Efeitos da liderança na melhoria da qualidade dos cuidados de enfermagem
Introdução
Os sistemas de saúde são constituídos por organizações de saúde, que enfrentam
todos os problemas inerentes a qualquer outro tipo de organização, desde o
equilíbrio entre despesas/receitas até aos problemas na gestão da prestação de
cuidados. Aqui, as chefias/lideranças dos vários serviços têm o desafio de
gerir e coordenar as capacidades e os conhecimentos de todos os colaboradores
de modo a que sejam alcançados os objetivos estabelecidos para os respetivos
serviços, no sentido de otimizar os propósitos da organização.
Também Sousa et al. (2008, p. 58) o corroboram, ao referirem que melhorar a
qualidade dos cuidados de saúde prestados aos cidadãos e assegurar a todos os
utilizadores acesso a cuidados de qualidade, em tempo útil e com custos
adequados é, pois, o grande desafio para os profissionais da área da saúde.
Criar sistemas de qualidade em saúde de acordo com o Conselho de Enfermagem da
Ordem dos Enfermeiros Portugueses é, pois, uma ação prioritária, onde os
enfermeiros assumem um papel fundamental na definição de padrões de qualidade
dos cuidados prestados. Ao longo da vida, procura-se prevenir a doença e
promover os processos de readaptação, a satisfação das necessidades humanas e a
máxima autonomia na realização das atividades de vida diária.
Estabrooks (2008) são da opinião de que os enfermeiros são o maior grupo
profissional dentro das organizações de saúde onde a comunidade espera que os
cuidados prestados sejam de qualidade para diagnosticar e cuidar na saúde e na
doença, para que o utente seja independente e tenha uma vida mais saudável.
O enfermeiro chefe é, pois, o elemento-chave dentro de um grupo de trabalho de
enfermagem hospitalar enquanto gestor da liderança. É decisivo para o
funcionamento eficaz da organização e motivador da equipa que lidera.
A capacidade do gestor influenciar os resultados das organizações depende,
então, de acordo com Frederico e Castilho (2006), mais da implementação de
estratégias, de motivação e de liderança do que do seu peso hierárquico.
Tendo como base a questão central que levou ao estudo, será que a qualidade
dos cuidados de enfermagem prestada depende dos enfermeiros líderes? procurou-
se através da literatura traçar como objetivo investigar até que ponto a
liderança em enfermagem, percepcionada pelos enfermeiros, influencia a melhoria
da qualidade dos cuidados de enfermagem.
Vários autores são da opinião da necessidade premente de estudos efetuados
nesta área. Schaubhut (2009) é da opinião de que é necessário estudar a
perceção dos enfermeiros do seu papel na melhoria dos indicadores de qualidade
dos cuidados de enfermagem. Schmalenberg e Kramer (2009) concordam, ao afirmar
que se os líderes de enfermagem têm como função o papel de apoio, também na
perspetiva deles devem ser identificados e avaliados pelo enfermeiro
colaborador na prestação de cuidados.
Burhans e Alligood (2010) também referem que os estudos efetuados na área da
qualidade dos cuidados de enfermagem são efetuados na sua maioria por
enfermeiros líderes, pelo que devido à sua posição na organização não estão
envolvidos na prestação de cuidados. Assim, o verdadeiro significado da
qualidade dos cuidados de enfermagem dos enfermeiros prestadores de cuidados
não está verdadeiramente representado. Referem mesmo que a investigação
relacionada com a perceção da qualidade dos cuidados de enfermagem tem sido
limitada.
Enquadramento/Fundamentação Teórica
Qualidade dos serviços de saúde
A qualidade nos serviços de saúde é adotada por todos como uma meta a ser
atingida. Marquis e Huston, citados por Tafreshi, Pazargadi e Saeedi (2007),
afirmam que qualidade dos cuidados de saúde é a probabilidade dos resultados de
saúde desejados pelos indivíduos e população em geral aumentarem com a melhoria
da qualidade dos serviços prestados.
