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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Serão crises de identidade? Serão crises de identidade? Will it be identity crisis?

José Vasconcelos-Raposo

Os relatos de progressos científicos surgem a um ritmo verdadeiramente notório.

Mas esses progressos não acontecem em todas as áreas científicas. No caso da medicina, em múltiplas áreas de especialização, através de investigações que conjugam diversas áreas do saber os avanços fazem-se e consolidam-se. Em outras áreas, porém, pouco de novo surge e até por vezes assistimos ao definhar de domínios do conhecimento que de algum modo, num passado recente, pareciam ser promissoras. Apenas como forma de destacar a complexidade em que desenvolvem as consequências das eventuais crises disciplinares, falaremos, de forma breve, de´alguns incidentes na Psicologia, na Educação e Desporto. Não é nosso propósito aprofundar qualquer problema, mas sim alertar para a necessidade de se repensar a forma de estar numa comunidade científica.

Várias áreas da Psicologia têm sido absorvidas por outras disciplinas, entre elas as agora designadas neurociências. Num passado recente esta foi por excelência uma área onde predominavam os psicólogos, mas atualmente intervêm pesquisadores de várias áreas científicas. Outro caso é o que verificámos com a Psicofisiologia que com a sua emancipação da Psicologia Fisiológica passou a atrair pesquisadores de outras áreas do conhecimento, nomeadamente das engenheirias e isso permitiu-lhe ganhar novos contornos e ritmos de progresso.

Mais recentemente na área da Psicologia da Saúde pudemos verificar um apelo aos psicólogos para que tomem em consideração as práticas do dia-a-dia das pessoas que pretendem estudar. Sem se ter em conta as vivências e crenças dos cidadãos, tal como estas se transformam de geração em geração, dificilmente os psicólogos poderão ser bem sucedidos nas suas intervenções profissionais. No caso da Psicologia do Exercício e Saúde observa-se um crescente número de psicólogos a publicar nesta área, mas este despertar parece estar desatempado, uma vez que domínios científicos como a medicina e outras ciências assumem papel pioneiro. Nesta área em particular não é possível manter um perspectiva teórica de carácter mentalista acente em heranças teóricas que datam das décadas de 50 e 60, tal como nos é dado observar quando olhamos às grelhas curriculares dos cursos que a maioria das Universidades oferece para treinar novas gerações de psicólogos. Mais do que em qualquer outra disciplina da Psicologia o estudo da fisiologia humana é de primordial importância.

Por último, tomemos o caso da Psicologia do Desporto que se manteve, primordialmente, entre os muros das instituições de ensino superior. Por um lado, os psicólogos dedicaram muito do seu tempo à pesquisa e em alguns casos, maoritariamente entre os académicos norte americanos, verificámos uma tendência para reclamar o estatudo de atletas de elite aos praticantes de nível universitário, o que de todo está longe de representar o conceito de elite. Tal fato resultou numa certa desvirtualização da realidade das evidências acumuladas. Por outro lado, a intervir nesta área do conhecimento tínhamos os pesquisadores que emergiam com formação em ciências do desporto e educação física e que nos seus trabalhos tendiam a trazer para a literatura uma realidade diferenciada, na medida em que reflectiam com maior propriedade os conhecimentos práticos dos desportos em estudo. Consequentemente, assistimos ao renascer de um debate sobre quem são efectivamente os psicólogos do desporto.

Tal debate na sua essência evidencia uma formação debil na área da Psicologia, pois se para se produzir saber em Psicologia e ser reconhecido como tal fosse necessário ser Psicólogo de formação de base, um volume muito grande dos corpos teóricos que sustentam a prática profissional seria posto ao lixo. Confundiram- se realidades profissionais.

