Vulnerabilidade costeira e perda de ambientes devido à elevação do nível do mar
no litoral sul do Rio Grande do Sul
1. Introdução
Atualmente vivemos em um período marcado por mudanças climáticas globais, o
qual vem sendo estudado com especial interesse pela comunidade científica que
se dedica às ciências da natureza e da sociedade. Alterações climáticas são
alguns dos efeitos já visíveis da grande modificação que o planeta está
sofrendo devido ao fenómeno do aquecimento global (Andrade & Lacerda, 2009;
Bindoff et al., 2007). Outros efeitos observados, são a acentuação do efeito El
Niño, catástrofes de grandes proporções, desequilíbrio das chuvas e grandes
enchentes.
A zona costeira que se destaca pelos seus recursos naturais e diversidade
ambiental, bem como pelo seu grande potencial para o desenvolvimento de
atividades económicas múltiplas (Carter, 1990; Diehl et al., 2010) poderá ter
os efeitos das mudanças climáticas agravados pela intensa antropização dos
espaços urbanos, trazendo situações que caracterizam vulnerabilidades e
adaptações para as populações e instalações (IPCC, 2001).
Resultados obtidos a partir de modelagem (Meehl et al., 2007; Marengo, 2006),
em escalas que vão de interanual até decadal, e a longo prazo, constataram que
a intensidade de tempestades tropicais e extratropicais aumentarão, o que
implica em mais impactos na costa do que apenas aos atribuídos a elevação do
nível médio do mar, especialmente para sistemas costeiros tropicais e de médias
latitudes. Assim sendo, a região costeira do Estado do Rio Grande do Sul, por
ser uma extensa planície arenosa e de baixo gradiente topográfico, ficará ainda
mais vulnerável a eventos erosivos com o aumento do nível médio do mar, quando
comparada a áreas mais íngremes, especialmente durante eventos extremos.
Somente na década de 90, o enfoque nas possíveis alterações da linha de costa e
seus efeitos na erosão costeira, devido a uma elevação do nível médio do mar,
despertaram maior atenção dos cientistas, da mídia e do público em geral.
Dentre os principais indicadores de tais elevações, destacam-se: o recuo da
linha de costa, a erosão costeira, o desaparecimento de ilhas, a destruição de
ecossistemas costeiros eáreasurbanizadas, dentre outros. Assim, desde o avanço
desses estudos, várias tentativas para prever este comportamento durante os
próximos séculos têm surgido.
No que se refere à média das mudanças do nível médio do mar feitas no Brasil,
os dados sobre o comportamento atual do nível médio do mar possuem
disponibilidade limitada, o que, eleva a incerteza para os modelos de resposta
costeira para o futuro aumento do nível do mar. No Brasil, poucos locais
apresentam registros suficientes para permitir comparações climáticas
(Mesquita, 2003). Apenas no ano de 2004 houve a implantação do Sistema Global
de Observação do Nível do Mar (GLOSS), coordenado pelo Centro de Hidrografia da
Marinha do Brasil (CHM). O principal objetivo do projeto é unir esforços de
instituições brasileiras que dependem das observações do nível do mar para seus
monitoramentos e pesquisas.
Neste trabalho, destacaremos os impactos causados pela elevação do nível médio
do mar, ocasionada pelas mudanças climáticas, para a região costeira adjacente
a desembocadura da Lagoa dos Patos. Assim considerando as características
geológicas e morfodinâmicas, principalmente o caráter oceânico aberto; a
orientação Sudoeste-Nordeste da linha de costa, que a expõe às tempestades mais
intensas provenientes do quadrante Sul-Sudeste; e o baixo gradiente topográfico
da antepraia; a costa gaúcha -atualmente inserida numa faixa de alto risco a
qualquer elevação do nível do mar, ficará nos cenários de mudanças climáticas
globais relatadas no Ipcc (2007) e Church et al. (2013), ainda mais vulnerável
à erosão.
