Biópsia transtorácica com agulha cortante (Trucut) para o diagnóstico dos
tumores mediastínicos
Introdução
A biópsia transtorácica por agulha guiada pela radioscopia é considerada uma
técnica aceita na avaliação diagnóstica das massas mediastínicas. Este método é
capaz de evitar procedimentos diagnósticos mais invasivos, como a
mediastinoscopia, a mediastinotomia, a toracoscopia ou a toracotomia
exploradora1-3. Na maioria das vezes, a biopsia é realizada com agulha fina,
capaz de recolher material suficiente para o exame citopatológico e
microbiológico, mas incapaz de retirar material para estudo histopatológico4.
A biópsia realizada com agulha cortante (Trucut)fornece um fragmento de tecido,
no qual, além do estudo histopatológico, podemos realizar outros, como a
microscopia eletrónica, a imunoistoquímica e a análise dos marcadores tumorais
de superfície, os quais aumentam a especificidade diagnóstica, além de ser de
extrema utilidade no diagnóstico das massas mediastínicas.
5-7
Neste estudo, relatamos a nossa experiência com a biópsia percutânea com agulha
cortante (Trucut)como procedimento diagnnóstico inicial nos doentes com tumores
mediastínicas.
Objectivo
Este estudo teve por objectivo avaliar a contribuição da biópsia transtorácica
com agulha cortante no diagnóstico das massas mediastínicas. Utilizamos em
todos os casos a agulha cortante Tru Core(Med Tech Tru-Core, Gainsville, Fl,
EUA) como procedimento diagnóstico invasivo inicial para os doentes portadores
de massas mediastínicas.
Material e métodos
Realizamos a análise retrospectiva das biopsias transtorácicas com agulha
cortante (Trucut), orientadas, mas não guiadas pela tomografia computadorizada
do tórax, em 56 doentes, no período de Maio de 1999 a Junho de 2008.
Um procedimento é guiado pela tomografia computadorizada quando ele é realizado
concomitantemente à biópsia, guiando e orientando o posicionamento da agulha. A
biópsia transtorácica com agulha cortante é orientada pela tomografia
computadorizada quando utilizamos a tomografia computadorizada do tórax já
realizada para orientar o posicionamento da agulha. Foram 29 homens e 27
mulheres. A idade dos doentes variou de 8 a 79 anos, e a idade mediana foi de
40 anos.
As lesões apresentavam-se radiologicamente como massas sólidas e homogéneas em
todos os casos. O diâmetro das lesões variou de 3 a 10 cm e em 80% dos casos o
tumor tinha diâmetro superior a 4 cm. Todas as lesões estavam localizadas a
menos de 2 cm da pele. O tumor estava localizado no mediastino anterior em 52
doentes (93%) e no mediastino posterior em quatro (7%).
Todas as biópsias foram realizadas na sala de procedimentos do ambulatório do
serviço de cirurgia torácica, sem sedação e com anestesia da pele e do trajecto
da agulha com 5 mL de lidocaína a 2%, sem vasoconstritor e em regime
ambulatorial, sem necessidade de internação do doente.
As biópsias foram realizadas com a agulha Trucut, com diâmetro de 18 gauge.
Esta agulha foi desenvolvida para a retirada de tecido da lesão para estudo
histológico através de um mecanismo que dispara uma pequena cânula cortante,
capaz de retirar fragmentos adequados para o exame histopatológico dentro de um
estilete de 1,7 cm8.
Uma média de duas biópsias foi realizada em cada doente e material adicional
foi colhido quando necessário. Após a biópsia, o doente era submetido à
radiografia do tórax, e não observamos nenhum caso de pneumotórax, de
sangramento intratorácico ou escarros com sangue.
Os resultados das biópsias foram classificados como suficientes e
insuficientes, baseados na presença ou na ausência de células neoplásicas nas
amostras colhidas através da biópsia transtorácica com a agulha Trucut.