Investigar em Psicologia deverá ser o direito de cada um, desde que na sua prática evidencie ser conhecedor dos códigos de conduta que regulam essa prática. Para que a motivação para aprofundar conhecimentos se consolide e o conhecimento progrida é da maior importância ter acesso aos instrumentos que torne esse desejo em realidade. Mas alguns reclamam que apenas os psicólogos deveriam ter acesso aos instrumentos psicométricos. Passadas que são algumas décadas, assistimos a um gradual abandono da pesquisa por parte dos profissionais da Educação Física e do Desporto. Ficaram os Psicólogos e com eles o aparente empobrecimento da disciplina, enquanto os outros profissionais continuaram a empenhar-se no desenvolvimento de conhecimentos e áreas de intervenção inovadoras no mercado de trabalho. Diga-se, em abono da verdade, que esse dinamismo se traduz em sucesso na forma do coaching. Num artigo recente propunha-se que se redefinisse a área da Psicologia do Desporto e que esta designação fosse restrita para intervenções com atletas de elite e que os outros domínios fossem abrangidos pela designação de psicologia da performance.

Mais uma vez se intervem de forma desatempada. Aquilo que agora propõe, foi ultrapassado e consolidado na prática dos profissionais do coaching.

A outra realidade, para a qual os psicólogos têm toda a ligitimidade de reclamar um papel activo, prende-se com a necessidade de regulamentar a prática profissional de quem faz intervenções clínicas, seja em que domínio de intervenção for. Mas esse controlo, felizmente, se consolidou com a intervenção das Ordens e dos Colégios Profissionais. Seria uma afronta aceitar que indivíduos sem preparação para aplicar técnicas de mudança comportamental o fizessem. Importa nunca perder de vista que ao longo da sua história a Psicologia ganhou e fez progressos notórios com a participação de estudiosos de muitas áreas do saber.

A Educação Física, dependendo dos países em causa, conhece diferentes realidades. Por exemplo, no Brasil os profissionais deste ramo do saber reclamam para si uma identidade que é digna de registo. Apresentam-se como classe profissional e são eficazes na sua intervenção sócio-política. Em Portugal, a identidade de classe parece ter desvanecido com o emergir de uma perspectiva que defende que tudo o que é prática de atividade física é desporto. Escusado será dizer que esta classificação, aos olhos de uma prática científica alicerçada em critérios de rigor, se fica pelo mero discurso e vigente em algumas práticas institucionais onde os seus proponentes ainda exercem o poder. Mas em verdade encontrou eco em muitos profissionais que beneficiando da sua formação como Educadores Físicos asseguravam o seu vencimento de base, mas depois todo a sua alma e empenho dirigia-se para o treino onde eram, tipicamente, mal remunerados. Mas os limites da proposta de que tudo é desporto também não encontrou eco entre os próprios proponentes. Na realidade, enquanto pesquisadores e quando querem publicar os seus trabalhos em revistas científicas de qualidade reconhecida não têm alternativa que não seja a de proporcionarem definições operacionais onde a atividade física, o exercício físico e o desporto estão claramente diferenciados uns dos outros.

Mais, mesmo onde se oferece a formação em ciências do desporto e em educação física, graças aos requisitos legais para a prática profissional de professor de educação física, todos têm de frequentar o mesmo tipo de treino para a habilitação profissional e , mais uma vez a conceção de que tudo é desporto parece deixar de fazer sentido. Mas o que é verdareiramente relevante nesta discussão é a confusão que se gerou tanto ao nível da identidade profissional, assim como a que se gerou ao nível da formação desses profissionais. Em suma, os alunos que procuram cursos em Educação Física e em Ciências do Desporto recebem uma formação superior que não está suficientemente consolidada nem diferenciada quer para a educação física quer para o desempenho da função de treinadores.

Numa altura em que o conhecimento progride a ritmos tão acelerados, uma visão segmentada das áreas científicas é contraproducente. Por exemplo, quer a Psicologia quer a Educação Física e Desportos têm centrado muita da sua pesquisa no estudo da obesidade. Numa fase incial da pesquisa, para uns o foco estava, entre outros aspetos, nos mecanismos compensatórios a que os indivíduos recorrem regularmente sendo os comportamentos alimentares um deles. Para outros, os alimentos traduziam-se em número de calorias ingeridas e que para combater a obesidade era importante desenvolver programas com o objectivo de gastá-las. Com o tempo criaram-se parcerias entre áreas científicas e gradualmente apareceram perspectivas mltidisciplinares e hoje, com o apoio da investigação no âmbito da genética, a compreensão da obesidade vai muito para além das perspecivas monodisciplinares e discutem-se variáveis intervenientes em aspectos do comportamento humano nunca antes tido em consideração. Mas quem fala nestes exemplos poderia encontrar muitos outros.