A qualidade da prestação de serviços em saúde é uma preocupação contemporânea
da Direção Geral de Saúde e, como tal, foi consagrada no Plano Nacional de
Saúde de 2011/2016. Parte de uma premissa de que existe uma fraca cultura de
qualidade, uma deficiente organização dos serviços de saúde, insuficiente apoio
nas áreas de diagnóstico e decisão terapêutica e falta de indicadores de
desempenho (Portugal. Direcção Geral de Saúde. Departamento Qualidade Saúde,
2011). Como tal, a procura incessante de orientações estratégicas e a
necessária implementação de intervenções urgentes com o intuito de melhorar a
qualidade dos serviços de saúde é uma das atuais prioridades.
Fernandes e Lourenço (2007, p.2) referem que a qualidade em saúde pode ser
analisada segundo várias perspetivas. Para os utentes é importante ser bem
assistido em condições de conforto e segurança. Para os profissionais de saúde
o objetivo é reduzir erros e melhorar práticas. Para os administradores
hospitalares a qualidade consiste no cumprimento das metas assistenciais e
gestão racionalizada, sendo naturalmente geradas algumas divergências com os
profissionais de saúde, na medida que implica consumir menos. Para os políticos
está relacionada com a boa imagem dos serviços de saúde, existência de
equipamentos sofisticados e o bom acolhimento dos doentes.
Qualidade em enfermagem
Estudos efetuados revelam que a qualidade em enfermagem exige reflexão sobre a
prática, de modo a definir objetivos do serviço que se vai prestar, e delinear
as estratégias possíveis para que esses objetivos sejam atingidos, o que requer
algum tempo para pensar nos cuidados prestados. É, pois, importante que todas
as instituições de saúde se preocupem em proporcionar condições aos
profissionais para que seja implementada a qualidade e esta faça parte da
rotina dos profissionais de enfermagem.
Os focos de atenção dos cuidados de enfermagem são a promoção dos projetos de
saúde que cada pessoa vive e persegue. Assim, procura-se ao longo da vida
prevenir a doença e promover os processos de readaptação, a satisfação das
necessidades bem como a autonomia na realização das atividades da vida.
Cabe ao enfermeiro coordenar e gerir todos os cuidados prestados ao utente.
Neste sentido, e de acordo com Barbosa e Melo (2008, p. 367), o paciente e
suas especificidades, suas necessidades, sua alta ou recuperação, constituem a
principal razão da assistência de enfermagem, a qual deve, portanto, ser
realizada eficientemente, com comprometimento de quem a desenvolve, garantindo
qualidade do cuidado prestado e, principalmente, a satisfação do paciente e
seus familiares.
Os padrões de qualidade dos cuidados de enfermagem requerem níveis de
realização que articulam e entrecruzam capacidades científicas, realização
técnica e relação interpessoal.
Qualidade dos cuidados de enfermagem na perspetiva dos enfermeiros, segundo
Tafreshi, Pazargadi e Saeedi (2007), é a prestação dos cuidados com segurança
baseada em padrões de enfermagem como a satisfação do utente, cuidados mínimos
otimizados e cuidados seguros para os utentes.
Barros, Vaidotas e D´Innocenzo (2010) vêm corroborar, ao afirmarem que a
enfermagem, como ciência em desenvolvimento que é, necessita, pois, de
identificar e caracterizar os seus conhecimentos e as suas técnicas científicas
para que a prática seja o espelho desses mesmos conhecimentos.
A Ordem dos Enfermeiros emitiu, como primordial na prestação de cuidados de
enfermagem, o estabelecimento de alguns padrões de qualidade baseados na
evidência, que visam a melhoria contínua de qualidade do exercício
profissional, em que o utente é o centro dos cuidados, visando a sua
satisfação.
Numa altura em que os utentes assumem cada vez mais a sua posição, pois estão
conscientes dos seus direitos e deveres, crê-se que é cada vez mais importante
o seu papel no planeamento e avaliação dos serviços de saúde, pois são eles que
melhor conhecem as suas expectativas e necessidades, bem como a forma como
foram satisfeitas. Também Florentim e Franco (2006) corroboram, ao afirmarem no
estudo por eles efetuado que é imprescindível a prestação de cuidados de saúde
com qualidade para a satisfação do utente ser a melhor.
