Segurança da imunoterapia específica em pauta ultrarápida utilizando extractos
alergénicos modificados em idade pediátrica
INTRODUÇÃO
A vacinação anti-alérgica ou imunoterapia específi ca (IE), é o único método
terapêutico que pode alterar a história natural da doença alérgica1. Está
indicada para o tratamento de múltiplas doenças alérgicas mediadas por IgE,
tais como a asma, a rinite, a conjuntivite alérgica e o eczema atópico, com
sensibilização a aeroalergénios, na alergia ao veneno de himenópteros, em
alguns casos de alergia ao látex e, ainda, na alergia alimentar, permitindo
alcançar uma melhoria signifi cativa, quer na sintomatologia e na qualidade de
vida, quer na redução de outras medicações, permitindo simultaneamente obter
uma redução global de custos1,2.
A administração de IE pode ser efectuada por via subcutânea, por via sublingual
ou oral, com vários esquemas possíveis de administração tais como o clássico, o
cluster,os esquemas acelerados, em rushou mesmo ultrarápidos (ultra-rush).
Estes últimos permitem uma administração mais célere, atingindo -se rapidamente
a fase de manutenção, em até menos de uma hora, o que pode favorecer a adesão
ao tratamento e acelerar o início do efeito benéfico destes tratamentos
específicos1,2.
Uma preocupação na administração de IE subcutânea resulta de algumas
considerações quanto à sua segurança, pelo risco de ocorrência de reacções
adversas, nomeadamente em idade pediátrica. As reacções adversas podem ser
locais ou sistémicas: a reacção local pode manifestar-se como eritema, prurido
e/ou edema no local da injecção; a reacção sistémica manifesta-se por sintomas
de órgãos distantes do local da injecção, podendo ter diferentes graus de
gravidade, desde ligeiras, até reacções sistémicas graves, potencialmente
fatais2-4. Têm sido reportadas em vários estudos de IE subcutânea em esquema
convencional, a ocorrência de reacções sistémicas entre 0,8% a 46,7% dos
doentes5. Frew et al., num estudo multicêntrico de IE subcutânea em doentes com
rinoconjuntivite sensibilizados a pólenes, documentaram uma taxa de 4,4% de
reacções sistémicas de grau 36.
A ocorrência de reacções adversas tem sido relatada em estudos que documentam a
utilização de extractos aquosos modificados por métodos físicos (semidepot) ou
físicos e químicos (alergóides), sendo muitas vezes necessária a administração
de pré -medicação com anti-hista mínicos e corticosteróides1,2.
Recentemente foram disponibilizados comercialmente extractos alergénicos
submetidos a novos métodos de purificação que consistem na despigmentação
combinada com a polimerização com gluteraldeído (alergóides polimerizados)7-10.
Estudos anteriores, randomizados, em dupla ocultação contra placebo,
documentaram a eficácia clínica e segurança da administração de extractos de
alergóides polimerizados de ácaros7,8e de pólenes9,10em esquema convencional de
imunoterapia subcutânea, em doentes com asma7,8 e rinite9,10.
Em 2012, Pfaar et al., publicaram um estudo prospectivo randomizado em dupla
ocultação controlado com placebo, com dois anos de duração, que comparou a
eficácia clínica e imunológica em doentes com rinoconjuntivite alérgica,
sensibilizados a gramíneas, pela administração de extracto de pólen de
gramíneas, despigmentado e polimerizado, em esquema rushpré-sazonal. Os autores
concluíram da eficácia clínica e imunológica da utilização destes extractos,
bem como da sua segurança, quantificada pela ausência de reacções graves11.
Do mesmo modo, Brehler et al., estudaram doentes com rinoconjuntivite alérgica
sensibilizados a pólenes de gramíneas, a pólenes de árvores e a ácaros do pó,
dos quais um subgrupo fez um esquema de imunoterapia subcutânea convencional e,
o outro, um esquema rushsem pré-medicação, com a utilização de um alergóide
polimerizado. Na sua avaliação não houve diferenças estatisticamente
significativas na ocorrência de reacções adversas entre o grupo rushe o grupo
de administração clássica, independentemente do alergénio implicado12.
