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EuPTCVAg0871-018X2012000100006

EuPTCVAg0871-018X2012000100006

variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Efeito da topografia na estabilidade temporal dos parâmetros do solo numa pastagem permanente mediterrânica

Introdução As pastagens permanentes, normalmente em regime de montado de sobro ou de azinho, ocupam cerca de 200.000 ha do Alto Alentejo, o que, por um lado, traduz a importância desta cultura e, por outro, justificou o desenvolvimento de um projecto, entre 2004 e 2007, financiado pelo governo português através do programa AGRO designado "Demonstração de tecnologias de aplicação diferenciada de fertilizantes e de sementes no melhoramento de pastagens no Alentejo".

As pastagens e forragens na pecuária extensiva alentejana fazem parte de uma estratégia de conservação dos recursos, estando estas inseridas em explorações onde o uso múltiplo da floresta e da silvo - pastorícia garanta a diversidade do uso, a segurança perante as alterações de preços no mercado e as variações do clima, e permitam, deste modo, a rendibilidade dessas mesmas explorações e, simultaneamente a garantia de ocupação de mão-de-obra nas regiões rurais. Para pôr em prática esta tarefa de conservação e recuperação dos recursos através dos sistemas agro ' silvo - pastoris é necessário conhecer os factores limitantes ao uso destes sistemas, em especial o factor solo, e para tal é necessário conjugar com o conhecimento agronómico as novas tecnologias que estão à disposição.

O desenvolvimento das pastagens em solos delgados e relativamente pobres encontra-se dependente do nível de nutrientes no solo, em especial dos macronutrientes principais, mas também do nível de matéria orgânica e do pH. Os solos no Alentejo, devido à natureza da rocha mãe que lhes deu origem, são relativamente ricos em potássio. Por outro lado, a utilização de pastagens biodiversas, onde se incluem as leguminosas, espécies que, quando devidamente inoculadas, incorporam azoto no solo a partir da fixação do azoto atmosférico, permite ao agricultor concentrar a sua atenção nos níveis de fósforo no solo, normalmente baixos em solos pobres e degradados, quer pela erosão, quer pela utilização sistemática em monocultura de cereais. É, por isso, prática comum, a aplicação de fertilizantes fosfatados em pastagens com o objectivo de aumentar os teores deste nutriente no solo até chegar aos 80-100 mg P2O5 kg-1, favorável ao desenvolvimento da flora biodiversa, especialmente as leguminosas (Efe Serrano, 2006). A importância da aplicação de fertilizantes fosfatados para melhoria da produtividade das pastagens encontra-se documentada por vários trabalhos (Gatiboni et al., 2000; Daniels et al., 2001). No entanto, a aplicação homogénea de fertilizantes, sem ter em conta a variabilidade das características do solo, conduz a importantes perdas económicas e reflecte-se em poluição ambiental, nomeadamente ao nível das linhas de água (Makowski et al., 2000; Mallarino e Wittry, 2004). Justifica-se, por isso, a implementação de metodologia que permita a identificação de zonas para gestão diferenciada das parcelas. Os ensaios realizados em pastagens são, contudo, complexos uma vez que envolvem três sistemas biológicos: solo, plantas e animais (Petersen, 1994). De acordo com Schellberg et al. (2008), a implementação da agricultura de precisão em pastagens permanentes é dificultada por várias razões, entre elas a variabilidade temporal associada. A situação é mais complicada quando está envolvido o pastoreio animal (Rook et al., 2004), cuja presença adiciona uma notável fonte de variabilidade dos nutrientes no solo em resultado da heterogénea deposição das fezes (McCormick et al., 2009).

Em trabalhos publicados nos últimos anos por esta equipa de investigação foi demonstrado o potencial de tecnologias para aplicação diferenciada de fertilizantes (Serrano et al., 2007), para avaliação expedita das características do solo (Serrano et al., 2010) e da produtividade da pastagem (Serrano et al., 2009). Marques da Silva et al. (2008) verificaram também a importância do relevo do terreno e das características do ano agrícola, em termos pluviométricos, nos teores de humidade do solo e, consequentemente, na produtividade das pastagens. No entanto, é reconhecido o reduzido conhecimento existente sobre a extensão ou a estabilidade da variabilidade temporal dos nutrientes no solo em pastagens permanentes, factor fundamental ao nível da tomada de decisão na implementação de programas de gestão diferenciada das parcelas (Vrindts et al., 2005). Este trabalho teve, por isso, como objectivo avaliar o efeito da topografia na estabilidade temporal dos macronutrientes, da matéria orgânica e do pH no solo em pastagens permanentes Mediterrânicas, no período entre 2004 e 2010. 

