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EuPTHUHu0874-55602012000200003

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Representações sociais do «Envelhecer no masculino» e do «Envelhecer no feminino»

Introdução A forma como envelhecemos e a "categoria social" das pessoas idosas são extremamente heterogéneas, diversas e eivadas de assimetrias várias. No entanto, nos discursos públicos, mediáticos, políticos e até mesmo no domínio das ciências tal heterogeneidade é geralmente ocultada por assunções homogeneizadoras que retratam este processo e este grupo como um mesmo e . Em resultado desenvolvem- se visões distópicas da velhice (Daniel, 2006a). Alguns estudos críticos denunciam as excessivas generalizações da "categoria social idosos", lembrando que a "velhice" é uma categoria diversa que esconde diferenças e desigualdades (Paúl, 1997). Indicam também a plasticidade e a diversidade como características fundamentais da forma como as pessoas envelhecem; enfatizam a importância das políticas e condições socioeconómicas na manutenção dos indivíduos de idades avançadas, e mostram que as diferenças (étnicas, etárias, sexuais e socioeconómicas) tornam as experiências de envelhecimento muito distintas.

As especificidades relacionadas com o género, aquando do envelhecimento e da categoria social de "pessoa idosa", têm sido invisibilizadas (Alber e Ginn, 1996; Goldani, 1999; Miller e Simeth, 2007; Wheeler, 1997). Esta invisibilização terá impactos não no desenho das políticas societais, como também ao nível das interações sociais inter e intracategoriais, e ainda ao nível das cognições dos sujeitos sociais acerca do fenómeno e das categorias de pessoa idosa1 (Doise, 1985; Moscovici, 1988).

O presente trabalho pretende ser um contributo para a sexualização2 das análises sobre o envelhecimento e sobre essa categoria social distopicamente apontada como neutra. Fá-lo, refletindo sobre os elementos de género que enformam o fenómeno, apresentando a evolução das narrativas públicas sobre estereotipia idadista e apresentando um estudo sobre as representações sociais do envelhecimento masculino e do envelhecimento feminino num contexto institucional específico. Em linha com a proposta de Serge Moscovici, adotamos a definição de Jodelet de representação social como "uma modalidade de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático e contribuindo para a construção de uma realidade comum a um conjunto social" (apud Vala e Monteiro, 1993: 354). Mais concretamente, articulamos esta proposta com a dos estudos da identidade social (Tajfel, 1972, 1982), centrando-nos no tipo de representações que respeitam a atributos personológicos e características estereotípicas que definem os membros de um determinado grupo de pessoas, constituído como categoria. Mobilizaremos conceitos como estereotipia de género e papéis sexuais (Amâncio, 1998) de forma a compreender as representações associadas ao envelhecimento no masculino e no feminino.

Em termos da sua estruturação, o artigo engloba três partes. Num primeiro momento são apontados alguns dados e reflexões que consideramos necessárias a uma leitura sexualizada do processo. Num segundo momento, expomos a viragem paradigmática no tratamento social do envelhecimento, designadamente o combate à estereotipia idadista negativa. Finalmente apresenta-se um estudo sobre as representações sociais de "envelhecer no masculino" e "envelhecer no feminino", junto de vinte e duas mulheres diretoras técnicas de Instituições Particulares de Solidariedade Social (doravante IPSS) com valências de apoio a população idosa.

1. Envelhecer no masculino e no feminino: sexualizando o fenómeno Estudos críticos denunciam que a especificidade das mulheres idosas e de meia- idade tem sido invisibilizada (Goldani, 1999), até mesmo pelas análises feministas (Alber e Ginn, 1996; Miller e Simeth, 2007; Wheeler, 1997).