Projeções de elevação do nível médio do mar apresentadas no terceiro e quarto
relatórios de avaliação no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(IPCC, 2001; IPCC, 2007) mostram taxas similares de aumento do nível do mar, no
entanto, este último depende de um número de modelos climáticos de crescente
complexidade e realismo, resultando em taxas mais confiáveis de aumento do
nível do mar global que variam entre 0,18 m a 0,59 m em 2100. Com base nos
resultados das projeções de elevação acelerada do nível médio do mar, foram
desenvolvidos modelos capazes de prever a resposta costeira em diferentes
situações de comportamento do nível médio do mar.
Historicamente, a Praia do Cassino vem sofrendo acreção (Lélis & Calliari,
2004) devido, em parte, à construção dos molhes da Barra do Rio Grande, a qual
interferiu no balanço sedimentar da ao obstruir o transporte de sedimentos para
Nordeste, acarretando em um aumento localizado na largura da praia na região do
Cassino. Entretanto, Figueiredo (2013), ao simular cenários futuros de resposta
costeira a elevação do nível do mar para a costa no Rio Grande do Sul,
utilizando o STM (Shoreline Translation Model) de Cowell et al. (1992),
constatou os maiores valores de recuo da linha de costa para o setor que inclui
a Praia do Cassino alcançando distâncias médias de recuo de até 695m. A autora
utiliza uma faixa de valores de elevação do nível do mar com valor mínimo de
0,18 m, modal de 0,89 m e máximo de 1,1 m para o ano de 2100. Estes são valores
combinados de projeções de Rahmstorf (2007) e do Ipcc (2007). Devido ao fato de
que a incerteza na própria modelagem de clima é inerente a todas as previsões e
está intimamente relacionada o grau de contribuição antropogénica e em relação
à dinâmica do derretimento das placas de gelo (IPCC, 2007), os resultados da
modelagem de resposta costeira sob condições de mudanças climáticas é
apresentado na forma de probabilidade de serem excedidas, e.g., a linha de
costa localizada a 695 m da linha de costa atual tem 50% de probabilidade de
ser ultrapassada em 2100.
Neste trabalho, as projeções de linha de costa obtidas por Figueiredo (2013)
para o ano de 2100, são resultantes da aplicação do modelo proposto por Cowell
et al. (2006), onde os impactos relacionados aos efeitos das mudanças
climáticas incluem aumento do nível médio do mar, alterações no clima de ondas
e distúrbios no balanço de sedimentos ao longo da costa, podendo resultar em
erosão e recuo da mesma. O autor também considera que, áreas mais vulneráveis
à erosão costeira podem ser identificadas em termos de distância continente
adentro a partir da atual linha de dunas, à medida que a linha de costa recua
num determinado período de tempo no futuro (estabelecido na modelagem). O recuo
total em função do tempo leva em consideração os seguintes termos: tendência
média de recuo devido ao desequilíbrio no suprimento de sedimentos litorâneos
(no caso de balanço negativo), tendência média de recuo devido à elevação
acelerada do nível do mar, e aumento da erosão devido à ocorrência de
tempestades (ver Eq._1). Assim, as previsões de recuo da linha de costa podem
ser utilizadas para estimar o volume de perda de areia e futuramente prever
custos da realimentação artificial necessária para preservar praias e proteger
os recursos imediatamente interiores a elas.
onde, R(t) é o recuo total,
é o recuo médio devido ao desequilíbrio do suprimento sedimentar,
é o recuo médio devido à elevação acelerada do nível do mar e k(t)SD é a
alteração do balanço sedimentar devido ao aumento da intensidade das
tempestades.
Também, a fim de prever os impactos da elevação do nível do mar, uma
metodologia para identificar as áreas que podem ser mais vulneráveis a essa
elevação no futuro foi desenvolvida (Gornitz, 1991). Esta técnica será descrita
com detalhes na subseção 3.2.
