Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

BrBRCVHe0004-28032003000400005

BrBRCVHe0004-28032003000400005

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0004-2803
Year2003
Issue0004
Article number00005

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

Metaplasia intestinal especializada de esôfago distal na doença do refluxo gastroesofágico: prevalência e aspectos clínico-epidemiológicos ARTIGO ORIGINALORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO A metaplasia intestinal especializada (MIE) pode ser classificada, de acordo com os achados endoscópicos e histológicos, em três grupos: Barrett longo (BL), Barrett curto (BC) e metaplasia intestinal da cárdia (MIC)(17, 33, 38). O esôfago de Barrett (EB) é uma doença adquirida que ocorre em aproximadamente 10% a 13% dos indivíduos com doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), representando condição pré-neoplásica(13, 14, 15, 17, 18, 32, 33). É caracterizado por substituição do epitélio escamoso estratificado pelo metaplásico colunar especializado, contendo células caliciformes(12, 38).

Resulta da agressão ácida crônica e está diretamente relacionado ao desenvolvimento do adenocarcinoma de esôfago(12, 28, 32). A incidência desta complicação chega a até 0,8% na MIE(17, 21, 35, 37).

Biopsias realizadas em epitélio de aspecto endoscópico róseo-salmão, independentemente de sua extensão, que ao exame histológico revelem a presença de MIE com células caliciformes, fornecem o diagnóstico de EB(37, 38), que pode ser classificado em curto, menor do que 3 cm de extensão, e longo, cuja extensão é maior ou igual a 3 cm(1, 32, 33). Biopsias realizadas imediatamente abaixo da junção escamocolunar (JEC) são capazes de revelar MIE, mesmo quando o EB sequer é suspeitado endoscopicamente(36). Este achado pode representar MIC, que ainda é objeto de discussões quanto à etiologia(24, 33, 36, 41). uma associação bem definida entre EB, mesmo de segmento curto, e o adenocarcinoma de esôfago, porém a associação com MIC ainda não está bem definida, sendo citada pela literatura como possível, não estando claro se o risco entre as duas entidades é equivalente e se merecem a mesma vigilância endoscópica(10, 29, 33, 37).

Cronicidade da DRGE, sexo, idade, raça, consumo de tabaco e álcool são fatores envolvidos no desenvolvimento da MIE de esôfago distal.

Os objetivos deste estudo foram determinar a prevalência de MIE, BL, BC e MIC em pacientes encaminhados à realização de endoscopia digestiva alta (EDA) devido a sintomas da DRGE, e comparar a distribuição dos fatores clínico- demográficos entre os pacientes com e sem MIE e entre os com EB e MIC.

METODOLOGIA Pacientes De abril a outubro de 2002, o Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR), Curitiba, PR, avaliou 1.677 pacientes adultos, encaminhados do ambulatório para realização eletiva de EDA, por indicações clínicas diversas. Destes, 428 foram referidos devido a sintomas de DRGE. Foram convidados a participar do estudo aqueles que não apresentaram critérios de exclusão, que eram: idade menor que 18 anos, diagnóstico prévio de EB (independentemente da extensão), imunossupressão, acalásia, câncer, varizes de esôfago, coagulopatia ou qualquer outra condição clínica que contra-indicasse biopsias de esôfago, bem como hemorragia digestiva alta, demência, incapacidade de compreender ou assinar o termo de consentimento e recusa formal em participar do estudo.

Dez pacientes preencheram critérios de exclusão. Houve 16 perdas e 402 pacientes foram incluídos para avaliação endoscópica e histológica. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos do Hospital e os pacientes assinaram termo de consentimento informado, sendo esclarecidos previamente a respeito do estudo e sua finalidade.

Questionário aplicado e dados clínicos Questionário padronizado foi aplicado por um dos investigadores a todos os participantes do estudo para identificar sexo, idade, raça e sintomatologia relacionada à DRGE e consumo de álcool e tabaco.