Investigações realizadas, a partir por exemplo de estudos de coorte, têm analisado as diferenças entre os homens e as mulheres, chamando a atenção para a ausência de visibilidade das mulheres idosas e das suas desvantagens cumulativas (Goldani, 1999). Outros estudos apontam os impactos diferenciadores das vivências de género sobre a geração mais velha, que:

experimentou, por maior espaço temporal, relações de poder e também naturalizou, mais intensamente, noções sobre papéis masculino/ feminino calcadas num modelo tradicional de relações de género, em que havia o exercício da autoridade dos homens sobre as mulheres e os filhos no seio das famílias, ou seja, vivenciou uma assimetria relacional, o que pode influenciar, também de modo diferencial, o modo do idoso perceber e vivenciar a sua velhice, conforme a marca do seu género (Fernandes, 2009: 706).

Toni Calasanti (2009), por exemplo, é apologista e defensora de uma gerontologia feminista, entendendo que ela fornece um enfoque nas desigualdades interseccionais, elemento crítico das experiências de envelhecimento. Não obstante, e apesar destes esforços analíticos sensíveis ao género, os discursos políticos e científicos produzem conceitos e visões de envelhecimento e de pessoa idosa, muitas vezes, neutros, ao passo que os dados demográficos apontam uma clara feminização deste fenómeno. A feminização da velhice tem atraído pouco a atenção da ciência e da política, secundarizando o facto de a fragilidade das idosas estar marcada por desigualdades de género que, somadas às desigualdades estruturais da sociedade, colocam a feminização da velhice como um elemento fundamental das futuras políticas sociais e desafia os contratos de género e intergeracionais vigentes.

A falta de reconhecimento das relações sociais de género como característica fundamental da hierarquia social, tem atuado como barreira à equidade entre homens e mulheres, principalmente na velhice (Snyder e Wong, 2007; CEDAW, 2010). O nível de bem-estar das mulheres e dos homens resulta das diferentes trajetórias de vida, determinadas pelo contexto social, económico e institucional que as/os rodeia. Desta forma, homens e mulheres, aquando da velhice, encontram estados de vulnerabilidade de acordo com os seus papéis sociais, culturais e o nível de proteção institucional que a sociedade lhes proporciona (Figueiredo et al., 2007). No que diz respeito à mortalidade as mulheres tendem a sobreviver aos homens mas isso não significa que estas mulheres gozem de melhor saúde. A mortalidade diferenciada não espelha as profundas variações que se registam no estado de bem-estar daquelas que sobrevivem: "as mulheres mostram uma maior taxa de morbilidade do que os homens em termos de saúde atribuída a si própria " (Paúl e Fonseca, 2001: 53). De facto, não as mulheres vivem mais tempo, como vivem mais sós3 e com mais doença (Monge, 2006; Nunes, 2005). Tal facto deve-se à circunstância de estas viverem mais anos e de não voltarem, com a mesma representatividade, que os seus congéneres masculinos, a constituir família depois da primeira viuvez, separação ou divórcio. As mulheres também predominam nas instituições de acolhimento de pessoas idosas (Daniel, 2006b). Em termos de saúde, as mulheres quando comparadas com os seus congéneres tendem a desenvolver mais doenças crónicas não fatais, incapacidades e limitações funcionais. Devido ao seu papel reprodutivo e à pressão associada ao seu papel de cuidadoras, colocam-se numa plataforma epidemiológica diferente da dos homens (Snyder e Wong, 2007). As mulheres apresentam uma maior taxa de morbilidade, maior número de visitas e utilização dos serviços de saúde. A sua tradicional condição de cuidadora, primeiro das crianças, depois dos/as progenitores/ as e muitas vezes dos maridos, favorece uma relação estreita com os serviços de saúde (Snyder e Wong, 2007). São, por isso, e também elas, as mais afetadas pelas políticas de proteção social, saúde e de terceira idade. Por outro lado, sabe-se que o impacto das desigualdades de género ao longo da vida é exacerbado na velhice (CEDAW, 2010), sendo as mulheres mais afetadas pela pobreza do que os homens, especialmente nesta fase4. A discriminação que as mulheres mais velhas experienciam é muitas vezes resultado da desigual alocação de recursos e acesso limitado a serviços básicos. A desigualdade e discriminação de género no emprego durante toda a sua vida têm um impacto cumulativo na idade avançada, auferindo as mulheres mais velhas pensões mais baixas (57% da pensão média dos homens, em 2011) (CIG, 2010). As possibilidades e liberdade abertas supostamente pela reforma são vividas de forma diferente pelas mulheres. Como refere Toni Calasanti, a "capacidade dos maridos de terem boas carreiras e segurança financeira na idade avançada ou a possibilidade de escolherem o que querem fazer na reforma assenta no trabalho doméstico das suas esposas" (2009: 473). Também os estereótipos de género e práticas tradicionais e habituais podem ter impactos negativos em todas as áreas da vida das mulheres idosas (nos papéis de cuidadoras na família, papéis na comunidade, na sua representação nos meios de comunicação, nas atitudes das entidades empregadoras, de trabalhadores/as de saúde e outros/as prestadores/as de serviços) podem resultar em violência e abuso psicológico, verbal e financeiro (CEDAW, 2010). As mulheres idosas congregam na sua identidade os efeitos interseccionais da estereotipia de género com a estereotipia idadista sobre a qual tem recaído, nas últimas décadas, todo um esforço de desconstrução, como veremos no ponto que se segue.