Liderança em Enfermagem
O processo de liderança está principalmente orientado para a consecução de
objetivos da organização. Estes devem ser conhecidos pelos colaboradores para
que possam ser motivados a aumentar a produtividade, a atingir metas e a obter
uma maior satisfação no trabalho. O papel do líder é fundamental na criação de
um ambiente de confiança, pois será ele que o impele através de estímulos e do
desenvolvimento de competências dos colaboradores, resultando melhor desempenho
e maior colaboração. A liderança é, pois, fundamental nas relações de trabalho,
dado que os trabalhadores liderados identificam o estilo de liderança como
agente catalisador dos conflitos laborais.
Definir liderança não é fácil, pois o conceito depende da perspetiva de cada
investigador que se debruçou sobre este assunto. De acordo com a GLOBE (Global
Leadership and Organizational Behavior Effectiveness) citado por Cunha et al.
(2007, p. 332), a liderança é a capacidade de um indivíduo para influenciar,
motivar e habilitar outros a contribuírem para a eficácia e sucesso das
organizações de que são membros.
Os líderes são os principais responsáveis pela melhoria do desempenho,
desenvolvendo, implementando e monitorizando a gestão do serviço. É aos
enfermeiros chefes/gestores que cabe a responsabilidade de garantir a qualidade
dos cuidados que são prestados no seu serviço, devendo motivar e alertar a
equipa para uma prática de enfermagem de qualidade, estando atenta às
necessidades do utente para que os cuidados de enfermagem recebidos sejam de
qualidade, garantindo a sua satisfação.
Liderar em enfermagem é saber conduzir, organizando o trabalho de equipa,
visando um atendimento eficiente, pois o líder é o ponto de apoio da equipa,
quer na educação ou na coordenação do serviço, estimulando a equipa para
desenvolver plenamente o seu potencial, o que interferirá diretamente na
qualidade da assistência (Gelbcke, et al., 2009, p. 137). Assim, todos os
elementos da equipa de enfermagem têm possibilidade de crescer, aprofundar os
seus conhecimentos e atitudes no desenvolvimento dos cuidados de enfermagem.
Alguns autores salientam que os enfermeiros só podem exercer a sua autoridade
como lideres se os elementos da sua equipa os reconheçam como tal.
Também Burhans e Alligood (2010) são da opinião que os gestores de enfermagem
poderiam desenvolver e implementar estratégias para que os enfermeiros
prestadores de cuidados aplicassem os seus conhecimentos científicos com
qualidade e responsabilidade, dando ênfase ao ensino dos alunos de enfermagem
na qualidade e significado da mesma nos cuidados de enfermagem ao utente.
O cuidar é a essência e o pilar dos enfermeiros, sendo pois o centro das ações
dos líderes de enfermagem. O cuidado de enfermagem possui um sentido único na
medida em que fomenta nos utentes a importância de cuidar de si, as
responsabilidades consigo e com o outro. Há autores que referem que o cuidado
de enfermagem está intimamente ligado com a comunicação entre o enfermeiro e o
utente, entre o enfermeiro e o ambiente envolvente e entre todos os enfermeiros
pertencentes à equipa.
De acordo com Vesterinen, Isola e Paasivaara (2009), os líderes das
organizações de saúde têm um desafio importante para garantir uma elevada
qualidade dos cuidados na prática de enfermagem, desafio esse que é manter os
enfermeiros nos hospitais.
De acordo com Chaubhut (2009), foram efetuadas pesquisas para quantificar o
impacto que o ambiente de trabalho e a liderança em enfermagem produzem nos
resultados de qualidade dos cuidados, verificando-se que qualidade está
relacionada com o estilo de comunicação e colaboração, com os modelos de
supervisão e com o status, entre outros.
Também Frederico e Castilho (2006, p.260) corroboram da mesma opinião, ao
referirem que a gestão desenvolve novas formas de liderança assentes em
comunicação horizontal e colaboração interdepartamental. Também Vesterinen
Isola e Paasivaara (2009) são da opinião de que os problemas de comunicação têm
um efeito negativo no funcionamento dos serviços. A partilha de informações com
os colegas através de reuniões devem ser vistos como aspetos importantes na
forma como se relacionam nos vários serviços.
