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EuPTCVHe0874-02832012000300010

EuPTCVHe0874-02832012000300010

variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Significados das ações educativas de enfermagem centradas na amamentação na perspectiva das nutrizes e familiares

Introdução A prática da amamentação sempre foi realizada ao longo da história, apresentando oscilações no período de duração, dependendo da época ou situação cultural em que se encontravam as mulheres (Galvão e Silva, 2011). Entretanto, o número de mães que optam por fórmulas infantis em detrimento ao leite materno é crescente ocasionando aumento da morbimortalidade infantil (Frota et al., 2008).

No Brasil, a última pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2009), revelou baixos índices de mães que amamentavam conforme as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS): amamentação exclusiva até os seis meses, e associada a outros alimentos até os dois anos ou mais de vida da criança (World Health Organization, 2008).

Esta situação pode ser consequência da falta de informação da população ou até mesmo de orientação inadequada dos serviços de saúde (Frota et al., 2008).

Assim serão necessários esforços para o alcance dos índices de aleitamento materno preconizados pela OMS (Venancio et al., 2010).

Nesse sentido, deve-se implementar estratégias centradas no aspecto educativo que desenvolvam a formação de opiniões sobre a importância do aleitamento materno, visando a sua divulgação de forma mais consciente (Freitas et al., 2008). Portanto, uma alternativa viável para a obtenção de um processo educacional participativo, criativo e transformador voltado para a promoção da amamentação poderá ter como base os constructos de Paulo Freire.

Nessa tentativa de mudança de uma educação mecanicista e tecnológica, de caráter informativo e formador de indivíduos passivos, para uma educação reflexiva, libertadora e consciente, proposta por Freire, várias estratégias e campanhas são criadas para favorecer e estimular a prática da amamentação, como por exemplo, a implantação do ambulatório de amamentação em um hospital escola, em Recife-PE, nordeste do Brasil.

Esse ambulatório, além de acolher a nutriz, tem o objetivo de desenvolver mudanças de atitudes do companheiro e/ou familiares, direcionadas ao apoio a mulher durante o processo da amamentação. Neste sentido, a mulher e os seus familiares são atendidos pelos profissionais que realizam consultas na unidade hospitalar e no domicílio desta mulher, desde o pré-natal até os seis meses de vida da criança, centradas nos princípios da humanização, encorajando o aleitamento materno, ampliando o atendimento aos atores envolvidos nesta fase de vida (Pontes, Alexandrino e Osório, 2009).

Nessas consultas são desenvolvidas ações educativas com metodologias ativas e participativas por meio de orientações dialogadas, utilizando recursos instrumentais (vídeos, álbum seriado, panfletos, cartazes) e técnicas demonstrativas (com o modelo de peito cobaia e boneca ou com a nutriz e a criança). Esta maneira de assistir está centrada na construção do conhecimento e valores positivos sobre a amamentação, baseada nas ideias de Paulo Freire: diálogo, problematização e humanização. Assim, é necessário que um escute o outro, levando em consideração os saberes, a cultura, as experiências e as vivências da trajetória de vida de cada um (Brandão, 2001).

Neste ambulatório, a família é considerada como sendo o primeiro contacto do ser humano, sua escola inicial, a qual propicia o processo de aprendizagem, influenciando e interferindo em muitas formas na vida dos sujeitos, onde os valores, crenças e práticas são transmitidos e traçados entre várias gerações (Martins e Kalinowski, 2001). O enfoque dos familiares no contexto da amamentação possibilita uma interação maior entre seus membros, o que se traduz em um apoio à nutriz e, consequentemente, na promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno (Teixeira e Nitzchke, 2008).

Por isso, indagamos: quais os significados das ações educativas de Enfermagem para as nutrizes e familiares acompanhados no Ambulatório de Amamentação do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco? Dessa forma, destaca-se a necessidade de buscar a valorização das ações educativas de Enfermagem que favoreçam o aleitamento materno e estimulam a participação conjunta entre as nutrizes e familiares nessa prática.

Assim, este estudo poderá contribuir na otimização da promoção da amamentação e na atenção mais qualificada às nutrizes e familiares. Também, poderá colaborar para mudanças das práticas educativas, as quais devem considerar as necessidades biopsicossociais individuais e coletivas, a autonomia e a cultura, visando o envolvimento dos atores e o aumento da adesão materna em amamentar.

Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi compreender os significados das ações educativas de Enfermagem para as nutrizes e familiares atendidos no ambulatório de amamentação do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife-PE.

Metodologia Estudo descritivo, exploratório, qualitativo, realizado com vinte e dois sujeitos, onze nutrizes e onze familiares. O número de participantes foi delimitado pela saturação dos dados (Polit e Beck, 2011).

Como critérios de seleção, a nutriz deveria ter participado no mínimo a seis consultas de Enfermagem, seja na unidade hospitalar e/ou no domicílio, durante o acompanhamento no ambulatório de amamentação da referida instituição. o familiar deveria ter acompanhado essa nutriz em pelo menos três atividades específicas deste ambulatório, e o seu filho deveria ter a idade a partir de seis meses e um dia de vida. A opção desta faixa etária foi fundamentada na duração do aleitamento materno exclusivo recomendado pela OMS (World Health Organization, 2008) por seis meses e representa o limite de tempo de encerramento das atividades de acompanhamento. O número de consultas foi estabelecido para a mulher e familiares, para que todos tivessem um período mínimo de participação nas atividades deste ambulatório.

Na coleta de dados, optou-se pela técnica de entrevista semiestruturada (Polit e Beck, 2011), guiada por um roteiro constituído por perguntas fechadas, relacionadas com a caracterização dos sujeitos entrevistados, situação da amamentação e por duas questões norteadoras: O que significou para você ter recebido orientações sobre amamentação durante as consultas no ambulatório e na sua casa? Você poderia explicar como essas orientações sobre amamentação foram transmitidas tanto nas consultas no ambulatório quanto na sua casa? Antes de proceder às entrevistas, um estudo piloto foi realizado com três nutrizes e três familiares participantes do ambulatório de amamentação. Após a constatação da adequação desse roteiro para alcançar o objetivo proposto, esses entrevistados foram incluídos no estudo.

As entrevistas foram agendadas por telefone, conforme a disponibilidade da nutriz e familiar. No período de maio a setembro de 2011, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, as entrevistas foram realizadas individualmente, no mesmo dia e em momentos diferentes, na residência da nutriz ou do respectivo familiar, para não haver comunicação entre eles sobre o conteúdo da entrevista. A média de duração da entrevista foi de 20 minutos, sendo gravada por meio de aparelho MP4 e, em seguida transcrita na íntegra.

As transcrições foram validadas pelas autoras do estudo, por meio da escuta da gravação, de maneira individual e separadamente, verificando a exatidão e a precisão dos dados transcritos (Polit e Beck, 2011).

As falas foram submetidas à análise de conteúdo, na modalidade temática (Bardin, 2011), percorrendo os seguintes passos: inicialmente realizou-se leitura exaustiva e repetitiva das falas, para apreender o conteúdo das entrevistas; em seguida, foram realizados recortes dos núcleos de sentido, a unidade de significação, entendida como a ideia central em resposta a questão norteadora; estes núcleos de sentido foram codificados pelas suas semelhanças, originando as subcategorias e estas foram reagrupadas por meio de inferência interpretativa para a construção dos temas.

Estes temas foram interpretados segundo os constructos da teoria de Paulo Freire: diálogo, problematização e humanização. O diálogo é o elemento chave onde educador e educando se aproximam e são sujeitos atuantes. A problematização é a ação transformadora do contexto vivido, revelando a realidade dentro de uma postura conscientizada. E a humanização é o alcance, por métodos educativos, do respeito ao ser humano em sua totalidade (Freire, 2011).

Algumas dificuldades para a realização deste estudo foram encontradas: alguns números de telefones, para contato, não eram os mesmos que estavam disponíveis na ficha de cadastro do ambulatório de amamentação; adequação da disponibilidade da nutriz e de seu familiar para o mesmo dia, para a realização das entrevistas. Estas limitações não impediram o desenvolvimento do estudo, porém, aumentou o período da coleta dos dados.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências de Saúde da Universidade Federal de Pernambuco, protocolo de Certificação de Apreciação da Avaliação Ética (CAAE) 0086.0.172.000-11. E para garantir os preceitos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, foram adotadas as palavras nutriz e familiar com a denominação do parentesco (avó, sogra, entre outros), seguidas de números (1 a 11), conforme a ordem de realização da entrevista, possibilitando correlacionar a nutriz e seu respectivo familiar.

