Os olhos da Geologia, o discurso dos engenheiros e o saber dos geólogos: o
início da utilização de métodos geofísicos na prospecção de recursos minerais
em Portugal
INTRODUÇÃO
A história da constituição de uma comunidade geológica em Portugal encontra-se,
em grande medida, por fazer. Pouco se sabe, ainda, sobre a forma como ocorreram
as etapas do processo que, em História da Ciência, é normal associar à
institucionalização de uma área científica, neste caso a Geologia, e a
concomitante formação da comunidade científica e profissional que a pratica.
Entre essas etapas encontram-se a criação de departamentos universitários
dedicados ao ensino e à investigação, o surgimento de periódicos
especializados, a formação de sociedades científicas, a profissionalização e o
reconhecimento profissional (MORRELL, 1988). No caso da Geologia, é
particularmente relevante a criação de um serviço geológico nacional.
É a este último factor que boa parte dos trabalhos mais recentes da História da
Geologia nacional têm sido dedicados. Tal como noutros países ocidentais,
também em Portugal um dos primeiros contextos da profissionalização em Geologia
se encontra associado à criação e evolução de serviços geológicos nacionais
durante o século XIX.1.
No entanto, e ao contrário do que sucedeu em muitos desses países, a criação de
um serviço geológico em Portugal não surgiu no seguimento da existência de uma
'cultura geológica' (KNELL, 2000) assente, por exemplo, numa prática amadora da
Geologia, na criação de escolas de minas, na constituição de sociedades
científicas regionais, no desenvolvimento de estudos geológicos parcelares do
território nacional. Dada a impossibilidade da implementação e prática da
Geologia em Portugal se fazer via sociedade civil, ela acabou por se
concretizar através da iniciativa estatal, com a criação do primeiro serviço
geológico nacional em 1857, então designado Comissão Geológica do Reino. Pode
dizer-se que, durante o século XIX e até ao início do século XX, não existiu
Geologia em Portugal fora da esfera do Estado (CARNEIRO, 2005).
Entre 1857 e 1908, o serviço geológico português2 realizou o reconhecimento
geológico do território nacional e a elaboração de cartografia geológica de
forma cuidadosamente definida e planeada, com base num trabalho de campo
sistemático e a adopção de estratégias e metodologias idênticas àquelas
utilizadas nos serviços geológicos de outros países, em especial da França
(LEITÃO, 2004). Durante o período citado, o serviço geológico nacional foi
dirigido, primeiro, pelo engenheiro militar CARLOS RIBEIRO (1813-1882)3 e, em
seguida, pelo seu discípulo, também engenheiro militar, NERY DELGADO (1835-
1908). Apesar das diversas reorganizações por que passou e dos interesses
contraditórios, dificuldades financeiras e preconceitos que teve de defrontar,
a instituição conseguiu alcançar uma produtividade científica significativa em
termos quantitativos e qualitativos até à primeira década do século XX. Foram
publicados diversos estudos geológicos, paleontológicos e arqueológicos; várias
folhas do mapa geológico de Portugal na escala 1:100000; duas edições do mapa
geológico de Portugal na escala 1:500000, respectivamente em 1876 e 1899, entre
outros trabalhos e estudos (CARNEIRO e MOTA, 2005).
Em grande parte, tal circunstância deveu-se ao facto de tanto Ribeiro como
Delgado possuírem amplos conhecimentos geológicos e de terem sabido rodear-se
de outros praticantes da Geologia, de entre os quais se destacam o geólogo
suíço PAUL CHOFFAT (1849-1919), WENCESLAU DE LIMA (1858-1920), BERKELEY COTTER
(1845-1919), e ALFREDO BENSAÚDE (1856-1941). Além disso, na época, os
engenheiros militares parecem ter sido os únicos a possuir os conhecimentos e
as competências necessárias à prática geológica requerida nuns serviços
geológicos (LEITÃO, 2004; CARNEIRO, 2005).
Uma das consequências desta situação foi a ocupação pelos engenheiros
portugueses dos postos mais elevados do quadro de pessoal técnico dos Serviços
Geológicos. A ocupação de lugares públicos pelos engenheiros encontra-se ligada
ao processo de profissionalização e afirmação desta classe durante o século
XIX, com destaque para o período da Regeneração. Este processo propiciou a
ocupação de lugares em diversas instituições e organismos estatais e mesmo a
ascensão a posições de poder por parte dos engenheiros portugueses, conferindo-
lhes um protagonismo ao nível do Estado português que, com alguns altos e
baixos, se manteve ao longo do século XX (DIOGO, 1994; RODRIGUES, 1999; MATOS E
DIOGO, 2002).
Quando, a partir da década de 1930, se iniciou a constituição de uma verdadeira
comunidade geológica em Portugal, os seus elementos depararam-se com uns
serviços geológicos 'colonizados' pelos engenheiros de minas. A necessidade de
inverter este tipo de situação levou a uma certa confrontação entre a
comunidade geológica e os engenheiros de minas, ao mesmo tempo que
circunstâncias mais ou menos fortuitas e conjunturais acabaram por favorecer os
geólogos da instituição (MOTA, 2007). O presente trabalho é dedicado à
explicitação de uma delas.