Transgressões e regressões marinhas ocorreram anteriormente durante o
Pleistoceno e Holoceno moldando a costa como a conhecemos hoje. Estimativas
indicam que durante o Holoceno no Rio Grande do Sul, o nível médio do mar
atingiu altitudes máximas entre 2 e 4 m acima do nível atual (Dillenburg et
al., 2000; Dillenburg et al., 2005). Entretanto, os impactos de uma subida
acelerada do nível do mar na presente configuração costeira, ainda são em
grande parte desconhecidos.
2. Área de estudo
A costa do Rio Grande do Sul (RS), de orientação sudoeste-nordeste (Fig._1),
possui características oceânicas, devido à ação de ondas, correntes litorâneas
e o vento, que são os principais fatores responsáveis por alterar a sua
morfologia. A plataforma continental adjacente é larga, com 150 a 200 km de
extensão, apresentando profundidades máximas variando entre 100 e 140 m, e
declividade suave da ordem de 0,5 a 1,5 m/km (Dillenburg et al., 2000). Ao
longo dos 640km do litoral do estado observam-se poucas descargas flúvio-
lagunares importantes (Figueiredo & Calliari, 2005), porém, inúmeros cursos
de água doce, conhecidos como sangradouros, estão presentes.
A região é incluída no regime de micromarés, onde as oscilações têm amplitude
máxima de 0,5 m. As maiores alterações do nível médio do mar percebidas nesse
local devem-se às chamadas marés meteorológicas ou de tempestades. Já as
ondulações que atingem a região costeira da de estudo têm duas direções
predominantes: de leste-nordeste e de sudeste (Martinho et al., 2009; Pianca et
al., 2010).
A ação morfogênica na estudada, relacionada com a atividade das correntes, é
controlada basicamente pelas correntes litorâneas induzidas pelas ondas e
ventos e, muito secundariamente, por correntes fluviais. Do mesmo modo,
Fontoura (2013) descreve que o transporte longitudinal na região é
bidirecional, apresentando resultante positiva para nordeste.
3. Material e métodos
3.1. Análises de Perda Ambiental
O mapeamento das unidades ambientais presentes na de estudo foi realizado em
meio digital, através da técnica de classificação supervisionada (Maxlike)
disponível no SIG Idrisi, utilizando imagens do satélite ALOS de 2010, com
resolução espacial de 10 metros. A linha de costa atual foi digitalizada no SIG
ArcGis seguindo a base das dunas frontais. As seguintes unidades foram
identificadas e mapeadas: marismas, dunas, sangradouros, banhados, campos
litorâneos, matas eáreascom a infraestrutura urbana.
Figueiredo (2013) estimou através de modelagem o recuo da linha de costa na de
estudo para o ano de 2100 em condições de mudanças climáticas. Suas projeções
de linha de costa foram apresentadas na forma de distribuição probabilidade,
onde cada valor projetado para futura posição da linha de costa em metros está
associado a uma probabilidade (de 0% a 100%) de ser ultrapassado num dado
horizonte temporal, neste caso o ano 2100. A partir destas projeções, foram
selecionadas para este estudo três linhas de costa projetadas com as
respectivas probabilidades de serem ultrapassadas em 2100: linha azul, com 70%
de probabilidade de ser ultrapassada (1:1,44); linha laranja, 50% de
probabilidade de ser ultrapassada (1:2); linha verde, 10% de probabilidade (1:
10) (Fig._2). Para cada situação/posição da linha de costa projetada foram
calculadas as perdas ambientais (s e percentuais relativos) utilizando os
métodos overlay e area disponíveis no programa Idrisi.