Resultados A faixa etária variou entre 16 e 35 anos de idade para as nutrizes, 19 a 61 anos para os familiares e 11 a 20 meses para as crianças. O grau de parentesco familiar em destaque foi o companheiro seguido da mãe da nutriz. Sete nutrizes cursaram o ensino médio, mas somente quatro delas o concluíram, enquanto quatro não terminaram o ensino fundamental. na escolaridade do familiar, o ensino médio incompleto foi predominante. As ocupações dos familiares eram bastante diversificadas, enquanto sete nutrizes realizavam as tarefas domésticas da sua própria casa. Houve predominância entre dois e quatro salários mínimos vigente no Brasil (R$ 622,00) para a renda familiar dos participantes. Com exceção de duas nutrizes entrevistadas, as quais eram solteiras, todas as outras mantinham união estável, o que predominou também entre os familiares. Quanto ao tempo de amamentação exclusiva, apenas quatro nutrizes conseguiram manter até o sexto mês de vida do filho, no entanto, seis ainda continuavam amamentando o seu filho no momento da entrevista. A participação das nutrizes nas consultas de Enfermagem, no hospital, variou de quatro a seis vezes, e nas visitas domiciliares, de seis a oito vezes. Seus familiares estiveram presentes, predominantemente, em torno de seis vezes nas visitas domiciliares.

Das falas dos vinte e dois entrevistados emergiram quatro temas: Experiência exitosa envolvida pelo acolhimento e cuidado; Aprendizagem familiar; Empoderamento do conhecimento para amamentar; Orientações centradas em metodologias ativas. As subcategorias que originaram estes temas estão descritas no quadro 1, conforme as orientações de Bardin (2011).

Quadro 1 ' Categorias e subcategorias de análise emergidas das falas dos participantes do estudo

Tema 1 - Experiência exitosa envolvida pelo acolhimento e cuidado Os participantes do estudo vivenciaram sentimentos positivos ao receber as orientações voltadas à promoção da amamentação, seja nas consultas de Enfermagem ou nas visitas domiciliares, durante acompanhamento no ambulatório de amamentação: Foi ótimo, foi uma experiência. (Nutriz 1); Eu mesma adorei, achei ótimo. Foi bem proveitoso, mesmo eu sendo mãe, até que eu ainda aprendi. (Familiar/sogra 5); Foi muito bom, foi ótimo, gostei muito mesmo, nota dez. (Familiar/avó 7); Para mim foi ótimo, porque a gente receber orientação de pessoas capacitadas é um privilégio, eu não tenho plano de saúde e me ajudou muito receber isso de um serviço público (...) (Nutriz 8).

Nessa teia de sentimentos positivos, parte das nutrizes revelou a importância dessas orientações em suas vidas, o que levou a se considerar diferente em relação às outras pessoas, e até mesmo, guardar essa boa experiência em suas lembranças para o resto da vida: Achei muito importante, e me achei muito bem informada, me senti diferente dos outros hospitais que não tem acompanhamento (...) (Nutriz 4); Eu achei essencial para mim, em tudo, tudo que eles (equipe do ambulatório) me ensinaram assim, eu acho que eu vou guardar isso para o resto da minha vida, uma experiência muito boa. (Nutriz 10).

Ainda, embalados por sentimentos positivos, alguns participantes consideraram o acompanhamento no ambulatório de amamentação como algo inovador, surpreendente e que fez toda a diferença: (...) para mim, uma coisa desconhecida, que eu achava que não existia esse outro lado do acompanhamento (...) está de parabéns, porque além de ter esse novo acesso de tratamento, sempre escolheu boas pessoas (...) (Familiar/mãe 10); (...) ela (enfermeira) veio aqui, para mim foi uma surpresa, eu não sabia não que vinha em casa! (Nutriz 2); (...) as informações fizeram muita diferença, tirou aquele estresse, ajudou muito (...) (Familiar/companheiro 8).

Essa diferença revelada pelos participantes desse estudo também foi percebida na prevenção e transposição dos obstáculos envoltos pela dor e sofrimento, durante o processo da amamentação: Me ajudou bastante a aprender mais como amamentar, eu estava dando de forma errada, (...) me ajudou até também a não me machucar. (Nutriz 9); (...) o mau jeito que ele (criança) estava pegando, estava doendo, ele estava pegando no bico (...) quando ela (enfermeira) veio que me ensinou tudo direitinho, parou de doer. (Nutriz 6); Eu que sou homem enfrentei a amamentação muito melhor depois da ajuda dela (enfermeira).