Protocolo de endoscopia e biopsia Todos os exames foram realizados por médicos do Serviço de Endoscopia Digestiva do HC-UFPR, utilizando-se videoendoscópios Fujinon Série 200 e Olympus Evis CV- 100. O exame endoscópico avaliou os principais pontos de referência do esôfago distal em relação à arcada dentária superior: pinçamento diafragmático, junção esofagogástrica (JEG) e JEC ou linha Z. Foi documentada também, a presença ou ausência de hérnia de hiato e de esofagite, classificada conforme Savary-Miller (25).

Considerou-se BL a presença de mucosa de aspecto róseo-avermelhado, circunferencial ou não, com 3 ou mais cm de extensão, ou linguetas que se projetassem proximalmente a partir da JEC. Com extensão menor do que 3 cm, esses achados foram definidos como BC.

As biopsias de esôfago foram realizadas com pinças de abertura de 6 mm. A coleta do material foi efetuada nos quatro quadrantes da luz do órgão, 1 cm abaixo da JEC e em todas as linguetas de mucosa róseo-avermelhada que se projetavam acima da junção. Nos casos de mucosa de aspecto róseo-avermelhado circunferencial extensa, as biopsias foram realizadas nos quatro quadrantes com intervalos de 2 cm. A cada 10 pacientes incluídos, foi efetuado controle de qualidade interno.

Os pacientes com MIE foram divididos em três grupos: 1) MIC, quando endoscopicamente não se observava EB, mas a histologia revelava MIE; 2) BL, quando o exame endoscópico demonstrava epitélio róseo-avermelhado > 3 cm de extensão em esôfago distal e a histologia revelava MIE, e 3) BC, quando a endoscopia demonstrava epitélio róseo-avermelhado < 3 cm e histologia confirmava achado de MIE.

Avaliação histopatológica As biopsias foram fixadas em formalina 10% e encaminhadas ao Serviço de Anatomia Patológica do HC-UFPR e avaliadas por patologistas que tinham conhecimento do protocolo deste estudo, porém desconheciam os laudos endoscópicos. As lâminas foram coradas pela hematoxilina-eosina e submetidas ao método de análise histoquímica PAS-alcian blue pH 2,5. Diagnosticou-se MIE na presença de células caliciformes coradas em azul pelo alcian blue. Para controle de qualidade interno, 80 lâminas foram selecionadas aleatoriamente e reavaliadas por um patologista da equipe, que desconhecia os achados endoscópicos e histológicos prévios. Para controle de qualidade externo destas 80 lâminas, 40 foram selecionadas aleatoriamente e revistas em outro serviço.

Metodologia estatística Utilizou-se o teste paramétrico t de Student, e os não-paramétricos comparação entre duas proporções" (através do "software primer of biostatistics"), Qui- quadrado e exato de Fisher (pelo "software" Epi-Info). O nível de significância (probabilidade de significância) adotado foi menor que 5% (P < 0,05).

RESULTADOS Quatrocentos e dois pacientes completaram o estudo. O erro amostral foi estimado em 4,9%, ficando garantida a representatividade da amostra. Do total, 131 (32,6%) eram homens e 271 (67,4%) mulheres, 377 (93,8%) eram brancos e 25 (6,2%) não-brancos. A média de idade foi de 50,1 anos (18 a 86 anos).

Quando se considerou o aspecto endoscópico, 35 (8,7%) apresentaram achados sugestivos de BC e 4 (0,99%) de BL. Hérnia de hiato esteve presente em 44 (59,5%) com e em 200 (61%) sem MIE. Esofagite erosiva foi encontrada em 40 (54,1%) com e em 180 (54,9%) sem MIE.

À histologia, 74 (18,4%) apresentaram MIE em esôfago distal: 2 (0,5%) com BL e 13 (3,2%) com BC. Os 59 (14,7%) sem achados endoscópicos compatíveis com Barrett foram definidos como MIC. Destes, 18 (30,5%) tinham exame endoscópico normal e 41 (69,5%) apresentavam alterações diversas (Tabela_1).

Com relação àqueles com MIE, 43 (58,1%) eram do sexo feminino e 31 (41,9%) masculino. A idade média foi de 54 anos (25 a 79 anos), havendo predomínio para a raça branca, com 67 (90,5%) indivíduos.

Os dados demográficos são apresentados nas Tabelas_2, 3, 4. Não houve diferença significativa entre os grupos com e sem MIE para nenhuma das variáveis.

