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BrBRCVHe0034-71672010000300023

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National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
Year2010
Issue0003
Article number00023

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Avaliação no estágio curricular de administração em enfermagem: perspectiva dialética

INTRODUÇÃO Ao considerarmos cenários de mudanças cada vez mais dinâmicas e complexas, percebemos que as questões do nosso tempo são outras, os caminhos e avanços das ciências e tecnologias também mudaram e hoje, muitas inovações fazem parte do nosso cotidiano.

O papel da universidade, nesse contexto, é um espaço privilegiado que possibilita a dinâmica de (des)construção e reconstrução do conhecimento. A "universidade sempre esteve vinculada ao conhecimento, embora tenha perdido a maior parte de suas energias criativas em equivocadamente "transmitir" conhecimento, sem perceber, por vezes, que transmitimos informação"(1).

Ressaltando o contexto educacional no qual estamos imersos, percebemos que muitas inovações fazem parte do nosso cotidiano, e mesmo vivenciando fatos que parecem irrefutáveis, sabemos que tudo é passível de questionamentos, o que nos remete à reflexão da ação docente.

Devemos considerar que mesmo sabendo que existem coisas e fatos irrefutáveis, tudo é passível de questionamentos. Então, qual é a nossa tarefa como educadores? Propor caminhos para que os modelos que não conseguem mais compreender nosso mundo e suas múltiplas realidades sejam alterados.

Nossas ações, de maneira geral, têm sido centradas na análise dos produtos e não dos processos, desconsiderando que a aprendizagem, por ser processual, precisa ser acompanhada conti-nuamente (2).

Deste modo, quando analisamos a metodologia de ensino e avaliação presentes no cotidiano universitário, percebemos estruturas educacionais muito arraigadas em modelos tradicionais, caracterizadas pelo dogmatismo e pela postura acrítica frente à realidade vivenciada, permitindo certa passividade do ponto de vista pedagógico.

Para romper esse modelo, é necessário, dentre outros, que o professor considere as diferentes interpretações dos outros atores do processo de ensino- aprendizagem, ou seja, os estudantes(3). A finalidade é promover o estudante a um papel ativo e responsável para seu crescimento.

Nesta direção, o projeto político pedagógico do Curso de Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP) tem como objetivo possibilitar a formação de enfermeiros críticos e reflexivos da realidade onde se inserem.

Considerando a concepção de Estágio Curricular como a oportunidade de vivência prática em contexto organizacional real, e a metodologia dialética adotada na disciplina Estágio Curricular de Administração em Enfermagem do bacharelado dessa Escola, podemos afirmar que essa disciplina tem proporcionado aos estudantes, professores e preceptores, um modelo de educação mais participativo e reflexivo, pois extrapola a orientação do fazer técnico, preocupando-se com a crítica visando a transformação da realidade.

Vislumbrando promover uma análise dessa disciplina e contribuir com a docência no que se refere a mostrar a aplicação prática de um modelo teórico, este relato de experiência tem por objetivo descrever o desenvolvimento da disciplina Estágio Curricular de Administração em Enfermagem do bacharelado dessa Escola, tendo por base a perspectiva dialética do processo ensino- aprendizagem.

Na Metodologia Dialética o conhecimento é construído pelo sujeito na sua relação com os outros e com o mundo, na qual professores e alunos trabalham, refletem e reelaboram os conteúdos, tornando a aprendizagem real e significativa(4).

Na teoria dialética o conhecimento é construído em três grandes momentos: a síncrese, a análise e a síntese cuja tarefa pedagógica do professor é mediar as fases de mobilização, construção e síntese do conhecimento. Nestas etapas, busca-se, portanto, favorecer a concepção do conhecimento por meio da problematização, da dúvida e da crítica, propiciando o uso da criatividade na resolução de problemas, criando situações construtivas e significativas, desenvolvendo, assim, múltiplas competências.

Esta abordagem foi adotada no planejamento, desenvolvimento e avaliação da disciplina, a qual é semestralmente oferecida pelo Departamento de Orientação Profissional da EEUSP no . semestre do curso, com carga horária total de 315 horas.