Durante a década de 1940, o único geólogo que trabalhava nos então designados
Serviços Geológicos de Portugal (SGP), GEORGES ZBYSZEWSKI (1909-1999), foi
encarregado de acompanhar a utilização de métodos geofísicos na prospecção de
depósitos minerais na região do vale diapírico de Caldas da Rainha. Neste
trabalho, defende-se que a actividade desenvolvida por Zbyszewski lhe valeu o
reconhecimento dos engenheiros de minas que dirigiam os SGP, circunstância que
acarretou, a médio prazo, o reconhecimento mais lato da Geologia e dos geólogos
no seio da instituição. Defende-se, igualmente, que esse reconhecimento teve
lugar porque a utilização dos métodos de prospecção geofísica permitiu ao
geólogo dos SGP a partilha de um ethoscientífico que era caro aos engenheiros
portugueses.
OS SERVIÇOS GEOLÓGICOS DE PORTUGAL (SGP) NAS VÉSPERAS DA II GUERRA MUNDIAL
Durante as três primeiras décadas do século XX, Portugal viveu um dos períodos
mais complexos da sua história, assistindo-se à implantação e queda de
sucessivos regimes: Monarquia Constitucional, I República, Ditadura Militar e
Estado Novo. O país passou por graves dificuldades económicas e financeiras,
enfrentando, ao mesmo tempo, sérios problemas de instabilidade política e
social (MEDEIROS, 1978; CABRAL, 1979; ROSAS, 1986; MIRANDA, 1987; SERRÃO, 1991;
FRANÇA, 1992).
Foi neste contexto económico e social que, em 1918, os SGP ficaram oficialmente
ligados à Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos (DGMSG) (DECRETO,
1918), circunstância que contribuiu para agravar as dificuldades que já vinham
sendo sentidas pela instituição desde a segunda metade do século XIX.4 A partir
de 1918, a DGMSG passou a atribuir de forma discricionária as verbas destinadas
aos SGP, não lhes conferindo, simultaneamente, liberdade para contratar o
pessoal necessário ou para gerir as suas próprias actividades. A actuação dos
SGP resumia-se a pouco mais do que a execução de tarefas pontuais, sempre que,
para isso, eram solicitados. Essas tarefas dependiam muito dos interesses das
diversas tutelas a que os SGP estiveram sujeitos e iam desde a prestação de
apoio a obras de carácter agrícola até à ajuda em situações de emergência,
como, por exemplo, desmoronamento de edifícios e deslizamentos de terras.
Nestas circunstâncias, os SGP não conseguiram cumprir aquele que deveria ser o
seu principal objectivo: o reconhecimento geológico do território português e a
consequente produção e publicação de cartografia geológica (MOTA, 2007).
Na verdade, a cartografia geológica não era considerada relevante nem por parte
dos engenheiros de minas que estavam à frente da DGMSG, nem pelo poder
político, apesar de estes serem dois dos principais agentes responsáveis pela
sua realização (MOTA, 2007). Ao contrário do que sucedeu durante o século XIX
(LEITÃO, 2004),o poder político ' e, em especial, o poder republicano ' não parece ter tido
uma orientação clara no que respeita ao conhecimento geológico do território
nacional e a cartografia geológica parece não ter tido um significado
particular na cultura dos dirigentes republicanos portugueses. Estes parecem
ter entendido os SGP essencialmente como um organismo público de aconselhamento
técnico, não atribuindo à Geologia e aos SGP o mesmo significado e importância
que estes detinham noutros países, em que eram associados à industrialização e
ao desenvolvimento económico (MOTA, 2007).
Quanto aos engenheiros de minas, o quadro de pessoal dos SGP pertencia-lhes
quase em exclusivo, uma vez que todas as posições técnicas superiores apenas
podiam ser ocupadas por engenheiros, provenientes, preferencialmente do Corpo
de Engenharia de Minas e Serviços Geológicos (MOTA, 2007). O quadro de pessoal
dos SGP não previa a categoria de geólogo e estes apenas podiam ingressar na
instituição mediante contrato, o que os impedia de progredir na carreira. Além
disso, a partir de 1918 e até à década de 1950,os poucos geólogos contratados pelos SGP
viram as suas remunerações diminuir mais e mais, sendo a sua equiparação, em
termos financeiros, um reflexo do estatuto que possuíam no seio da instituição.
Entre 1936 e 1952, os geólogos auferiam do mesmo vencimento que os engenheiros
de minas de 3.ª classe, a categoria mais baixa para este grupo profissional, e
o mesmo que os auxiliares técnicos mais graduados (Figura 1) (MOTA, 2007).
