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BrBRCVHe0004-28032002000400004

BrBRCVHe0004-28032002000400004

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0004-2803
Year2002
Issue0004
Article number00004

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Expressão dos antígenos ABH e Lewis na gastrite crônica e alterações pré- neoplásica da mucosa gástrica ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO As gastrites são alterações histológicas da mucosa gástrica onde se observa infiltrado de células inflamatórias(32). A inflamação pode ser aguda, crônica ou apresentar formas especiais. A gastrite crônica bacteriana que está associada à infecção pela bactéria Helicobacter pylori, é o tipo de maior freqüência. Esta bactéria é também considerada um dos agentes causadores da úlcera péptica e atua como co-fator na etiologia das malignidades gástricas.

A bactéria H. pylori coloniza especificamente a mucosa gástrica e as microvilosidades gástricas das células epiteliais. Os mecanismos moleculares que intermediam a inflamação e as doenças ulcerativas em resposta à infecção pela bactéria não estão totalmente compreendidos, porém sua erradicação leva à cura da doença ulcerosa e também à redução na taxa de recurrência. Além do H.

pylori, muitos outros fatores ambientais (álcool, fumo, dieta, etc.) e genéticos (grupos sangüíneos, complexo principal de histocompatibilidade, etc.) estão interelacionados na etiologia dessas doenças(31).

A taxa de infecção populacional pelo H. pylori apresenta uniformidade relacionada ao grau de desenvolvimento dos países(16): nos desenvolvidos, a taxa varia entre 25% a 50%, enquanto naqueles em desenvolvimento está em torno de 70%-90%. Em Belo Horizonte, MG, COELHO et al.(6) descreveram que, em 51 pacientes sintomáticos, a prevalência da infecção pelo H. pylori foi de 80%. Em Belém, PA, NETO(18) encontrou prevalência de 57,14% da bactéria, enquanto que SAGICA(24) encontrou taxa superior a 70% em diferentes amostras de pacientes com gastrite crônica.

Os prováveis receptores do H. pylori no epitélio gástrico são carboidratos das mucinas gástricas, que têm papel primordial na proteção da mucosa gástrica. Os antígenos de grupos sangüíneos ABH e Lewis fazem parte da composição das mucinas gástricas e têm sido implicados como receptores da bactéria na mucosa gástrica(4).

A síntese e regulação dos antígenos de grupos sangüíneos ABH e Lewis envolve o produto dos genes ABH, Secretor e Lewis (Figura_1). Esta biossíntese se pela adição de monossacarídios feita por diferentes glicosiltransferases à cadeia precursora (glicosilação). A capacidade de secreção dos antígenos ABH nos fluidos corporais (saliva, sêmen, secreção vaginal, muco gástrico) está presente nos indivíduos que apresentam o gene Se, sendo classificados como secretores. O tipo de antígeno secretado dependerá do genótipo do indivíduo. Os indivíduos que não apresentam este gene (sese), não expressam os antígenos ABH nas secreções, e quando portadores do gene Lewis secretam apenas o antígeno Lea (8).

A expressão dos antígenos ABH e Lewis varia de acordo com a origem embriológica do tecido, seu estágio de desenvolvimento e sua regulação gênica. No caso do epitélio gástrico normal de indivíduos adultos, a região superficial (ou foveolar) do tecido, está sob controle do gene Secretor, enquanto que na zona profunda ou glandular, esta expressão ocorre independente deste gene(23).

Os fenótipos de grupos sangüíneos no indivíduo podem apresentar variações sob certas condições fisiológicas e doenças, como as neoplasias(10). Entre essas alterações temos a expressão aumentada do antígeno Lea,conseqüente do bloqueio da síntese do antígeno Leb(29). Outro exemplo é a alteração na expressão de antígenos que são sintetizados pela enzima produto do gene Secretor, levando à expressão do antígeno Leb, em não-secretores(25).

Apesar de todas as demonstrações favoráveis à hipótese que esses antígenos influenciam a infecção e a colonização da mucosa gástrica, alguns estudos mostraram aparente perda de consistência dessa associação(19, 28, 30). Desta forma, ainda existe muita controvérsia gerada, principalmente, por esses diferentes resultados, assim como pelas diferentes naturezas de cada estudo.

