Validade de construto e consistência interna da escala de autoestima de
Rosenberg para uma população de idosos brasileiros praticantes de atividades
físicas
O envelhecimento é acompanhado por perdas que contribuem para a redução da
satisfação com o próprio corpo (Gripo & Hill, 2008), fato que pode estar
relacionado às perdas físicas, funcionais e sociais (Schieman & Campbell,
2001).
Associado às perdas inerentes ao envelhecimento, a inatividade física age como
acelerador desse processo, resultando em incapacidade funcional e perda de
qualidade de vida. A inatividade física tende a aumentar com o envelhecimento
(U.S. Department of Health and Human Services, 1996). Dados de pesquisa recente
mostram que 53.2% das mulheres e 51.5% dos homens brasileiros acima dos 65 anos
são insuficientemente ativos (Ministério Brasileiro da Saúde, 2009).
A autoestima é definida como o sentimento, o apreço e a consideração que uma
pessoa sente por si própria (Rosenberg, 1965) e é destacada como uma das chaves
para resolver a baixa participação em atividades físicas (Spence, McGannon,
& Poon, 2005). Partindo desse pressuposto, um estudo mostra que quanto mais
alta a autoestima maior a possibilidade de inserção em programas de exercícios
físicos (Wilson & Rodgers, 2002). Também Fox (1997) relatou que a
autoestima elevada está associada com a escolha, a persistência e o sucesso de
comportamentos relacionados à saúde.
O modelo do exercício físico e da autoestima descrito por Sonstroem e Morgan
(1989) sugere que a autoestima global e o exercício físico estejam associados
por meio das percepções da autoeficácia, da competência física e da aceitação
física. O exercício físico influencia na percepção da auto-eficácia, da
competência e aceitação física, interferindo sobre a autoestima global (Spence
et al., 2005).
A autoestima é um aspecto fundamental na vida do idoso e representa uma das
dimensões da personalidade que influencia o bem-estar do indivíduo e a sua
adaptação no mundo que o circunda (Ruibyte, 2007), sendo importante para o
sucesso e a satisfação com a vida (Rosenberg, 1965). É um atributo
profundamente individual, embora modelado nas relações cotidianas e também
decisivo na relação do indivíduo consigo mesmo e com os outros, influenciando
na percepção dos acontecimentos e das pessoas, no comportamento e nas vivências
do indivíduo (Andrade, Souza, & Minayo, 2009).
Embora evidenciada a importância da autoestima para o bem-estar individual e a
sua estreita relação com a atividade física, há escassez de estudos sobre a
temática no cenário brasileiro, especialmente entre idosos. Um dos obstáculos
para as investigações desse construto é a falta de instrumentos de medida de
autoestima consolidados cientificamente.
Entre os instrumentos disponíveis, em português do Brasil, está a Escala de
Autoestima de Rosenberg - RSES (Rosenberg Self-Esteem Scale) que foi
desenvolvida por Morris Rosenberg (Rosenberg, 1965). Ela é uma escala para a
avaliação da autoestima na população geral. Essa escala é a mais utilizada nos
estudos internacionais com diferentes populações (Baranik et al., 2008), desde
adolescentes (Farruggia, Chen, Greenberger, Dmitrieva, & Macek, 2004),
estudantes universitários (Pruessner et al., 2005; Tafarodi & Milne, 2002)
até idosos (An, An, O'Connor, & Wexler, 2008; Pruessner et al., 2005). No
Brasil, foram encontradas duas traduções dessa escala para o português do
Brasil, uma adaptada para adolescentes (Avanci, Assis, Santos, & Oliveira,
2007) e outra para pacientes pré-cirurgia plástica (Dini, 2000).