Fig. 1 ' Vencimentos do pessoal técnico dos SGP entre 1918 e 1952 [retirado de
Mota, T. S., Os Serviços Geológicos entre 1918 e 1974: da Quase Morte a uma
Nova Vida, Tese de doutoramento não publicada, (Lisboa, Faculdade de Ciências e
Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, 2007), p. 200].
A verdade é que até à década de 1930, não existiu, em Portugal, uma verdadeira
comunidade científica/profissional de geólogos. Desta forma, a colonização'
dos SGP por parte dos engenheiros desde o dia da sua criação, foi, não só
possível, como inevitável. No século XIX, os engenheiros militares eram os
únicos a possuir as competências necessárias à consecução de alguns objectivos
dos SGP, nomeadamente a realização de cartografia geológica, uma vez que tinham
uma boa experiência na organização de equipas em trabalho de campo e dominavam
a leitura e a feitura de mapas (CARNEIRO, 2005). Por outro lado, alguns
engenheiros militares, como foi o caso de Ribeiro e Delgado, tornaram-se
competentes em termos de realização de trabalho e estudos geológicos porque
complementaram e aprofundaram por sua própria iniciativa a reduzida formação
científica que possuíam ao nível da Geologia. Todavia, com o passar do tempo, o
quadro do pessoal técnico da instituição passou a ser ocupado não só por
engenheiros militares mas também, e maioritariamente, por engenheiros civis e
de minas, a quem já faltava, na maior parte das vezes, não apenas a preparação
científica em Geologia, como a familiaridade com o trabalho de campo (CARNEIRO,
2005).
9
Se, dada a inexistência de uma comunidade geológica em Portugal, o recrutamento
de engenheiros por parte dos SGP, se revelou, inicialmente, a única solução
possível, com o passar dos anos esta situação acabou por ter consequências
nefastas. Muitos dos engenheiros de minas e seus técnicos auxiliares
(condutores de minas, mais tarde agentes técnicos de engenharia de minas) que
trabalhavam nos SGP no início do século XX, parecem não ter tido nem uma
predilecção especial pela Geologia, nem competências científicas nesta área,
fazendo parte do quadro de pessoal da instituição devido a contingências da sua
carreira profissional (CARNEIRO, 2005; MOTA, 2007). Além disso, não
consideravam a Geologia relevante para aquela que era a sua principal
actividade: proceder à extracção de minérios através das mais diversas
técnicas. Tal situação levou a que os engenheiros de minas da DGMSG,
oficialmente responsáveis pela elaboração e publicação das cartas geológicas em
Portugal, nunca tenham levado a cabo essa tarefa. Convertidos em burocratas, a
maior parte foi incapaz de compreender as funções dos SGP a que pertenciam, o
que acabou por levar à estagnação científica da instituição durante as
primeiras décadas do século XX (MOTA, 2007).
A CRIAÇÃO DO SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO (SFM) NO CONTEXTO DO INDUSTRIALISMO
PORTUGUÊS
No início da década de 1930, quando o Estado Novose instaurou em Portugal, a
indústria mineira apresentava sérios problemas originados pela congregação de
vários factores, entre os quais a falta de capital, o elevado grau de risco
económico do sector e o desconhecimento das possibilidades mineiras do país
(GUIMARÃES, 1995 e NOGUEIRA, 1941; DIRECÇÃO GERAL DE GEOLOGIA E MINAS, 1990).
Apesar de, durante a I Guerra Mundial e a década de 1920, ter tido lugar uma
conjuntura favorável a um certo desenvolvimento industrial do país, que levou
ao incremento do sector mineiro, terminado o conflito ocorreu uma crise que se
revelou difícil de ultrapassar, com a actividade mineira a registar novo
decréscimo (MEDEIROS, 1978; ROSAS, 1986).
O desconhecimento das reservas minerais existentes em solo nacional resultava,
em grande parte, do reconhecimento geológico do país se basear, ainda, nos
levantamentos do século anterior, com a consequente inexistência de uma
cartografia geológica a uma escala adequada. Foi esse desconhecimento que
serviu de justificação para que o Estado Novocriasse, em 1939, o Serviço de
Fomento Mineiro (SFM), com o objectivo de proceder ao reconhecimento,
prospecção e pesquisa dos recursos minerais de Portugal continental (DECRETO,
1939). A prioridade foi dada a matérias como o ferro, ouro, pirites, antimónio,
estanho, carvão, hidrocarbonetos e sais de potássio. Todas as jazidas minerais
reveladas pelos trabalhos de prospecção e pesquisa realizados pelo SFM deveriam
ser propostas para concessão, permitindo a sua exploração à iniciativa privada
(DECRETO, 1939).