A Praia do Cassino, no município de Rio Grande, RS, encontra-se ao sul da
desembocadura da Laguna dos Patos, a partir da qual se desenvolve uma extensa
restinga (barreira arenosa) com 220 km de extensão, limitada ao sul pelo Arroio
Chuí. A de estudo compreende um embaiamento sutil de aproximadamente 60km de
extensão (zona UTM 22S, entre 396383/6442021 e 364937/6382475), desde a raiz do
Molhe Oeste até a região do Farol do Sarita (Fig._1). A região possui
características semelhantes, representando uma unidade geomorfológica da
barreira arenosa holocénica (Tomazelli & Villwock, 2005) apresentando
sistemas praiais dissipativos, campos de dunas, marismas e sangradouros
associados, e suas praias são compostas de areia quartzosa de granulometria
fina.
3.2. Índice de Vulnerabilidade Costeira à Elevação do Nível do Mar
Para descrever a vulnerabilidade a uma mudança física como o aumento do nível
médio do mar na costa em estudo, foi utilizada uma metodologia desenvolvida por
Gornitz (1991). Esta técnica utiliza diferentes intervalos de vulnerabilidade
(muito baixa a muito alta), associando a cada um deles um valor (Tabela_1).
Valendo-se de seis variáveis (físicas e geológicas), e conhecendo seus valores
referentes à estudada, os valores dos intervalos de vulnerabilidade
correspondentes a cada parâmetro são incorporados a uma equação (ver Eq._2).
Esta produz um índice de vulnerabilidade costeira (IVC), onde: valores de IVC
abaixo de 8,7 são incluídos na categoria de baixa vulnerabilidade; valores
entre 8,7 - 15,6 são considerados de vulnerabilidade moderada; valores entre
15,6 e 20 indicam alta vulnerabilidade; valores de IVC acima de 20 são
classificados como de vulnerabilidade muito alta. A partir dessa técnica, foi
calculado o índice para a costa atual, bem como o projetado para o ano de 2100,
e comparados os valores obtidos.
Onde: A- geomorfologia; B - taxas de erosão/acreção da linha de costa (m.ano-
1); C - declividade da costa (%); D - mudanças relativas do nível do mar
(mm.ano-1); E - altura significativa de onda (m); e F - amplitude de maré (m).
4. Resultados e discussão
4.1. Perda ambiental para 2100
Nas Tabelas_2, 3 e 4 são apresentados os resultados dos cálculos de perda
ambiental devido à elevação do nível do mar, em km2 e % relativo. Foi
considerada como máxima perdida, apenas a contida entre a linha da base das
dunas frontais e a linha de costa modelada com 10% de probabilidade de ser
ultrapassada (recuada 1032m da atual linha de costa). Entretanto, para fins de
classificação inicial dos ambientes, foi incluída toda a da barreira arenosa
holocénica (Fig._3). Para um melhor entendimento, os resultados obtidos foram
separados em três cenários.
1) Melhor cenário
Este cenário utiliza a linha de costa modelada que recuou 561m da posição da
atual linha de costa e tem 70% de chance de ser ultrapassada até o ano 2100.
Nesta situação, observa-se que mais da metade da perdida é representada por
dunas, seguida de uma fração menor, porém significativa, de campos (Tabela_2).
Comparando os três cenários (Tabelas_2, 3 e 4), percebe-se com este cenário o
maior percentual de perda de urbana, além da totalidade da de sangradouros, já
que estes se limitam à região mais próxima à costa.
2) Cenário intermediário
Este cenário utiliza a linha de costa modelada que recuou 695m da posição da
atual linha de costa e tem 50% de chance de ser ultrapassada até o ano 2100. Na
Tabela_3 observa-se que, do mesmo modo que no contexto anterior, as dunas ainda
representam a maior parte de ambiental perdida. Porém, dividindo espaço
comáreasde campos e, em menor escala, de matas.
3) Pior cenário
Este cenário utiliza a linha de costa modelada que recuou 1032m da posição da
atual linha de costa e tem 10% de chance de ser ultrapassada até o ano 2100.
Este cenário mostra uma inversão no percentual dos ambientes perdidos (Tab._4).
Pode-se observar que a de campos foi a mais afetada com a máxima incursão
marinha considerada, chegando próximo a 50% de perda. Com aproximadamente 35%
de perdida estão as dunas, e apresentando pouco mais de 10%, as matas.