O estudo de Avanci, Assis, Santos, e Oliveira (2007) objetivou padronizar a
escala de autoestima de Rosenberg para adolescentes residentes no Rio de
Janeiro. As seguintes equivalências foram avaliadas: conceitual e de itens,
semântica (significado referencial e geral), de mensuração (confiabilidade
teste-reteste, consistência interna, análise fatorial e validade de construto),
operacional e funcional. Foram encontrados bons resultados para equivalência
semântica, o alfa de Cronbach foi de 0.68, Kappa predominantemente moderado e
regular e a análise fatorial proposta é de duas estruturas fatoriais (baixa e
alta autoestima), indicando a aplicabilidade da escala na população de
referência, porém sugerindo a necessidade do desenvolvimento de outros
trabalhos em amostras distintas.
O objetivo do trabalho de Dini (2000) foi traduzir para a língua portuguesa,
adaptar ao contexto cultural brasileiro e validar a escala de autoestima de
Rosenberg para uma população de pacientes que iriam submeter-se à cirurgia
plástica. Após o processo de tradução, a validade foi testada por julgamento
(face e conteúdo) e por testes de correlação (Pearson, Spearman e regressão
múltipla) dos escores da escala com os resultados de outras escalas (SF-36,
SRQ-20, escalas numéricas de beleza, vergonha, satisfação com a aparência e
cuidados com a saúde) que medem aspectos correlatos à autoestima. Observou-se
um coeficiente de reprodutibilidade intra e inter-observador de 0,98. Foram
identificados bons índices de reprodutibilidade e validade e o autor concluiu
ser um instrumento válido para medir a autoestima de pacientes brasileiros que
irão submeter-se à cirurgia plástica, com média de idade de 40 anos.
Nesse estudo, optou-se por utilizar como base a escala traduzida e adaptada por
Dini (2000), pois o objetivo dessa pesquisa é validar a escala de autoestima de
Rosenberg para idosos brasileiros (Tabela 1) e a média de idade dos
participantes da escala adaptada por Dini (2000) foi de 40 anos, sendo mais
aproximada da faixa etária dos sujeitos visados no presente estudo.
Tabela 1
Escala de autoestima de Rosenberg para idosos brasileiros praticantes de
atividades físicas
Face ao exposto, o presente estudo objetivou investigar a validade de construto
e a consistência interna da Escala de Autoestima de Rosenberg (1965) para uma
população de idosos brasileiros praticantes de atividade física.
MÉTODO
Amostra
Participaram do estudo idosos integrados em programas de atividades físicas na
Universidade Federal de Santa Catarina e na Prefeitura Municipal de
Florianópolis-SC. Os programas de atividades físicas eram desenvolvidos com
aulas de ginástica, realizadas três vezes por semana, com duração de uma (1)
hora por sessão, com orientação de profissionais formados em Educação Física.
Nessas aulas eram trabalhadas diferentes qualidades físicas, entre elas a
flexibilidade, a força, o equilíbrio, a coordenação e a resistência aeróbia,
além de exercícios específicos para o fortalecimento da musculatura pélvica e a
descontração por meio de relaxamento.
Os critérios de inclusão foram: apresentar mais de 60 anos e ter
disponibilidade em participar do estudo. Assim, participaram do estudo 292
idosos (235 mulheres e 57 homens), com média de idade de 67.54 anos (DP =
6.90), participantes de programas de atividades físicas na Universidade Federal
de Santa Catarina (n = 188) e na Prefeitura Municipal de Florianópolis (n =
104).
Instrumentos
A Escala de Autoestima de Rosenberg ' RSES foi desenvolvida por Rosenberg em
1965 é um instrumento utilizado para a avaliação da autoestima global
(Rosenberg, 1965). Para o autor, a autoestima é a autoavaliação pessoal, a qual
implica um sentimento de valor, que engloba um componente predominantemente
afetivo, expresso numa atitude de aprovação/desaprovação em relação a si mesma.
A RSES é constituída por 10 itens, com conteúdos referentes aos sentimentos de
respeito e aceitação de si mesmo. Metade dos itens é enunciada positivamente e
a outra metade negativamente. Para cada afirmação existem quatro opções de
resposta, tipo Likert (concordo totalmente = 4, concordo = 3, discordo = 2 e
discordo totalmente = 1). A soma das respostas aos 10 itens fornece o escore da
escala cuja pontuação total oscila entre 10 e 40 e a obtenção de uma pontuação
alta reflete uma autoestima elevada.