10
O SFM pode ser entendido como a concretização, ao nível do sector mineiro, da
afirmação, no seio do Estado Novo, de uma corrente pró-industrialista
protagonizada, entre outros, pelos engenheiros portugueses. Surgida durante a
década de 1930, atingiu a sua expressão máxima, enquanto movimento de
teorização e intervenção política, aquando da realização do 1.º e 2.º
Congressos Nacionais de Engenharia, respectivamente em 1931 e 1948, e do 1.º
Congresso da Indústria Portuguesa, em 1933 (ROSAS, 1986; ROLLO, 2006). A
corrente industrialista era caracterizada por uma particular ideologia de
nacionalismo industrializante, um discurso de progresso industrialista
habilmente incorporado na retórica patriótico-passadista oficial ( ) a
formulação de um novo modelo de desenvolvimento assente na hegemonia da
indústria (ROSAS, 1986; MIRANDA, 1987; BRITO, 1989; ROLLO, 2006). Entre os
seus principais teorizadores, encontravam-se os engenheiros, que auto-
reivindicavam um novo papel económico, social e mesmo político na sociedade
portuguesa, argumentando que seria a racionalidade técnica e organizacional '
simbolizada na imagem do engenheiro ' a única forma de ultrapassar o
subdesenvolvimento do país (ROSAS, 1986; MIRANDA, 1987; BRITO, 1989; DIOGO,
1994; RODRIGUES, 1999; ROLLO, 2002; ROLLO, 2006).
O SFM foi integrado na DGMSG e, a fim de levar a bom porto as tarefas
atribuídas ao SFM, esta última deveria proceder ao reconhecimento geológico do
país, devendo, para isso, ser acelerados os trabalhos de levantamento e
publicação da carta geológica (DECRETO, 1939). Depois da criação do SFM, a
orgânica da DGMSG passou a ser a evidenciada pelo esquema da figura 2 (MOTA,
2007).
Fig.2 ' Orgânica da DGMSG depois da criação do SFM.
A necessidade de levar a cabo o reconhecimento geológico do país, de forma a
que o SFM pudesse atingir os objectivos a que se propunha, poderia ter sido a
ocasião ideal para o Estado português dotar os SGP de meios humanos e materiais
que permitissem torná-los mais eficientes e produtivos. Afinal, a própria
legislação de 1918, que esteve na base da criação da DGMSG, declarava que os
serviços geológicos e de minas têm uma relação íntima, como é reconhecido nos
países onde a ciência geológica e a indústria mineira estão mais adiantadas
(DECRETO, 1939).
Alguma legislação que foi publicada ao longo das décadas de 1920 e 1930,
evidencia preocupação por parte do Estado português com a situação da indústria
mineira nacional, mostrando interesse em tentar resolver alguns dos seus
problemas e reconhecendo o papel dos SGP nessa resolução. Todo o contexto se
afigurava, pois, propício ao incentivo e desenvolvimento de estudos e pesquisas
geológicas, sendo de esperar que o Estado português, à semelhança do que
aconteceu noutros países, atribuísse aos SGP os meios humanos e materiais
necessários à realização do seu trabalho.
No entanto, tal acabou por não se verificar; a consciência estatal sobre o
papel fundamental que os serviços geológicos de um país podem ter no
desenvolvimento da actividade mineira parece ter sido apenas uma figura de
retórica. O Estado português acabou por optar pela criação de um novo organismo
no seio da DGMSG, o SFM, cujas atribuições e competências acabaram por se
sobrepor, em grande parte, às dos SGP, enquanto esta instituição continuou a
viver tempos difíceis.
A UTILIZAÇÃO DOS MÉTODOS GEOFÍSICOS: OS OLHOS DA GEOLOGIA E A SUA DEFESA
PELOS ENGENHEIROS DE MINAS DO SFM
Uma vez criado o SFM, uma das suas principais tarefas consistiu no
reconhecimento das jazidas de ferro de Portugal continental, com vista ao
posterior uso desse minério na indústria siderúrgica. Para proceder a esse
reconhecimento, o SFM decidiu utilizar a prospecção geofísica.11 Não era a
primeira vez que métodos geofísicos eram utilizados em Portugal; durante a
década de 1930, o Instituto Geográfico e Cadastral tinha realizado algumas
determinações gravimétricas em vários locais do país (COSTA, 1942). Por sua
vez, em 1943, o Instituto Geologico y Minero de Espanha (IGME) procedeu à
prospecção de sais alcalinos através de técnicas sísmicas na zona centro de
Portugal (CARDOSO, 1947; DIRECÇÃO GERAL DE GEOLOGIA E MINAS, 1990). No entanto,
foi o SFM que utilizou pela primeira vez, de forma sistemática e continuada, a
prospecção geofísica no reconhecimento de recursos minerais. Como não possuía
nem a aparelhagem necessária, nem o conhecimento técnico necessário, contactou
uma empresa sueca: a Aktiebolaget Elektrisk Malmletning (ABEM),
12
de Estocolmo. Em Maio de 1942, estabeleceu-se um acordo de prestação de
serviços entre esta empresa e o SFM e, durante cerca de dois anos, o pessoal
técnico do SFM acompanhou um engenheiro sueco nos trabalhos de reconhecimento
de jazidas de ferro através da utilização de uma das técnicas possíveis de
prospecção geofísica: a magnética. A utilização de métodos geofísicos acabou
por se estender ao reconhecimento de outros depósitos minerais, nomeadamente,
sais alcalinos e pirites, tendo sido utilizadas, nestes casos, técnicas
sísmicas e eléctricas, respectivamente (SFM, 1943/1945; FERREIRA, 1945;
DIRECÇÃO GERAL DE GEOLOGIA E MINAS, 1990).