No presente estudo, foram analisadas as distribuições dos antígenos de grupos sangüíneas ABH e Lewis na mucosa gástrica com graus variáveis de gastrite crônica, associadas à presença da bactéria H. pylori.

MATERIAL E MÉTODOS Analisaram-se biopsias gástricas, saliva e sangue periférico de 63 pacientes não-consecutivos, submetidos a exame endoscópico nos Hospitais Universitários Bettina de Ferro Souza e João de Barros Barreto (Universidade Federal do Pará, Belém, PA), durante o período de março a novembro de 1998. As amostras de sangue e saliva dos pacientes foram colhidas antes do exame endoscópico, para a caracterização dos fenótipos ABO, Lewis e Secretor. Previamente à coleta das amostras, foi solicitada a autorização dos pacientes para a obtenção e utilização das amostras na pesquisa, através de termo de consentimento livre e esclarecido.

As biopsias foram fixadas em solução de formalina a 10% e encaminhadas ao Laboratório de Anatomia Patológica do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará, onde foram processadas em álcool e parafinizadas.

Posteriormente, foram realizados cortes histológicos seqüenciais de 5 mm de espessura, dispostos em lâminas e coradas pela hematoxilina-eosina (HE) e pelo Gram modificado. As lâminas coradas pela HE foram utilizadas na análise histopatológica, enquanto que o método de coloração do Gram modificado, para a detecção do H. pylori, mediante suas características morfológicas: forma curva e espiralada, e coloração azul intensa. Todos os pacientes selecionados apresentaram diagnóstico histológico de gastrite crônica. Pacientes com outras afecções gástricas foram excluídos desta análise.

As amostras de saliva e sangue dos pacientes foram encaminhadas para o Laboratório de Imunogenética do Departamento de Genética da Universidade Federal do Pará para a caracterização dos antígenos de grupos sangüíneos. A colheita da saliva foi realizada em copo descartável, transferida para um tubo de ensaio e mantida a 4ºC. Simultaneamente foram coletados 5 mL de sangue periférico de cada paciente. A presença dos antígenos de grupos sangüíneos ABH e Lewis no sangue e na saliva dos mesmos foi determinada através da técnica dot-blot-ELISA, modificada de PFLUG et al.(22), utilizando anticorpos monoclonais das empresas Biotest (anti-A, anti-B, anti-Ulex europaeus, anti-Lea e anti-Leb) como anticorpos primários e Sigma (anti-IgM de camundongo conjugado à fosfatase alcalina) como anticorpo secundário. As diluições dos anticorpos eram realizadas segundo as especificações dos fabricantes. O teste dot-blot- ELISA oferece alta especificidade e sensibilidade através do ensaio com anticorpos monoclonais e marcação enzimática, proporcionando reação positiva facilmente detectável pela mudança de cor visível, tornando a leitura dos resultados simples, rápida e exata, substituindo desta forma, as técnicas sorológicas convencionais.

Nas biopsias dos pacientes estudados, a expressão dos antígenos de grupos sangüíneos A, B, H, Lea e Leb foi determinada imunohistoquimicamente, segundo a técnica da imunoperoxidase indireta(20, 21), utilizando os mesmos anticorpos primários utilizados na técnica dot-blot-ELISA, e o anticorpo secundário conjugado à peroxidase (IgM Sigma).

O padrão de reação para os antígenos ABH e Lewis nas regiões da mucosa gástrica foi classificado segundo o tipo de coloração encontrada. Foram consideradas positivas as reações que coraram de forma homogênea toda região analisada, enquanto foram agrupadas em padrão de reação heterogênea, as que continham células com e sem coloração.

Como controle do presente estudo, foram analisadas 70 amostras de sangue de indivíduos da população da cidade de Belém, sem sintomas gástricos, para distribuição dos antígenos de grupos sangüíneos ABH e Lewis.