Foi realizado um estudo piloto com 10 idosos com características semelhantes da
amostra, utilizando a RSES (Rosenberg, 1965) traduzida e adaptada por Dini
(2000). Nessa aplicação, os idosos foram entrevistados e foi observada a
compreensão da escala. Além da resposta ao item especificamente, foi aplicada
uma escala de clareza, questionando se a questão estava clara, mais ou menos
clara ou nada clara.
Uma das questões propostas no questionário sofreu ajuste, uma vez que a maioria
dos idosos teve dificuldade de entendê-la, passando de Eu sinto que sou uma
pessoa de valor, pelo menos num plano igual às outras pessoas para Eu sinto
que sou uma pessoa de valor, igual às outras pessoas. A questão proposta
também foi avaliada em relação à sua clareza, pelos idosos, sendo que foi
considerada clara.
Procedimentos
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética na Pesquisa em Seres Humanos da
Universidade Federal de Santa Catarina (nº. 075/2008) e pela Universidade do
Estado de Santa Catarina (UDESC) (nº. 185/2007). Todos os idosos participantes
dos programas de atividade física mencionados foram convidados a participar do
estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
A coleta de dados ocorreu em forma de entrevista individual, por
entrevistadores previamente treinados, nas dependências físicas do ginásio de
esportes da UDESC e nos Centros de Saúde do município de Florianópolis, locais
onde ocorriam as atividades físicas.
Análise Estatística
Após a tabulação e organização dos dados, o banco de dados foi conferido
visando identificar possíveis erros de digitação. Analisou-se a normalidade dos
dados a partir de histogramas e gráficos de caixa, visando identificar as
características do escore geral (assimetria e curtose), bem como testar a sua
normalidade (Kolmogorov-Smirnov).
A análise estatística descritiva dos dados (medidas de tendência central e
variabilidade) foi feita com o escore geral, com o grupo todo e separado por
sexo. Isso foi feito para explorar a capacidade da escala em diferenciar os
grupos, bem como entender como é a distribuição dos dados para o sexo feminino
e masculino.
Para analisar a validade de construto, realizou-se a análise fatorial
exploratória dos dados. A análise fatorial exploratória permite investigar os
padrões de correlação entre as questões da escala, visando identificar o
construto latente às questões, especialmente em relação à sua dimensionalidade.
Primeiramente, procedeu-se a análise do índice de Keiser-Meyer Olkin (KMO) para
verificar a adequação dos dados para análise fatorial. Essa é uma medida da
fatorabilidade das matrizes de correlação na qual a análise fatorial está
baseada. Em seguida, realizou-se o teste de esfericidade de Bartlett para
verificar se os dados atendiam ao pré-requisito de esfericidade.
A análise fatorial foi descrita em duas etapas: a análise dos componentes
principais e a análise dos pesos fatoriais. A análise dos componentes
principais foi feita para identificar quantos fatores ou dimensões são
responsáveis pela variação nos itens da escala e o quanto de variância cada um
desses fatores consegue explicar (em percentual com base nos valores próprios '
eigenvalues). Nessa fase, o objetivo foi obter um número mínimo de fatores que
expliquem o máximo da variação no conjunto total dos dados. Além disso, nessa
fase se observa os valores das comunalidades, que indicam o quanto de variância
foi extraída, ou seja, quanto de variância essa variável compartilha com o
conjunto total.