MATERIAL E MÉTODOS O ensaio foi conduzido numa parcela com cerca de 6 ha, situada na Herdade da Revilheira (38º27'51,6"N; 7º25'46,2"W) a cerca de 40 km a Nordeste de Évora (Figura 1). O solo predominante deste campo é classificado como um LUVISOL (FAO, 1998). No ano 2000 foi instalada nesta parcela uma pastagem biodiversa de gramíneas e leguminosas. Foram estabelecidos 3 períodos de intervenção na pastagem (Figura 2): a) Entre 2000 e 2003 foi submetida a pastoreio por ovinos e à aplicação homogénea de 300 kg ha-1 de adubo Superfosfato 18% no Outono de cada ano; b) Entre 2004 e 2007, para além do pastoreio por ovinos, integrou um projecto de demonstração de tecnologias de agricultura de precisão, sendo submetida à aplicação diferenciada de adubo fertilizante (Superfosfato 18%) no Outono de cada ano em função dos teores de fosfatos no solo no final do ciclo vegetativo das plantas (este período de intervenção na pastagem, onde se incluem os mapas de aplicação diferenciada de fertilizante, encontra-se documentado no artigo publicado por Serrano et al., 2011b); c) Entre 2008 e 2010 a parcela encontrou-se em pousio (não foi pastoreada nem foi aplicado fertilizante). Para efeitos de amostragem do solo, a parcela foi subdividida em 20 quadrículas de 56 m de lado. No final da Primavera de 2004, de 2007 e de 2010 (final de cada um dos períodos de intervenção na pastagem), procedeu-se à recolha, georeferenciada com GPS diferencial, de amostras compósitas de solo em cada quadrícula, obtendo-se os teores de azoto, fósforo, potássio e matéria orgânica e o pH, na camada de solo de 0-0,20m. Cada amostra compósita resultou da recolha de 20 sub-amostras realizadas em cada quadrícula de acordo com o diagrama apresentado na Figura 3.

Figura 1 - Aspecto geral da parcela de ensaio na Herdade da Revilheira.

Figura 2 - Diagrama cronológico de gestão da parcela de pastagem.

Figura 3 - Pontos de recolha de solo para amostragem em cada quadrícula da parcela.

Análise da estabilidade temporal A estabilidade temporal da concentração de macronutrientes, do teor de matéria orgânica e do pH do solo entre 2004 e 2010 foi determinada calculando o coeficiente de variação de cada ponto de amostragem ao longo do tempo (Eq. 1), método utilizado previamente por Blackmore (2000) e Xu et al. (2006) para determinar a estabilidade temporal da produtividade de cereais e de forragens, respectivamente. Este método também foi utilizado por Serrano et al. (2011a) na pastagem do campo experimental deste estudo mas para o período de 2004 a 2007.

onde: CVi é o coeficiente de variação de cada ponto de amostragem (i) ao longo do tempo; é a concentração dos parâmetros do solo nos pontos de amostragem (i) no tempo t e n é o número de anos de amostragem; é o valor médio do parâmetro no ponto de amostragem (i) no conjunto dos anos de amostragem.

O coeficiente de variação médio () para o período de ensaio (6 anos) e para o conjunto de todos os pontos de amostragem foi calculado de acordo com a Eq. 2 (Xu et al., 2006):

onde: m é o número de pontos de amostragem do solo.

Os mapas de estabilidade temporal foram produzidos a partir da estimativa dos valores não conhecidos dos parâmetros do solo, obtidos por interpolação. Os mapas resultantes indicam a variação da concentração dos parâmetros do solo, do teor de matéria orgânica e do pH para um determinado ponto ao longo do tempo. O  para o conjunto de todos os pontos de amostragem foi calculado com o objectivo de evidenciar a magnitude relativa da variação temporal dos parâmetros em análise; valores elevados de  indicam considerável variação temporal.

