Alfred Smith (1822-1898), pioneiro do turismo ornitológico em Portugal
1. Introdução
A variedade de aves em Portugal resulta da presença de duas regiões
biogeográficas, a Atlântica e a Mediterrânica sendo, particularmente a segunda,
a causa de presença de muitas espécies ausentes do Centro e Norte da Europa, o
que sempre conferiu a Portugal um potencial de atração de estudiosos e
observadores de aves; o mesmo se aplica à flora e à restante fauna.
Alfred Smith foi, provavelmente, a primeira pessoa a fazer turismo ornitológico
em Portugal, quando nos visitou em abril e maio de 1868. Esta visita deu lugar
a um artigo na conceituada revista inglesa de ornitologia Ibis, em 1868 (A
Sketch of the Birds of Portugal) e a um livro descritivo da viagem, em 1870
(Narrative of a spring tour in Portugal).
O livro que publicou contém uma lista comentada de aves de Portugal, até agora
desconhecida da comunidade ornitológica portuguesa, que só encontrámos porque o
bibliotecário da Academia de Ciências de Nova York acrescentou ao título, na
ficha bibliográfica "com uma capítulo sobre as aves de Portugal, e uma
lista de 235 espécies cuidadosamente determinadas".
O pastor protestante Alfred Charles Smith (1822-1898) era um dos, então,
quarenta membros honorários da prestigiada "British
Otnitologists´Union". Foi reitor da igreja de Todos os Santos, em
Yatesbury, Wiltshire, em Inglaterra, de 1852 a c. 1878 (vendeu este título em
1882[1]); foi, ainda, um amador da história natural, arqueologia e viagens, que
se correspondeu com Charles Darwin[2].
Veio a Portugal com o pai, "... tal como nas melhores viagens dos últimos
anos" e "...carregava uma espingarda, um par de binóculos, e todos
os utensílios necessários a um ornitologista, parar obter e preservar espécimes
de aves, ele[o pai]levou a sua câmara, e tudo o que um fotógrafo
precisa." Para esta viagem Smith calculou gastar cerca de 50 libras.
Embarcou nas docas de Southampton no navio brasileiro Shannon por volta do dia
de Páscoa de 1868. Visitou Lisboa, Sintra, Évora e Setúbal, e depois veio para
o Norte, por Alcobaça, Batalha e Coimbra até ao Porto, de onde partiu para
Braga e Viana.
Smith usou o comboio expresso de Coimbra para o Porto, e nisso gastou três
horas; na parte final desta viagem, após passar Ovar, anota que "...
agora surgiu a costa, com o extenso Atlântico a oeste, e areia nos dois lados,
e nada mais que areia, pura e simples, para ser visto. Isto foi no final da
nossa jornada, e depressa chegamos ao términos em Vila Nova de Gaia."
Esta descrição faz sentido pois o revestimento florestal das dunas de Ovar,
Cortegaça e Esmoriz iniciou-se, apenas, em 1930 (Lamy & Rodrigues, 2000),
pelo que à data da viagem de Smith (1868, recorde-se) a linha da caminho de
ferro de Ovar a Vila Nova de Gaia atravessava os areais costeiros, com uma
paisagem idêntica à que hoje ainda podemos ver um pouco no troço de S. Félix da
Marinha.
Smith atravessou para o Porto pela Ponte Pênsil e instalou-se no Hotel Mary
Castro que, nesta data, ainda seria na esquina da Rua de Sampaio Bruno com a do
Bonjardim e, mais tarde, se mudou para a Rua das Motas, na Foz.
Entre o muito que visitaram e os impressionou no Porto cabe destacar os jardins
do capelão da Feitoria inglesa, rev. Edward Whiteley, que, entre outras
espécies, tinha um Tulipeiro (Liriodendron tulipifera), com cerca de 5,2 m de
perímetro a 90 cm do solo, segundo as medições de Smith e do pai; atribuíram
este excecional crescimento ao facto de ter um sistema de rega. Dizem que, no
entanto, uma magnólia ali existente ainda era mais espetacular, com 18 m de
altura. Também as camélias de diversas variedades chamaram a atenção de Smith.