A reconhecida utilidade dos métodos geofísicos, levou o SFM a considerar a
possibilidade de passar a ser o próprio a aplicá-los. Deste modo, o SFM iniciou
a compra do seu próprio equipamento geofísico, adquirindo à ABEM, em 1945, um
equipamento de prospecção sísmica e, em 1947, um aparelho de prospecção
eléctrica, desta feita a uma empresa americana, a Sullivan Machinery Company
(FERREIRA, 1945; CARDOSO, 1947; FERREIRA, 1947). A partir de 1951, o SFM foi
beneficiário do Plano Marshall, o que lhe permitiu um maior volume de compras
em termos de aparelhagem de ensaio e investigação, nomeadamente a continuação
da aquisição de equipamento de prospecção geofísica (SANTOS, 1952; ROLLO,
1994).
O método sísmico de prospecção possibilita a identificação das formações
geológicas que existem no interior da crusta terrestre mediante a determinação
da velocidade de propagação de ondas sísmicas, uma vez que a formações com
características diferentes correspondem velocidades diferentes. A aparelhagem
sísmica utilizada na implementação deste método permite a determinação dos
tempos de percurso das ondas sísmicas desde os pontos onde foram originadas '
normalmente através da detonação de cargas explosivas ' até outros pontos onde
são captadas por sismómetros. A determinação dos tempos é feita a partir da
leitura e interpretação do registo que a aparelhagem fornece, o sismograma,
onde é possível identificar os momentos dos abalos provocados e os de chegada
das ondas aos diversos sismómetros. Conhecendo-se os tempos de percurso das
ondas, traçam-se gráficos espaço/tempo ou dromocrónicas que, mediante a
aplicação de fórmulas matemáticas, permitem calcular as velocidades
características e identificar as diferentes formações geológicas atravessadas,
assim como a profundidade a que as mesmas se encontram (COUTO, 1947 e CARDOSO,
1947).
No final da década de 1940, diversos engenheiros, entre os quais os engenheiros
de minas do SFM, publicaram trabalhos defendendo a utilização dos métodos
geofísicos (CARDOSO, 1947; QUEIRÓS, 1947; COUTO, 1947 e GONÇALVES, 1948). Esses
trabalhos revelam, em parte, a retórica típica da corrente industrialista,
apresentando os métodos geofísicos como um exemplo de racionalidade e
objectividade técnica e científica, valores indispensáveis ao progresso
económico e social na nação portuguesa, e que os engenheiros consideravam
encontrar-se materializados no seu estatuto e profissão. No entanto, os autores
dos trabalhos, cujos destinatários eram, fundamentalmente, outros engenheiros e
cientistas, não escamoteiam as complexidades inerentes à constituição,
instalação e funcionamento da aparelhagem de prospecção geofísica, assim como
as dificuldades existentes e a perícia necessária na interpretação dos
resultados obtidos a partir da sua utilização.
Por exemplo, um dos trabalhos (COUTO, 1947), dedicado à descrição e
funcionamento da aparelhagem sísmica do SFM, encontra-se repleto de
terminologia técnica e científica de difícil entendimento para alguém pouco
familiarizado com o tema. Apesar dessa terminologia se tornar mais
compreensível à medida que o autor descreve e explica, de forma cuidada e
minuciosamente, o modo de funcionamento da aparelhagem, desmontando o conceito
de black-boxing (LATOUR, 1987) que poderia surgir associado à sua manipulação,
a verdade é que as características do trabalho revelam que este se destina a um
público de especialistas.
Já noutro trabalho (QUEIRÓS, 1947), os métodos geofísicos são apresentados como
os olhos da Geologia,
13
instrumentos quase infalíveis na sua capacidade de perscrutar e revelar o
interior da Terra. Todavia, o autor não deixa de fazer referência a uma série
de condicionantes existentes no contexto da sua utilização. Assim, refere, por
exemplo, a necessidade de conhecer do modo mais completo e exaustivo possível a
geologia da região alvo da utilização dos métodos geofísicos ou os diversos
factores condicionantes da escolha do método mais conveniente. Refere ainda as
dificuldades existentes na leitura dos sismogramas obtidos a partir da
utilização da técnica sísmica, nomeadamente a distinção dos resultados
correspondentes à refracção e reflexão das ondas sísmicas.
Considerações idênticas são tecidas num terceiro artigo (CARDOSO, 1947), com
destaque para as ambiguidades da leitura e interpretação dos sismogramas, onde
o sujeito desempenha um papel particularmente activo.