Os estudos que usam a pauta rushpara administração de alergóides polimerizados
são escassos em idade pediátrica, sendo desejável a existência de mais
informação obtida na prática clínica que comprove, quer a sua eficácia, quer a
sua segurança.
Em Portugal, na criança, não existem estudos alargados que documentem a
segurança da utilização destes extractos em pauta ultrarápida na prática
clínica diária, pelo que o presente estudo teve como objectivo primordial
avaliar a segurança, em idade pediátrica, da fase de indução de IE com
alergóides polimerizados, usando uma pauta ultrarápida; secundariamente
pretendeu-se avaliar a segurança da administração na fase de manutenção.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram incluídas para o presente estudo todas as crianças, observadas pelos
autores durante os últimos 5 anos (Maio de 2007 a Junho de 2012), no nosso
Centro de Imunoalergologia, submetidas a tratamento com IE com extracto
alergénico modificado de ácaros ou de pólenes (despigmentado, polimerizado com
gluteraldeído e adsorvido em hidróxido de alumínio), em que a fase de indução
foi efectuada em pauta ultrarápida. Foram registados os dados demográficos
(idade e género), patologia alergológica de base, sensibilizações a
aeroalergénios, registo do tipo de reacções adversas durante a indução em pauta
ultrarápida e na fase de manutenção da IE subcutânea, bem como a respectiva
abordagem.
O tratamento com imunoterapia subcutânea foi proposto pelos autores a crianças
com rinite alérgica persistente moderada a grave, com ou sem conjuntivite, asma
e/ou eczema atópico, sensibilizadas a ácaros e/ou pólenes, tendo sido obtido o
consentimento informado dos seus pais / prestadores de cuidados para a inclusão
no presente estudo. O tratamento (Laboratórios LETI, Tres Cantos, Madrid,
Espanha) foi iniciado com o frasco contendo a concentração máxima recomendada
do(s) alergénio(s) modificado(s) (denominado pelo fabricante como número 2),
cujo processo de produção e potência foram descritos em publicações
anteriores7-12. O protocolo da fase de indução consistiu na administração, no
mesmo dia, de duas doses de 0,2 e 0,3 mL em braços alternados, com um intervalo
de 30 minutos. A dose cumulativa de 0,5 mL, após as duas primeiras injecções,
foi a dose de manutenção recomendada pelo fabricante da vacina, sendo esta
repetida num intervalo de cerca de 4 semanas. Todas as administrações do
protocolo ultrarápido foram administradas por um médico imunoalergologista, nas
instalações do hospital-de-dia, mantendo vigilância médica permanente e
respeitando um período de monitorização mínimo de sessenta minutos após a
última dose, com registo e tratamento de eventuais reacções adversas. Nenhum
doente recebeu pré-medicação mas foi mantida a terapêutica anti-alérgica
prescrita para controlo da patologia de base.
A fase de manutenção consistiu numa injecção mensal de 0,5 mL (Depigoid®), ou
em cinco injecções semanais, nos doentes a fazer imunoterapia pré-sazonal com
pólenes (Depifast®).
A todos os doentes foi facultado o contacto telefónico da equipa médica,
acessível 24/24 horas, nomeadamente para relato da ocorrência de reacções
tardias após a fase de indução ou para qualquer evento durante a fase de
manutenção. Após a indução, perante uma reacção tardia, foi programado contacto
e eventual observação médica e indicado o tratamento apropriado.
Avaliação das reacções adversas
As reacções adversas foram classificadas de acordo com a localização (locais ou
sistémicas) e o tempo de aparecimento (imediatas, dentro dos primeiros 30
minutos após a administração ou tardias, quando ocorreram após este tempo).
As reações locais foram classificadas medindo o maior diâmetro da reacção. As
reacções imediatas com um diâmetro inferior a 5 cm e as reacções tardias
inferiores a 10 cm foram consideradas clinicamente não relevantes1,2,13.