Foram empregados testes estatísticos adequados para a comparação, visando detectar ou não diferenças significativas entre os grupos, objeto deste estudo.

O programa de computação utilizado foi o Bio Estat(2), com os testes do qui- quadrado e teste G. A significância estatística foi definida em 95% (P valor <0.05).

RESULTADOS Do total de 63 pacientes analisados nesta série, 32 eram do sexo masculino e 31 do feminino, com média de 47 anos de idade e mediana de 48 anos.

Os estudos histopatológicos e as relações epidemiológicas As alterações histopatológicas dos pacientes da amostra estão descritos na Tabela_1.

As associações testadas entre os resultados histopatológicos revelaram significância entre diversas variáveis. A relação entre o grau de inflamação e o grau de colonização pelo H. pylori, indicou inflamação mais severa em 43% (16/37) dos espécimes colonizados com maior intensidade, enquanto que 81% com inflamação leve apresentavam número reduzido de bactérias (6/26) ou não estavam infectados (57,69%) (c2= 8,82; P = 0,0122).

A Tabela_2 indica que nas biopsias com graus de inflamação de moderado a intenso (inflamação forte), havia com freqüência a presença de infiltrado neutrofílico (c2= 9,39; P= 0,0022), assim como a presença de infiltrado neutrofílico é maior nos infectados pelo H. pylori versus não-infectados (c2 = 3,547; P= 0,0596).

De acordo com a Tabela_3, a maioria dos infectados pelo H. pylori tem maior ocorrência de folículos linfóides (teste-G = 8,5703; P = 0,0138), se comparada com o baixo número de folículos linfóides observados nos não-infectados.

Observou-se, também, aumento da ocorrência dos folículos linfóides (teste-G = 13,5552; P = 0,0011), associado com a maior gravidade da inflamação gástrica.

Existe, também, relação entre a presença da atividade neutrofílica e a maior freqüência de folículos linfóides (teste-G = 6,4109; P= 0,0405).

Não foram encontradas diferenças ou associações estatisticamente significativas na relação entre as variáveis: inflamação e metaplasia, inflamação e displasia, H. pylori e metaplasia, H. pylori e displasia, metaplasia e displasia, metaplasia e atividade, metaplasia e folículo linfóide, folículo linfóide e displasia, displasia e atividade, folículo linfóide e atividade.

Fenotipagem dos antígenos ABH e Lewis na saliva e nos eritrócitos Na distribuição fenotípica dos grupos sangüíneos Lewis testados (Tabela_4) observou-se discordância na expressão destes antígenos entre eritrócito e saliva, permitindo agrupar os indivíduos em: Lewis concordantes e Lewis discordantes. Os concordantes tinham antígenos Lewis idênticos no sangue e na saliva, nos discordantes, os antígenos dos eritrócitos eram diferentes das especificidades presentes na saliva. Esta discordância representa 23,8%(n = 15/ 63)do total da amostra, sendo que 17,5% (11/63) deste total pertenciam ao fenótipo eritrocitário Le(a-b-).

Quando se compara a distribuição dos subtipos dos fenótipos dos grupos sangüíneos ABO, nota-se inversão nas freqüências (teste-G = 19,4210; P = 0,0006) referentes à distribuição dos subtipos A1 e A2 entre a amostra de pacientes e a amostra da população em geral (Tabela_5).

Perfil imunohistoquímico do epitélio gástrico na amostra de pacientes Na análise do padrão de expressão dos antígenos ABH na borda da mucosa de secretores, o antígeno H foi expresso em 77,78% dos indivíduos (49/63). Porém, em 6,35% (4/63) esta expressão foi heterogênea. Também quanto à expressão do antígeno H, foi encontrado um indivíduo não-secretor (1,58%), exibindo padrão de reação heterogêneo na borda da mucosa gástrica (Figura_2).

Entre os indivíduos secretores pertencentes aos grupos sangüíneos A (n = 15/63; 23,81%) e AB (1/63) na amostra, 12 (19,04%) expressavam o antígeno A na borda da mucosa gástrica. Entre os não-secretores, dois (3,17%) apresentaram padrão heterogêneo de reação na borda da mucosa gástrica (Figura_2).