Questões de investigação/Hipóteses
A liderança envolve um processo de condução de um grupo de pessoas, motivando e
influenciando os liderados para a consecução dos objetivos da organização. Cabe
ao líder possuir visão a longo prazo, focalizar-se nas pessoas, motivando-as,
ser inovador, propenso a correr riscos.
Considerando liderança em enfermagem como uma variável multidimensional [i)
Reconhecimento, ii) Desenvolvimento da equipa, iii) Comunicação e iv) Inovação]
e tendo em conta os padrões da qualidade emanados pela Ordem dos Enfermeiros
[satisfação dos utentes, promoção da saúde, prevenção de complicações,
readaptação funcional, organização dos cuidados], todo o estudo se centrou em
torno da seguinte hipótese de investigação:
H1. A Liderança em enfermagem influencia positivamente a qualidade dos cuidados
de enfermagem.
Metodologia
Qualquer tipo de investigação deve obedecer a princípios éticos rigorosos, com
o objetivo de proteger os direitos do ser humano. Neste sentido, foi pedido
autorização formal ao Conselho de administração da Unidade Local de Saúde de
Castelo Branco Empresa Pública Empresarial (ULSCB EPE) para efetuar a colheita
de dados pretendidos, explicando previamente o que se pretendia com o mesmo e
assegurando o anonimato.
A recolha de dados foi efetuada através de um questionário formado por questões
de resposta fechada (tipo Likert), aplicado aos enfermeiros liderados da ULSCB
EPE e foi realizada entre agosto e outubro de 2011. Após explicação do que se
pretendia com o estudo, os questionários foram entregues, conjuntamente com um
envelope para posteriormente serem recolhidos em data a combinar e de forma
anónima. Para que houvesse um maior número de questionários respondidos e
validados, nalguns serviços foram entregues e recebidos no momento, a pedido do
próprio enfermeiro, com receio de alguma represália por parte do seu superior.
O total dos enfermeiros colaboradores inquiridos foi 283. Foram recebidos 197
questionários dos quais 13 não obedeciam aos pressupostos inicialmente
traçados, pelo que foram eliminados. Assim, a amostra final é constituída por
184 enfermeiros colaboradores de todos os serviços da ULS Hospital de Castelo
Branco. Dos questionários entregues, houve assim uma percentagem de
respondentes de 65,02%.
A liderança em enfermagem percecionada pelos enfermeiros foi medida através de
um conjunto de itens retirados da escala desenvolvida e validada no contexto
português por Frederico e Castilho (2006), a quem foi feito o pedido formal
para a sua utilização. A escala original aborda a liderança em enfermagem como
uma variável multidimensional explicada por um conjunto de quatro dimensões:
(i) Reconhecimento (dezanove itens), (ii) Comunicação (quinze itens), (iii)
Desenvolvimento de equipa (quinze itens) e (iv) Inovação (oito itens).
Atendendo à dimensão significativa da escala, em termos de itens envolvidos,
optou-se por selecionar apenas alguns dos itens da escala original, trabalhando
assim com uma versão reduzida dessa mesma escala. A Liderança em enfermagem foi
assim medida através de um conjunto de 13 itens repartidos da seguinte forma:
(i) Reconhecimento (três itens), (ii) Comunicação (três itens), (iii)
Desenvolvimento de equipa (três itens) e (iv) Inovação (dois itens).
A variável qualidade dos cuidados de enfermagem foi medida através de um
conjunto de seis itens, selecionados de entre os diversos padrões emanados da
Ordem dos Enfermeiros (Satisfação do utente, promoção da saúde, prevenção de
complicações, readaptação funcional e organização dos cuidados de enfermagem).
Resultados
No tratamento estatístico dos dados recolhidos recorreu-se a instrumentos de
natureza descritiva (frequências absolutas, médias, a medidas de dispersão como
o desvio padrão) e à análise de equações estruturais. Para o efeito,
utilizaram-se os softwares IBM SPSS Statistics (v. 19.0.0, SPSS Inc, Chicago,
Il) e IBM SPSS AMOS (v. 19.0.0, SPSS Inc. Chicago, II).