Os portadores de MIE foram avaliados à parte, com o objetivo de identificar diferenças de comportamento entre o subgrupo portador de Barrett curto ou longo (EB) e o subgrupo portador de MIC.

Quanto ao sexo, houve tendência para o masculino em relação ao EB: 10 (66,7%) (P= 0,0594) homens apresentando a doença contra 5 (33,3%) mulheres (Tabela_4).

Naqueles com MIC, tendência para o sexo feminino: 38 (64,4%) contra 21 (35,6%).

Não houve diferença estatisticamente significativa entre EB e MIC quanto à média de idade, raça, sintomatologia e consumo de álcool e tabaco.

Em relação ao tempo de sintomas, nove (60%) com EB relatavam cronicidade mais de 5 anos e 33 (55,9%) com MIC, entre 1 e 5 anos.

Quanto aos achados endoscópicos, 12 (80%) com EB possuíam hérnia de hiato e 8 (53,3%) esofagite. Todos os pacientes com EB apresentavam algum tipo de alteração à endoscopia e o achado endoscópico de maior prevalência foi a combinação de BC e hérnia de hiato. Em 69,5% dos exames endoscópicos daqueles com MIC havia algum tipo de alteração e o aspecto mais comumente observado foi o da combinação de hérnia de hiato e esofagite (Tabela_4).

DISCUSSÃO Admite-se que, no Brasil, a DRGE possua características semelhantes às dos demais países ocidentais, com prevalência na população geral entre 20% e 40% (19, 22, 23, 26).

O EB, que por seu caráter pré-neoplásico se reveste de grande importância como complicação da DRGE, tem prevalência na população geral variando de 0,41% a 0,89%, elevando-se para 10% a 13% entre indivíduos com DRGE(9, 12, 15, 17, 18, 27, 29, 31, 32). A alta prevalência neste grupo, a predominância no sexo masculino e na faixa etária acima de 40 anos dão diretrizes para o rastreamento de casos sugeridos nos consensos atuais. Em paralelo, discutem-se as características e o papel da MIC, ou seja, da MIE sem aspecto endoscópico de EB.

A população do presente estudo foi representativa dos pacientes que procuram os ambulatórios deste serviço especializado, universitário, em Curitiba, com queixas compatíveis com o diagnóstico clínico de DRGE, que são rotineiramente encaminhados para realização de EDA.

A prevalência de MIE encontrada de 18,4% foi mais elevada do que aquela descrita por HIROTA(17) (13,2%), ao analisar 889 pacientes. A distribuição entre os três grupos mostrou prevalência menor de casos de EB (BL: 0,5% contra 1,6%, BC: 3,2% contra 6%) e maior de casos de MIC (14,7% contra 5,6%). O mesmo ocorreu na comparação com SHERMANN et al.(34) e outros autores que utilizaram sempre a presença de sinais endoscópicos de DRGE, como esofagite para definir a inclusão. Os dados do HC-UFPR aproximam-se aos de CAMERON et al.(2, 4, 5), que adotaram critérios de inclusão semelhantes, baseados na sintomatologia dos pacientes, ou seja, ampliando a população com acometidos de doença não-erosiva.

No entanto, CAMERON et al.(5) encontraram prevalência ainda maior de MIC (22%).

A literatura sugere que o BC pode ser até 3 vezes mais prevalente que o BL(8), o que foi igualmente observado na presente casuística. MORALES(24), que também encontrou maior prevalência de MIC, relata que, embora este achado seja relativamente comum, a displasia nesta situação é rara e sugere que o rastreamento através de biopsias da cárdia deve ser limitada a protocolos de estudo.

O perfil do grupo com e sem MIE foi semelhante com relação a idade, sexo, raça e consumo de álcool e tabaco. Embora não haja diferença estatisticamente significativa, é curioso observar que os acometidos de MIE apresentam média de idade superior à dos não-acometidos, em cerca de 5 anos.

Também no que diz respeito aos sintomas investigados, os resultados concordam com os da literatura, não sendo detectada diferença estatística que permita associar sua apresentação e duração à presença ou não de MIE.