O material da biópsia foi considerado insuficiente quando não tinha
representação patológica da lesão ' e foi analisado separadamente.
Resultados
Cinquenta e seis doentes submeteram-se à biópsia transtorácica com agulha
cortante (Trucut) de massas mediastínicas durante o período do estudo.
O diagnóstico foi definido através desse procedimento em 49 (88%) dos doentes:
23(41%) linfomas; 12 (21%) timomas; 5 (3%) carcinomas tímicos; 3 (2%)
carcinomas indiferenciados de pequenas células; e 1 (0,6%) adenocarcinoma
metastático, carcinoma epidermóide metastático, carcinoma neuroendócrino
primitivo, plasmocitoma, teratoma e bócio.
Nos sete (13%) doentes nos quais o material colhido foi insuficiente para o
diagnóstico, este foi definido através da biópsia cirúrgica: 3 (43%) linfomas;
1 (14%) timomas; 1 (14%) linfangioma cístico; 1 (14%) carcinoma; e 1 (14%)
disgerminoma.
Discussão
Os tumores mediastínicos tradicionalmente são diagnosticados através da
mediastinoscopia, da toracoscopia ou da toracotomia exploradora. Estes
procedimentos necessitam, para sua realização, de anestesia geral e internação
hospitalar. A proposta do presente estudo foi avaliar a utilidade clínica da
biópsia transtorácica com agulha cortante (Trucut) no diagnóstico destes
tumores e determinar se ela deveria ser o procedimento diagnóstico inicial
nestes casos.
A maioria dos tumores localizava-se no mediastino anterior. As entidades
patológicas mais comuns foram as neoplasias linfoproliferativas, as neoplasias
epiteliais e os timomas.
Estes achados são semelhantes aos descritos na literatura mundial
3-7,13
.
O conhecimento da natureza do tumor mediastínico é fundamental para o correcto
planejamento terapêutico. Por exemplo, os timomas são primariamente tratados
cirurgicamente, enquanto os linfomas são tratados com quimioterapia, associada
ou não à radioterapia. Os doentes com doença metastática necessitam dessa
definição, pois disso depende o seu tratamento posterior.
A biópsia transtorácica com agulha cortante (Trucut) mostrou alta
especificidade do grupo de doentes, já que foi positiva em 88% deles
12
.
O pneumotórax é a complicação mais comum resultante da biópsia trasntorácica
com agulha cortante relatada na literatura; entretanto, não tivemos nenhum caso
neste grupo de doentes
8,10,12,13
. A ausência de pneumotórax nestes doentes possivelmente pode ser explicada
pela localização superficial das lesões biopsiadas ' todas localizadas a menos
de 2 cm da parede torácica.
Outras complicações relatadas na literatura, como a hemoptise (1,6%) e a dor
(3,2%), não foram observadas neste grupo
11,12,14
.
Um grande número de doenças mediastínicas é tratado clinicamente, como os
linfomas, ou é claramente não ressecável, como, por exemplo, as neoplasias
metastáticas; portanto, está claro que o diagnóstico histopatológico é
essencial para esses doentes.
Com base na nossa experiência, acreditamos que a biópsia transtorácica com
agulha cortante é um procedimento de fácil realização e seguro, capaz de
definir o diagnóstico na maioria dos tumores malignos do mediastino.
Ela pode, em muitos casos, substituir procedimentos cirúrgicos extensos, como a
toracoscopia ou a toracotomia, que necessitam de anestesia geral e internação
hospitalar e estão associadas a maior morbidade e a alto custo13,14.
Conclusão
Por ser um procedimento fácil de realizar e seguro, com mínimas complicações e
alto rendimento diagnóstico, recomendamos que a biópsia transtorácica com
agulha cortante deva ser o método diagnóstico inicial na avaliação dos doentes
com tumores mediastínicos, especialmente naqueles tumores que à tomografia
computadorizada do tórax se mostram irressecáveis.