2. A promoção de representações sociais positivas de envelhecimento e de pessoa idosa O envelhecimento emergiu nos tempos recentes como um dos principais desafios colocados às sociedades contemporâneas. Surge ancorado a uma multiplicidade de implicações que perpassam a esfera micro dos indivíduos (suas identidades e situações sociais concretas), a esfera meso na forma como os diversos subsistemas lhe respondem (laboral, familiar, de proteção social, fiscal, científico, entre outros), e a esfera macro ao nível da sustentabilidade socioeconómica dos países e regiões mundiais.

Prova do carácter socialmente construído do fenómeno do envelhecimento (Debert, 1999) é a recente tentativa de "requalificação" discursiva do envelhecimento ao surgir associado a uma pluralidade terminológica cujos adjetivos "produtivo ", "saudável", "bem- sucedido", "positivo" e "ativo" são a mais cabal ilustração. O objetivo destas novas terminologias públicas tem sido, desde a década de 1980, nos EUA, (AARP, 2010) e a década de 1990, na Europa, o de afastar a imagem e representação social negativa que pesa no conceito de envelhecimento, produto da estereotipia idadista negativa, denunciada pela documentação/legislação soft emanada por várias instâncias internacionais.

Falamos, por exemplo, da Primeira Assembleia Mundial do Envelhecimento (Viena, 1982); dos Princípios das Nações Unidas (NU) a favor das pessoas idosas (Resolução 46/91 das NU); da Proclamação das Nações Unidas sobre o Envelhecimento (Resolução 47/5 das NU); do Ano Internacional das Pessoas Idosas (1999); da Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento (2002, Madrid), da Declaração Política e do Plano Internacional de Ação de Madrid sobre Envelhecimento.

O Plano Internacional de Ação de Madrid sobre o Envelhecimento (ONU, 2002) destaca-se pela sua importância paradigmática e programática. É nele que se preconiza a necessidade de mudança da imagem social das pessoas velhas, da velhice e do envelhecimento; é nele também que se visibiliza a diferença entre homens e mulheres e as implicações das relações sociais de género no envelhecimento. Mas antes deste Plano, em 1997, a Organização Mundial de Saúde, inspirada pelos Princípios das Nações Unidas a favor das pessoas idosas (Resolução 46/91 das NU) apresentava o conceito de envelhecimento ativo definido como "o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança de forma a aumentar a qualidade de vida das pessoas à medida que envelhecem" (WHO, 2002: 12, tradução nossa). Também a União Europeia assumiu a retórica do envelhecimento ativo, estabelecendo metas até 2010 com vista a aumentar os níveis de emprego das pessoas mais velhas e retardar a saída do mercado de trabalho (Conselho Europeu de Estocolmo de 2001 e Conselho Europeu de Barcelona de 2002). Declarou inclusivamente o ano de 2012 como o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo.