Nos secretores pertencentes ao grupo sangüíneo B (n = 4; 6,34%) e AB (1/63), a expressão do antígeno B na borda da mucosa gástrica foi observada em 100% dos indivíduos. Um indivíduo não-secretor (1,58%) apresentou padrão de reação negativo para o antígeno B na borda da mucosa (Figura_2).

O antígeno Lea foi detectado em 18 (28,57%) dos 63 pacientes da amostra. Em 10 pacientes (15,87%) secretores houve expressão deste antígeno na borda da mucosa gástrica. Deste total, três (4,76%) apresentavam padrão heterogêneo. Todos os oito indivíduos não-secretores (100%) apresentaram a expressão deste antígeno na região foveolar da mucosa gástrica, assim como, expressaram também o antígeno Lebna borda da mucosa, sendo que em um (12,5%) indivíduo o padrão da reação foi heterogêneo. O antígeno Leb foi detectado na superfície da mucosa de 52 dos 55 secretores (94,54%) da amostra, sendo que 5 (9,61%) dos 52 tinham expressão heterogênea (Figura_3).

Nos pacientes com metaplasia intestinal na mucosa gástrica, foi verificada a expressão dos antígenos ABH, Lea e Leb em áreas de tecido normal e áreas com metaplasia. Notou-se que o perfil imunohistoquímico diferiu marcadamente entre o epitélio gástrico e as glândulas metaplásicas na expressão dos antígenos H e Lea(Figuras_4 e 5). Observou-se perda de reatividade para o antígeno H nas áreas onde metaplasia, enquanto que para o antígeno Lea houve ganho de expressão.

Distribuição dos grupos sangüíneos ABH e Lewis na amostra de pacientes e sua relação com a infecção pela H. pylori Quanto à prevalência do H. pylori, entre os grupos sangüíneos ABO, Lewis e Secretor, não foram encontradas diferenças significativas entre indivíduos de diferentes grupos sangüíneos na amostra de pacientes infectados versus não- infectados pelo H. pylori(Tabelas_6, 7 e 8).

Interrelações dos fenótipos de grupos sangüíneos salivar e eritrocitário com a distribuição dos antígenos na superfície da mucosa gástrica Levando-se em consideração os dados histopatológicos dos pacientes com fenótipos Lewis discordantes (15/63), 7/63 (11,11%) estavam infectados pelo H.

pylori, 2/63 (3,17%) apresentavam alterações pré-malignas no tecido gástrico, 4/63 (6,35%) apresentavam tanto a infecção pelo H. pylori, quanto alterações pré-malignas no epitélio gástrico e somente 2/63 (3,17%) não estavam infectados pela bactéria nem apresentavam alterações pré-malignas no tecido. Constatou-se ainda que entre 60% (9/15) dos pacientes agrupados como Lewis discordantes e do fenótipo eritrocitário Le(a-b-) e que na saliva secretavam as substâncias ABH e Leb, a reatividade para estes antígenos no epitélio gástrico concorda com o fenótipo salivar.

Nos pacientes Lewis concordantes (48/63; 76,19%), 33 (52,38%) indivíduos apresentaram distribuição anormal dos antígenos ABH e Lewis na borda da mucosa gástrica, sendo que 9/63 (14,29%) pacientes estavam infectados com o H. pylori, 10 (15,87%) biopsias apresentavam alterações pré-malignas no tecido gástrico, 13/63 apresentavam concomitantemente a infecção pela bactéria e alterações pré- neoplásicas na mucosa gástrica e apenas em 1/63 (1,59%) não foi detectada a presença da bactéria ou alterações como a metaplasia e a displasia no tecido gástrico.

DISCUSSÃO Nos últimos anos, muitos mecanismos têm sido propostos para explicar o sucesso da bactéria H. pylori em colonizar um ambiente hostil como o estômago humano (15). Porém, a presença da bactéria não constitui fator exclusivo no desenvolvimento dessas patologias. Fatores ambientais e a predisposição genética do indivíduo também contribuem para o aparecimento desses tipos de achados(26). Neste estudo, a taxa de infecção pela bactéria encontrada está de acordo com valores esperados para a população de Belém, PA(18, 24) e Brasil(6).