As reacções sistémicas foram classificadas de acordo com The World Allergy
Organization Subcutaneous Immunotherapy Systemic Reaction Grading System, que
define 5 graus de gravidade3.
No tratamento das reacções locais foi recomendada a aplicação de gelo e,
dependendo da gravidade, também corticoides tópicos e anti-histamínicos orais
não sedativos. O tratamento das reacções sistémicas seguiu as recomendações da
European Academy of Allergy and Clinical Immunology(EAACI), tendo ao dispor
todos os fármacos e os meios necessários para a eventualidade da ocorrência de
uma reacção sistémica, independentemente da sua gravidade2,14.
RESULTADOS
Foram incluídas 100 crianças (57 do género masculino) com uma média etária de
11,6 anos (5 a 18 anos, desvio padrão de 3,3).
Todas tinham rinite alérgica persistente moderada a grave, 60% tinham
conjuntivite alérgica, 62% asma e 25% eczema atópico. No momento do início da
IE, todos os doentes tinham a sua asma controlada, clínica e funcionalmente.
Quanto ao perfil de sensibilização a aeroalergénios, 74% dos doentes estavam
sensibilizados a ácaros, 77% a pólenes de ervas e 60% a pólenes de árvores; 21%
estavam sensibilizados apenas a ácaros, 26% apenas a pólenes de ervas e/ou
árvores e 53%, simultaneamente a ácaros e a pólenes.
Todos os doentes tinham o(s) teste(s) cutâneo(s) por picada e o(s) doseamento
(s) da IgE específica sérica positivo(s) para o(s) alergénio(s) incluído(s) na
sua vacina anti-alérgica, seleccionado(s) como alergénio(s) majorpor ser(em)
aquele(s) clinicamente mais relevante(s). A IE com extractos de pólenes
modificados foi iniciada fora do pico da estação polínica, mas foi mantida
durante a mesma, prevendo-se o ajuste de dose quando indicado. A composição dos
extractos administrados encontra-se descrita no quadro_1.
Todos alcançaram a dose de manutenção de 0,5 mL no dia da indução, excepto uma
criança, que fez apenas a dose de 0,2 mL, por ter ocorrido uma reacção local
imediata que justificou a interrupção do protocolo (descrita posteriormente).
O número total de administrações de vacinas subcutâneas durante a pauta
ultrarápida foi assim de 199.
Durante a fase de indução ocorreram 21 reacções adversas locais em 11 doentes;
11 foram imediatas (9 com extracto D. pteronyssinus, 2 com gramíneas) e 10
foram tardias (4 com extracto D. pteronyssinus, 6 com gramíneas).
O quadro_2 mostra o número e a gravidade destas reacções, o quadro_3 mostra a
descrição dos casos. Todas as 11 reacções locais imediatas foram menores que 5
cm.
Num dos casos (doente n.º 1 do quadro_3) a reacção local imediata de 2,5 cm
após a dose de 0,2 mL motivou desconforto local intenso com prurido, edema e
dor, pelo que, de acordo com a vontade dos pais e da criança, se decidiu
suspender o protocolo, tendo alta após 2 horas com indicação de vigilância; foi
realizado contacto telefónico após 6 horas, dado ter ocorrido agravamento com
reacção local tardia superior a 10 cm. Perante esta evolução, o tratamento foi
suspenso, tendo sido reportado à área de Farmacovigilância do Laboratório Leti.
Após ter sido analisada, a vacina foi considerada com concentração dentro dos
parâmetros normais. Por não haver disponibilidade do doente e dos seus pais
para reiniciar a IE em pauta convencional, optou-se por propor a IE na forma
sublingual. Os outros 5 doentes com reacções locais imediatas inferiores a 5 cm
mantiveram a dose de manutenção de 0,5 mL com tolerância.
