Editorial
Editorial
A diversidade temática dos textos acolhidos pela Revista Portuguesa de Educação
tem sido invocada, neste lugar, por diversas vezes, pelos seus sucessivos
editores, quer como sinal da fecundidade teórica do campo educacional, quer
como limitação, sobretudo quando considerado o leitor que, cada vez mais
especializado, tenderá a um consumo mais do "texto" do que da Revista
e, por isso, se afastará dela, porque nem sempre, em cada número, "aquele
texto" está editado.
Talvez porque a questão do Leitor das revistas académicas esteja hoje resolvida
com a disponibilização on-line dos textos, e de cada um por si, pronto a ser
descarregado, as revistas académicas, apesar da pressão dos indicadores de
consulta (mas sempre do "texto") têm vindo a transformar-se num lugar
de produção, instituindo-se, neste circuito, como categoria quase
exclusivamente relevante, a figura do Autor.
Este número da Revista é composto por oito textos (número que, sem dúvida,
reflecte a crescente procura que dela fazem os autores). Mas, com isto, a
Revista, na sua edição em papel, apenas parcialmente cumpre a sua missão.
Agora, abre-se a porta ao leitor que, independentemente da intenção
(in)formativa, mais ou menos especializada, com que procurará um texto ou
outro, terá aqui a possibilidade de uma leitura lenta, integradora; aquela que
é capaz de sustentar a compreensão efectiva da complexidade do fenómeno
educativo. Foi com esta intenção que foram organizados, nas quase duzentas e
quarenta páginas deste número, os textos que o integram. Ao leitor cabe agora
concluir o processo.
Ana Maria Morais e Isabel Neves descrevem um modelo, sustentado na teoria do
discurso pedagógico de Basil Bernstein, que "conceptualiza uma prática
pedagógica" com potencial para o sucesso dos alunos e, assim, para a
diminuição do "fosso entre alunos socialmente diferenciados".
No texto de Paulo Coelho Dias apresentam-se os dados de um estudo que procurou
comparar a "eficácia da aprendizagem" em situações informais
(visionamento de documentários científicos sobre a natureza) e formais (aulas
de ciências).
No terceiro texto, Ana Lúcia Gomes e Jane Correa analisam a produção verbal em
contextos de comunicação instantânea e apresentam dados que indicam "como
os adolescentes utilizam a escrita na Internet nas suas práticas sociais"
e como as escolhas linguísticas nesse processo são uma função do contexto
virtual em que comunicam.
O texto de Maria Cecília Santos elege uma questão de metodologia de
investigação como objecto central: o grupo de discussão. As potencialidades e
limites da utilização desta metodologia no trabalho de campo, bem assim como o
papel e funções do investigador/moderador constituem o núcleo do texto
José Augusto Pacheco, no quinto texto, inscreve a discussão do currículo numa
"lógica estruturada de decisão política". Para a análise crítica dos
"recentes processos e práticas de educação e formação", o Autor foca
a relação entre "globalização, conhecimento e currículo, de modo a
salientar as mudanças ao nível da educação formal, não formal e informal para o
estudo do currículo".
João dos Reis Silva Júnior examina as actividades e a formação do professor
pesquisador das universidades estatais públicas no contexto da transformação da
universidade numa instituição "tutelada pelo Estado" com o
"mercado como mediador". Formulando uma hipótese para a compreensão
das mudanças da identidade da instituição universitária, o Autor discute o
impacto de tais transformações no "trabalho dos professores e em sua
formação humana em geral, mas em particular no dos professores
pesquisadores".
Ione Valle e Elizete Ruschel reflectem igualmente sobre políticas de educação
brasileiras, agora no contexto de um Estado específico: Santa Catarina. Da
análise documental, resulta a caracterização dos sistemas de ensino e do seu
"impacto no acesso ao ensino" como "seletivos, regulados e
meritocráticos".
Por fim, Flávio Brayner inquire, no sentido da sua desnaturalização, o estatuto
do conceito de diálogo. Em tese, o Autor defende que, apesar da
intencionalidade de estabelecimento ou facilitação de "consensos
intersubjectivos" subjacente à noção, o seu sentido não é consensual, o
que pode contribuir para a "confusão ou imprecisão da nossa linguagem
pedagógica".
A Revista inclui ainda uma nota de leitura do livro "Na Girândola dos
Significados: Polissemia de Excelências em Escolas Portuguesas do Século
XXI", obra que segundo o Autor da nota é mais uma forma de homenagem ao
trabalho de Stephen Stoer.
Boa leitura!
Maria de Lourdes Dionísio
Centro de Investigação em Educação
Instituto de Educação
Universidade do Minho - Campus de Gualtar
4710 Braga - Portugal
rpe@iep.uminho.pt