Para determinar o número de fatores a serem retidos, utilizou-se dois critérios
combinados: o dos autovalores (> 1) e o scree plot. Ou seja, buscou-se o
equilíbrio entre os eigenvalues e o ponto onde eles estabilizam, chamado como
cotovelo do gráfico. Após, procedeu-se à rotação oblíqua, por meio do método
Oblimin (delta em zero). Optou-se por um método de rotação oblíqua, porque a
escala mede apenas um construto ou então dimensões que apresentam correlação
entre si. Observou-se a pattern matrix porque ela costuma prover uma
interpretação melhor dos fatores e cargas. Conforme geralmente praticado na
literatura (Streiner & Norman, 2007), itens que apresentaram pesos
fatoriais acima de 0.3 foram considerados, sendo que aquelas acima de 0.4 foram
consideradas significativas. Para verificar a consistência interna da escala,
utilizou-se o coeficiente alfa de Cronbach.
RESULTADOS
Em relação ao escore total da escala, observou-se uma assimetria negativa
(assimetria = - 0.922) e uma curtose positiva menos acentuada (curtose =
0.491). Isso significa que as pessoas tendem a apresentar escores máximos na
escala, o que indica a presença de um efeito teto moderado. Por essa razão, o
teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov apontou que a distribuição difere
significativamente de uma distribuição normal (p < .001).
As medidas de tendência central e variabilidade são apresentadas na Tabela 2.
Tabela 2
Medidas de tendência central, variabilidade e distribuição do escore total na
escala Rosenberg.
Em relação à análise fatorial (Tabela 3)exploratória, foram atingidos os pré-
requisitos para a sua realização (KMO = 0.848; Barlett = 759.98, p < .001).
Esses indicadores apontam que os dados são apropriados para a análise fatorial.
Tabela 3
Pesos fatoriais e comunalidades dos itens da escala com e sem rotação oblíqua.
Primeiramente, na análise dos componentes principais, observou-se a existência
de dois fatores (com autovalores > 1), que juntos responderam por 51% da
variância total dos resultados da escala. O primeiro desses fatores, sozinho,
respondeu por 38% dessa variância e o segundo por apenas 13.4% da mesma. Isso
indica que a escala mede predominantemente o primeiro fator. Como era presumido
que a escala é unidimensional, optou-se pela solução fatorial com um único
fator, pois todos os itens carregam significativamente no primeiro fator (38%).
Apresentou-se nessa mesma Tabela as cargas dos itens nos dois fatores,
utilizando rotação oblimin.
Embora se tenha verificado a existência de dois fatores, observou-se que, sem
rodar a matriz, todos os itens carregam significativamente em um único fator,
todos com cargas acima de 0.4. Ao rodar a matriz, são separados os itens
positivos e negativos da escala, mostrando que existe, na escala, duas
dimensões, uma relacionada com percepção positiva de si mesmo, e outro
negativa. O mais forte é o negativo, o que indica uma tendência da escala a
valorizar os aspectos negativos da autoestima.
Em relação à consistência interna, o alfa de Cronbach verificado foi de 0.812,
o que se pode considerar aceitável para uma escala.
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
A maioria dos estudos que avaliaram as propriedades psicométricas da RSES
(1965) utilizaram análise fatorial exploratória (Andrade et al., 2009; Avanci
et al. 2007; Baranik et al., 2008; Dias, 1996; Schmitt & Allik 2005) ou
confirmatória (Farruggia et al., 2004; Horan, DiStefano, & Motl, 2003;
Romano, Negreiros, & Martins, 2007).
A pontuação média obtida com os participantes do presente estudo foi elevada
(35.10; DP = 4.28), corroborando com Schmitt e Allik (2005) que, ao
investigarem a autoestima de pessoas de 53 diferentes nações, utilizando a
RSES, também identificaram uma média elevada (30.85; DP = 4.82). De acordo com
Schmitt e Allik (2005), as pontuações foram acima do ponto médio teórico do
RSES, desta forma sugerindo que a autoestima geralmente positiva pode ser
universal. Acredita-se que a autoestima elevada também possa ser atribuída à
participação em atividades físicas, conforme já vem sendo apontado em outros
estudos (Chodzko-Zajko et al., 2009; Spence et al., 2005). No entanto, a
análise da distribuição dessa escala indicou que a autoestima talvez esteja
sendo medida com questões que induzem respostas de escores elevados, pois
verificou-se um efeito teto no instrumento, conforme foi demonstrado nos
resultados. O efeito teto indica que a maioria das pessoas apresenta escores
perto do máximo, o que sugere a presença de algum viés na escala. Considera-se
que o enviesamento possa estar relacionado com a maneira como as pessoas
respondem à escala. Adicionar mais graduações nas respostas, tais como 0 a 10,
poderia auxiliar na variabilidade das mesmas.