Os resultados aqui apresentados assumem um cenário de subida acelerada de nível
do mar numa região costeira de gradiente muito suave, com declividade da
antepraia em torno de 0,08° e dunas que não ultrapassam 3,5 m.
Entretanto, devemos ter em mente que a reorganização morfodinâmica em larga
escala temporal, de dezenas a centenas de anos se dá de forma lenta e que não
ocorrerá uma inundação abrupta dos ambientes pela subida do nível do mar em
longo prazo. Esta reorganização dos ambientes está relacionada com a
transladação da linha de costa em função de trocas sedimentares transversais
entre a região emersa da barreira, incluindo dunas frontais e áreas posteriores e
o limite inferior da antepraia como resultado da subida do nível médio do mar
(Bruun, 1988), além de trocas longitudinais que influenciam o balanço
sedimentar costeiro no setor como um todo.
Por outro lado, mesmo que ambientes como o pós-praia e campos de dunas migrem
gradativamente continente adentro, regiões mais interiorizadas e estáveis, como
as marismas, campos litorâneos, banhados e até áreas urbanizadas, ficarão de
qualquer forma mais próximas da linha de costa e assim mais vulneráveis aos
impactos de eventos extremos. Adicionalmente, teremos impactos sobre as
diversas comunidades da fauna e flora da zona costeira.
No caso específico dos sangradouros, mesmo no melhor cenário considerado
havendo perda total de área, foi concluído que, em longo prazo eles
restabeleceriam sua drenagem em direção ao mar. Isso pode ser comprovado
através de observações do interior da barreira arenosa holocénica, onde ficaram
evidentes interrupções nos cordões litorâneos que dão origem aos canais. Este
fato também foi observado por Hesp et al. (2007) próximo à Praia de Curumim,
no litoral norte do RS, onde inúmeros paleo-sangradouros corriam através da
barreira holocénica em direção ao mar, estando frequentemente ligados aos
canais atualmente ativos. Estes paleo-sangradouros provavelmente foram formados
durante o Holoceno, quando o nível médio do mar na região caía
progressivamente, após ter atingido um máximo de elevação por volta de 5100
anos atrás (cerca de 1 - 3m acima do atual), atuando como um sistema organizado
de drenagem (Martin et al., 1979).
Com relação à única ocorrência de marisma na de estudo, restrita às
adjacências do Molhe Oeste, observou-se que em todos os cenários possíveis há
alguma perda de deste ambiente. Embora não represente grande significância, em
termos de percentual perdido, a marisma é um dos ambientes de maior relevância
ecológica e sensibilidade ambiental da área, com relação à fauna e flora. Por
ser uma região estável, em termos morfodinâmicos, diferentemente da região de
dunas, a princípio, este ambiente não se deslocaria continente adentro devido
à uma elevação acelerada do nível do mar. Assim, concluímos que, as marismas
ficarão, em qualquer um dos três possíveis cenários projetados, localizadas
mais próximas dos cordões de dunas do que atualmente. Dessa forma, tornando-se
mais vulneráveis aos impactos da transgressão marinha. Conforme Huiskes (1990),
um pequeno aumento do nível médio do mar seria suficiente para acarretar
mudanças na zonação desse ecossistema, até sua total eliminação.
Por outro lado, foi considerado que, por haver conexão entre o estuário da
Lagoa dos Patos e a região de marismas em questão, existe a possibilidade de
que haja um aumento de deste ambiente. Com a subida do nível do mar, o nível da
lagoa também deve subir, influenciando no acréscimo da de marismas.
Segundo Costa (1998), existem cerca de 70 espécies de plantas que habitam a
região de marismas no estuário inferior. Estas possuem características muito
específicas, com diferentes gradientes de tolerância à inundação, dessecação e
salinidade. Assim, em qualquer uma das duas situações, seja de perda ou
acréscimo de área, elas sofreriam com o estresse às mudanças da dinâmica
ambiental. Dessa forma, poderiam facilmente desaparecer, caso não forem capazes
de se adaptar a essas alterações ocasionadas pela elevação do nível médio do
mar.