Com o objetivo de promover uma representação positiva de envelhecimento, em 1999, a ONU denunciou alguns dos "mitos" comummente associados às pessoas idosas: 1) as pessoas idosas concentram-se nos países desenvolvidos; 2) a população idosa é homogénea; 3) homens e mulheres envelhecem de forma igual; 4) todas as pessoas idosas são física e biologicamente frágeis; 5) inexistência ou baixo contributo social por parte das pessoas idosas (não reconhecimento do valor do trabalho não pago), subavaliação do seu papel, sobrevalorização do trabalho pago; e 6) as pessoas idosas são um peso para as economias e sociedades.

Afirmando esta revalorização do envelhecimento, numa lógica de direitos humanos (e não de necessidades), reivindica-se um olhar diferente para o fenómeno e, espera-se, novas abordagens e soluções políticas em sociedades que valorizam o produtivo, a juventude e a autonomia. Estes são, aliás, alguns dos fatores que, segundo Anthony Traxler (1980), produzem uma imagem negativa de velhice, ou seja, o temor da morte e da velhice; a ênfase e valorização da juventude; a ênfase na produtividade; o viés nas investigações realizadas com pessoas idosas que focam a dependência e o declínio por estudarem essencialmente idosos/as institucionalizados/as (Traxler, 1980). Este combate é também um combate à estereotipia produtora de idadismo negativo (Butler, 1969; Palmore, 1999, 2005). O idadismo, ou seja, a discriminação baseada no preconceito de um grupo etário contra outros grupos etários, no caso das pessoas idosas, integra três elementos: i) as atitudes preconceituosas para com os/as idosos/as, tanto das pessoas de outros grupos etários, como das próprias pessoas idosas; ii) as práticas discriminatórias nos diferentes papéis sociais, especialmente a nível laboral; iii) as políticas e práticas institucionais que perpetuam crenças sobre a velhice (Butler, 1980; Palmore, 1999, 2005). Podendo direcionar-se a todos os grupos etários, ele é particularmente incidente na velhice e suas representações, associando a velhice, a dependência, decadência, doença, pobreza, incapacidade, inutilidade, degradação física e estética. A própria medicina anti-idade é uma forma de idadismo, que o envelhecimento como doença, empolando a sua depreciação (Palmore, 1999).

Associados aos impactos da estereotipia idadista, os efeitos da institucionalização das pessoas idosas vêm agravar o quadro representacional e as relações sociais que se têm com elas, uma vez que a institucionalização não significa mudança, mas também um corte no estilo de vida e nas identidades da pessoa idosa (Daniel, 2006a), determinando novas formas de reconhecimento e de relacionamento. Tem-se inclusivamente alertado para o facto de estas relações encobrirem, muitas vezes, formas de violência simbólica (Bazo, 2006), como a infantilização ou bebeísmo (Martins, 2004). Alguns estudos (Martins, 2004; Serra, 2010) apontam os estereótipos associados à falta de capacidade funcional que se transformam em violência na forma de tratamento da pessoa idosa como uma criança, infantilizando as formas de interação. Estas formas de violência simbólica, dificilmente percebidas e reconhecidas como tal, persistem porque são praticadas em nome do carinho e do bem cuidar. Assentam num leque de estereótipos idadistas negativos, que acentuam a dependência, o corte com os papéis sociais (e sexuais) passados, a falta de autonomia, a demência, etc. O combate a este tipo de estereotipia negativa tem feito um caminho considerável, requisitando na atualidade uma nova racionalidade social sobre o fenómeno e esta categoria social, como veremos no ponto seguinte. Estudar e conhecer as representações sociais das pessoas que trabalham nas instituições de cuidados a idosos e idosas afigura-se, por isso, fundamental, sendo espectável que, tal como a análise de Anthony Traxler (1980) alerta, estas pessoas enfatizem a estereotipia negativa, expressa numa visão de pessoa idosa ligada à institucionalização e despersonalização.