Contrariamente ao discurso público dos engenheiros portugueses e à retórica
típica da corrente industrialista, os trabalhos analisados evidenciam os
problemas associados à utilização dos métodos de prospecção geofísica. Neles
não se escamoteia a incerteza dos resultados, nem as complexidades da sua
leitura e interpretação, salientando-se o papel determinante do sujeito
responsável pelas mesmas (QUEIRÓS, 1947):
(...) o geofísico precisa de obter o maior número possível de elementos físicos
sobre o terreno (...) Uma vez efectuadas as medidas das grandezas físicas
julgadas necessárias todas as afirmações serão questões de probabilidades. Será
possível, no geral, estabelecer mais do que uma hipótese que permita explicar
as anomalias encontradas. O grande problema a resolver pelo indivíduo
encarregado da interpretação será escolher a solução mais de acordo com a
realidade e para isso terá que relacionar os vários elementos geofísicos e
geológicos, o que só poderá ser feito por pessoas muito especializadas.
O modo como os engenheiros de minas encaram a utilização dos métodos geofísicos
e a interpretação dos resultados obtidos por seu intermédio, inscreve-se num
ethoscaracterístico da prática científica que surgiu no início do século XX
(GALISON, 1992)14 e no qual a interpretação e o julgamento praticados pelo
cientista têm um papel preponderante. O cientista é entendido como um
especialista, um perito que é treinado e aprende a ler e a interpretar a
informação que lhe chega, muitas vezes14de forma encriptada, através de
instrumentos e aparelhagens. No caso dos métodos de prospecção geofísica, a sua
utilização permite fazer falar uma Terra que é muda mas como a linguagem em
que esta responde é complexa e contingente, precisa de ser interpretada. O
papel do geofísico é desvendar essa linguagem e descodificar a informação
associada às representações visuais da Terra que são fornecidas pelo
equipamento geofísico.
O SABER DO GEÓLOGO: O PAPEL DE GEORGES ZBYSZEWSKI NAS CAMPANHAS DE PROSPECÇÃO
GEOFÍSICA
Em 1943 e 1946, foram realizadas, a pedido da Sociedade Portuguesa de Sais de
Potássio, Lda., duas campanhas de prospecção sísmica nas imediações das Caldas
da Rainha e Leiria, numa região conhecida por vale diapírico das Caldas da
Rainha,
15
respectivamente pelo IGME e pela companhia sueca ABEM. Essas campanhas
destinavam-se a verificar a existência, ou não, de sais alcalinos e, em caso
afirmativo, se estes recursos existiam em quantidade suficiente para serem
explorados economicamente. A partir de 1946, o SFM passou a ser a entidade
responsável pela prospecção sísmica e pela realização das sondagens na região.
Desde 1943 que Georges Zbyszewski, na altura o único geólogo dos SGP, se
encontrava oficialmente encarregado pela DGMSG de realizar a cartografia
geológica da região, assim como de acompanhar os resultados das sondagens e da
prospecção sísmica, realizados, primeiro pelo IGME, depois pela ABEM e, a
partir de Maio de 1946, pelo SFM. O trabalho de Zbyszewski consistiu na
realização de uma carta geológica na escala 1:25000 de toda a região, na
interpretação dos testemunhos das sondagens e, a partir de 1946, na decisão
sobre em que locais implantar o equipamento de prospecção sísmica (FERREIRA,
1945; CARDOSO, 1947).
Em 1945, depois de realizadas as primeiras campanhas de prospecção sísmica e
interpretados os resultados das primeiras sondagens, Zbyszweski foi da opinião
de que se deveria realizar novo estudo geológico da região, nova campanha de
prospecção sísmica e, eventualmente, novas sondagens (FERREIRA, 1946). As
condições de trabalho no campo não tinham sido as melhores: o geólogo queixava-
se das folhas utilizadas nos levantamentos cartográficos serem na escala 1:
50000 ' quando as indicadas seriam as 1:10000 ' o que impediu a correcta
representação de alguns afloramentos de extensão muito reduzida e a indicação
de todas as inclinações.
Além disso, devido à urgência que tinha sido posta no trabalho, nem todos os
terrenos tinham sido estudados de forma adequada. Apesar destas circunstâncias,
Zbyszweski tinha concluído que a quantidade de sais de potássio eventualmente
existente não era rentável para exploração. Avançava, no entanto, como provável
a ocorrência de reservas de sal-gema que poderiam apresentar interesse
económico mas, uma vez que a complexidade tectónica da região levantava
demasiadas dúvidas relativamente à profundidade a que estas reservas se
poderiam encontrar, considerava absolutamente necessário realizar novos estudos
geológicos e trabalhos de prospecção e pesquisa (ZBYSZWESKI, Óbidos... 1945;
ZBYSZWESKI, d'Obidos/Caldas da Rainha/São Martinho do Porto... 1945;
ZBYSZWESKI, Campo... 1946; ZBYSZWESKI, Leiria... 1946; ZBYSZWESKI, Caldas da
Rainha... 1946).
