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BrBRCVHe0004-28032004000300006

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National varietyBr
Year2004
SourceScielo

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Sobrevida de pacientes com estenose biliar maligna baseada no escovado endoscópico e na bilirrubinemia ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO As causas de estenose dos ductos biliares extra-hepáticos são variadas.

Carcinoma de pâncreas e colangiocarcinoma são as doenças malignas mais prevalentes, seguidas pelo câncer ampular, carcinoma de vesícula biliar e linfadenopatia hilar metastática. Entre as estenoses benignas destacam-se pancreatite crônica, estenose pós-cirúrgica e inflamação crônica não-específica provocada por cálculos biliares. Outras doenças benignas que comprometem esses ductos são a colangite esclerosante primária e a síndrome de Mirizzi(22, 40).

A conduta nos pacientes com suspeita de estenose biliar maligna deve ser baseada no diagnóstico definitivo(3), embora muitos casos sejam conduzidos sem confirmação histológica(12). A obtenção de tecido para diagnóstico é difícil, mas essencial para o planejamento terapêutico e a definição do prognóstico, evitando investigação adicional(22).

O valor do quadro clínico dos pacientes acometidos por doença obstrutiva biliar na determinação da etiologia é limitado(6). No entanto, perda de peso e hiperbilirrubinemia, em casos de estenose maligna, são altamente preditivos de qualidade de vida(1).

Entre os exames disponíveis, a pancreatocolangiografia retrógrada endoscópica (PCRE) ainda é o padrão-ouro na investigação de pacientes com estenose biliar, pois permite determinar o nível da obstrução e extensão do envolvimento do ducto(2, 44). Apresenta ainda a vantagem de permitir a coleta de tecido e fluido para o diagnóstico diferencial entre lesão maligna e benigna(34). Além disso, a PCRE oferece a oportunidade de realizar drenagem paliativa da via biliar em casos não-cirúrgicos(8, 12). O tratamento paliativo com inserção de prótese plástica ou metálica tem importância crescente, pois a maioria dos pacientes com icterícia obstrutiva de etiologia maligna está em fase avançada da doença(8).

O diagnóstico definitivo deve ser baseado na análise tecidual do material, que pode ser obtido durante a PCRE por coleta de bile ou secreção pancreática, escovado, biopsia ou punção aspirativa com agulha fina(26). Entretanto, ainda não existe técnica ideal para coleta de tecido durante PCRE. Tal técnica deveria ser simples, segura, de baixo custo e com alta sensibilidade e especificidade. Todos os métodos disponíveis no momento têm de baixa a moderada sensibilidade, mas com especificidade quase absoluta(7). O escovado é o método mais usado devido ao fato de ser simples e seguro(8, 17).

Embora a especificidade do escovado para a detecção de câncer se aproxime de 100%, sua sensibilidade é menor, variando de 30% a 70% na maioria dos estudos (11, 14, 15, 18, 19, 23, 25, 29, 30, 33, 36, 39, 40, 41, 43, 45, 46). Em uma revisão com oito estudos, englobando 578 casos de câncer em um total de 837 pacientes, a sensibilidade para o diagnóstico de malignidade foi de 42% e a especificidade 98%(8). Em quase todos os estudos analisados, apenas uma amostra de escovado foi obtida. A principal causa da sensibilidade limitada do escovado parece ser a presença de amostras celulares inadequadas.

O objetivo deste estudo foi avaliar a importância do duplo escovado e da bilirrubinemia na determinação da sobrevida dos pacientes acometidos de estenose biliar de etiologia maligna.

CASUÍSTICA E MÉTODO No estudo foram incluídos prospectivamente pacientes submetidos a PCRE no Setor de Endoscopia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), no período de abril de 1999 a janeiro de 2002, que apresentavam estenose localizada no ducto biliar extra-hepático, podendo comprometer também os ductos biliares intra- hepáticos principais. Foram excluídos aqueles com tumores periampulares visíveis endoscopicamente, estenoses que não permitiam a passagem de fio guia, escova ou dilatador, bem como os casos submetidos a citologia por escovado ou introdução de prótese biliar antes do início do estudo. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital São Paulo (UNIFESP).

Antes da PCRE, foram registrados os dados de cada paciente referentes a sua identificação e os valores de bilirrubina total (BT) e direta (BD).

A PCRE foi realizada com as técnicas habituais. Após identificação da estenose, foi posicionado fio guia acima da mesma. A citologia por escovado foi realizada com o conjunto de Geenen® (GRB-210-3-1.5; Wilson-Cook Medical Inc., Winston- Salem, NC, EUA). Após a retirada do fio guia, a escova foi introduzida no interior da capa e posicionada na região estreitada. A capa foi, então, puxada até logo abaixo da estenose, sendo o escovado colhido com múltiplos movimentos de vai-e-vem. Em seguida, a escova foi retirada através da capa e o fio guia reintroduzido para manter acesso à via biliar. A dilatação da estenose foi então realizada com cateter dilatador de 10 Fr, introduzido sobre o fio guia.

Retirado o dilatador, o processo de coleta de citologia por escovado foi repetido com outra escova do mesmo modelo. De acordo com indicações individualizadas, a via biliar foi drenada com prótese.

O material celular aderido a cada escova foi transferido para seis lâminas de vidro, imediatamente fixadas em solução de etanol a 95% (três lâminas) e secas ao ar (três lâminas). Os esfregaços foram avaliados por citologista experiente.

As lâminas fixadas em etanol a 95% e secas ao ar foram coradas, respectivamente, pela técnica de Papanicolaou e Giemsa. Os resultados da citologia foram classificados conforme características estabelecidas em estudo anterior por RABINOVITZ et al.(37), que empregaram critérios padrões de citologia para malignidade(20). As amostras foram consideradas: negativas para células malignas, atípicas, material insuficiente para diagnóstico, suspeitas para células malignas ou positivas para células malignas.