3. Estudo sobre as representações sociais de idosos e idosas institucionalizados/ as por parte do pessoal técnico Conscientes das ausências da análise de género nos estudos sobre velhice, e, em particular, nos estudos sobre representações sociais do fenómeno, procuramos, através do estudo aqui apresentado, contribuir para um olhar sexualizado do fenómeno. Assim, procurou-se analisar as representações sociais sobre o envelhecimento com um grupo de profissionais específico, entendendo que as "ideias" que se têm sobre determinados grupos determinam a forma como com eles se (inter)age (Doise, 1985; Moscovici, 1988). Mas também que as representações que temos de uma categoria ou grupo variam segundo a situação de evocação ou o quadro de referência no qual os discursos são produzidos (Doise, 1990). Por isso, partimos da hipótese central de que as representações destes/ as profissionais apresentam uma visão particularmente marcada pela estereotipia negativa, assente nas ideias de dependência. Inquirimos profissionais com funções de Direção Técnica em IPSS com respostas sociais dirigidas a idosos/as nos concelhos de Alcobaça e Porto de Mós. Inquirimos, em 2010, 22 diretoras técnicas que exercem as suas funções em 26 IPSS, das quais 19 no concelho de Alcobaça e 7 no concelho de Porto de Mós. Todas as inquiridas são do sexo feminino e têm formação académica de base nas áreas de Serviço Social, Política Social, Psicologia e Sociologia.

O estudo procurou conhecer as representações sociais sobre idosos e idosas de pessoas que com elas interagem em contexto de institucionalização, e a forma como este tipo de situações influencia as representações que profissionais apresentam destes dois grupos. As questões norteadoras desta investigação são as seguintes: Quais são as representações sociais das/os técnicas/os sobre homens e mulheres velhos/as? Quais os efeitos desse ponto de vista situado (a institucionalização) nessas representações? Que diferenças de género se destacam? As evocações assinalarão estereótipos e preconceitos (idadismo) comuns à categoria idoso/a institucionalizado/a, mas que diferenças de género?

3.1. Instrumentos Com o objetivo de acedermos às representações, foi utilizada a Técnica de Associação Livre de Palavras. De acordo com esta técnica basta a partir de um estímulo indutor "verbalizar o mais rápido possível as primeiras palavras que lhe vêm à mente" (Nóbrega e Coutinho, 2003, p. 59), realçando conteúdos não filtrados pela censura. Foram apresentados às participantes dois estímulos indutores: "Envelhecer no masculino faz-me lembrar " e "Envelhecer no feminino faz-me lembrar ", solicitando-se que associassem prontamente três evocações. Reforçou-se a ideia da utilização de uma expressão e não a utilização de frases.

3.2. Estratégia analítica Na organização das evocações dos estímulos indutores "Envelhecer no masculino faz-me lembrar " e "Envelhecer no feminino faz-me lembrar " efetuámos, em primeiro lugar, a contabilização das evocações apresentadas. As evocações referidas livremente pelas participantes foram submetidas a alguns agrupamentos. Convertemos todas as evocações que emergiram sob a forma de expressão verbal a um substantivo, sempre que esse procedimento se mostrou exequível. Relativamente àqueles dois estímulos indutores, procedemos ainda à organização das evocações, atribuindo-lhes uma valoração positiva e negativa. Utilizámos previamente o software Excel para a elencagem das evocações e a sua organização. Após este tratamento inicial exportámos para o software SPSS os dados no sentido de realizar o o tratamento descritivo das evocações.