A disciplina tem por metas desenvolver o processo de trabalho de gerenciamento em enfermagem no campo de prática; exercitar o papel de gerente de enfermagem na gestão de serviços de enfermagem e desenvolver autonomia e segurança para inserção igualitária nos diferentes grupos multiprofissionais.

A consecução destes objetivos está vinculada à mobilização das competências do saber conhecer, saber fazer, saber ser e saber conviver, adquiridas no decorrer da formação do curso de graduação nos diferentes níveis de atenção à saúde. De modo gradual, o estudante experimenta situações que envolvem conhecimentos adquiridos, oportunizando a aplicação desses conhecimentos em situações novas e, assim, desafiando-o a alcançar aquilo que ainda não tem domínio.

O programa da disciplina contempla duas mesas redondas com os temas: "Entidades de classe" e "Mercado de trabalho: oportunidades e perspectivas para os enfermeiros" antes da inserção dos estudantes em campo de estágio.

Em seguida, os mesmos são inseridos no campo onde desenvolvem os seguintes conteúdos: Reconhecimento da unidade campo de prática e sua inserção na instituição e dessa no Sistema Único de Saúde; Estrutura organizacional; Políticas, propostas e modelos assistenciais; Políticas e Gerenciamento de recursos humanos, físicos, materiais e de custos; Planejamento; Supervisão; Liderança e Ética no gerenciamento.

MOBILIZAÇÃO PARA O CONHECIMENTO: PLANEJA-MENTO E ESTRATÉGIAS DA DISCIPLINA Em consonância com a metodologia dialética, a disciplina planeja e desenvolve, no campo de prática, as condições necessárias para que o graduando integre-se à realidade e, assim, atue como agente social de mudanças no processo de trabalho de enfermagem.

Na fase de mobilização do conhecimento, compete ao professor despertar, provocar e sensibilizar o estudante para o processo pessoal de aprendizagem, tendo em vista a articulação da realidade com o objeto a ser apreendido, considerando-se a prática social como um elemento relevante em todo o processo (2,4). Utilizou-se um instrumento norteador para o reconhecimento da instituição composto dos seguintes itens: caracterização da instituição e inserção no Sistema Único de Saúde; identificação das políticas, filosofia, missão e objetivos institucionais; administração dos recursos físicos, humanos, materiais e financeiros.

Para complementar esse reconhecimento e favorecer a visão global e analítica da realidade, foram realizadas visitas à serviços de apoio: farmácia, nutrição, comissão de controle de infecção hospitalar e serviço de arquivo médico e estatístico, discutindo-se a interface gerencial entre essas áreas e o serviço de enfermagem.

Ainda na fase de mobilização, os sujeitos elaboram as primeiras representações mentais do objeto a ser estudado(4). Neste sentido, é fundamental promover um clima de acolhimento do estudante no campo a fim de favorecer sua inserção no ambiente e integração com a equipe multiprofissional.

Para proporcionar uma vivência da realidade e interação com a equipe, a disciplina prevê a distribuição de um estudante em cada uma das unidades no campo de estágio.

A supervisão direta do estudante no campo de estágio fica a cargo do enfermeiro responsável pela unidade, ao qual compete mostrar todas as ações por ele desenvolvidas, estimulando o aluno a executar e analisar sua própria atuação.

Para acompanhamento dessas atividades acadêmicas, os departamentos da EEUSP dispõem de enfermeiros especialistas, que colaboram com os docentes em atividades de supervisão dos estudantes em diferentes cenários de prática, discutindo temas concernentes ao estágio, avaliando o cronograma semanal de atividades, a identificação do perfil da clientela da unidade e as atividades do estudante no campo. Outro espaço de discussão contempla a participação desses sujeitos em discussões que emergem das necessidades dos alunos em campo de prática.

No decorrer do estágio, o discente desenvolve um estudo de caso relativo aos aspectos assistenciais, administrativos, éticos, legais e educativos envolvidos no processo de trabalho da unidade.