O rev. Whiteley tinha um colégio na Rua de Entre-Quintas (Gonçalves, 2001),
perto do Palácio de Cristal, onde fica a conhecida Casa Tait; esta propriedade,
anteriormente designada Quinta de Meio, foi adquirida em 22/04/1900 pelo
negociante inglês William Tait. O jardim do rev. Whiteley deveria ser o mesmo
da futura Casa Tait, como comprova o majestoso Tulipeiro (Liriodendron
tulipifera), ainda hoje existente.
2. Aves de Portugal
Na sua listagem de aves de Portugal, Alfred Smith começa por dizer que, à
época, sobre as aves de Portugal apenas existia uma listagem em português feita
pelo Professor Barbosa du Bocage[3], em 1862 e umas notas do George Frazer
Mathews, que foram publicadas na revista "The Naturalist", do ano
de 1864.
Quanto ao trabalho do Professor Barbosa du Bocage, Smith refere-se à brochura
publicada em 1862 "Instruções praticas sobre o modo de coligir e remeter
productos zoológicos para o Museu de Lisboa" que inclui uma lista
comentada de 326 espécies de aves que ocorriam ou podiam ocorrer em Portugal,
das quais Bocage apenas pôde confirmar a ocorrência de 280, das 440 que se
conhecem hoje[4]. Curiosamente, entre as espécies cuja presença não conseguiu
confirmar, estão algumas que hoje são comuns, como a Garça-branca-pequena
(Egretta garzetta) ou a Gaivota-parda (Larus canus).
Por outro lado, a lista de Bocage de 1862 incluiu espécies cuja ocorrência em
Portugal é duvidosa, como a Perdiz-mourisca (Alectoris barbara) (Fig._1) de que
só há três referências para o nosso país; um exemplar que Tait (1924) diz ter
um tio seu caçado anos antes em Vendas Novas e duas que António Themido (1944)
diz integrarem a coleção do rei D. Carlos e terem sido capturadas em Vila
Viçosa em 20 e 24/12/1906. É uma espécie do Norte de África e na Península
Ibérica a única população conhecida é em Gibraltar, embora haja alguns
exemplares capturados em Telleria (Cádiz), na primeira metade do século XX
(Lorenzo et al., 2003). Alguns sítios na internet referem a introdução recente
em Portugal, para fins cinegéticos, o que não se conseguiu comprovar e, a ser
verdade, é proibido.
Quando, acima, Alfred Smith fala de G. F. Matews está a referir-se ao
naturalista e arqueólogo que era vigário da Igreja de S. Pedro, em Mancetter
(Warwickshire, UK), secretário do Club de Cricket de Hayles (Kent, UK) e do
Clifton Rugby Football Club (Bristol, UK) que publicou em 1865 na revista
inglesa "The Naturalist" o artigo "Notes on the Azure-winged
magpie (Pica cyanea), &c." (TA: Notas sobre a Pega-azul (Cyanopica
cyanea), etc.); o autor acrescentou ao título "etc." porque fala de
diversas outras espécies de aves que viu nos arredores de Lisboa, ao todo três
dezenas de espécies, quando cá esteve em fevereiro de 1863 e em janeiro de
1865, e no Funchal, em dezembro de 1863.
Era, pois, esta a bibliografia que Alfred Smith dispunha sobre as aves de
Portugal; mas, em Portugal, socorreu-se se outros métodos de pesquisa, desde a
observação de campo "...armado com uma espingarda de dois canos e um
binóculo - o último, não posso deixar de acrescentar, tão útil para o estudante
de ornitologia como a primeira." Além disso, Alfred Smith também
frequentou feiras e mercados, de manhã cedo, para inspecionar os
"bouquets" de pequenas aves à venda; visitou, ainda, o Museu de
Zoologia de Lisboa e o de Coimbra.
Mas Alfred Smith também teve a colaboração de algumas pessoas da comunidade
científica, como o já referido Professor Barbosa du Bocage e o Dr. George Suche
(ou Such) médico em Londres e coletor no Brasil, onde estava em 1825 e enviou,
entre outras coisas, um tucano-de-bico-verde (Ramphastos dicoloris) e um
tucano-de-cinta ou araçari-de-bico-branco (Pteroglossus aracari) para Nicholas
Aylward Vigors (1785-1840) um zoólogo e político irlandês (Macgregor e Headon,
2000). Tal como Alfred Smith, Vigors era "Fellow of the Linnean
Society."