Assim, em Junho de 1946, a Brigada de Prospecção Sísmica do SFM iniciou a sua
primeira campanha de prospecção sísmica na região daquele vale diapírico,
utilizando uma aparelhagem portátil que adquiriu à ABEM (figura 3) e que era
considerada como uma das mais modernas da época (FERREIRA, 1946; COUTO, 1947).
O conhecimento derivado da larga experiência com esse tipo de aparelhagem,
tinha permitido à empresa sueca a introdução de algumas inovações que a
tornavam mais eficiente: alta velocidade do papel fotográfico em que era
registado o sismograma e disparo de tiro automatizado e controlado à distância
(COUTO, 1947 e CARDOSO, 1947).
16
Fig. 3 ' Aparelhagem de prospecção sísmica do SFM [retirado de Couto, M. S. G.
C., A aparelhagem sísmica de refracção do Serviço de Fomento Mineiro, ENT, 3
(1947), estampa I].
A aparelhagem do SFM era constituída por seis sismómetros, seis amplificadores,
um aparelho registador, uma caixa de tiro (registava o momento da explosão) e
uma bateria acumuladora (alimentava toda a aparelhagem). Todos estes elementos
operavam em conjunto, ligados através de cabos eléctricos especiais.
Os trabalhos de prospecção sísmica iniciaram-se com a marcação no terreno dos
perfis (alinhamento dos pontos de colocação das cargas explosivas e dos
sismómetros) de acordo com os locais indicados por Zbyszweski (FERREIRA, 1946;
ZBYSZWESKI, 1946; CARDOSO, 1947).
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Depois de marcados os diversos perfis e colocadas as cargas explosivas, teve
lugar o trabalho sísmico de campo propriamente dito, realizado por um
engenheiro e um agente técnico de engenharia de minas do SFM. Os sismogramas
obtidos eram revelados no final do dia de trabalho, quando era elaborado,
igualmente, um pequeno relatório (CARDOSO, 1947).
Seguia-se uma fase de trabalho de gabinete, quando os sismogramas eram lidos e
interpretados, permitindo o cálculo dos valores das velocidades das diversas
formações geológicas atravessadas pelas ondas sísmicas, assim como das
profundidades a que se situavam. Diversos factores podiam influenciar a leitura
e interpretação dos sismogramas: explosões fracas, fundo microssísmico
elevado devido a ventos fortes ou chuva, velocidade de deslocamento do papel
fotográfico, erros na identificação das ondas reflectidas e refractadas, erros
cometidos no cálculo dos tempos nos sismogramas, entre outros (CARDOSO, 1947).
As incertezas nas interpretações dos resultados obtidos, levaram a que os
elementos da Brigada de Prospecção Sísmica considerassem absolutamente
indispensável a realização de sondagens que os clarificassem. Não se pode
pedir à Geofísica mais do que aquilo que ela pode dar, diziam, para evidenciar
a complexidade e as dúvidas ligadas à interpretação dos resultados. Estes, não
eram mais do que uma mera imagem, tanto em sentido literal como figurado, que
necessitava de ser verificada através da utilização de outros meios. Além
disso, consideravam como absolutamente essencial que, para além dos estudos
geológicos prévios aos trabalhos de prospecção sísmica, também os resultados
fossem interpretados geologicamente. Uma das razões apontadas pela Brigada para
as dificuldades na interpretação dos resultados da prospecção sísmica era
exactamente a complexidade da estrutura geológica da região do vale diapírico,
algo para que Zbyszweski já tinha chamado a atenção (BRIGADA DE PROSPECÇÃO
SÍSMICA DO SFM, 1949).
Zbyszweski acompanhou a campanha de prospecção sísmica na região do vale
diapírico até à sua conclusão, em 1949. Seguiu-se a realização de mais
sondagens que foram, novamente, interpretadas pelo geólogo. No final, as
conclusões acerca da viabilidade económica da exploração de sais alcalinos na
região não foram diferentes daquelas que Zbyszweski tinha avançado
anteriormente: as reservas de sais alcalinos não eram economicamente rentáveis
mas as de sal-gema eram em quantidade suficiente para apresentar interesse
económico (CONSELHO SUPERIOR DE MINAS E SERVIÇOS GEOLÓGICOS, 1952).
Zbyszweski continuou a colaborar com o SFM nas décadas que se seguiram,
praticamente até à altura em que se reformou.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de este ser um tema que carece, ainda, de um estudo consistente e
aprofundado, é possível identificar nos últimos anos da década de 1940 algumas
circunstâncias que evidenciam uma alteração na situação da Geologia e dos
geólogos em Portugal e, em particular, nos SGP.
