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EuPTCVHe1647-21602014000200005

EuPTCVHe1647-21602014000200005

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1647-2160
Year2014
Issue0002
Article number00005

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Comunicação terapêutica em enfermagem: Como a caraterizam os enfermeiros Comunicação terapêutica em enfermagem: Como a caraterizam os enfermeiros Introdução A ideia de que vivemos numa sociedade de comunicação é hoje bastante generalizada. Convém no entanto não esquecer que, comunicar mais, pode não significar obrigatoriamente comunicar melhor.

Sendo esta uma ideia geral, pensamos ser pertinente a sua aplicação à realidade específica da enfermagem, em que o enfermeiro deve garantir o sucesso da comunicação que utiliza no âmbito da prestação de cuidados, uma vez que níveis de comunicação eficazes conduzem a resultados mais positivos (Gomes, Amendoeira e Martins, 2012).

A comunicação é tanto mais importante quanto a constatação de que, comunicar com aqueles que nos rodeiam constitui uma das nossas principais atividades, pois a comunicação é indispensável para a sobrevivência dos seres humanos.

Para Phaneuf (2005), numa comunicação as nossas trocas compreendem duas componentes principais: uma parte informativa, ligada ao domínio cognitivo ' o quê da mensagem; e uma parte mais afetiva ligada à maneira como é transmitida ' o como.

É vasta a literatura que aponta para a existência de uma gama de elementos verbais e não-verbais presentes no processo comunicativo, tornando assim a comunicação numa totalidade que integra o verbal e o não-verbal.

No processo comunicativo, sendo naturalmente importantes as trocas verbais, sabemos que estas representam uma pequena parcela no estabelecimento de uma boa comunicação, pois estima-se que apenas cerca de 7% do significado é transmitido por palavras, 38% por sinais paralinguísticos e 55% por gestos corporais (Stuart & Laraia, 2006).

A comunicação não-verbal favorece uma perceção mais lúcida e totalizadora dos processos comunicativos. O seu emprego na vida quotidiana acrescenta capacidade de prestar atenção e reconhecer o que acontece para além das palavras, o que pode conduzir à implementação das estratégias mais adequadas (Rulicki & Cherny, 2007) .

Como afirmam Bertone, Ribeiro, e Guimarães (2007), a comunicação deve fazer parte do exercício profissional dos enfermeiros, para que estes possam garantir o êxito dos procedimentos técnicos e da convivência que competem para uma melhor qualidade de vida da pessoa que necessita dos cuidados de enfermagem.

A comunicação é, desta forma, um denominador comum presente nas ações de enfermagem que terá influência na maneira como o cuidado é prestado a cada pessoa e deverá garantir a obtenção de ganhos terapêuticos (Gomes et al., 2012).

Neste contexto surge a comunicação terapêutica, que é mais que comunicar-se com a pessoa no exercício do papel profissional de enfermeiro (Gefaell, 2007), é um método de comunicação através do qual o cuidador responde às necessidades explícitas e implícitas da pessoa (Fuller, 2007), é um processo consciente e deliberado usado para reunir informações relacionadas com o estado de saúde da pessoa como um todo e responder com uma abordagem verbal ou não verbal que promova o seu bem-estar, melhore a forma como este entende os cuidados prestados (Wold, 2013) e permita estabelecer uma relação terapêutica (Williams & Davis, 2005).

No âmbito da saúde, a comunicação precisa de ser terapêutica, porque esta objetiva o cuidado e, através deste, favorece a tranquilidade, autoconfiança, respeito, individualidade, ética, compreensão e empatia pela pessoa cuidada (Bertone et al., 2007).

É igualmente importante considerar que a comunicação terapêutica tem a finalidade de identificar e atender as necessidades de saúde de cada pessoa, e contribuir para melhorar a prática de enfermagem.

Neste artigo pretende-se apresentar parte dos resultados obtidos com o desenvolvimento da tese no âmbito do curso de Doutoramento em Ciências de Enfermagem, no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) ' Universidade do Porto, no que se refere ao objetivo caraterizar os itens que integram a comunicação terapêutica.

Metodologia Trata-se de um estudo com enfoque quantitativo, exploratório, descritivo e transversal. Para a dimensão apresentada, tem como objetivo caraterizar os itens que integram a comunicação terapêutica.

O instrumento de colheita de dados foi o questionário construído por nós, por não ter sido encontrado um instrumento que permitisse colher dados sobre as variáveis em estudo, tornando assim o seu desenvolvimento parte do processo de investigação em si (Coutinho, 2011).