Em primeiro lugar, procede-se a uma breve caracterização sociodemográfica da
amostra, através de medidas descritivas (frequências absolutas, médias, desvio
padrão), utilizando-se para o efeito o IBM SPSS Statistics. Depois recorreu-se
ao IBM SPSS AMOS para aplicar a análise de equações estruturais, no sentido de
procurar analisar a hipótese central desta investigação, segundo a qual a
Liderança em enfermagem influenciaria positivamente a qualidade dos cuidados de
enfermagem.
A amostra deste estudo é constituída por 184 enfermeiros prestadores de
cuidados em serviços de enfermagem da organização de saúde hospitalar incluída
nesta pesquisa.
O quadro_1 mostra a média, o desvio padrão, o Alfa de Cronbach, bem como as
correlações entre as diversas variáveis latentes.
Além das duas variáveis centrais do estudo (Liderança e Qualidade),
consideraram-se ainda quatro outras variáveis, no sentido de permitir uma breve
caracterização da amostra estudada: i) Sexo (variável dicotómica), ii) idade
(variável contínua), iii) categoria profissional (variável nominal) e iv) tempo
de exercício profissional (variável contínua).
Verifica-se um predomínio claro do sexo feminino (77,7%), como é normal
acontecer na profissão de enfermagem. Em relação à idade, constata-se que os
enfermeiros colaboradores na prestação de cuidados apresentam uma média de
idade de 39 anos (desvio padrão: 8), variando entre 24 e 59 anos.
Quanto à categoria profissional, observa-se que apenas 23,4% da amostra
correspondem a enfermeiros com especialidade.
Finalmente, em relação ao tempo de exercício profissional, os resultados
apontam para uma média de 16 anos (desvio padrão: 8), indicando que os
enfermeiros já têm alguns anos de experiência profissional.
A viabilidade do modelo proposto foi investigada através da análise de equações
estruturais (AEE) que, de acordo com Marôco (2010), pode ser descrita, em
termos simplistas, como uma combinação das técnicas clássicas de Análise
Fatorial e de Regressão linear (Hair et al., 2005). Para o efeito, recorreu-se
ao software AMOS (v. 19.0.0, SPSS Inc, Chicago, Il).
No output da análise correspondente ao pressuposto da normalidade, observou-se
que nenhuma das variáveis observadas/manifestas apresentava medidas de
assimetria (skew) ou curtose (Kurtosis) que indicassem uma qualquer violação
severa do pressuposto da normalidade uni- e multivariada (|Sk|<3 e |Ku|<10
( Marôco, 2010).
A verificação do pressuposto da linearidade foi efetivada através de análise
das correlações de Pearson entre as diversas variáveis de cada variável
latente. Comprovou-se a existência de relações lineares significativas (para um
nível de 1%) entre praticamente todas as variáveis.
Como recomendado por Marôco (2010), para a identificação de eventuais outliers
multivariados optou-se pelo critério da distância Mahalanobis, considerando
para o efeito um nível de significância de 0,001, tal como recomendado por Hair
et al. (2005). A análise não revelou a presença de qualquer observação atípica.
Todos os indicadores calculados através do IBM SPSS Statistics (v. 19.0.0, SPSS
Inc, Chicago, Il) apontam para a ausência de problema no que toca à
multicolinearidade.
Na Análise Fatorial Confirmatória foi utilizado o software AMOS (v. 19.0.0) e
aplicou-se, para o efeito, o método da Máxima Verosimilhança (Maximum
Likelihood. A execução do modelo gerou o diagrama com as medidas padronizadas e
o relatório fit measures (medidas de ajuste) entre outros outputs, tendo-se
observado que todos os itens apresentavam pesos fatoriais elevados (? >0,5) e
fiabilidades individuais adequadas (R2>=0,25).
A validade convergente dos constructos foi testada através de várias medidas de
ajuste relativas, absolutas e de parcimónia, consideradas para o efeito, por
serem das mais utilizadas em estudos de investigação baseados na metodologia
SEM.
Concluída a validação do modelo de medição, através da Análise Fatorial
Confirmatória, e considerando as correlações estatisticamente significativas
entre as variáveis latentes, procedeu-se de seguida à validação do modelo
estrutural, procurando estudar a pertinência da hipótese levantada de que a
liderança em enfermagem teria uma influência positiva na qualidade dos cuidados
de enfermagem prestados. Para o efeito, manteve-se o método de estimação da
Máxima Verosimilhança.