Quanto às reacções tardias, registou-se a ocorrência de duas reacções locais
tardias superiores a 10 cm (doente n.º 2 do quadro_3) tendo sido decidido
suspender transitoriamente a IE. O caso foi reportado à área de
Farmacovigilância do Laboratório Leti, tendo a vacina sido considerada com
concentração dentro dos parâmetros normais. Posteriormente, reiniciou a IE com
pauta de indução convencional, sem reacção adversa e com boa tolerância na fase
de manutenção. Noutro doente, registou-se a ocorrência de duas reacções tardias
de 5 a 10 cm (doente n.º 3 do quadro_3), tendo-se optado por reduzir a dose de
manutenção para 0,3 mL, que se manteve durante a época polínica, com posterior
aumento progressivo até se atingir a dose de manutenção de 0,5 mL, com
tolerância. Refira -se ainda a ocorrência de duas reacções tardias inferiores a
5 cm (doente n.º 4 do quadro_3) após a pauta ultrarápida, mas com agravamento
nas doses de manutenção subsequentes, com registo de reacções locais tardias de
5 a 10 cm, coincidindo com o pico de polinização das gramíneas, pelo que se
optou pela redução da dose para 0,3 mL, com aumento progressivo posterior, com
boa tolerância da dose de 0,5 mL após a fase polínica. Os outros dois doentes
com reacções locais tardias inferiores a 5 cm mantiveram a dose de manutenção
de 0,5 mL com boa tolerância.
As reacções locais foram tratadas com a aplicação de gelo e, dependendo da
gravidade, também com corticoides tópicos na pele e anti-histamínicos orais não
sedativos.
Quanto às reacções sistémicas (o quadro_4 mostra o número e a gravidade destas
reacções; o quadro_5 mostra a descrição dos casos), foram registadas em 2
casos, sendo ambas imediatas e ligeiras (grau 1), após a dose cumulativa de 0,5
mL do extracto alergóide polimerizado para ácaros. Num caso (doente n.º 1 do
quadro_5) ocorreu eritema da face com prurido e, no outro (doente n.º 2 do
quadro_5), lipotímia / reação vaso-vagal, não tendo sido necessário
internamento hospitalar para nenhum deles.
Nos dois casos decidiu-se efectuar a administração da dose seguinte após 30
dias, sob vigilância do imunoalergologista, ocasião em que seria iniciada a
fase de manutenção. No primeiro caso repetiu-se a pauta ultrarápida (0,2 mL +
0,3 mL) e no segundo caso realizou-se a dose de manutenção de 0,5 mL, não tendo
ocorrido em nenhum caso qualquer reacção adversa. Ambos os doentes mantêm-se em
fase de manutenção com boa tolerância.
A fase de manutenção consistiu numa injecção mensal de 0,5 mL (Depigoid®), em
87 doentes, ou em cinco injecções semanais, nos doentes a fazer imunoterapia
pré-sazonal com pólenes (Depifast®) em 13 doentes, correspondendo a um número
total de 1347 injecções.
Durante a fase de manutenção ocorreram reacções adversas em 4 doentes, 3
locais, correspondendo a 0,22% das administrações e apenas 1 sistémica (1/1347
injecções por via subcutânea ou 0,074%). Duas das reacções locais ocorreram em
doentes sob Depigoid® gramíneas 100%, uma imediata inferior a 5 cm, em doente
com rinoconjuntivite e asma, e outra tardia, também com menos de 5 cm, em
doente com rinoconjuntivite. No primeiro caso a administração foi efectuada em
ambiente hospitalar, tendo sido reduzida a dose para 0,3 mL na época polínica
com aumento posterior para 0,5 mL. No segundo caso, a administração foi
efectuada no Centro de Saúde, tendo -se mantido a dose de manutenção de 0,5 mL
mensal.
A terceira reacção local foi tardia, com mais de 10 cm, em doente com rinite,
asma e eczema atópico a fazer Depigoid® D. pteronyssinus100% no Centro de
Saúde, tendo -se constatado posteriormente que a vacina estava a ser
administrada por via intramuscular no 1/3 superior do braço, pelo que repetiu a
dose de 0,5 mL no hospital.
