O Apoio Domiciliário a Pessoas Infectadas pelo VIH em França e Portugal
INTRODUÇÃO
Portugal é um dos países da União Europeia onde a
prevalência do VIH é mais elevada, a par com um sistema
social de saúde pouco satisfatório (1, 2). Em França, pelo
contrário, há um Estado Providência muito forte. A
mobilização associativa também. A mobilização
associativa em torno do VIH/Sida surge desde 1982, com
o Groupe de travail français sur le sida (3), enquanto em
Portugal é preciso esperar pela década seguinte para ver
nascer a primeira associação, a Abraço. Os conhecimentos sobre a doença da população em geral são menores
em Portugal, onde as atitudes discriminatórias são, pelo
contrário, mais importantes (4, 5, 6, 7, 8). Outra diferença
evidente diz respeito ao acompanhamento médico (9,
10).
Neste contexto, o apoio domiciliário pode aparecer,
em Portugal, como secundário. No entanto, ele é um
elemento chave do acompanhamento do doente em
situação de fragilidade física, psicológica e social.
O APOIO DOMICILIÁRIO EM FRANÇA E EM PORTUGAL
O apoio domiciliário é uma gama de serviços que
permitem às pessoas que sofrem de uma incapacidade
parcial ou total continuar a viver no seu próprio lar.
Consiste nomeadamente nos cuidados de higiene, realização de tarefas domésticas e deslocações do paciente,
mas representa também um apoio moral e um laço social
para os beneficiários. Pode ser prestado por empresas,
organizações não governamentais (ONG’s) ou indivíduos particulares (13).
Em França, o beneficiário do apoio domiciliário contribui com uma participação financeira em função dos seus
recursos: de €0,28 / hora quando são inferiores à €463 /
mês a €2,28 para recursos entre €1038 e €1110, despesas de alojamento deduzidas (13).
Em Portugal, o apoio domiciliário tem um âmbito
menos lato e é prestado sobretudo pelas Instituições
Particulares de Solidariedade Social (IPSS’s) e por entidades privadas. Não é, por conseguinte, acessível a
todos, e a qualidade dos serviços difere entre o domínio
associativo e o profissional. Há igulamente disparidades
em função dos subsistemas de protecção social. Aqueles
que subscrevem sistemas de protecção social privados
podem usufruir de serviços de apoio domiciliário privados, comparticipados em função dos seus rendimentos.
A comparticipação continua contudo a ser baixa em
comparação com a praticada em França. Além disso, o
pessoal que trabalha voluntariamente para ONG’s nem
sempre recebe a formação adequada.
O APOIO DOMICILIÁRIO AS PESSOAS SEROPOSITIVAS PARA O VIH/SIDA
O apoio domiciliário é solicitado por pessoas infectadas
pelo VIH/Sida que não têm necessidade de ser hospitalizadas mas que precisam de assistência para alguns
actos da vida quotidiana.
Em França, existe para cada departamento um ou
vários coordenadores de apoio domiciliário, sob a égide
da Direcção Geral da Saúde, que asseguram a relação
com os pacientes, avaliam as necessidades dos
beneficiários e determinam os serviços que se pode
oferecer-lhes. O pessoal do apoio domiciliário é especificamente formado para lidar com pacientes seropositivos
para o VIH/Sida. As ONG’s podem receber uma aprovação prefeitoral que lhes permite participar no dispositivo
de apoio domiciliário.
Em Portugal, o apoio domiciliário é menos desenvolvido. São sobretudo as ONG’s e IPSS’s que o prestam,
mas faltam-lhes meios financeiros para abranger todas
as pessoas que dele necessitam e também para dar
formação adequada aos prestadores de apoio, que se faz
geralmente com base no voluntariado. Esta lacuna provoca hospitalizações que poderiam ser evitadas. Ora,
tendo em conta a fraca capacidade das redes hospitalares (2,9 camas para 1000 habitantes contra 9,2 em
França), os pacientes acabam em enfermarias ou quartos de hospital.
AS RELAÇÕES SOCIAIS COMO FORMA DE APOIO
O fácil acesso ao apoio domiciliário é um elemento
essencial na luta contra as desigualdades sociais e na
saúde. O contexto social tem um peso decisivo na vivência
da doença. Tomar conta da sua saúde constitui um
conjunto de comportamentos que dependem em grande
parte dos recursos e constrangimentos diversos da vida
de um indivíduo, ligados ao trabalho, ao rendimento, à
vida familiar, às habilitações literárias, etc. (14). A variável “classe social” influencia as características do estado
de saúde, como a mortalidade e a morbidade, o estado da
dentição e da visão, a fertilidade ou ainda o número de
baixas médicas. Todos os elementos que definem a
posição social de um indivíduo influenciam o seu estado
de saúde ou geram comportamentos que têm uma influência sobre ele (12).
O laço social ajuda a assegurar o bem-estar psicológico da pessoa afectada pela doença. O casamento, a
família, os amigos, a prática de uma religião e a pertença
a outros grupos são os principais elementos de apoio
social. A família tem um papel central na gestão dos
cuidados de saúde e do apoio ao doente. Mas o Estado
não deve por isso desobrigar-se de obrar pelo acesso
aos cuidados de saúde para todos. Sendo o apoio
domiciliário um cuidado de saúde, deveria haver uma
maior implicação estatal na sua prestação.
As ONG’s prestam uma ajuda considerável, fornecendo serviços sociais e jurídicos, apoio psicológico ou
ainda um lugar de sociabilidade. A ajuda que representam para os doentes são a prova da importância do apoio
psicológico, social e material na gestão da doença.