Os pacientes com BL e BC foram reagrupados (EB) para fins de comparação estatística de seus dados com os daqueles acometidos de MIC.

O EB é descrito como doença do sexo masculino e da raça branca, mas relatos do aumento da incidência em mulheres e negros americanos(12, 17, 29, 33, 34), nestes particularmente em relação ao BC(42). a MIC parece não ter relação com sexo, idade ou raça, de acordo com CHALASANI et al.(6). No grupo com EB predominou o sexo masculino (66,7%) e no grupo com MIC o feminino (64,4%), revelando tendência (P= 0,0594) no que se refere ao EB. Todos os casos de EB ocorreram em brancos.

A prevalência do EB aumenta com a idade e alcança patamar por volta da sétima década de vida, com média de idade de 63 anos(3, 11, 12, 34). Neste estudo a média de idade dos pacientes com EB foi de 57,5 anos (34 a 73 anos). Nos pacientes com MIC foi de 53,6 anos. Os testes não mostraram diferença entre EB e MIC. Chama a atenção a média de idade mais baixa para o aparecimento de EB se comparado com a literatura norte-americana.

LAGERGREN et al.(20) demonstraram forte e provável relação causal entre DRGE e adenocarcinoma em indivíduos com sintomas de longa data. CAMERON et al.(3) não relacionaram a freqüência e a intensidade destes com a presença do EB, mas a cronicidade. CHALASANI et al.(6) encontraram MIE somente naqueles com sintomas de DRGE no mínimo 2 vezes por semana. Indivíduos com sintomas por 5 anos ou mais têm importante aumento na incidência de EB e adenocarcinoma(4, 36, 39).

Na presente casuística, 9 (60%) pacientes com EB relatavam tempo de sintomas compatíveis com DRGE por mais de 5 anos e 33 (55,9%) daqueles com MIC, entre 1 e 5 anos. Em ambos os grupos, o sintoma predominante foi a pirose retroesternal. Nenhum dos sintomas, sua intensidade ou duração pôde ser correlacionada ao EB e a MIC como elemento preditivo, aspectos semelhantes aos descritos pela maioria dos trabalhos da literatura médica(7, 16, 31).

controvérsias em relação ao consumo de álcool e tabaco e a presença de MIE, pois HIROTA(17) encontrou maior prevalência de tabagismo no BL (69%) do que no BC (49%). Van SANDICK et al.(38) demonstraram maior prevalência de EB entre aqueles com história de tabagismo. CHALASANI et al.(6) não evidenciaram associação entre MIE e uso de cigarro ou álcool. Segundo SHERMANN et al.(34), pacientes com MIE usavam mais freqüentemente cigarro e álcool. Na população estudada 79,7% daqueles com MIE não utilizavam tabaco e 51,4% não ingeriam álcool. No grupo específico da MIC também não houve correlação. Entre os portadores de EB, 73,3% utilizavam álcool.

Os estudos de SHERMANN et al.(34) e HIROTA(17) mostraram prevalência aumentada de hérnia de hiato em pacientes com MIE associada à DRGE. CSENDES et al.(8) encontraram prevalência aumentada de erosões, ulcerações e estenose entre pacientes com BL, assim como prevalência de MIC mais alta nas DRGEs com esofagite. WESTON(40), entretanto, não demonstrou associação entre hérnia de hiato ou esofagite com BC. Aqui não se encontrou correlação entre hérnia hiatal e esofagite com a presença de MIE, conforme outros estudos(18, 36).

CONCLUSÃO Em pacientes com sintomas de DRGE a prevalência de MIE foi de 18,4%, BL 0,5%, BC 3,2% e MIC 14,7%. O EB mostrou-se pouco prevalente entre indivíduos com DRGE, enquanto a MIC obteve valores mais expressivos.

Em relação ao sexo, houve tendência de maior número de homens com EB e mulheres com MIC. Não correlação entre sintomas da DRGE e a presença de MIE. Neste estudo, pacientes com EB apresentaram mais hérnia de hiato e esofagite em graus mais intensos do que os com MIC, mas estes achados não são preditivos da presença de MIE.

Não se encontrou relação estatisticamente significativa entre tabagismo e álcool e a presença de MIE.


Download text