No entanto, manteve reacção local tardia de 6 cm, sendo reduzida a dose
seguinte para 0,3 mL, em ambiente hospitalar, com aumento progressivo da dose
segundo a tolerância. As reacções locais foram tratadas com a aplicação de gelo
e, dependendo da gravidade, também corticóides tópicos na pele e anti-
histamínicos orais não sedativos.
A reacção sistémica tardia ligeira (grau 1: urticária da face) ocorreu num
doente com rinite alérgica, asma e eczema atópico a fazer Depigoid® gramíneas
100% em ambiente hospitalar. Foi medicado com anti-histamínico oral, com
regressão do quadro clínico, tendo-se reduzido a dose para 0,25 mL na época
polínica com aumento posterior para 0,5 mL, com tolerância.
DISCUSSÃO
A eficácia clínica da IE é dependente da dose de alergénio administrada; no
entanto, doses elevadas poderão colocar problemas de segurança, pelo risco de
reacções adversas15.
Os extractos de alergénios despigmentados e polimerizados com gluteraldeído
mostram uma importante redução na capacidade de ligação da IgE específica,
sendo mais imunogénicos e menos alergénicos, permitindo iniciar o tratamento
com doses mais elevadas do que os extractos não modificados, permitindo
alcançar a dose de manutenção num curto período de tempo, o que pode potenciar
o início mais precoce da sua eficácia16.
Vários estudos têm mostrado a segurança e a eficácia clínica precoce da IE
usando vacinas contendo extractos de alergénios modificados (despigmentados e
polimerizados) em crianças e adultos com rinoconjuntivite alérgica e/ou asma
com sensibilização a ácaros e/ou pólenes, a maioria usando pautas de início
convencionais ou pautas cluster9,17-23.
São escassos os estudos na literatura com a utilização de pautas de início
rápido ou ultrarápido, em idade pediátrica.
O nosso estudo mostra que a indução da IE com pauta ultrarápida é aplicável e
segura em idade pediátrica, sendo esta uma prática corrente no nosso Centro.
Este estudo documentou, nos últimos 5 anos, a ocorrência de reacções locais em
11% das crianças submetidas a uma pauta ultrarápida, com apenas uma reacção
local imediata e quatro locais tardias com relevância clínica. Quanto às
reacções sistémicas, foram registados apenas dois casos correspondendo a 1% de
todas as doses administradas durante a fase de indução, ambos imediatos e
ligeiros. Nenhum doente necessitou de internamento hospitalar.
Refira-se que na nossa população, 62% dos doentes tinha asma, sendo fulcral
manter o seu controlo, dado que é um dos principais factores de risco para
reacções sistémicas graves24.
Perante os raros casos de reacção local clinicamente relevante ou de reacção
sistémica ligeira houve necessidade de ajuste da(s) dose(s) seguinte(s) ou do
intervalo entre as doses, tendo sido excepcional a necessidade de passar à
pauta convencional ou de interromper a IE.
Durante a fase de manutenção também foram raras as reacções adversas, com
apenas reacções locais em 3 crianças e uma reacção sistémica ligeira num
doente. Nestes casos foi necessário um ajuste temporário da dose, tendo os
doentes alcançado novamente a dose de manutenção com boa tolerância.
Deve salientar-se o facto de que nos doentes que optam por fazer a manutenção
no Centro de Saúde é importante a informação sobre o registo e a comunicação de
reacções adversas, assim como a atenção a possíveis erros de administração, tal
como sucedeu num dos doentes neste estudo. Torna -se fundamental uma boa
articulação e coordenação com os Cuidados de Saúde Primários, com uma aposta na
formação quanto aos correctos procedimentos de imunoterapia específica, uma vez
que erros, nomeadamente relacionados com a dose e/ou com a técnica de
administração, podem ser causa da ocorrência de reacções adversas. A formação
nesta área torna-se também muito importante pela possível ocorrência de
reacções adversas que deverão ser pronta e correctamente tratadas; tal como é a
nossa prática, o contacto directo ao imunoalergologista deve ser assegurado.