Smith recolheu em Portugal uma "pequena" coleção de aves que
embalsamou e, já em Inglaterra, recorreu ao conhecido ornitologista inglês
Canon Henry Baker Tristram (1822-1906) (Baker, 1996) para a sua clara
identificação.
No artigo que publicou na revista Ibis, em 1868, Alfred Smith enumera 193
espécies e acrescenta: "Também fiz menção acessória de cinquenta e sete
outras, que me afirmaram com confiança serem bem conhecidas em Portugal,
pessoas em cujo rigor podia confiar." Assim, Smith apresenta uma lista de
250 espécies de aves, elaborada a partir de listas anteriores, mas também com
dados novos que recolheu e com comentários próprios.
2.1. O aditamento do Prof. Bocage à lista de Smith
Posteriormente o Professor Barbosa du Bocage (1870) fez um revisão à lista de
Smith e publicou-a no "Jornal das Sciencias matemáticas, physicas e
naturais da Academia Real de Sciencias de Lisboa"; basicamente Barbosa du
Bocage fala da reserva que Smith teve sobre a classificação de uma águia-
imperial (Aquila heliaca) existente no Museu de Lisboa, e demonstra que é mesmo
uma águia-imperial juvenil, espécie que segundo Barbosa du Bocage
"...póde dizer-se comum; abunda nas serras da Beira e do Alemtejo. D´esta
ultima província tenho recebido mais d´uma vez exemplares vivos d´ella."
Acrescenta, depois, uma listagem de 44 espécies de aves de Portugal não
referidas por Smith, e começa com a Aquila naevia, cujo nome atual é Aquila
clanga, referindo "Um exemplar proveniente de Traz-os-montes, morto nos
arredores de Bragança." A Aquila clanga é atualmente muito rara em
Portugal, havendo apenas 9 observações registadas desde 1998, todas no estuário
do Tejo, salvo uma, no estuário do Sado[5].
Refere, em seguida, a Alauda lusitana Gm. (Fig._2) dizendo que "Não
existem ainda exemplares d´esta espécie no museu de Lisboa, porém sei que se
encontra frequentemente no Alentejo e Algarve; d´esta província trouxe vários
exemplares d´ela um ornitologista de Halle, o sr. E. Rey, que ali foi
recentemente." Barbosa du Bocage referia-se a Eugène Rey (1838-1909),
ornitologista alemão que visitara Portugal no ano anterior (1869) e deu conta
das suas observações no artigo "Zur Ornis von Portugal" (TA: Para a
Ornitologia de Portugal) publicado no "Journal für Ornithologie"
(Rey, 1872).
Na reedição da "Histoire Naturelle", do Conde de Buffon[6], da
autoria de Charles Sonnini[7], feita em 1800-1801, este autor acrescentou uma
nota intitulada "L´Alouette de Portugal" na qual, depois de
descrever a espécie, diz que "É ainda ao Senhor Latham que devemos o
conhecimento desta espécie de cotovia, natural de Portugal" John Latham
[8] escreveu a "General History of Birds" (1822) e fala da
"Portugal Lark" de que faz uma pequena descrição que começa com a
indicação de ter um "bico robusto" e termina dizendo que
"habita Portugal", informação que atribui ao "senhor
Pennant"[9].
Em 1810 Antero Seabra[10], no seu "Catalogue des Vertébrés du
Portugal" considera a Alauda deserti (Licht) (Oliv. 18), sinónimo
deAlauda lusitanica Blyth (Oliv. 18), e da Ammomanes deserti (Oliv. 18) e
escreve que "Hab. Env. de Coimbra (Oliv. 18)".
Em 1816 o "Nouveau dictionnaire d´ histoire naturelle" registava:
A Cotovia de Portugal, Alauda lusitana, Lath. A côr geral da plumagem
desta cotovia é um ruivo muito pálido, que fica ainda mais claro nas
partes inferiores; as coberturas e as penas das asas tem uma
bordadura cinzenta, e as penas da cauda são ruivas amareladas, mais
claras nas penas exteriores; a ponta do bico e as unhas são pretas; o
resto do bico é branco, e os pés são cor de carne. Esta ave tem
tantas semelhanças com a alouette calandrelle (Alauda arenaria,
Vieill,) depois da muda, que eu julgo que pertencem à mesma espécie.
(pág. 371, TA).
