.
2ª edição. São Paulo: CosacNaify, 1999.
[23] Maliévitch, Kasimir. "Del cubismo y del futurismo al suprematismo. El
nuevo realismo pictorico". In: El nuevo realismo plástico. Trad. Antonio
Rodriguez. Madrid: Comunicación, 1975, p. 30.
[24] Posteriormente, em 1921, Maliévitch tornará explícita essa crítica à
técnica simplesmente utilitária. Ver Maliévitch, K. Dos novos sistemas de arte.
Trad. Cristina Dunaeva. São Paulo: Hedra, 2007, p. 26.
[25] Retomo a partir daqui, com as mudanças que os debates e a reflexão
possibilitaram, alguns argumentos desenvolvidos no meu ensaio "Anonimato e
singularidade em Volpi". In: A forma difícil. São Paulo: Ática, 1996.
[26] Para uma discussão das dificuldades de Morandi com a civilização
industrial, ver Solmi, Franco. Morandi: storia e leggenda. Bologna: Grafis,
1978.
[27] Tive a oportunidade de conversar sobre essas questões com Domingos Giobbi,
um dos mais importantes colecionadores de Volpi, que vê o trabalho do artista
de forma semelhante, ao menos quanto a esses aspectos. Giobbi passou a
freqüentar o ateliê de Volpi em fins da década de 1960. Sua perspicácia e
sensibilidade em relação à arte de Volpi também revelam a sofisticação
intelectual de vários dos colecionadores do artista.
[28] Até onde conheço, Waldemar Cordeiro foi o primeiro a ressaltar a
proximidade entre as cores de Volpi e "o saibro [que] coloria" paredes de casas
simples do interior (Ver "Volpi, o pintor de paredes que traduziu a visualidade
popular". Folha da Manhã, 20/04/1952). Para o autor, Volpi
realizava obras de arte "elevando o sentimento visual do povo brasileiro à
linguagem universal". O saibro é uma argila que, nas casas pobres, se diluía em
água para caiar as paredes. Conversei com o artista Antonio Manuel - que
conviveu com Hélio Oiticica nos anos 1960 e 1970 - sobre o assunto. Antonio me
disse que essa relação entre Volpi e os bólides de pigmento de Hélio Oiticica
sempre lhe pareceu clara.
[29] Essa afirmação me foi feita pelo próprio Amílcar, com quem tive bastante
proximidade nas décadas de 1980 e 1990. Amílcar atribuía os matizes tonais que
essas suas esculturas produziam à influência de Morandi. Acredito que Volpi
também foi decisivo para sua realização.
[30] Este ensaio não teria sido possível sem a ajuda de muitos pesquisadores,
amigos e conhecidos. Agradeço em particular a colaboração de Heloísa Espada
(pesquisadora da Equipe Brasil do projeto Documents of 20th-Century Latin
American and Latino Art), de Giovana Milani Bedusque (pesquisadora do Instituto
de Arte Contemporânea, de São Paulo), Fernanda Pitta, Cauê Alves, Domingos
Giobbi, João Bandeira, Antonio Manuel, Tiago Mesquita, Tadeu Chiarelli, Raquel
Arnaud, Camila Cristina Ferreira Paulino, Alberto Tassinari, Nilza Micheletto,
Lorenzo Mammì e Vilma Arêas.