Na elaboração do questionário, considerámos as etapas descritas por Fortin ( 2009), tendo a construção do esboço do mesmo sido precedida por revisão da literatura. O esboço do questionário foi submetido a revisão, pois com dados fiáveis se podem obter resultados válidos (Coutinho, 2011). Nesse sentido, procedeu-se à avaliação do questionário. Não tendo sido encontrada unanimidade quanto ao número de peritos a mobilizar nesta etapa, considerámos o referido por Lynn citado por Alexandre e Coluci (2011), que recomenda um mínimo de 5 e um máximo de 10 pessoas participantes neste processo.

Contámos assim com a colaboração de 7 peritos seleccionados de acordo com os seguintes critérios: grau académico de doutor, experiência de pelo menos dois anos na área da saúde/enfermagem ou como investigador na área da comunicação, pois, de acordo com Carvalho et al., (2008), deve considerar-se o tempo mínimo de dois anos para quem está no intervalo entre iniciado e perito. Após a primeira avaliação pelos juízes foram introduzidas no questionário todas as sugestões, à exceção das que tinham a ver como uso da terminologia própria dos autores mobilizados e identificados no mesmo. Após esta etapa o questionário foi de novo reenviado aos juízes tendo obtido a concordância dos mesmos.

Procedeu-se ainda ao pré teste do questionário, que foi aplicado a 12 indivíduos com características semelhantes às da população do estudo, tendo em conta, como afirma Fortin (2009), que este deve ocorrer numa pequena amostra da população, entre 10 a 20 pessoas. Foi o questionário resultante deste processo que foi utilizado no estudo. Trata-se de um questionário misto, no entanto, os resultados que apresentamos resultam de perguntas onde foi utilizada escala de Likert, com 5 opções de resposta (1 discordo totalmente a 5 concordo totalmente).

Os participantes do estudo e de acordo com o critério definido - ser enfermeiro e estar inscrito na OE, constituíram-se numa amostra não probabilística acidental ou de conveniência.

A colheita de dados foi feita com a colaboração da Ordem dos Enfermeiros (OE), através da aplicação online do questionário, cujo link de acesso ao mesmo esteve disponível na página da OE para todos os enfermeiros inscritos na mesma, entre os dias 4 e 25 de Novembro de 2013. Responderam ao questionário, de forma válida, 448 enfermeiros.

O tratamento dos dados foi efectuado com recurso a estatística descritiva e com auxílio do programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 20. Os resultados são apresentados em tabelas e gráficos.

O projeto de pesquisa foi aprovado pela Comissão de Ética do ICBAS, Universidade do Porto. Foram tidos em conta os princípios éticos de que se destacam o consentimento livre e esclarecido e o respeito pela confidencialidade de todas as informações.

Identificamos como principais limitações deste estudo o facto de não termos encontrado outros estudos que permitissem a comparação dos resultados; a divulgação do Link para acesso ao questionário não ter chegado a todos os enfermeiros; e, o número de questionários respondidos não permitir extrapolar os resultados para a população.

Resultados Caracterização dos Participantes Apresentam-se no quadro_nº_1 os dados que consideramos mais relevantes referentes às variáveis de caracterização.

Aspetos Caraterizadores da Comunicação Terapêutica Apresentamos de seguida dados que nos permitem caraterizar a comunicação terapêutica de acordo com a opinião dos enfermeiros. Através dos resultados apresentados no quadro_nº_2, podemos verificar que 94,2% dos enfermeiros referem a sua discordância quanto à afirmação "a comunicação terapêutica é necessária nas intervenções psicoterapêuticas", sendo de salientar que 60,6% afirmam discordar totalmente. Em relação à afirmação "toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica", discordam 38,2%, no entanto, 54,7% dos enfermeiros assinalam a sua concordância.

Perante a constatação de que para mais de 50% dos inquiridos toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica e não sendo esta, também para os teóricos, uma afirmação consensual, procedemos a uma análise cruzada com as variáveis de caraterização dos inquiridos, de forma a melhor compreender e descrever este posicionamento.

Como podemos verificar pelo quadro_nº_3, que apresentamos de seguida, a concordância (concordo + concordo totalmente) com a expressão "toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica" é maior nos inquiridos do sexo feminino, com a categoria profissional de enfermeiros e não detentores do título de especialista pela OE. Quanto ao grau académico, o nível de concordância vai diminuindo ao longo do percurso académico, sendo que, os doutores são os que menos concordam.