A "Alouette calandrelle" tem o nome atual de Calandrella
brachydactyla Leisler, 1814 e é a Calhandrina-comum, que se encontra em todo o
território nacional, na primavera e verão, mas que nada tem a ver com a
erroneamente chamada "Cotovia de Portugal".
O "Catálogo de las aves de España, Portugal y Islas Baleares" dá
como sinónimo da Alauda lusitana Gm a Alauda deserti Licht e anota
"Accidentalmente en Granada (Seoane)[11]. Obetenida dos veces en San
Ildefonso (Castellarnau) [Barcelona]" (Prosper, 1886:66).
Entre 1871 e 1882, o ornitologista inglês Henry Eeles Dresser (1838-1915)
publica uma extensa história das aves da Europa e refere a Alauda lusitanica, a
"Portugal Lark de Latham", considerando que houve um erro de
identificação, e que se trata da Ammomanes deserti Licht.[12], e acrescenta
"Nem mesmo parece que qualquer espécime autêntico de A. deserti tenha
sido obtido em Portugal ou Espanha." (Dresser, 1871: 329).
Apesar disso, Paulino d´Oliveira[13] (1869) publica "Aves da Península
Ibérica e especialmente de Portugal" e sobre a Alauda lusitanica faz a
seguinte nota:
119 A. lusitanica, Blyth. (A. deserti, Calb.).
Hab. - Ha annos que ferimos uma cotovia perto de Coimbra, e
presumimos não poder ser senão um ind. d'esta esp. Para a estudar
vagarosamente mettemol-a n'uma passareira e no dia immediato tinha
desapparecido. - Cita-se do s. e e. de Hesp. - Afr.
(Oliveira, 1896:139)
Quer William C. Tait, no seu livro "The Birds of Portugal" (Tait,
1924), quer Reis Júnior, no seu "Catálogo Sistemático e Analítico das
Aves de Portugal" (Júnior, 1930-1935), quer ainda António Armando
Themido, no livro "Aves de Portugal" (Themido, 1952) ignoram a
espécie.
Atualmente esta espécie distribui-se desde o Sara à Península Arábica, Médio
Oriente, Irão, Afeganistão e Paquistão, pelo que tudo indica que Henry Dresser,
em 1871, tinha razão e a espécie nunca existiu em Portugal.
3. Conclusões
O rev. Alfred Charles Smith (1868) foi, porventura, o primeiro turista
(ecoturista) que visitou Portugal motivado pela ornitologia.
Embora outros estrangeiros tivessem estado antes em Portugal, com interesses
naturalistas, mas por razões de negócios, Smith é o primeiro a assumir-se como
turista, e a terminar o seu livro "Narrrative of a spring tour in"
Portugal do seguinte modo:
E, como última palavra, deixem-me cordialmente recomendar, não só a
turistas em geral, mas especialmente aos meus irmãos Ornitologistas,
uma viagem a este canto do extremo sudoeste da Europa, agora tão
acessível, quer por mar como terra, e que oferece tantos e tão
variadas atrações - um clima quente e seco para quem busca saúde;
permanece incomparavelmente eclesiástico e conventual, de um carácter
único, para o eclesiástico ou o arquiteto; belo cenário para o
artista; com costumes nobres, no meio de gente agradecida e
hospitaleira, para os turistas em geral; enquanto que para o
naturalista de cada ramo, o geólogo, o botânico, o entomologista, o
zoólogo generalista, há uma rica recolha de factos que devem ser
aproveitados neste território que, embora tão perto das nossas costas
e, agora, de fácil acesso é, talvez, menos conhecido do público que
viaja que qualquer outra região da Europa.(Smith, 1870: 216).
Em 1970, John Gooders publicou em Londres o livro "Where to watch birds
in Britain and Europe" e nele sugere uma série de locais a visitar em
Portugal para ver aves, desde a lagoa de Albufeira ao Alentejo, da Ria de
Aveiro ao Estuário do Tejo. Gooders escreveu, a propósito da Ria de Aveiro:
A Pousada da Ria está situada nesta ponta de areia, e todos os
quartos tem um terraço sobre a laguna e, assim, você pode combinar
ornitologia com o seu chá (café?) matinal.(Gooders, 1970)
Esta localização priviligiada, a quantidade enorme de (eco)turistas que, ao
longo de décadas optaram pela Pousada da Ria por causa do livro do John Gooders
e, obviamente, por causa da sua localização, demoraram anos a perceber; só
muito recentemente a temática da ornitologia foi introduzida na pousada,
através de um painel decorativo do bar, mas sem outro incentivo, como listas de
espécies observáveis, melhores locais de observação, percursos guiados, etc.