O estudante, após as orientações para a prática, é encaminhado ao campo de estágio, onde atuará por, aproximadamente, dez semanas, com jornada de 30 horas semanais, distribuídas das 7 às 13h, ou conforme escala estabelecida, previamente, pelo estudante, em parceria com o enfermeiro chefe e o docente, contemplando as necessidades da unidade e os objetivos referentes à disciplina.

CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO EXPERIÊNCIA NO CAMPO DE ESTÁGIO Nessa fase, acontece a imersão do sujeito em seu objeto de estudo, a elaboração de relações complexas e o desenvolvimento de sua práxis(2,4). Nessa perspectiva de construção do conhecimento, adotaram-se estratégias sustentadas por alguns pressupostos, a saber: significação visa estabelecer vínculos entre os conteúdos com o contexto de vida do estudante, articulando-se suas necessidades de aprendizagem com os objetivos propostos pela disciplina de Estágio Curricular; problematização o estudante, imerso na realidade, elege uma situação-problema que mereça ser investigada; práxis é estimulado à prática reflexiva e ativa; criticidade percepção crítica da realidade buscando a essência dos processos; continuidade-rupturare-elaboração do objeto por meio da análise; historicidade destacar que a síntese de cada momento é fruto de um processo histórico que pode ser superado por novas sínteses; totalidade articulação do conhecimento adquirido com a realidade.

Para contemplar esses pressupostos, é imprescindível que os agentes do processo (professor, enfermeiro e especialista) elejam estratégias que estimulem, facilitem e permitam ao estudante a superação de uma visão inicial caótica e superficial do objeto para uma visão mais profunda e ampliada(2).

No campo da prática, o estudante vai incorporando o processo de integração e vivências, as relações com os membros da equipe multiprofissional, as percepções acerca do trabalho da equipe e, dessa forma, intera-se ao novo grupo. Nesse processo, ao apresentar sentimentos de pertença, ele reconhece, gradativamente, o trabalho do enfermeiro na sua magnitude, desenvolvendo as competências de trabalho nas dimensões assistencial e gerencial.

Concomitantemente, o estudante passa a realizar a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), identificando a complexidade dos pacientes e as atividades necessárias a serem desenvolvidas pela equipe de enfermagem.

Nesse percurso da aprendizagem, o estudante tem uma dimensão da teoria e da práxis com suas congruências e divergências e que trazem à tona conflitos que serão um potencial de discussão junto aos docentes e enfermeiro especialista nos momentos de supervisão.

SÍNTESE DO CONHECIMENTO PROCESSO DE AVALIAÇÃO Nessa fase, o estudante supera as etapas anteriores de apropriação e análise do conhecimento e realiza a sistematização expressa acerca do objeto apreendido e a consolidação dos conceitos, constituindo-se uma visão provisória, visto que a construção do conhecimento é dinâmica e está em constante movimento.

A supervisão é um elemento gerencial que deverá contribuir para a construção da síntese do conhecimento, pois consiste na apresentação sistemático-dialógica do conteúdo, contrastando-o ao cotidiano, num "exercício didático da relação sujeito-objeto pela ação do aluno e mediação do professor. É o momento da efetiva construção do novo conhecimento"(5).

Nessa ótica, a supervisão do estágio, com vistas a facilitar o momento de síntese do conhecimento, aconteceu em três encontros para articulação da teoria e prática. Assim, partindo-se de situações vivenciadas no campo de prática, discutem-se as dimensões ético-político e gerenciais envoltas às possíveis causas, influências e soluções de problemas identificados. Essa estratégia cria um estilo coletivo e colaborativo na construção do conhecimento para a formação do estudante.

Nesses encontros, os estudantes foram estimulados a exercitar a co- responsabilidade com o campo, sendo partícipes na organização do serviço, no processo de trabalho, na tomada de decisão, planejamento, coordenação e avaliação da assistência prestada em parceria com os enfermeiros e os docentes.

Este contexto de supervisão facilitou e revelou, por meio do relato dos estudantes, os conhecimentos técnicos, o compromisso ético com o campo de estágio as dificuldades nas relações de trabalho, a consciência social e de cidadania. Esses conteúdos expressos podem ser objetos discursivos para a avaliação do conhecimento adquirido.