Os mapas foram desenvolvidos em ARCGIS 9.3 (ESRI, 2009), com as superfícies interpoladas tendo por base uma grelha de 10 m, utilizando o método ordinário de krikagem e um modelo de semivariograma esférico com uma variável assente num raio considerando 12 pontos.

Com o objectivo de avaliar a evolução relativa da concentração dos macronutrientes no solo entre o final do projecto (2010) e o seu início (2004), foram calculados, para cada ponto de amostragem, os rácios entre a concentração de cada macronutriente no solo em 2010 e a respectiva concentração em 2004 em função da cota do terreno.

RESULTADOS No Quadro 1 apresentam-se as médias, no conjunto de todos os pontos de amostragem, dos parâmetros do solo no final de cada período de intervenção (2004, 2007 e 2010) e ainda o coeficiente de variação de cada parâmetro do solo, obtido pela aplicação da Eq. 2 no período de 2004-2010. As Fig.s 4 a 6 ilustram a distribuição espacial no campo experimental do coeficiente de variação dos macronutrientes principais, da matéria orgânica e do pH no período entre 2004 e 2010.

Quadro_1 - Média de todos os pontos de amostragem dos parâmetros do solo em cada ano e coeficiente de variação médio entre 2004 e 2010.

Em primeira análise (Quadro 1) constata-se, em termos médios, um acréscimo significativo na concentração dos parâmetros do solo e uma ligeira diminuição do pH. Por outro lado, e reconhecendo o CV como indicador da estabilidade temporal dos parâmetros considerados, é possível confirmar as indicações da literatura quanto à maior ou menor estabilidade temporal dos macronutrientes no solo. Tal como Pillesjo et al. (2005) e Haneklaus (2006) sugerem, o azoto apresenta uma grande volatilidade (com um coeficiente de variação médio superior a 100%; Figura 4) face ao fósforo e ao potássio (com coeficientes de variação médios da ordem dos 20-30%; Figura 5).

Figura 4 - Distribuição espacial do coeficiente de variação dos teores de azoto (NO3) no solo entre 2004 e 2010.

Figura 5 - Distribuição espacial do coeficiente de variação dos teores de fósforo (P2O5; à esquerda) e de potássio (K2O; à direita) no solo entre 2004 e 2010.

Os resultados também reforçam as indicações de Pillesjo et al. (2005) e Haneklaus (2006) quanto à grande estabilidade do pH (com um coeficiente de variação médio próximo de zero; Figura 6, à esquerda), demonstrada por Serrano et al. (2010) num estudo onde foi utilizado um medidor de condutividade eléctrica do solo realizado na mesma parcela.

Figura 6 - Distribuição espacial do coeficiente de variação do pH (à esquerda) e dos teores de matéria orgânica (à direita) no solo entre 2004 e 2010.

Apenas ao nível dos teores de matéria orgânica (Figura 6, à direita) se verifica um desfasamento entre as indicações de Pillesjo et al. (2005) e Haneklaus (2006), que apontam para uma estabilidade permanente deste parâmetro num horizonte de cerca de 10 anos, quando, no período considerado de amostragem (6 anos) se verificou um coeficiente de variação médio de cerca de 18% (Quadro 1). Deve, no entanto, ter-se em consideração a particularidade do sistema dinâmico solo-planta-animal, podendo ter contribuído decisivamente para a considerável variabilidade espacial e temporal deste parâmetro a elevada acumulação de fezes e outros detritos orgânicos animais nalgumas zonas da parcela experimental, preferencialmente debaixo das árvores nas zonas mais elevadas da parcela, locais de descanso dos animais, os quais apenas pastorearam a parcela nos primeiros três, dos seis anos do ensaio.

A Figura 7 mostra uma extraordinária evolução do rácio da concentração de azoto no solo de 2004 para 2010 (chegando o rácio a atingir um factor 20). O significativo acréscimo da concentração deste nutriente no solo, especialmente marcado nas zonas baixas da parcela, onde predominam as leguminosas (Marques da Silva et al., 2008) pode reflectir, por um lado, o efeito de fixação do azoto atmosférico proporcionado por esta família botânica e acumulado ao longo dos seis anos de ensaio e, por outro, aspectos relacionados com a distribuição da precipitação, uma vez que está demonstrada a tendência de lixiviação de nitratos, especialmente em solos com relevo importante.