Os dados do quadro_nº_4, permitem-nos verificar que uma concordância expressiva dos enfermeiros quanto às características da comunicação terapêutica. Para mais de 90% dos enfermeiros questionados, a comunicação para ser terapêutica deve: atender à individualidade da pessoa; identificar as verdadeiras necessidades de saúde das pessoas; contribuir para a melhoria da prática de enfermagem; responder às verdadeiras necessidades de saúde das pessoas; aumentar a eficácia da relação terapêutica; possuir valor terapêutico complementar, aumentando ou complementando a eficácia de outras intervenções.

Quanto aos itens "ser utilizada de forma intencional" e "possuir valor clínico autónomo de outras intervenções", salienta-se que, respetivamente 23,5% e 35,6% dos respondentes não concordaram (por discordância ou indecisão) com estas afirmações.

Porque se destacam pela menor concordância obtida, procedeu-se ao cruzamento da concordância dos enfermeiros quanto à expressão "ser utilizada de forma intencional" e "possuir valor clinico autónomo de outras intervenções", com as variáveis de caraterização. Verifica-se, de acordo com o quadro_nº_5, que a concordância com a afirmação "ser utilizado de forma intencional", é maior para os inquiridos com mais de 10 anos de experiência profissional, especialistas em enfermagem pela OE e docentes. Quanto ao grau académico verifica-se que todos os bacharéis concordam, sendo importante ter em conta a baixa percentagem de respondentes neste grupo e, em relação aos outros graus, o nível de concordância aumenta nos graus mais elevados, sendo que todos os doutores concordam.

Quanto à concordância dos inquiridos com a expressão "possui valor clínico autónomo de outras intervenções", e pela análise do quadro_nº_6, verifica-se que esta é maior para os doutores, para os que têm o título de especialista pela OE, para os docentes e para os que têm mais de 10 anos de exercício profissional.

Discussão Através da análise conjunta dos resultados referentes aos aspetos caraterizadores da comunicação terapêutica, verifica-se que os enfermeiros parecem não ter dúvidas de que a utilização desta está presente em mais do que intervenções psicoterapêuticas. No entanto, perante a afirmação de que toda a comunicação que o enfermeiro utiliza é comunicação terapêutica, as opiniões são menos unânimes. Estamos assim, perante resultados que parecem confirmar a afirmação de que comunicação terapêutica é uma expressão empregue de diferentes maneiras no domínio dos cuidados de enfermagem, uma vez que, para alguns, ela pode ter uma abordagem terapêutica específica e, para outros, abranger todas as interações cuidador ' cuidado (Rubenfeld & Scheffer,1999).

No entanto, é fundamental não esquecer que a comunicação deve fazer parte do exercício profissional dos enfermeiros, para que estes possam garantir o êxito dos procedimentos técnicos e da convivência que competem para uma melhor qualidade de vida da pessoa que necessita dos cuidados de enfermagem (Bertone et al., 2007) pois esta constitui a principal ferramenta terapêutica de que dispõe o enfermeiro (Phaneuf, 2005). Falamos desta forma da comunicação terapêutica que, sendo uma componente essencial dos cuidados de saúde para qualquer cliente (Tamparo & Lindh,2008), é a base da enfermagem (Gefaell, 2007).

É igualmente importante que os enfermeiros tenham em conta que, de entre as mensagens emitidas, algumas são voluntárias ou intencionais e respondem às necessidades do momento, outras porém são involuntárias (Phaneuf, 2005), tornando difícil que toda a comunicação seja terapêutica.

A constatação de que são os especialistas pela OE e os que têm mais formação académica a concordar menos com a afirmação de que toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é terapêutica, permite-nos considerar a importância da formação profissional e académica na atenção a esta temática, sobretudo tendo em conta que a comunicação terapêutica é um comportamento adquirido, exige um compromisso ativo, não depende da sorte nem é casual (Fuller, 2007) o que reforça a importância da formação nesta matéria.

Nesta sequência, quando são apresentados aos inquiridos alguns aspetos que de acordo com vários autores caraterizam a comunicação terapêutica, , como referimos, uma quase unanimidade com a maioria deles. Evidencia-se porém a menor concordância com as afirmações "ser utilizada de forma intencional" e "possuir valor clínico autónomo de outras intervenções".

O não reconhecimento, por parte de alguns enfermeiros, da importância da utilização intencional da comunicação terapêutica, pode pôr em causa a eficácia da mesma e dessa forma contribuir para o insuficiente reconhecimento da dimensão humana na saúde, identificado pela Organização Mundial da Saúde (2008), sendo que, pelo contrário, o seu uso efectivo pode constituir-se num contributo importante para que os serviços de saúde adaptem as suas respostas à especificidade de cada individuo e comunidade, aumentando assim os ganhos em saúde (OMS, 2008).