Como se pode observar na Figura_1, o modelo estrutural também apresenta índices
razoavelmente satisfatórios de ajuste. De facto, com exceção do GFI (Goodness
of Fit Index), todos os índices de ajuste calculados para a avaliação do modelo
apresentaram valores acima dos referenciais realçados na literatura (Hair et
al., 2005; Marôco, 2010). Observou-se que todos os itens apresentam pesos
fatoriais elevados (? >0,5) e fiabilidades individuais adequadas (R2>=0,25).
A análise da trajetória entre o fator Liderança e o fator Qualidade sugere
claramente que a Liderança em enfermagem tem um efeito direto (ß=0,724)
estatisticamente significativo (p=0,007) sobre a Qualidade dos serviços de
enfermagem prestados, proporcionando assim suporte à hipótese levantada.
Os resultados sugerem assim que o processo de liderança é de suma importância
na gestão em enfermagem, no que diz respeito à melhoria da qualidade dos
cuidados de enfermagem prestados ao paciente. Lin et al. (2007) citado por
Schmalenberg e Kramer (2009) realçam que os enfermeiros líderes desempenham um
papel chave nas organizações de saúde, atendendo a que necessitam de gerir os
diversos recursos disponíveis, planear as diversas atividades (devidamente
integradas com a estratégia global da organização), interagindo com diversas
áreas funcionais dentro da organização. Assim, os líderes das organizações de
saúde têm um desafio importante para garantir uma elevada qualidade dos
cuidados na prática de enfermagem (Vesterinen, Isola e Paasivaara, 2009). Na
verdade, a liderança tem sido uma preocupação chave por parte dos
administradores das organizações de saúde, cientes de que o processo de
liderança deve envolver uma gestão de recursos humanos, assente no
desenvolvimento de competências e capacidades, de um clima de motivação, e de
uma cultura focalizada na melhoria contínua da qualidade. Os resultados desta
investigação mostram que a qualidade dos serviços de enfermagem prestados
depende da capacidade do enfermeiro-chefe liderar a sua equipa de uma forma
coerente, assente na definição de estratégias que possibilitem o
desenvolvimento do potencial dos profissionais de enfermagem, facilitando assim
um ambiente propício à melhoria do desempenho individual e coletivo. Além
disso, a melhoria da qualidade dos serviços de enfermagem também passa pela
capacidade do enfermeiro-chefe em procurar racionalizar os serviços,
identificando os processos ineficientes no que toca à prossecução dos
objetivos, bem como a sua capacidade em envolver os seus colaboradores neste
processo, de uma forma ativa.
Discussão
Os resultados desta investigação sugerem de forma clara que a liderança em
enfermagem influencia de forma direta e significativa a qualidade dos cuidados
de enfermagem, reforçando um vasto conjunto de ideias difundidas ao longo de
toda a literatura que sugerem a pertinência dessa relação. Contudo, há alguns
estudos, como o de Demarcos (2004), que sugerem não haver correlação entre a
qualidade percepcionada pelos profissionais de saúde e a liderança.
A enfermagem como classe profissional inserida numa organização hospitalar,
detentora de hierarquia estratificada, tem muita importância nas organizações
de saúde bem como um grande potencial de estudo na liderança. Esta, se for
adequada e impulsionadora de comportamentos que potencializem a qualidade dos
cuidados de enfermagem, bem como a satisfação dos profissionais colaboradores,
pode gerar ganhos em termos de gestão, o que se vem a refletir nos cuidados de
saúde prestados ao utente.
Com a evolução do desenvolvimento pessoal e profissional, é cada vez mais
evidente a necessidade de definir estratégias partilhadas, em que a liderança e
o espírito de equipa estejam presentes para a concretização da realização de
tarefas.
Também a perceção que o enfermeiro tem sobre a equidade das oportunidades no
seu serviço, motiva-o a prestar cuidados de qualidade. Essa ideia vem de
encontro a Ernest Jiang e Krishnamoorthy (2004), quando referem que os horários
de trabalho dos enfermeiros devem ser otimizados para garantir benefícios,
exigindo cuidados nas tomadas de decisão de modo a que haja equidade de
horários por turno.