Figura 7 - Evolução da concentração de azoto (NO3) no solo (rácio 2010/2004) em função da cota do terreno.

Relativamente ao fósforo, a fertilização diferenciada no espaço e no tempo com Superfosfato 18% entre 2004 e 2007, com o objectivo de gradualmente aumentar os teores médios deste nutriente no solo até valores considerados adequados para o desenvolvimento da pastagem, pode aceitar-se como suficiente para justificar esta variabilidade temporal registada e o acréscimo médio da sua concentração no solo (Figura 8).

Figura 8 - Evolução da concentração de fósforo (P2O5) no solo (rácio 2010/2004) em função da cota do terreno.

No potássio verifica-se uma tendência para subida dos teores no solo de 2004 para 2010 (Figura 9) e, embora com um factor de acréscimo pouco superior à unidade, significativo uma vez que os teores deste nutriente eram, à partida, elevados. Em ambos os casos, no fósforo e no potássio este acréscimo é especialmente marcado nas zonas altas da parcela, o que deverá reflectir a libertação gradual destes nutrientes do complexo de troca, mas especialmente, o efeito do pastoreio animal selectivo e a concentração de fezes animais e outros detritos orgânicos nas zonas de descanso, por baixo dos aglomerados de árvores localizadas nas zonas mais elevadas da parcela, e o efeito da mineralização gradual destes resíduos.

Figura 9 - Evolução da concentração de potássio (K2O)  no solo (rácio 2010/ 2004) em função da cota do terreno.

Pode constatar-se que a conjugação de um relevo ondulado, em parcelas de montado, com a presença de animais, que realizam um pastoreio selectivo das espécies vegetais e a deposição heterogénea das fezes, proporcionam uma notável variabilidade espacial e temporal da concentração dos nutrientes no solo (McCormick et al., 2009) e confirmam as dificuldades indicadas por Schellberg et al. (2008) na implementação de tecnologias de agricultura de precisão em pastagens permanentes.

Como implicações práticas do projecto AGRO que suportou este estudo podem deixar-se duas notas. Por um lado, a intervenção de melhoria da pastagem através da fertilização diferenciada da parcela (aplicação de adubos fosfatados) baseada unicamente no histórico da concentração de fosfatos no solo parece não encontrar suporte nos resultados obtidos neste trabalho, o que exige a avaliação, ano a ano, das características do solo e da evolução das condições meteorológicas, especialmente ao nível da distribuição da precipitação, uma vez que ficou demonstrada a importância decisiva dos teores de humidade no solo sobre a produtividade das pastagens de sequeiro em solos Mediterrânicos pobres (Marques da Silva et al., 2008). Por outro lado, depois de demonstrado o potencial da tecnologia de aplicação variável (VRT) na aplicação de fertilizantes (Serrano et al., 2007), o desenvolvimento tecnológico no campo das pastagens permanentes de sequeiro deverá passar pela "sementeira diferenciada de espécies" (com tremonhas duplas ou triplas, comandadas por um sistema electrónico de gestão diferenciada), forma de restituir o equilíbrio biodiverso da pastagem que, ano a ano, em função das características do ano agrícola e do relevo tende a entrar em desequilíbrio, com reflexos negativos na qualidade da pastagem e na alimentação dos animais.

CONCLUSÕES A análise dos resultados obtidos revelou marcadas descontinuidades na concentração dos nutrientes no solo, tanto no espaço como no tempo, numa importante proporção do campo experimental. O pH foi a única característica química do solo que manteve uma elevada estabilidade, quer espacial, quer temporal ao longo dos seis anos de ensaio. Esta notável variabilidade resulta da conjugação de um relevo ondulado, solos delgados, em parcelas de montado, com a presença de animais em pastoreio.

A topografia da parcela mostrou uma influência significativa sobre a dinâmica dos nutrientes no solo, podendo ser utilizada em combinação com diferentes tipos de informação agronómica para ajudar a explicar a variabilidade dos nutrientes no solo.

Este trabalho confirma a complexa dinâmica dos nutrientes em pastagens Mediterrânicas envolvendo dois sistemas biológicos, plantas e animais, o que dificulta a implementação de estratégias de gestão diferenciada em pastagens de sequeiro no Alentejo e justifica a realização de mais estudos nesta área.


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