3.3. Resultados Convertemos as expressões obtidas a partir dos dois estímulos indutores "Envelhecer no masculino faz-me lembrar " e "Envelhecer no feminino faz-me lembrar " em cento e trinta e duas frequências.

A tabela 1 reporta-se às evocações mais mencionadas nos dois dicionários. No que concerne ao dicionário Envelhecer no masculino faz-me lembrar as evocações modais são a "experiência" (16,7%), uma evocação positiva com uma identidade social ligada à maturidade, e "dependência" uma evocação negativa ligada à ausência de autonomia, à perda de funcionalidade. No dicionário Envelhecer no Feminino faz-me lembrar as maiores percentagens, ex aequo, são obtidas com as evocações "rugas", "solidão", "experiência" e "vida" (10%). As evocações mencionadas como modais referem-se a aspetos negativos, de características físicas (rugas) e isolamento e perda de rede (solidão) e a aspetos positivos como a "experiência" (mencionada também como modal no dicionário Envelhecer no masculino faz-me lembrar ) e a "vida", de conteúdo tributário de uma positividade ambivalente, simultaneamente de trajetória, realização, mas também de fardo ou mesmo fado/destino.

Tabela 1 Evocações com maior representatividade por dicionário (%)

A tabela 2 apresenta as evocações comuns aos dicionários. O conteúdo partilhado pelos estímulos "Envelhecer no feminino faz-me lembrar " e "Envelhecer no masculino faz-me lembrar " que surge com a mesma proporção em ambos os dicionários são "família", "lazer" e "vida", com 6,3%, 6,3% e 9,4%, respetivamente. A representação do envelhecimento feminino e masculino ancora numa raiz familialista e numa ideação associada ao tempo livre e corte com os tempos do trabalho. No que concerne às evocações com maior percentagem, a evocação "experiência" surge em ambos os dicionários como evocação modal, contudo no dicionário Envelhecer no masculino ela emerge juntamente com "dependência" enquanto no dicionário Envelhecer no feminino faz-me lembrar ela surge concomitantemente com outras evocações modais como "solidão" e "vida".

Tabela 2 Evocações comuns aos dicionários (%)

Os atributos exclusivos dos dicionários Envelhecer no masculino faz-me lembrar e Envelhecer no feminino faz-me lembrar fazem ressaltar as especificidades representacionais (tabela 3). Se, por um lado, no dicionário Envelhecer no masculino faz-me lembrar , emerge a "perda", a "proteção", a "resignação" e a "teimosia ", isto é, valências associativas de cariz negativo do processo de envelhecimento; na representação "Envelhecer no feminino faz-me lembrar " emergem evocações mistas como "resistência", "ternura", "degradação" e "cuidados". É importante salientar que, nas evocações "Envelhecer no feminino faz-me lembrar ", continuam a surgir elementos relacionados com o aspeto físico ("rugas") e com os papéis sociais e familiares desempenhados ("avó").

Tabela 3 Evocações exclusivas aos dicionários (%)

A partir das 132 evocações dos dois dicionários, identificámos 122 evocações que referiam aspetos positivos e negativos. Podemos constatar que a representação do envelhecer no feminino é mais homogénea quando são analisadas as ocorrências negativas (existe maior partilha nas evocações negativas). Pelo contrário, a representação do envelhecer no masculino é mais homogénea quando são analisados os estímulos positivos, como se pode verificar pela leitura do gráfico 1.