Esta investigação vem também reforçar a ideia de que o fator comunicação é
essencial para o exercício da influência na coordenação das atividades em
grupo, de modo a efetivar o processo de liderança, visando mudanças no
comportamento do indivíduo através de atitudes, desempenho que leve à
satisfação profissional. Ruthes e Cunha (2009) são da opinião de que liderar a
equipa, ensinar os enfermeiros, comunicar e orientar ações e a prática do
cuidar tem como objetivo a competência do enfermeiro. Esta investigação vai de
encontro a essas constatações, atendendo a que a comunicação corresponde a uma
das 4 dimensões da liderança em enfermagem.
Para que o desempenho profissional seja adequado, a inovação é uma das
dimensões de grande importância no mercado competitivo em que se vive nos dias
de hoje. É necessário inovar, pelo que o enfermeiro deve tomar consciência
quando, como, porquê e para quê, sendo imprescindíveis as orientações definidas
pelo líder no controlo da criatividade. O mesmo se conclui através desta
investigação. Os resultados sugerem que os enfermeiros líderes devem dar
importância à inovação, incentivando e permitindo que os seus enfermeiros
colaboradores sejam criativos na implementação de estratégias, tendo como meta
a qualidade dos cuidados ao utente, e procurando, de forma contínua, formas
inovadoras de prestar os serviços necessários.
Conclusão
Após a conclusão do estudo, é possível constatar que a liderança influencia a
melhoria da qualidade dos cuidados de enfermagem. Os enfermeiros são os agentes
que diretamente influenciam a qualidade dos cuidados prestados. Os resultados
desta investigação mostram que essa qualidade depende de forma significativa do
líder e da forma como este gere o serviço quer em termos ambientais, humanos
ou técnicos.
Este estudo deve propiciar aos administradores em geral e aos enfermeiros
chefes em particular a necessidade de refletirem sobre os diversos processos de
gestão tanto de pessoal como de recursos físicos, ambientais, organizacionais e
de como estes têm influência significativa na qualidade dos serviços prestados.
Os resultados da investigação mostram a importância que têm na qualidade dos
serviços de enfermagem, i) o reconhecimento demonstrado pelo líder, ii) as suas
ações orientadas para o desenvolvimento dos enfermeiros em geral, iii) a forma
como comunica com os seus liderados, assim como iv) a forma como ele incute e
incentiva o espírito inovador no seu serviço.
Este estudo não pode ser considerado como isento de limitações relativamente às
quais seria importante atender em futuras pesquisas. De facto, a investigação
restringiu-se a uma única Unidade Local de Saúde (ULS EPE de Castelo Branco),
pelo que as conclusões às quais se chegou poderão não ser generalizáveis a
outras organizações do setor. A escolha dos itens considerados para medir as
variáveis consideradas representa uma limitação em si, apontando para a
necessidade de estudos de maior envergadura, onde por exemplo, não houvesse
limitações em termos do número de itens utilizáveis e onde se pudesse usar a
escala original de Frederico e Castilho (2006) para medir a liderança, bem como
usar a generalidade dos padrões emanados da Ordem dos Enfermeiros para medir a
qualidade dos serviços de enfermagem, podendo até mesmo considerar esta última
como variável multidimensional, de acordo com a própria estrutura sugerida pela
Ordem: Satisfação do utente, promoção da saúde, prevenção de complicações,
readaptação funcional e organização dos cuidados de enfermagem.
Como futuras linhas de investigação, seria importante replicar o mesmo estudo
numa população muito mais abrangente, dado que a amostra do estudo é reduzida a
uma organização de saúde, para se poder extrapolar os resultados sobre a
relação existente entre a liderança e a melhoria da qualidade dos cuidados de
enfermagem para a generalidade das instituições de saúde.
Seria de igual modo interessante desenvolver, na mesma organização de saúde, um
estudo similar, mas agora na perspetiva do líder, para permitir comparar os
resultados de ambas as investigações e verificar se existem diferenças
significativas ao nível das conclusões alcançadas.