Porém, é bem provável que os valores de positividade nesta amostra estivessem aumentados se métodos diagnósticos mais sensíveis fossem utilizados, como por exemplo, a sorologia para anticorpos contra o H. pylori, isso porque a sensibilidade do exame histopatológico depende da distribuição da bactéria na mucosa gástrica, que se de forma focal ou segmentada. Esta diferença de positividade devido à sensibilidade do método foi demonstrada recentemente por AZEVEDO e BARROS(3), em um grupo de pacientes com gastrite crônica, em que o índice de positividade para a bactéria na análise histopatológica foi de 68%, enquanto que pelo exame sorológico, foi superior a 90%. Outro fator relevante é que entre os pacientes diagnosticados como H. pylori negativos, 15,87% (10/63) apresentavam metaplasia intestinal. Na metaplasia é incomum a presença da bactéria, pois este tipo de epitélio não favorece seu crescimento(31).

Atualmente, existem evidências de que o grau de gravidade da gastrite está relacionado ao grau de colonização da mucosa gástrica pelo H. pylori(34), em concordância com o que foi encontrado neste estudo. A relação encontrada entre a atividade neutrofílica e o grau de inflamação é, possivelmente, conseqüência da infecção pelo H. pylori(14). A intensidade do infiltrado neutrofílico variou entre indivíduos e está, possivelmente, relacionada com o dano inflamatório da mucosa e, provavelmente, com o tipo de cepa da bactéria presente(31) e não com o grau de colonização na mucosa. O H. pylori produz substâncias quimiotáticas que atraem e ativam neutrófilos e outras células inflamatórias que, através de estímulo intermitente, geram a agressão dos tecidos do hospedeiro(34).

A mucosa gástrica normal não apresenta folículos linfóides, normalmente encontrados na mucosa do cólon e do intestino delgado. A presença de folículos linfóides neste estudo está relacionada ao grau de inflamação da mucosa, à presença do H. pylori e à atividade neutrofílica. Estas correlações descritas previamente, sugerem que a proliferação linfocítica está relacionada à resposta imune do hospedeiro pela presença do H. pylori(27).

Observou-se discordância entre os fenótipos eritrocitário e salivar dos antígenos Lewis nos pacientes. Os antígenos Lewis são produzidos a partir de células epiteliais exócrinas que liberam estes antígenos no plasma, do qual são adsorvidos às hemácias. Desta forma, a expressão desses antígenos ao nível eritrocitário pode não refletir o verdadeiro fenótipo Lewis. Algumas condições fisiológicas e de doenças, podem tornar o indivíduo incapaz de sintetizar os antígenos em quantidades detectáveis sorologicamente nas hemácias, porém o fenótipo Lewis salivar permanece inalterado. Assim, foi detectada a presença de Lea e Leb na saliva e/ou nas células gástricas de todos os pacientes fenotipicamente positivos, independentemente da expressão dos antígenos Lewis nos eritrócitos. Nesses casos, onde existe a discordância eritrócito-saliva, o fenótipo expresso no epitélio foveolar dos pacientes, concorda, na sua maioria, com o fenótipo salivar(10).

Existem na literatura poucos estudos epidemiológicos de predisposição genética para doenças gástricas. Entretanto, estudos prévios mostraram associação dos antígenos de grupos sangüíneos Lewis e ABH com a susceptibilidade à colonização pelo H. pylori. ALKOUT et al.(1) evidenciaram que o aumento da susceptibilidade dos indivíduos do grupo O para infecção pelo H. pylori, poderia ser parcialmente causado por densidade elevada de colonização por esta bactéria comparada aos outros grupos sangüíneos. ILVER et al.(12) indicaram que existe maior susceptibilidade entre os indivíduos dos grupos sangüíneos O e Leb à infecção pelo H. pylori, por estes apresentarem maior quantidade de antígenos fucosilados, que o receptor da bactéria à superfície gástrica contém fucose (4).