Os nossos resultados estão de acordo com estudos anteriores, que também
concluíram da elevada segurança da pauta ultrarápida, com o registo de reacções
sem gravidade11,12.
De facto, Pfaar et al., num estudo prospectivo randomizado em dupla ocultação,
em 195 doentes dos 11 aos 69 anos de idade (média etária de 33 anos) com
rinoconjuntivite alérgica, sensibilizados a gramíneas, com administração de
extracto de pólen de gramíneas, despigmentado e polimerizado, em esquema
rushpré 'sazonal (n=135) versusplacebo (n=60), documentaram a ocorrência de
reacções locais em 70% (n=95) versus40% (n=24) dos doentes, respectivamente,
mas sem necessidade de redução da dose administrada ou de suspensão do
protocolo. Referiram ainda a ocorrência de reacções sistémicas ligeiras em 16
doentes no grupo activo versus7 no grupo placebo, mas não documentaram reacções
graves11.
Brehler et al., estudaram 303 doentes adultos com rinoconjuntivite alérgica
sensibilizados a pólenes de gramíneas, pólenes de árvores e ácaros do pó, em
esquema de imunoterapia subcutânea convencional versus rushcom a utilização de
um alergóide polimerizado, documentando 6% de reacções sistémicas e 32% de
reacções locais, no grupo rush, sem diferenças estatisticamente significativas
em relação à administração clássica, independentemente do alergénio
implicado12.
Casanovas et al.,realizaram um estudo prospectivo observacional, multicêntrico,
incluindo 1068 doentes dos quais 33,2% tinham entre 3 e 18 anos de idade, com
rinoconjuntivite e/ou asma sensibilizados a ácaros e/ou pólenes, para avaliar a
segurança em usar uma vacina com extracto de alergénio despigmentado e
polimerizado (ácaros ou pólenes) com início em pauta rush, descrevendo a
ocorrência de apenas sete reacções locais relevantes e oito reacções
sistémicas, nenhuma das quais grave13.
Este último estudo, reporta uma menor ocorrência de reacções adversas, em
relação aos estudos de Pfaar11 e Brehler12, estando em concordância com o nosso
estudo, abrangendo igualmente um grande número de doentes em idade pediátrica.
Podemos enumerar muitas vantagens da utilização da pauta acelerada em idade
pediátrica, nomeadamente a maior conveniência pelo menor número de
administrações, o que se torna particularmente relevante neste grupo etário, a
menor morosidade para atingir a dose de manutenção, reduzindo-se o número de
deslocações à unidade de saúde o que pode aumentar a adesão ao tratamento e
reduzir custos directos e indirectos, a redução da probabilidade de erro de
dose nas administrações, a ausência da necessidade de utilização de pré-
medicação e, ainda, uma redução global dos custos, já que numa pauta
convencional o doente pode demorar várias semanas até atingir a dose de
manutenção, justificando um recurso muito superior a serviços de saúde.
Salienta-se que, para além da prescrição, a indução de IE deverá ser realizada
exclusivamente sob a supervisão de médicos especialistas em Imunoalergologia e
sempre em locais onde existam os meios necessários para o tratamento de
reacções adversas, nomeadamente de eventuais reacções sistémicas graves; no
tratamento de manutenção, deverão ser tomadas todas as medidas relativas à
segurança da utilização da IE subcutânea, respeitando as normas gerais e
recomendações que expressam as melhores práticas clínicas1,2.
CONCLUSÃO
Demonstrámos com este estudo que, efectuada por especialistas em
Imunoalergologia, a administração subcutânea de IE com extractos alergóides
polimerizados em pauta ultrarápida, em idade pediátrica, é segura, permitindo
alcançar a dose de manutenção no primeiro dia de tratamento, sem reacções
adversas, locais ou sistémicas, significativas. Da mesma maneira, a ocorrência
de reacções adversas foi excepcional durante a fase de manutenção.