A estrutura fatorial da RSES vem sendo estudada e alguns estudos consideram a
escala unidimensional (Azevedo & Faria, 2004; Schmitt & Allik, 2005),
conforme também mostra o presente estudo, enquanto que outros a consideram
bidimensional (Andrade et al., 2009; Dias, 1996; Romano et al., 2007).
Os resultados do presente estudo corroboram com Rosenberg (1979) que evidenciou
que estes fatores (positivos e negativos) medem o mesmo construto, baseando-se
no fato de que os padrões de correlação com diversas variáveis são praticamente
similares (Tafarodi & Milne, 2002). Esse argumento de Rosenberg (1979)
ajuda a explicar porquê todos os itens carregam significativamente em um único
fator (cargas acima de 0.4) e também puderam ser separados a partir da rotação
da matriz. Desta forma, evidencia-se que a estrutura mais adequada seja
unidimensional, uma vez que a escala se propõe a medir a autoestima global e
sugere a soma de valores e não a distinção entre autoestima positiva e negativa
(Greenberger, Chen, Dmitrieva, & Farruggia, 2003).
Marsh (1996) observou que a RSES (1965) pode ser unidimensional numas
populações e bidimensional noutras, pois de acordo com Goldsmith (1986) e Marsh
(1996), as variações observadas na estrutura fatorial podem estar relacionadas
com as características das amostras utilizadas, como as variáveis sexo e idade
dos sujeitos, capacidade de compreensão e tipo de ocupação.
Dias (1996), em uma validação com jovens portugueses, encontrou dois fatores
com autovalores superiores a 1 (4.53 e 1.23), que explicavam 57.7% da variância
total da RSES. De forma idêntica, no presente estudo também foram verificadas
duas dimensões (com autovalores > 1), sendo uma relacionada com percepções
positivas e outra com percepções negativas, explicando 51% da variância total
dos resultados.
Um estudo realizado com adultos brasileiros (Andrade et al., 2009) concluiu que
a RSES (1965) explicou 59% da variância total dos resultados, sendo que a
escala apresentou dois fatores. De forma semelhante ao presente estudo, no
primeiro fator, concentraram-se itens da avaliação predominantemente negativa
e, no segundo, de avaliação positiva, indicando uma tendência da escala a
valorizar os aspectos negativos da autoestima.
Tafarodi e Milne (2002), aplicando a RSES a estudantes do curso de psicologia,
explicaram 61% da variância total ao fator comum e 22% aos fatores positivos e
negativos. No presente estudo com idosos brasileiros, o total da variância
explicada foi inferior (51%), sendo que o primeiro fator respondeu por 38%,
indicando que a escala mede predominantemente o primeiro fator, ou seja, quando
tratada de forma unidimensional.
Em uma pesquisa mais abrangente (Schmitt & Allik, 2005) realizada com
pessoas de 53 nações, a proporção da variação explicada para o primeiro
componente principal variou de 24.6%, na República Democrática do Congo, a
54.4%, em Israel, com 41.4% da variação explicada quando consideradas todas as
53 nações. Comparando os resultados, o percentual da variância explicada no
presente estudo foi superior (51%).
Em estudo realizado com adolescentes portugueses (Romano et al., 2007), o total
de variância explicada foi de 46,03%. Assim, pode-se considerar que a variância
explicada pela RSES no presente estudo realizado com idosos brasileiros (51%)
pode ser considerada satisfatória.