(Familiar/companheiro 8).

Percebe-se, também, que nesta experiência bem-sucedida os participantes foram bem cuidados e acolhidos com carinho pela equipa de Enfermagem, ao receber orientações sobre a prática da amamentação durante o acompanhamento no ambulatório de amamentação: Ela (enfermeira) vinha todo mês, me orientava mais, eu me sentia mais cuidada sabe? Saber que todo mês vem alguém querer saber do seu filho, eu gostei por isso, todo mês ela vinha, procurava saber como ele estava, se ele estava mamando direitinho, se eu estava mal em alguma coisa, meu peito (...) (Nutriz 6); Me senti muito amparada (...) foram muito atenciosos comigo, muito, muito, muito atenciosos (...) eles (equipe do ambulatório) têm um carinho enorme com a gente, acolhem muito bem, eu não tinha a mínima noção de como era amamentar uma criança, dar o peito e tudo, então é muito válido. (Nutriz 11); A menina (enfermeira) trata a pessoa bem, explicou direitinho (...) . (Familiar/companheiro 4); Olhe o atendimento dela (enfermeira) com a menina (neta) aqui foi ótimo, não poderia ser melhor, gostei muito, muito atenciosos, explicava tudo direitinho, foi um bom acompanhamento para ela (neta) (...) (Familiar/avó 7); (...) eu achei excelente, tanto assim as explicações que disseram, pessoas (equipe do ambulatório) bem orientadas, simpáticas, assim, muito paciente quando eu não sabia, não entendia, eu perguntava, eles (equipe do ambulatório) explicavam de novo (...) (Familiar/mãe 10); (...) a atenção que ela (enfermeira) teve com a gente aqui, ligava sempre para a gente, ela chegava perto da família (...) e de ter ajudado (...) acompanhou meu bebê (...) ela (enfermeira) foi muito legal com a gente trazendo o conhecimento aqui (...) (Familiar/companheiro 11).

Tema 2 - Aprendizagem familiar As orientações fornecidas durante o acompanhamento no ambulatório de amamentação proporcionaram aos participantes, deste estudo, uma aprendizagem contínua, em qualidade e quantidade, para si mesmo e para a família: (...) a gente aprendeu mais (...) (Familiar/sogra 5); (...) foi bom também, eu aprendi mais também, junto com ela (nora). (Familiar/sogra 6); Porque orienta a gente de tudo, de coisas que a gente não sabe (...) coisas que a gente fazia que não era certo, então ela (enfermeira) nos orientou (...) (Familiar/avó 7); (...) você está sempre comunicando, sempre aprendendo mais alguma coisa, porque você sabe, cada dia que passa tem mais uma novidade, mais alguma coisa (...) (Familiar/mãe 9); Tinha coisas que eu não sabia e ela (enfermeira) foi falando (...) (Familiar/companheiro 11).

A partir dessa aprendizagem, alguns sujeitos relataram que puderam repassar para outras pessoas, os ensinamentos voltados à prática da amamentação: Foi mais uma coisa que eu aprendi mais do que eu tinha esquecido do meu tempo, depois dela (nora) eu fui podendo aprender mais coisa, logo depois veio minha menina também eu tive como explicar a ela (filha) alguma coisa (...) (Familiar/sogra 6); (...) duas amigas minhas engravidaram, uma teve neném e outra está grávida de sete meses, repassei panfletos, revistas, o que eu aprendi (...) (Nutriz 11).

Porém, nesse contexto do conhecimento adquirido, chamou à atenção que um único participante não mencionou o termo aprendizado em suas falas, referindo que o acompanhamento fornecido levou a adesão na prática da amamentação exclusiva por parte da nutriz, sua filha, trazendo benefícios apenas para a mesma, por considerá-la muito preguiçosa: Bom para ela (filha), porque para mim (...) porque ela (filha) é muito preguiçosa. Para ela (filha) fazer uma comida é que ia ser mais complicado, que ela (filha) não sabe fazer nada mesmo, o peito foi ótimo para ela (filha) ter dado peito para ele. (Familiar/mãe 1).

