Narrativas do poder feminino
Narrativas do poder feminino Maria José Lopes, Ana Paula Pinto, António Melo,
Armanda Gonçalves, João Amadeu Silva, Miguel Gonçalves (orgs.), publicações da
faculdade de filosofia, universidade católica portuguesa, Braga, 2012. 741 pp.
ISBN: 978-972-697-205-1
Virgínia Soares Pereira*
*Universidade do Minho, Instituto de Letras e Ciências Humanas, Departamento de
Estudos Portugueses e Lusófonos, 4710-057 Braga, Portugal.
virginia@ilch.uminho.pt
No mundo ocidental é hoje em dia atribuído à mulher um peso social que as
sociedades transactas tiveram dificuldade em reconhecer, como se sabe. Que esse
poder, exercido nas mais diversas áreas da vida humana (família, trabalho,
lazer), se tem consolidado paulatinamente, é indiscutível. O que é menos
conhecido é o modo como ao longo dos tempos esse poder se foi afirmando, como
se foram tecendo as narrativas do poder feminino, como se foram construindo,
ou reavaliando, ou reinterpretando as imagens da mulher desde a Antiguidade até
aos nossos dias. Tal é o cerne dos contributos reunidos no presente volume, que
alia os estudos clássicos e os estudos do feminino. Os artigos revisitam
grandes figuras míticas, literárias ou reais da Antiguidade, como sejam Helena,
Ifigénia, Andrómaca, Antígona, Safo, Lisístrata, Tecmessa, Cleópatra, Octávia,
Dido, Lívia, Lucrécia, Pasífae, Medeia, Jezabel, Hipátia, Medusa, Cassandra,
com todas as evocações e dimensões para que tais vultos remetem, seja no
passado clássico, seja nas suas representações nos tempos modernos. Somam-se,
aos artigos relativos às figuras mencionadas, outros artigos que incidem sobre
figuras porventura menos conhecidas, como, por exemplo, Sássia, a perversa mãe
de Cluêncio, a plautina Fronésio, Psique (e o Amor), a rainha visigoda
Brunilda, a peregrina Egéria, a bíblica Asenet, a camiliana Teresinha da
Ginjeira. Acrescentem-se ainda artigos em torno de catálogos de ilustres
mulheres ou de entidades femininas, como as Amazonas ou as Sereias, bem como
artigos consagrados a conjuntos como as mulheres na Atenas de Eurípides, as
mulheres na Eneida,as mulheres na Lusitânia Romana, ou a mulher cristã na
Antiguidade Tardia (com recurso a fontes documentais e muito particularmente
epigráficas), a Domina afro-romana de finais do século IV, ou as mulheres
celtas na Antiguidade. A este elenco, já de si muito amplo, juntem-se ainda
artigos que revisitam mulheres de poderoso recorte histórico, como, entre as
portuguesas, a Rainha Santa Isabel, Leonor Teles, a Dama na corte de D. João
II, a rainha D. Maria I, bem como as escritoras Glückel Von Hameln, Rosalía de
Castro, Ana Hatherly, a pintora Lourdes Castro e o poder feminino em José
Saramago. São igualmente evocadas as rainhas da restauração, as mulheres do
Portugal Colonial, ou uma Lavínia do século XIX, ou figuras da pós-modernidade
portuguesa, ou as mulheres da migração internacional, ou as mulheres em
narrativas televisivas, entre outros.
Ressalvada alguma omissão involuntária, esta enumeração caleidoscópica tem
exatamente o objetivo de dar uma visão panorâmica e discriminada da diversidade
dos temas e das abordagens da matéria feminina, que vão desde a Literatura à
Arte, da Psicologia à História, e trazem até ao leitor inesperadas perspectivas
ou dão a conhecer textos literários modernos de menor difusão junto do público.
Apesar do interesse em referir os nomes dos autores e dos títulos, a verdade é
que o Índice, no início do volume, supre de imediato esta falta. Pretendeu-se
desta forma, enunciando apenas os temas, sem referir os autores dos artigos nem
os títulos, evitar a apresentação de mais duas listagens, por um lado, e, por
outro, deixar aberta a porta à curiosidade de quem se interesse quer pelos
estudos clássicos, quer pelos estudos do feminino. E o leitor, seja ele quem
for, não se arrependerá. Dada a pertinência atual do tema e atendendo a que os
artigos foram sujeitos a um processo rigoroso de avaliação por pares, sem
dúvida que não sairá defraudado quem pretenda consultar tantos artigos
(sessenta e dois) que se caracterizam por uma indesmentível qualidade,
variedade, novidade e interesse.
O volume encerra com cerca de setenta páginas de referências bibliográficas
(páginas 675 a 741), que têm a virtude de dar a ver, mediante a própria
diversidade dos títulos bibliográficos elencados, a diversidade dos temas
tratados no âmbito das Narrativas do poder feminino e mostram de modo
expressivo a vitalidade dos estudos clássicos.
Campus de Gualtar
4710-057 Braga
Portugal
ceh@ilch.uminho.pt