Quando a prevalência do H. pylori foi analisada na presente série e comparada à amostra da população da cidade de Belém, considerando os fenótipos de grupos sangüíneos ABO, Lewis e estado Secretor de ABH, não foi encontrada nenhuma diferença significativa, a exemplo do que tem sido descrito em estudos prévios (30, 33). Porém, resultado interessante a ser destacado é a associação com os subgrupos do tipo sangüíneo A. Observou-se que no grupo de pacientes houve o predomínio do subgrupo A2, enquanto que, na amostra da população em geral, a freqüência de A1 é muito mais elevada do que A2. A diferença entre estas variantes antigênicas se pelo fato da transferase A1 ser mais eficiente que a transferase A2 na conversão do antígeno H, para a formação do determinante A (13). Dessa forma, a principal diferença entre os dois subgrupos de A é que a quantidade de substância H convertida em antígeno A é maior no subgrupo A1.

Isto pode justificar parcialmente o aumento da freqüência do subgrupo A2 na amostra de pacientes, que este fenótipo A2 tem maior quantidade de substância H, e portanto, maior disponibilidade de antígenos fucosilados. É importante ressaltar que se desconhece entre os estudos realizados com a associação dos grupos sangüíneos e a infecção pelo H. pylori, que em algum deles tenha sido investigada a freqüência dos subgrupos de A entre as doenças gástricas.

Nos dados analisados para o epitélio foveolar de indivíduos secretores, constatou-se que a expressão dos antígenos ABH e Leb totalizou mais de 80% da amostra e que o perfil de expressão destes antígenos, nos casos de gastrite crônica com ausência de alterações pré-malignas, não mostrou diferença em relação ao padrão clássico de expressão na mucosa gástrica. Por outro lado, na maioria dos pacientes onde ocorreu reação negativa ou havia reação positiva, mas com padrão de expressão heterogêneo para estes antígenos, foi constatada comumente a presença de metaplasia intestinal e/ou de infecção pelo H. pylori.

Este achado demonstra que o padrão de glicosilação parece sofrer alterações gradativas e progressivas ocasionadas pela infecção bacteriana que, conseqüentemente, influencia no padrão de diferenciação e regulação tecidual (5).

Em alguns indivíduos secretores da amostra de pacientes, houve também a co- expressão dos antígenos Lea e Leb no epitélio foveolar da mucosa. Dados publicados por ERNST et al.(9) citam que a ocorrência da síntese e co-expressão destes antígenos Lewis no epitélio foveolar de secretores é compatível com a síntese e distribuição normal destes antígenos. Desta forma, SAKAMOTO et al.

(25) dividem os indivíduos secretores em dois grupos, segundo a expressão do antígeno Lea no epitélio foveolar da mucosa gástrica: um grupo expressando o antígeno Lea juntamente com o antígeno Leb, e outro onde não expressão de Lea em nenhuma região do epitélio. Explicação encontrada para esta variação é que, em heterozigotos para o gene Secretor, haja atividade diminuída das a-1, 2-fucosiltransferases na mucosa de secretores, viabilizando, assim, a produção do antígeno Leª.

Foi observada a perda de expressão do antígeno A na mucosa de quatro pacientes secretores da amostra. Em dois deles havia metaplasia e nos outros dois havia processo inflamatório acentuado da mucosa gástrica. Por outro lado, nos pacientes não-secretores, foi observada expressão normal do antígeno Leª, além da expressão freqüentemente incompatível do antígeno Leb. Esta expressão residual do antígeno Leb no epitélio foveolar de pacientes não-secretores poderia ser devido a outra a-2-fucosiltransferase, provavelmente pela enzima H.

De acordo com MURATA et al.(17), a presença da inflamação poderia mudar o padrão de expressão relativo aos antígenos de cadeias tipo 1 e 2, descritas para tecidos normais.