Tema 3 - Empoderamento do conhecimento para amamentar A apropriação do conhecimento das orientações recebidas impulsionou as nutrizes em direção à importância da amamentação e ao aumento da competência para incorporar um comportamento desejado, resultando em amamentar corretamente com facilidade, coragem e tranquilidade: Porque eu não saberia amamentar tão direitinho do jeito que elas (equipe do ambulatório) me explicaram entendeu? (Nutriz 6); (...) eu não tive dificuldade nem quando eu fui amamentar, o pessoal fala muito que seio (...), racha e tem mulher que realmente tem problema (...) eu me sentir a vontade, quando chegava a hora de amamentar ela (criança), eu ficava bem tranquila (Nutriz 10); (...) quando tive meu filho eu não fiquei aquela mãe apreensiva e com medo, eu sabia como lidar com aquilo, com a questão da amamentação, como ele devia pegar direitinho, ai não tive problema com isso (...) depois de você está instruída a saber qual é a forma que seu bebê deve pegar no peito pronto, não tem peito que não saia leite, todos vão encher e encher cada vez mais de leite, não tem esse que não saia não (...) (Nutriz 11).

Tema 4 - Orientações centradas em metodologias ativas Durante o acompanhamento, as orientações voltadas à promoção da amamentação foram fornecidas no diálogo, em grupo ou de forma individualizada, esclarecendo as dúvidas e trazendo exemplos de outras mães: Ah, era mais um diálogo com a gente (...) (Familiar/companheiro 3); Ah, foi uma palestra (...) Ela (enfermeira) passou muita informação falando, conversando (...) (Familiar/ companheiro 8); (...) tinha também perguntas para responder no papelzinho e fazia um debate com as perguntas e respostas (...) perguntavam as coisas as mães mais experientes para ver se estavam certas ou não, de forma que não chateassem elas (...) (Nutriz 11); Ela (enfermeira) vinha e fazia perguntas, perguntava como ele (criança) estava, como estava amamentando, como eu estava (...) tirava as dúvidas. (Nutriz 4); Ela (enfermeira) conversou bastante, mostrava cartazes, mostrou panfletos, me explicou (...) mostrando exemplos de outras mães (...) (Nutriz 3).

Nesse processo de aprendizagem, o diálogo era conduzido por recursos instrumentais como imagens e vídeos, visualizados por meio do computador, cartazes, panfletos/folders, cartilha e até papel manuscrito: Outras vezes elas (equipe do ambulatório) mostravam cartaz ou então imagem no computador (...) (Familiar/companheiro 2); Tinha vídeos que ela (enfermeira) me mostrava através do leptop dela, ela (enfermeira) me mostrou uma vez, tinha uns folderes que ela me dava sobre amamentação. (Nutriz 11); Era falando, explicando, trazia é (...) livros, papéis, explicando, trazia panfletos, orientava (...) (Familiar/avó 7); (...) davam a cartilhinha para a gente, explicando (Nutriz 6); Ela (enfermeira) pegava uma folha de caderno e escrevia passo a passo para mim, para ler e ficava lendo o assunto para fazer o certo. (Nutriz 9); Às vezes ela (enfermeira) deixava uma listinha por escrito para a gente sempre se lembrando (...) botava o que deveria comer, o que deveria fazer (Familiar/mãe 9).

Além dos recursos instrumentais, eram utilizadas técnicas de demonstração, praticadas com auxílio de modelo do peito cobaia e boneca: (...) às vezes ela (enfermeira) mostrava numa borrachinha que tinha , que ela fazia as orientações e mostrava para a gente como era para fazer (...) um formato de uma mama. Tinha de borracha (...) ai ela (enfermeira) mostrava a gente (...) (Familiar/companheiro 2); (...) a professora botava um peito de mentira nela para ensinar, uma boneca, ela botava na gente também, que atacava atrás, depois botava a boneca assim no peito da gente, o peito de mentira, botava em todo mundo que estava , nas mães, ensinava a dar de mamar (Nutriz 5); Ela (enfermeira) colocou um negócio (...) tipo um colete, que tinha o peito, ela vestia e ficou-me ensinando (...) (Nutriz 7).

Também, essas demonstrações do ato de amamentar eram praticadas com a própria criança no peito da nutriz: falar não, ela (enfermeira) ensinou mesmo, ela (enfermeira) botava mesmo W. no peito, pegava e ensinou a ela (nora) como botava (...) (Familiar/sogra 5); Ela (enfermeira) botava ele (criança) em mim pra ele mamar, botava a cabeça dele direitinho, tudo para eu fazer quando ela (enfermeira) não estivesse (...) (Nutriz 6).