Gráfico 1 Total de ocorrências positivas e negativas

Conclusões Com este estudo identificámos as representações sociais sobre o envelhecer no masculino e no feminino, das diretoras técnicas de 26 IPSS, um contexto institucional que marca as imagens representacionais das categorias de idoso e idosa, explorando diferenças na estereotipia de género associada à estereotipia idadista. Pudemos verificar a hipótese central de associação da categoria à estereotipia negativa, de onde se destaca a "dependência" como traço comum e homogeneizante de pessoa idosa, quer se trate de uma mulher ou de um homem. Comprova- se assim o efeito da situação de evocação, emergindo a institucionalização como produtora de uma visão de pessoa idosa centrada na dependência, perda de autonomia (Traxler, 1980). A institucionalização provoca uma espécie de libertação das rígidas expetativas dos papéis sexuais, fruto das características das pessoas idosas institucionalizadas. A "dependência" impõe-se como marca identitária destas pessoas que deixaram a "idade ativa", e as funções de provisão de recursos (geralmente associada ao masculino) e de cuidado de terceiras pessoas (geralmente associada ao feminino), e passam a depender dos cuidados institucionalizados. A prevalência desta ideia será como uma marca da ideologia da fragilidade física e da dependência económica das pessoas idosas, como refere Calasanti (2009).

Porém, e não obstante este poderoso efeito homogeneizador da institucionalização sobre as representações, foi possível constatar a força da estereotipia de género. Para estas profissionais "o envelhecer no masculino" não é igual ao "envelhecer no feminino". O envelhecimento no masculino ancora tanto na "dependência" como na "experiência". Existem atributos relacionados com a perda de funcionalidade e de autonomia, dominantes na estereotipia associada ao masculino (Amâncio, 1998) e com uma identidade social ligada à maturidade e acumulação de competências; o positivo e o negativo emergem como evocações modais, portanto. No envelhecer no feminino a ideia de "dependência" não emerge com evocação modal. Os aspetos negativos realçados remetem para perdas em dimensões estereotipicamente valorizados no feminino, a beleza física ou ideal estético ("rugas") e o domínio relacional e familiar ("solidão"). A decadência biológica é empolada quando se pensa no envelhecimento das mulheres, sinal da centralidade do corpo e da beleza na identidade feminina valorizada. no entanto que destacar os atributos positivos realçados no envelhecimento feminino, como a "resistência", "ternura" e "dedicação" a par de atributos relacionados com papéis de género "avó". Note-se que não surgiu nenhuma evocação do masculino associado à palavra avô. A palavra "avó", "rugas", "saudade" e a "ternura" aparecem assim como exclusivos do "envelhecer no feminino".

Concluímos com a persistência de estereotipia idadista, mas esta é atravessada pela estereotipia de género na definição de imagens sobre os idosos e idosas.

Pesarão essas diferenças na nova retórica política que revaloriza o envelhecimento ativo, produtivo? Terão os homens idosos e as mulheres idosas os mesmos recursos estatutários para responder a essa nova retórica do envelhecimento ativo? Que expressão têm os indutores de mudança (políticas públicas, novas terminologias) que destacámos acima e que perspetivamos analiticamente centrais na compreensão da representação deste fenómeno sobre a mudança no consenso social implícito nos contratos de género e o combate à representação e estereotipia negativa de envelhecimento? São algumas questões que deixamos em aberto com este trabalho. Esperamos com ele ter contribuído para o que Calasanti (2010) afirma como o potencial de análises que focando a desigualdade proporcionem novas e mais efetivas pesquisas, práticas e políticas para as pessoas, homens e mulheres, de idade avançada.

Assumimos que existe uma tensão, e até mesmo uma certa dislexia pública em torno do fenómeno do envelhecimento e da velhice ' por um lado a prevalência de estereótipos idadistas negativos visíveis nos pictogramas que representam as pessoas idosas maioritariamente com a solidão, doença, dependência, tristeza e institucionalização (Daniel, Antunes e Amaral, 2012; Oliveira et al., 2011).

Por outro lado, existe um discurso político internacional e nacional que induz a estereotipia positiva, plasmada no conceito de envelhecimento ativo, que quer manter os/as idosos/as na participação cívica, política e económica, o mais possível. Ora esta tensão aportará, certamente, desafios à forma como idosos e idosas passarão a ser representados relativamente ao ideal normativo de "envelhecimento ativo".


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