Estabelecer um paralelismo entre a afirmação "possuir valor terapêutico complementar, aumentando ou complementando a eficácia de outras intervenções" onde a concordância dos inquiridos foi quase total, com a afirmação "possuir valor clínico autónomo de outras intervenções" em relação à qual 35,6% dos respondentes não concordaram, leva-nos a refletir sobre as dimensões interdependente e autónoma dos cuidados de enfermagem. Ainda que a complementaridade da comunicação terapêutica possa ocorrer tanto em relação a intervenções autónomas como interdependentes, parece-nos oportuno ter em conta que, e de acordo com o Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros - REPE (Decreto Lei 161/96 de 4 de setembro) no 2 do artigo , se consideram "autónomas as ações realizadas pelo enfermeiro sob sua única e exclusiva iniciativa e responsabilidade de acordo com as respetivas qualificações profissionais...", o que parece incluir a comunicação terapêutica, pois, como afirma Gefaell (2007), a comunicação terapêutica é parte do papel autónomo do enfermeiro e requer pensar de uma maneira específica.

Existem porém alguns enfermeiros para quem este aspeto parece não ser tão claro, o que pode ter influência na decisão de utilizar ou mesmo na utilização da comunicação terapêutica na sua verdadeira abrangência, aspeto da maior relevância, reforçado pelo estudo de Pontes, Leitão e Ramos, (2008), ao concluir que o processo de comunicação terapêutica deve ser priorizado como actividade de enfermagem relevante e essencial, para efectivar a comunicação terapêutica enfermeiro paciente.

O facto de se tratar, como temos vindo a referir, de aspetos que sendo importantes na caracterização da comunicação terapêutica vão influenciar na concretização da mesma e que não congregam a unanimidade dos respondentes, levou-nos a procurar de entre estes os que manifestaram maior concordância.

Encontramos uma tendência de maior concordância nos enfermeiros que trabalham mais de 10 anos, são especialistas em enfermagem pela OE, são docentes, e doutores. A importância dos aspetos apresentados é referida por autores como Carvalho et al., (2008), ao identificar o tempo de serviço como indicador de experiência que influencia na tomada de decisão, e por Benner (2001) que, ao ter por base a experiência, refere que são enfermeiros com mais experiência que estão mais próximos do estado de proficiente, aquele que é capaz de percecionar as situações na sua globalidade, ou de perito, que tem uma enorme experiência e compreende de maneira intuitiva cada situação.

Verifica-se assim, pelas respostas dos enfermeiros, que tanto o percurso profissional como o formativo, que acontecem frequentemente em simultâneo, têm influência na forma como estes se posicionam em relação à comunicação terapêutica, sendo que esta ideia pode ser reforçada por Negreiros, Fernandes, Macedo-Costa e Silva (2010) ao apresentarem como conclusão do seu estudo a importância de um maior investimento na educação permanente, alertando e esclarecendo os profissionais sobre a importância da comunicação terapêutica.

Conclusão O estudo efectuado permite concluir que, a comunicação terapêutica é considerada pelos enfermeiros necessária em mais do que intervenções psicoterapêuticas, havendo enfermeiros que consideram que toda a comunicação que utilizam é comunicação terapêutica e outros que não comungam desta opinião.

Globalmente existe uma manifesta concordância dos inquiridos em relação aos aspetos caraterizadores da comunicação terapêutica, salientando-se no entanto o facto de esta concordância ser menor quando se refere ao uso intencional e ao valor clínico autónomo, fundamentais para o desenvolvimento da dimensão autónoma dos cuidados.

Salienta-se também que os inquiridos que mais referem concordar com os itens caraterizadores da comunicação terapêutica trabalham mais tempo, são especialistas pela OE, têm grau académico mais elevado e são docentes, o que nos permite refletir no que se refere à comunicação terapêutica e à forma como esta é tida em conta pelos enfermeiros, na importância da formação académica e profissional, e da experiência/ percurso profissional.

Relevância para a Prática Clínica Os resultados deste estudo permitem conhecer não a forma como os enfermeiros relevam os aspetos apresentados, como também identificar variáveis que influenciam a opinião dos mesmos. Esta identificação permite-nos sugerir a inclusão e/ou o aprofundamento dos aspetos relacionados com a comunicação terapêutica, sobretudo na formação inicial dos enfermeiros e ao nível da formação contínua desde o início da atividade profissional, o que acreditamos se irá refletir numa utilização mais efectiva e adequada da comunicação terapêutica, e, dessa forma, em cuidados de enfermagem que respondam às verdadeiras necessidades de saúde das pessoas em cada situação.


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