Ao encontro de outros estudos (Andrade et al., 2009; Marsh, 1996; Santos &
Maia, 1999, 2003), verificou-se tendência de valorização das questões negativas
que sugerem que as respostas aos itens negativos, mesmo após a sua inversão,
produzem fatores independentes, o que pode significar que os sujeitos não
interpretam da mesma maneira os itens formulados negativamente. Assim,
concorda-se com Corwyn (2000) e Dunbar, Ford, Hunt, e Der (2000) que apontam
que estes dois fatores são, na maioria das vezes, uma conseqüência dos efeitos
do método associados com os itens negativamente expressos.
Esses resultados vão ao encontro dos encontrados na presente pesquisa, uma vez
que os itens com os maiores pesos fatoriais são em sua maioria negativos (ex.
Quase sempre eu estou inclinado (a) a achar que sou um fracassado; às vezes, eu
realmente me sinto inútil; às vezes, eu acho que eu não sirvo para nada; eu
gostaria de ter mais respeito por mim mesmo (a); eu sinto que não tenho muito
do que me orgulhar).
A escala contém itens negativos e positivos porque um dos métodos para
construir escalas indica que é importante incluir afirmações em ambos os
sentidos para reduzir a tendência de respostas positivas em todos os itens
(DeVellis, 2003). Esse método pressupõe que tanto os itens positivos quanto os
negativos representam o mesmo construto, no entanto, a confiabilidade dessas
escalas normalmente é reduzida devido a estrutura bifatorial que elas geram
(Quilty, Oakman, & Risko, 2006).
O estudo realizado por Quilty et al. (2006) indicou que fatores de
personalidade estão diferentemente associados com as respostas aos itens
negativos e positivos. Por exemplo, quanto maior o neuroticismo do sujeito,
maior a sua tendência a responder mais nas afirmações negativas e menos nas
positivas. Como existem diversos padrões de personalidade, os autores sugerem
que essas escalas devem sim manter a estrutura de itens positivos e negativos,
justamente para evitar que a personalidade afete muito no escore total ou
mascare as diferenças entre grupos.
Por exemplo, em estudos com atividade física, se a escala só contiver itens
negativos, ao comparar o grupo sedentário com o grupo ativo, e a autoestima do
grupo ativo fosse significativamente mais alta, não se saberia ao certo o
quanto o neuroticismo ou as diferenças de personalidade entre os grupos
afetaram o resultado. Dessa forma, conforme apontam Quilty et al. (2006)
sugere-se a utilização da escala com o somatório das questões positivas e
negativas, mas também se considera válida a exploração dos dois fatores embora
o somatório total seja mais válido, conforme foi argumentado e investigado
pelos autores.
Analisando os itens separadamente, identifica-se na literatura (Baranik et al.,
2008; Farruggia et al., 2004) que o item eu gostaria de ter mais respeito por
mim mesmo (a) é o que normalmente tem baixa carga fatorial, contrapondo os
achados do presente estudo. Ainda, esse mesmo item pode ter carregamento
positivo ou negativo, dependendo do contexto de análise, sendo considerado
ambíguo. De forma idêntica aos resultados do presente estudo, na análise das
versões da RSES (1965) para diferentes países (Bangladesh, Republica
Democrática do Congo, Indonésia, Malásia e Tanzânia), também tiveram
carregamentos negativos para este item (Schmitt & Allik, 2005).
O item em geral, estou satisfeito comigo mesmo(a), carregou tanto no fator
positivo quanto negativo (cross loading), o que ainda não foi documentado em
outros estudos que analisaram a RSES. Todavia, esse mesmo item apresentou
baixos pesos fatoriais para amostras de diferentes países (Canadá, Alemanha,
Nova Zelândia, Kenya, Singapura e Taiwan), conforme registrado por Baranik et
al. (2008). No estudo realizado com adolescentes portugueses (Romano et al.,
2007), esse item teve baixo carregamento (0.41) e se enquadrou naqueles de
avaliação positiva. Dessa forma, sugere-se que a compreensão de estar
satisfeito remeteu a um significado negativo para muitos dos idosos
participantes do presente estudo. Pode-se sugerir que tiveram a interpretação
que estar satisfeito representaria não buscar melhorar em algum aspecto, ou
seja, esse item pode ter sido interpretado de forma ambígua pelos idosos.