Discussão Os participantes, deste estudo, ao receber as orientações sobre amamentação, durante as consultas de Enfermagem, na unidade hospitalar e/ou nas visitas domiciliares, desde o pré-natal até o sexto mês de vida da criança, vivenciaram sentimentos positivos. Dessa forma, o processo ensino-aprendizagem experienciado por esse grupo de pessoas foi envolto por interesse, felicidade, satisfação, segurança e gratidão. Um estudo, realizado em Portugal, mostrou que as intervenções de enfermagem devem ser contínuas desde a gestação até o puerpério, para o sucesso da amamentação (Graça, Figueiredo e Conceição, 2011).

Outro estudo enfatizou que o domicílio é um local estratégico para que os profissionais de saúde possam mergulhar no quotidiano familiar e direcionar ações de promoção do aleitamento materno (Teixeira e Nitzchke, 2008).

Ainda, atrelada a essa teia de sentimentos positivos, todo o processo de construção de conhecimento foi entrelaçado pelo carinho, respeito, acolhimento e cuidado. Isso é possível na medida em que o educador tem como características essenciais a amorosidade, advinda de uma atitude de compaixão com o outro e de humildade, reconhecendo a limitação de seu conhecimento e a aquisição do novo aprendizado resultante da sua interação com o aprendiz (Mitre et al., 2008).

Assim, durante o processo de ensino/aprendizagem, a relação entre o educador e educando deve ser agregadora, um aprendendo com o outro, por meio do diálogo e da reflexão, para solucionar os problemas do quotidiano. Ainda nesta relação, o educador deve respeitar as limitações e saberes prévios do educando e compartilhar das vivências de sua realidade (Freire, 2008).

Nesse contexto, percebe-se que, em um processo contínuo de interação e troca entre os atores, a adoção da escuta paciente e a abertura ao conhecimento do outro possibilita a construção compartilhada do saber e de formas diferenciadas do cuidado (Acioli, 2008), o que pode ser evidenciado nas falas dos sujeitos entrevistados. Não esquecendo que a escuta aqui mencionada, significa estar disponível permanentemente à fala, ao gesto e às diferenças do outro, conforme os postulados de Freire (2008).

Além do respeito, da escuta e da abertura ao saber do outro, o diálogo esteve sempre presente nas ações educativas de Enfermagem do ambulatório de amamentação, em grupo ou de forma individualizada, proporcionando aprendizado não da nutriz, mas dos membros de sua família. A família é o ponto de partida, seguido da comunidade escolar e das instituições de saúde, na rede de apoio social à nutriz no ciclo grávido-puerperal e no processo de amamentar (Pontes, Alexandrino e Osório, 2009). Um estudo de intervenção (Teixeira e Nitzchke, 2008) e uma pesquisa bibliográfica (Marques et al., 2010) comprovaram que a família precisa ser inserida no apoio e incentivo ao aleitamento materno por meio do diálogo.

A partir dessa relação dialógica da troca de experiências entre educador e educando, as ações educativas desenvolvidas em saúde buscaram estratégias para a conscientização dos sujeitos quanto à relevância da adesão à prática da amamentação, assim, impulsionaram o empoderamento das mulheres para um amamentar corajoso, tranquilo e sem dificuldades. Na verdadeira dialogicidade, os sujeitos envolvidos aprendem e crescem na diferença e no respeito à mesma (Freire, 2008); trabalham juntos, para o mundo transformar e humanizar.

Em um estudo realizado nos pressupostos da educação para a promoção da saúde (Santana et al., 2010), o suporte informativo fornecido por meio do diálogo como ação educativa em saúde, aumentou as taxas de aleitamento exclusivo nos três anos de intervenção e favoreceu uma maior interação entre a equipe multidisciplinar.

Portanto, o resultado positivo da intervenção educativa reforça a necessidade de propiciar um movimento dinâmico e de permanente mudança do conhecimento, de aquisição de habilidades e de atitudes que torne os educandos mais capazes para a vida e para o trabalho, assumindo-se, assim, a educação crítica reflexiva (Silva et al., 2009).