Durante a década de 1930, teve lugar o início da constituição de uma verdadeira
comunidade geológica em Portugal, consubstanciada, no ano de 1940, pela criação
da Sociedade Geológica de Portugal.18 Alguns elementos desta comunidade eram
professores universitários e/ou detinham postos noutras instituições públicas
nacionais, pelo que é de admitir uma proximidade e possível influência junto do
poder político. É de admitir que a comunidade geológica portuguesa tenha
conseguido dar a conhecer os seus objectivos a responsáveis políticos e, deste
modo, ver atendidas algumas das suas pretensões. A verdade é que, a partir de
meados da década de 1940, elementos da Assembleia Nacional e da Câmara
Corporativa começaram a alertar para o desconhecimento geológico do país e para
a falta de uma cartografia geológica adequada, chamando, simultaneamente, a
atenção para a difícil situação em que se encontravam os SGP.19Considerava-se
que a realização e publicação da carta geológica de Portugal eram fundamentais
para o progresso da vida económica do país, nomeadamente do desenvolvimento da
indústria mineira, da agricultura e das obras públicas (MOTA, 2007). Com a
implementação pelo Estado Novo, a partir de 1953, dos sucessivos Planos de
Fomento, os SGP passaram a dispor de condições materiais e humanas para
realizar a cartográfica geológica do país (MOTA, 2007).
Por outro lado, no início da década de 1950, a atitude dos engenheiros de minas
da DGMSG relativamente aos geólogos e ao seu trabalho era já diferente. A
partir de 1951, passou a ser prática do SFM mencionar explicitamente na sua
principal publicação, a revista Estudos, Notas e Trabalhos, a proveitosa e
inteligente assistência prestada por Georges Zbyszweski (SANTOS, 1952). E logo
no ano seguinte, em 1952, no quadro de pessoal do SFM, os geólogos passaram a
pertencer ao pessoal técnico; até aí, eram considerados pessoal auxiliar
(SANTOS, 1952). No entanto, a sua categoria continuava a ser mais baixa que a
de qualquer categoria ocupada pelos engenheiros de minas e, nos SGP, os
geólogos continuaram a manter-se numa posição de subalternidade (S/A, 1952).
Apenas em 1957, a categoria profissional de geólogo passou a constar do quadro
do pessoal técnico dos SGP (DESPACHOS, 1957). Durante a década de 1950, o
número de geólogos, tanto no SFM, como nos SGP, aumentou consideravelmente
(figura 4) e, cada vez mais, os engenheiros reconheciam a necessidade de
proceder a estudos geológicos, com destaque para a cartografia (MOTA, 2007).
Fig. 4 ' Evolução do número de geólogos nos SGP e no SFM entre 1918 e 1974
[dados obtidos a partir de DIRECÇÃO GERAL DE GEOLOGIA E MINAS (1990), Estudos
Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro: Tomo comemorativo do 50.º
aniversário do Serviço de Fomento Mineiro, 1939-1989. Porto. Direcção Geral de
Minas e Serviços Geológicos; dos volumes de Estudos, Notas e
Trabalhospublicados entre 1946 e 1966 e de um sem número de fontes primárias
encontradas no Arquivo Histórico do LNEG].
Em parte, é possível atribuir esta mudança de atitude dos engenheiros de minas
da DGMSG às consequências da construção de uma comunidade geológica em
Portugal. Internamente, é igualmente plausível admitir que essa mudança esteve
ligada ao trabalho desenvolvido por Georges Zbyszewski para o SFM durante as
campanhas de prospecção sísmica, que demonstrou de pouco servirem os aparelhos
geofísicos se, simultaneamente, não existir um acompanhamento de cariz
geológico.
Como se verificou, os engenheiros de minas eram grandes defensores da
utilização dos métodos de prospecção geofísica, pois associavam-nos a alguns
dos valores da prática científica que lhe eram mais caros, como a objectividade
dos procedimentos e a quantificação de resultados. No entanto, estavam também
cientes da complexidade inerente e perícia necessária ao uso desses métodos,
assim como do grau de subjectividade aliado à interpretação dos resultados
fornecidos pelos instrumentos, numa atitude característica de um
ethoscientífico que se tornou comum durante o século XX. Ao constatarem que
Zbyszweski foi capaz não apenas de lidar com complexidade associada à
utilização dos métodos geofísicos, como de demonstrar a absoluta necessidade de
associar o conhecimento geológico a esses métodos, criou-se uma plataforma de
entendimento com os engenheiros, pois estes consideraram que os valores
associados à prática científica que defendiam, eram, de algum modo, partilhados
pelo geólogo dos SGP.
Com o tempo, acabaram por reconhecer a importância da Geologia e de quem a
praticava. Os estudos de carácter geológico e, em particular, as cartas
geológicas tornaram-se uma ferramenta indispensável ao trabalho de
reconhecimento e pesquisa dos recursos minerais em que os engenheiros de minas
estavam empenhados e, neste processo, acabaram, inevitavelmente, por reconhecer
aos geólogos o estatuto que lhes era devido no interior das instituições que
dirigiam, com destaque para os SGP. Os métodos de prospecção geofísica foram um
veículo desse reconhecimento.