Associada a toda esta tentativa de diferenciação disciplinar está a procura pela publicação. Publicar muito é a ordem do dia. Nesta busca quase eufórica sem dúvida que as revistas científicas têm ganhado, nomeadamente no número de artigos submetidos. Mas esse novo volume acarreta um preço, pois nesse volume é pouco perceptível que a preocupação de quem quer publicar seja efectivamente a de contribuir para o conhecimento. Cada vez mais é notória a preocupação em somar mais uma publicação ao índice de produtividade. Por um lado, importa dar resposta às solicitações que as instituições impõem aos seus docentes/ investigadores, mas por outro é fundamental preservar a qualidade científicae que nos tempos atuais assume contronos de transdisciplinaridade.

Como podem as revistas científicas intervir na busca de um equilíbrio entre volume e qualidade de publicação? Neste quadro de limitações e vantagens de pesquisa transdisciplinar, importa questionar qual o papel que as revistas científicas poderão ter. A resposta não é simples, mas obrigatoriamente passa por um maior compromisso por parte dos conselhos editoriais para que a qualidade dos estudos a publicar seja mais bem controlada. Atualmente, a nossa experiência sugere que um dos grandes obstáculos a ultrapassar é a tendência para produzir trabalhos em massa e isso traduz-se, entre outros problemas, na submissão de relatos de estudos com amostras excessivamente pequenas. A revista Motricidade, pela sua parte, deu alguns passos no sentido de contrariar esta prática, mas todos os manuscritos submetidos a partir do 1 de Janeiro de 2013 serão sujeitos a um escrutínio ainda mais apertado no que se refere ao tamanho das amostras. Procuraremos: 1- incentivar os autores a serem mais explícitos no que se refere aos contributos efectivos que os seus trabalhos fazem; 2- solicitar que os critérios de decisão sejam claramente transpostos para o manuscrito: 3- continuar a contrariar a prática de submeter trabalhos onde se adicionam autores sem que a dimensão do trabalho o justifique.

Com o fechar de mais um ano de edição, importa dizer algo sobre o que foi este ano. Crescemos, tivemos de lidar com mudanças com as quais não esperavamos, mas fomos capazes de dar respostas atempadas. Fomos avaliados, mantivemos a nossa classificação, mas na essência melhoramos em todos os domínios em que fomos avaliados e em particular na área da Psicologia sentimo-nos injustiçados.

Continuamos respeitando a liberdade de cada autor seleccionar as fontes para fundamenar os seus trabalhos, mas estamos conscientes que nos penaliza a ausência de uma política que encoraje a citação da nossa revista. Talves tenha chegado ao momento de aderirmos às práticas vigentes e assim ganhar mais competitividade, melhorando o nosso factor de impacto e assim ir ao encontro das regras a que os pesquisadores são sujeitos.

Olhamos o futuro com entusiasmo. Cerca de 70% das pessoas que visitam a nossa revista fazem o download das normas de publicação e os restantes documentos de apoio que proporcionamos no nosso site. A ter o mesmo significado de anos anteriores, teremos em 2013 um acréscimo de submissões. É ainda gratificante saber que cerca de 50% das visitas que recebemos resultaram de uma busca directa através do nome da própria revista. Em 2013 iremos aumentar o número de artigos por volume. Ainda em 2013 estaremos mais uma vez envolvidos na organização do Encontro Internacional de Pesquisadores que de novo terá lugar em Montes Claros, Minas Gerais, durante o período de 8 a 12 de Outubro. Seremos também a revista onde se farão as publicações associadas aquele evento.

Porque a Motricidade resulta de esforço colectivo, a todos os que connosco colaboram deixamos o nosso sentido OBRIGADO.


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