No estudo de Schmitt e Allik (2005), o item Eu sinto que sou uma pessoa de
valor, igual às outras pessoas teve carga fatorial com variação de 0.53 à
0.80. O resultado identificado para este item no presente estudo é aproximado e
pode ser considerado aceitável. Todavia observa-se que a comunalidade desse
item é baixa. Essa questão sofreu modificação no processo de adaptação para
idosos e sugere-se que ainda não esteja suficientemente clara, uma vez que pode
ter interpretação dúbia, pois o sujeito pode se considerar com valor
superior, o que o faria discordar completamente da questão e pontuar o valor
mínimo, mesmo tendo um apreço elevado por si próprio.
O item Eu sou capaz de fazer coisas tão bem quanto a maioria das outras
pessoas apresentou menor carga fatorial na presente pesquisa (0.440). O mesmo
item teve carregamento semelhante para alguns países no estudo conduzido por
Schmitt e Allik (2005), sendo que a carga fatorial variou de 0.37 (França) a
0.79 (Bangladesh). No Brasil, o estudo citado identificou carga fatorial de
0.48 neste item, resultado próximo à presente investigação. Sugere-se que esta
questão também pode ter duplicidade de interpretação, uma vez que a resposta do
idoso depende do parâmetro de comparação que utilizou. Se considerar como
outras pessoas, aqueles da mesma faixa etária, a resposta poderia ser
positiva, mas, se considerar pessoas mais jovens, por exemplo, sua resposta
poderia ser negativa.
A confiabilidade da escala foi avaliada pela consistência interna, verificada
por meio do coeficiente Cronbach alfa. Em um estudo que avaliou a versão
traduzida da RSES para 53 países (Schmitt & Allik, 2005), foi identificado
que a confiabilidade média transversal de todas as nações foi 0.81, o que se
assemelha ao valor do alfa obtido na presente investigação (0.812).
No pesquisa de Schmitt e Allik (2005), a mais baixa consistência interna foi
encontrada na República Democrática do Congo (0.45) e o mais elevado foi
compartilhado por Israel e Reino Unido (0.90). Para a versão brasileira
avaliada no mesmo estudo, o valor de alfa de Cronbach foi de 0.79, ligeiramente
inferior ao identificado com a presente pesquisa realizada com idosos.
Assis, Pesce, e Avanci (2006) encontraram alfa de Cronbach de 0.81 para a
Escala de Rosenberg aplicada em adolescentes. Giacomoni (2002), investigando o
bem-estar subjetivo de crianças, encontrou índice inferior à presente pesquisa
(0.75 de Alpha de Cronbach). Gonzalez, Fortaleza, e Ruiz (1993), adaptando a
escala de Rosenberg para adolescentes mexicanos, obtiveram alfa de Cronbach de
0.67. No estudo da RSES com adolescentes portugueses (Romano et al., 2007), o
alfa identificado foi de 0.63. Assim, o coeficiente alfa de Cronbach obtido na
presente pesquisa pode ser considerado aceitável para essa escala, pois os seus
valores são próximos ou superiores aos encontrados nas versões citadas na
literatura.
Considerando que a solução com um único fator mostrou-se adequada, tanto em
termos de cargas fatoriais quanto em termos de consistência interna, recomenda-
se o uso da estrutura de um único fator. Além disso, os valores de consistência
interna das duas dimensões encontradas na segunda solução são inferiores ao que
foi encontrado para a primeira solução. Dessa forma, recomenda-se que o uso da
escala com idosos ativos seja feito com base no construto unitário da escala,
ou seja, com base na solução 1. Sugere-se a necessidade da revisão de algumas
questões e um novo estudo das qualidades psicométricas da escala.