Por fim, o último ambiente a ser considerado neste estudo, também sujeito aos
impactos da subida do nível do mar - o Urbano - é o que oferece maior
preocupação à população que vive na região costeira. Por afetar diretamente a
segurança da vida humana e seus bens materiais, o risco de uma inundação
provocando perdas ou danos as suas propriedades mantém as pessoas em estado de
alerta. Embora a diferença seja pouco expressiva em nossa de estudo, o
percentual representado pela urbana é maior quanto mais próximo à costa. Isto
representa uma tendência nas regiões costeiras de todo o mundo, tornando os
riscos de uma elevação do nível médio do mar ainda mais preocupantes. Foi
considerado ainda, que a elevação média do nível do mar, quando associada com
tempestades costeiras e ressacas (marés meteorológicas), potencializará ainda
mais os impactos previstos para essa .
Assim sendo, para os futuros cenários projetados, certamente serão necessárias
estratégias de adaptação, que podem incluir obras de proteção costeira para
conter o avanço marinho, e realocação, mas principalmente um melhor
planejamento da ocupação em zonas costeiras vulneráveis aos impactos diretos
das mudanças climáticas globais.
4.2. Vulnerabilidade Costeira à Elevação do Nível do Mar: Cenários Atual e
Futuro
Como forma de quantificar a vulnerabilidade da Praia do Cassino à elevação
acelerada do nível do mar, foram inseridos os valores da região, relativos a
cada uma das variáveis, físicas e geológicas, na tabela utilizada para o
cálculo do índice de Vulnerabilidade para a Costa Atlântica de Gornitz (1991).
Foi obtido um valor de IVC de 14,4 (ver Equação_3), classificando a praia como
moderadamente vulnerável a uma elevação do nível do mar na atualidade, conforme
mostrado na Tabela_5.
Ao observar a Tabela_5, nota-se que, se consideradas constantes as variáveis:
geomorfologia, declividade da costa, altura significativa de onda e amplitude
de maré; e utilizando os parâmetros das duas variáveis restantes, para o
cenário projetado (2100), a região de estudo seria classificada como muito
altamente vulnerável a uma elevação do nível do mar, com um IVC de 51,03 (ver
Equação_4).
Segundo Toldo Jr. et al. (2005), a retração e progradação das zonas costeiras
arenosas submetidas ao regime de micromarés, caso da região em estudo, resultam
principalmente da dinâmica entre a quantidade e tipo de suprimento sedimentar,
energia física de ondas e mudanças relativas do nível médio do mar.
Neste sentido, a Tabela_6 apresenta os valores dos parâmetros físicos e
geológicos para classificação de vulnerabilidade ao aumento do nível médio do
mar, projetados para 2100 por Figueiredo (2013), enquanto a Equação_4 resulta
no IVC calculado para o mesmo cenário futuro.
Com relação à s Taxas de Erosão/Acreção da Linha de Costa, estudos de
Dillenburg et al. (2000); Martinho et al. (2009) concluíram que, o volume de
sedimentos transportados ao longo da costa, bem como a energia de ondas, tende
a aumentar conforme a costa torna-se convexa (projeções) e diminuir conforme a
costa torna-se côncava (embaiamentos). A causa desse padrão está provavelmente
relacionada aos processos de refração e dissipação, que as ondas de águas
profundas encontram ao se aproximarem da costa. Quando a costa é côncava, a
plataforma interna é larga e suave, esses processos ocorrem lentamente, e ao
atingirem a costa, as ondas já perderam grande parte da sua energia. Assim, a
deposição é favorecida. Por outro lado, quando a costa é convexa, a plataforma
interna é estreita e íngreme, os processos de refração e dissipação ocorrem
menos, e as ondas atingem a costa com alta energia. Portanto, o volume de
sedimentos retirado destes locais é maior.