Diante do exposto, entende-se que o ensinar durante o acompanhamento no ambulatório de amamentação foi mais além da normatização de informações ou da transmissão de conhecimento e ideias. Assim, a proposta dialógica cria possibilidades para produção ou construção do próprio conhecimento (Freire, 2008), transformando saberes existentes.

Dessa maneira, o diálogo, presente nas atividades do ambulatório, mencionado nas falas dos atores, foi permeado por metodologias ativas, conduzidas por técnicas de demonstração, com auxílio de modelo de peito anatómico e boneco, ou até mesmo com a própria nutriz e a criança; ainda utilizou recursos instrumentais como vídeos, cartazes, panfletos/folders e papéis manuscritos, propondo a esses sujeitos a análise crítica de sua realidade concreta através do diálogo problematizador proposto por Freire (2011).

As metodologias ativas utilizam a problematização com o objetivo de encontrar e motivar o educando, pois diante da dificuldade, ele analisa, reflete, relaciona a sua realidade e passa a atribuir um novo significado às suas descobertas.

Logo, a problematização pode levá-lo ao contato com as informações e à produção do conhecimento, com a finalidade de solucionar os obstáculos e promover o seu próprio desenvolvimento (Mitre et al., 2008).

O verdadeiro pensar dialógico problematizador nas relações humanas tem sentido a partir da busca do respeito à autonomia e à identidade do educando, da libertação de tudo aquilo que nos desumaniza e nos proíbe de sermos mais humanos, dignos e éticos em nossa existência (Freire, 2008).

O respeito à autonomia parece ser o melhor modo para a compreensão, por parte do binómio educador/educando, do processo de produção, construção e apreensão do conhecimento, dentro de uma perspectiva de mudança da realidade, pois é se conhecendo que se transforma (Mitre et al., 2008).

Portanto, no processo de ensino/aprendizagem, primeiramente, é preciso conhecer os indivíduos para os quais se destinam as ações educativas de saúde, incluindo suas crenças, culturas, hábitos, papéis na sociedade, e as condições sociais em que vivem, para depois os envolver nessas ações, o que se contrapõe a imposição do educador (Santana et al., 2010).

Dessa maneira, a solidariedade social e a política na prática educativa, necessária à construção de uma sociedade mais humanizada, devem ser pautadas na compreensão do valor dos sentimentos, das emoções, do desejo, da insegurança e do medo a serem superados. Também, devem ser centradas no respeito à identidade cultural do educando, bem como aos seus saberes construídos e as diferenças existentes na relação entre educador e educando, onde não se reduzem a condição de objeto um do outro (Freire, 2008).

Assim, as ações educativas em saúde voltadas para a promoção da amamentação, mencionadas pelos participantes do estudo, foram percebidas como efetivas na mudança do conhecimento pessoal, desenvolvidas com respeito às suas crenças, seus valores e seus hábitos de saúde, facilitando o envolvimento dos atores durante o acompanhamento no ambulatório, resultando na adesão e manutenção do amamentar.

Conclusão O estudo revelou a experiência exitosa, permeada por sentimentos de alegria, satisfação e gratidão, vivenciada pelos atores envolvidos no processo de ensino-aprendizagem durante acompanhamento no ambulatório de amamentação, demonstrando que existem ações educativas efetivas na promoção e apoio ao aleitamento materno.

As atividades do referido ambulatório foram capazes de envolver a mulher e a família na construção, produção e apreensão do conhecimento, a partir do cuidado, apoio e respeito aos seus saberes existentes, resultando no empoderamento para uma prática do amamentar corajosa, tranquila e cheia de facilidades.

A construção do saber foi alcançada pela nutriz e pelo familiar que a acompanhava nas atividades desenvolvidas por meio do diálogo, baseadas na escuta e no reconhecimento da identidade cultural do educando, com auxílio de técnicas de demonstração e de recursos instrumentais. Logo, as ações educativas de enfermagem do ambulatório de amamentação utilizaram metodologias ativas e participativas centradas nas ideias de Paulo Freire, permeadas no apoio e cuidado.

Assim, reconhece-se a importância da continuidade deste ambulatório, do desenvolvimento de mais estudos de intervenção, centrados em ações educativas dialógicas, problematizadas e humanizadas, para a transformação da relação profissional/usuário ou educador/educando, visando o acolhimento da mulher nutriz e dos seus familiares, no contexto da promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno.


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