As modificações no padrão de expressão dos antígenos do tipo carboidratos podem estar correlacionadas com o prognóstico de doenças malignas(7). As mais encontradas envolvem o desaparecimento ou perda de certos antígenos, seguidos pela neo-expressão de outros, gerando expressão de antígenos incompatível com o genótipo do indivíduo(25). Tem sido verificado(11) que determinados casos de metaplasia intestinal exibem secreção alterada de mucinas. Neste sentido, a expressão inapropriada dos antígenos Lewis foi descrita por TORRADO et al.(29), onde indivíduos do fenótipo Le(a-b+) desenvolvem bloqueio na síntese do antígeno Leb, resultando no acúmulo dos precursores e formação intensificada do antígeno Lea. Os resultados do presente estudo também indicam expressão acentuada do antígeno Lea em áreas com metaplasia intestinal na mucosa de secretores. Esta expressão inapropriada do antígeno Lea ocorreu em 76% dos casos com lesões pré-malignas e somente em 29% com gastrite crônica. E ainda, neste grupo sem lesões pré-malignas e que expressavam Lea, 18% dos pacientes estavam infectados pelo H. pylori. Tais evidências sugerem que a progressiva expressão do antígeno Lea sofre influência na evolução do processo cancerígeno.

Ao contrário do antígeno Lea, o antígeno H revelou expressão decrescente nas áreas de metaplasia intestinal. Isto deve ocorrer pela diminuição da atividade do gene Secretor, determinando que grande parte do precursor seja transformado em antígeno Lea, pela enzima do gene Lewis, diminuindo, assim, a expressão do antígeno H e Leb nestes tecidos e, conseqüentemente, provocando as freqüentes deleções de antígenos A e/ou B, proporcionando a atividade aumentada da enzima Lewis e neo-expressão de Leª. Tal relação é de interesse, porque padrões anômalos de expressão de antígenos do tipo carboidratos podem estar associados com o aumento do risco relativo de transformação maligna e/ou de elevado potencial metastático. Estes achados sugerem função importante de verificação da expressão da Lea, como marcador associado a mudanças no padrão de proliferação e diferenciação celular e, também, de alteração da expressão dos antígenos de grupo sangüíneo na superfície celular, podendo auxiliar decisivamente no diagnóstico e prognóstico de diversas afecções gástricas.

Estudos adicionais são necessários para melhor elucidar mecanismos genéticos e interações gene-ambiente no processo multifatorial da carcinogênese gástrica.

CONCLUSÕES A taxa de infecção pelo H. pylori detectada na amostra de pacientes é compatível com as taxas de prevalência descritas para a população da cidade de Belém e outras regiões de países em desenvolvimento. A prevalência da infecção pelo H. pylori não mostrou associação significativa com os fenótipos ABO, Lewis e Secretor, entretanto a freqüência aumentada de antígenos fucosilados (O, A2 e Leb) são indicadores de predisposição genética dos portadores destes fenótipos de grupo sangüíneo para as doenças gástricas.

No grupo de pacientes, as freqüências dos subgrupos de A (A1 e A2) apresentavam diferenças significativas quando comparadas com as freqüências da amostra da população de Belém.

O perfil de expressão dos antígenos ABH e Leb no epitélio foveolar de pacientes secretores, com gastrite crônica, porém sem lesões pré-malignas, não diferiu significativamente, em relação ao padrão clássico de expressão da mucosa gástrica.

Nas áreas do epitélio com metaplasia intestinal, foi observada perda de expressão dos antígenos H e Leb, provável conseqüência da inibição da atividade enzimática, com acúmulo do precursor de cadeia tipo 1, reduzindo a expressão de antígenos ABH e Leb. Ainda, a expressão acentuada de Lea em pacientes secretores e, particularmente, em áreas com metaplasia, indica que a progressiva expressão deste antígeno sofre influência na evolução para transformação maligna.

Em pacientes não-secretores, foi observada a expressão normal do antígeno Lea, além da expressão freqüentemente incompatível do antígeno Leb, o que pode ser devido a outra a-2-fucosiltransferase, possivelmente pela enzima H.

Os antígenos de grupos sangüíneos investigados refletem padrões diferentes de diferenciação celular, constituindo-se em potenciais marcadores, utilizáveis no diagnóstico e prognóstico de diversas doenças gástricas.


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