Somada à dinâmica natural, historicamente, a linha de costa adjacente a Praia
do Cassino, vem sofrendo uma acreção relevante. Parte desta acreção se deve ao
período que sucede a construção dos molhes da Barra do Rio Grande, a qual
interferiu no balanço sedimentar da área, ao bloquear o transporte de
sedimentos para nordeste, intensificando a acreção e acarretando um aumento
localizado na largura da praia. Dessa forma, com uma acreção da linha de costa
atual de aproximadamente 3,2m/ano (Lélis & Calliari, 2004), a região está
inserida num setor de barreira progradante. Porém, considerando o cenário de
elevação acelerada do nível do mar prevista para os próximos anos, esta poderá
se tornar retrogradante, com taxas de erosão da linha de costa estimadas em
11,47 m/ano no pior cenário projetado (com 10% de probabilidade) para 2100
(Figueiredo, 2013).
Com relação à s Mudanças Relativas do Nível do Mar, a região de estudo possui
uma taxa atual de 2mm/ano de mudança relativa do nível do mar. Observa-se que o
nível atual sobe lentamente, colocando a região costeira em um cenário de baixa
vulnerabilidade. No entanto, quando consideradas as taxas para 2100 (1,1m/90
anos), percebemos que a vulnerabilidade é considerada muito alta, quando o
nível do mar atinge taxas de aproximadamente 12 mm/ano.
Através do exposto, percebe-se que, alterando os valores de somente duas
variáveis, a Praia do Cassino deixaria de ser caracterizada como uma região
moderadamente vulnerável, atualmente, e passaria a ser considerada como uma
praia de vulnerabilidade muito alta à s elevações do nível do mar, apresentando
um IVC futuro de 51,03.
5. Conclusões
A região costeira do Estado do Rio Grande do Sul, na qual a Praia do Cassino
está inserida, possui características geomorfológicas herdadas que, de forma
geral, a torna bastante vulnerável às variações do nível médio do mar.
Considerando o atual cenário de mudanças climáticas globais, é de extrema
importância o estudo detalhado da citada. Este se deu no presente estudo de
forma qualitativa e quantitativa, de modo a determinar a vulnerabilidade
costeira da região em questão, frente ao aspecto acima mencionado, com base nos
resultados obtidos por Figueiredo (2013).
Neste contexto, como principais conclusões do trabalho efetuado destacam-se as
seguintes:
* Conforme os cálculos de perda de área, considerando as prováveis futuras
linhas de costa projetadas para 2100, todos os ambientes da região de estudo
apresentaram um percentual perdido de ambientes costeiros emersos, mesmo no
melhor cenário considerado;
* Campos litorâneos e dunas representaram os maiores percentuais absolutos de
perda ambiental quando considerado o pior cenário projetado (linha de costa
modelada com 10% de probabilidade de ser ultrapassada em 2100);
* Sangradouros tiveram a totalidade de sua perdida, mesmo no melhor cenário
projetado (linha de costa modelada com 70% de probabilidade de ser
ultrapassada em 2100);
* Os valores obtidos nos cálculos de IVC indicam que, a Praia do Cassino é
classificada atualmente como moderadamente vulnerável à s elevações do nível
do mar, enquanto que nas situações projetadas para 2100 (Figueiredo, 2013), a
de estudo seria caracterizada como muito altamente vulnerável à subida do
nível do mar.
Os dados obtidos na pesquisa são considerados extremamente úteis para a
realização de adaptações na região de estudo, como obras de contenção ao avanço
marinho, bem como de um manejo minucioso dos ambientes nela encontrados, no
cenário de mudanças climáticas globais. Assim, será possível planejar
adequadamente o uso, a ocupação e a adaptação desta região costeira, valendo-
se, sobretudo, das individualidades de cada setor da costa do Rio Grande do
Sul.