Em 1973, Oleg Polunin e B.E. Smythies publicam em Oxford o livro "Flowers
of South-West Europe - A Field Guid" que, pela primeira vez, indica
itinerários e locais de observação de plantas em Portugal e dá interessantes e
importantes informações sobre as espécies que podem ser observadas. Curiosa a
referência feita, no capítulo sobre o Algarve, a um país bucólico que,
entretanto, se perdeu:
Quem circule pelas estradas do Algarve não pode ficar indiferente ao
trabalho de quem as mantém, os cantoneiros do Ministério das Obras
Públicas, nem ao aspecto limpo e bem arranjado das suas margens,
plantadas de todas as cores com acácias ornamentais, marmeleiros de
grandes flores brancas e ligeiramente rosadas em Março e Abril,
lírios (principalmente Iris albicans com alguns I. Germânica), Salvia
officinalis, geránios e outras flores.(Polunin & Smythies, 1973).
Também esta obra motivou a vinda a Portugal de muitos turistas (ecoturistas) em
busca da flora mediterrânica.
Nos tempos mais recentes a designação "ecoturismo" implantou-se em
Portugal e surgiram algumas empresas de ecoturismo, embora a confusão com
outras formas de turismo na natureza (muito predador) seja, ainda, grande.
O potencial de Portugal para o ecoturismo é muito relativo, quando comparado
com os grandes destinos ecoturísticos africanos e americanos, e reside no facto
do país conter elementos da paisagem atlântica e da paisagem mediterrânica, ter
um interior relativamente preservado e de possuir uma série de endemismos de
fauna e de flora; acresce a isto o clima ameno, a segurança e os custos
moderados de estadia.
Temos, no entanto, alguns pontos fracos: a enorme falta de informação sobre os
sítios a visitar, a má sinalização rodoviária, a ausência de equipamentos de
acolhimento, e a falta de percursos pedestres sinalizados e guias
especializados.
A paisagem é, sem sombra de dúvida, a tela de fundo de toda a atividade
turística e, muito em especial, da ecoturística. Paisagens naturais e não
degradadas são escassas em Portugal, pois todo o território foi profundamente
transformado pelo Homem, ao longo dos últimos milénios. A fauna é, assim, um
dos maiores atrativos do ecoturista, e muito especialmente as aves.
Neste particular, Portugal é muito interessante para amadores de ornitologia do
Centro e Norte da Europa, que aqui podem ver com facilidade uma série de
espécies mediterrânicas, que não chegam aos seus países: o Grifo (Gyps fulvus),
o Abutre-do-Egito (Neophron percnopterus), a Águia-imperial-ibérica (Aquila
adalberti) a Galinha-sultana (Porphyrio porphyrio), são exemplos entre dezenas
de outras espécies.
Sendo grande o potencial de atração de turistas de natureza provenientes do
Centro e Norte da Europa, muito falta, contudo, fazer ao nível de promoção
deste segmento turístico em crescimento, que poderá ter um impacto
significativo na economia das comunidades do interior.
Um adequado ordenamento de território é fundamental para preservar e valorizar
o potencial ecoturístico de Portugal e alguns passos foram dados com a criação
da áreas protegidas, com os respetivos planos de ordenamento, e com a Rede
Natura 2000, uma rede comunitária de proteção da biodiversidade e dos habitats
naturais resultante da aplicação das Diretivas nº 79/409/CEE (Diretiva Aves) e
nº 92/43/CEE (Diretiva Habitats).
Apesar destes instrumentos de proteção, a par com a REN (Reserva Ecológica
Nacional) e a RAN (Reserva Agrícola Nacional), serem de inclusão obrigatória
nos Planos Diretores Municipais e noutros planos de ordenamento do território,
a sua importância tem sido mal avaliada e, frequentemente, em lugar de serem
vistos como oportunidade, são vistos como entrave a um modelo de crescimento
predador da paisagem.
As caraterísticas geográficas de Portugal, propícias a uma variada
biodiversidade, devem ser respeitadas se queremos aproveitar o potencial
económico dos serviços prestados pela natureza já avaliado, à escala global, em
33 x 1012 dólares USA (Costanza et al, 1997).