O método de avaliação dos discentes na disciplina contempla estudo de caso, participação em grupos para discussão do desenvolvimento das atividades relacionadas à prática profissional, bem como escolha de uma situação-problema e implementação de um Planejamento Estratégico Situacional (PES); durante e ao final do estágio, realizam-se auto-avaliação e avaliação do desempenho discente, que envolvem os próprios estudantes, os docentes e enfermeiros do campo de estágio.

Buscando apreender do estagiário suas habilidades prévias fundamentadas teoricamente, identifica-se aquilo que ele deseja fazer e o que ele ainda precisa saber, ou que competências necessita desenvolver, os docentes responsáveis pela disciplina elaboraram instrumento de avaliação, pautado nas competências gerenciais e ético-políticas do enfermeiro(6).

Esse instrumento foi entregue ao estudante e ao enfermeiro que o acompanhou desde o início do estágio, permitiu que ambos tivessem conhecimento das competências a serem desenvolvidas, o que, também norteou o planejamento das ações para consecução dos objetivos da disciplina.

Sendo assim, a avaliação, como parte integrante do processo de aprendizagem compreensiva e significativa, possibilitou o diálogo crítico dos estudantes sobre os problemas que encontraram ao  realizarem suas  tarefas.

Compreendendo a avaliação de modo processual, o enfermeiro chefe foi orientado pelos docentes a participarem das orientações, correções e reforços na medida em que surgiam os questionamentos e dúvidas dos estudantes. Nessa perspectiva, o estudante deve assumir a responsabilidade de avaliar o campo e as condições para o seu desenvolvimento, manifestando-se continuamente.

A auto-avaliação é indispensável nesse processo, pois o avaliado (estudante) tem a oportunidade de desenvolver sua capacidade crítica e refletir acerca de seus limites e possibilidades(6).

Avaliar a aprendizagem deve ser um ato amoroso, inclusivo, dinâmico e construtivista, partindo do acolhimento da realidade tal como ela se apresenta.

Acolher o educando passa, então a fazer parte da conduta do avaliador que precisa ter essa disposição de acolhimento desprovido de pré-julgamentos e aberto a tudo que se apresenta(7).

Dessa forma, a avaliação deve ser holística e globalizadora, analisando os fatores intervenientes no processo de ensino-aprendizagem. Deve ser consideradas as diferentes perspectivas e interpretações dos atores envolvidos, contribuindo para a análise da própria avaliação, a meta-avaliação, não se limitando aos aspectos intelectuais da pessoa do estudante, mas considerando as dimensões afetiva, social e ética(3).

Assim, é fundamental que a avaliação assuma uma vertente questionadora e transformadora da práxis, a fim de analisar e melhorar essa mesma ação: trata- se de um processo de reflexão-ação-reflexão(8-9).

CONSIDERAÇÕES FINAIS A avaliação da aprendizagem, na perspectiva dialética, valoriza as relações interpessoais e a participação dos sujeitos envolvidos, por meio do acolhimento e estabelecimento de vínculos em todo o processo.

O professor detém um papel importante em todo processo dialético de ensino- aprendizagem, que é o de coordenar, propor critérios para a consecução, estabelecer parcerias com os estudantes, propor e, se necessário, rever prazos e o tempo para o desenvolvimento de ações. É preciso estar aberto à diversidade e às diferenças individuais e culturais, valores e crenças dos sujeitos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, valorizando-se os vínculos afetivos e as efetivas amorosidades, possibilitando, dessa forma, o diálogo consensual e a construção do conhecimento.

Assim, ao propormos o desenvolvimento de um estágio na perspectiva da metodologia dialética baseada na idéia de que o conhecimento é construído pelo sujeito nas suas relações com os outros e com o mundo, favorecemos a concepção do conhecimento por meio da problematização da práxis, propiciando o uso da criatividade na busca de soluções, criando situações construtivas e significativas, desenvolvendo múltiplas competências e diminuindo a dicotomia teoria e prática.


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