Para análise estatística, os casos de material insuficiente e os negativos para malignidade foram considerados benignos, enquanto os atípicos e suspeitos para malignidade foram associados aos certamente malignos.

Os pacientes foram acompanhados até julho de 2002 ou até o óbito, para determinação do diagnóstico final, detecção de complicações relativas ao procedimento e sobrevida. O diagnóstico definitivo foi estabelecido por descrição cirúrgica, às vezes com exame anatomopatológico da lesão, por diagnóstico histocitológico da lesão primária, infiltração de órgão adjacentes ou metástases, ou pela evolução clínica e exames complementares.

Análise estatística As variáveis numéricas foram descritas através de média, desvio padrão e mediana. Foram comparadas entre os grupos com doença maligna e benigna através do teste t de Student.

Foram calculados sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo, e acurácia no diagnóstico de malignidade, com os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%), para escovados biliares.

O método de Kaplan-Meier foi usado para calcular e construir curvas de sobrevida dos pacientes com doença maligna. Os resultados da citologia e os valores de BT e BD foram usados para dividir os pacientes em grupos. O ponto de corte das bilirrubinas foi a mediana. As curvas foram comparadas usando o teste log rank.

Em todas as comparações, resultados de P inferiores ou iguais a 0,05 foram considerados significativos.

RESULTADOS Foram avaliados 50 pacientes consecutivos com estenose de ducto biliar submetidos a PCRE com citologia por escovado. O diagnóstico final de doença maligna, causando estenose da via biliar, foi feito em 40 pacientes: adenocarcinoma de pâncreas (18), colangiocarcinoma (17), neoplasia de vesícula biliar (2), metástases (2) e carcinoma neuroendócrino do pâncreas (1).

Observou-se doença benigna em 10 pacientes: pancreatite crônica (6) e estenose inflamatória (4).

Os pacientes foram acompanhados até julho de 2002 ou até o óbito. Apenas três do grupo com doença maligna estavam vivos ao término do estudo, sendo um caso de colangiocarcinoma ressecado cirurgicamente, com boa evolução após 14 meses de diagnóstico, e dois casos de câncer de pâncreas com 6 meses de diagnóstico: um submetido a cirurgia e outro em estádio avançado da doença. Entre os pacientes do grupo com doença benigna, todos estavam vivos após acompanhamento de 17 a 39 meses, exceto um com diagnóstico de pancreatite crônica. Tal paciente apresentou acidente vascular cerebral e tuberculose pulmonar no pós- operatório tardio de cirurgia de Whipple, com óbito 17 meses após a PCRE.

O número total de homens (25) e mulheres (25) incluídos no estudo foi idêntico, sendo que as mulheres representavam 55% do grupo com doença maligna e 30% daquele com doença benigna, sem diferença estatística. Os pacientes com doença maligna eram significativamente mais velhos (P= 0,02), com média de idade de 64 anos (42 a 82 anos), enquanto aqueles com doença benigna apresentavam média de 54 anos (39 a 68 anos).

Os valores de BT e BD estavam significativamente mais elevados no grupo com doença maligna (Tabela_1).

Os resultados da combinação dos escovados biliares obtidos nos 50 pacientes antes e depois de dilatação da estenose com dilatador de passagem de 10 Fr foram avaliados (Tabela_2). A combinação dos resultados foi considerada positiva, se pelo menos um escovado foi positivo. O material coletado foi insatisfatório para diagnóstico citológico em nove pacientes (18%).

A positividade do escovado foi maior nos casos de colangiocarcinoma (76,5%) do que no carcinoma de pâncreas (50%) e outros tumores (60%). O número pequeno de pacientes pode ser responsável pela ausência de significância estatística.

Os pacientes com doença maligna tiveram baixa sobrevida (Figuras 1, 2, 3, 4, 5). Foi analisada a sobrevida dos pacientes acometidos por doença maligna conforme os resultados da citologia por escovado e/ou os valores de BT e/ou BD.

Observaram-se complicações em seis casos: pancreatite aguda (dois), obstrução precoce de prótese (dois), sangramento após esfincterotomia de acesso (um) e um óbito 4 dias após o procedimento num paciente com perfuração de alça aferente, que apresentava gastrectomia com reconstrução a Billroth II e colangiocarcinoma em estádio avançado.

DISCUSSÃO Estenoses biliares com aspecto maligno podem ser encontradas durante a PCRE, mas a diferenciação precisa entre etiologia benigna e maligna continua sendo um desafio. A coleta de material dessas lesões durante a PCRE é a forma mais prática para obtenção de diagnóstico tecidual, pois tais pacientes são geralmente avaliados e tratados inicialmente com base nesse exame(10). Essas amostras teciduais têm papel valioso, principalmente na conduta daqueles pacientes que não são considerados candidatos à cirurgia. A definição diagnóstica durante a PCRE evita que o paciente seja submetido a outros testes invasivos e permite a instituição imediata de tratamentos paliativos(8).

O escovado, método escolhido para este estudo, é o mais utilizado na avaliação das estenoses biliares, por ser tecnicamente simples, seguro e rápido(13, 14, 25, 41, 45, 46). Vários estudos sobre a técnica do escovado surgiram desde a sua primeira descrição em 1975, por OSNES et al.(32).

De acordo com os resultados da presente pesquisa, a idade do paciente deve ser considerada na formulação da hipótese diagnóstica. A média de idade dos acometidos por doença maligna era 10 anos superior à daqueles com doença benigna.

Os maiores valores de BT e BD no grupo com doença maligna sugerem que as estenoses biliares malignas sejam mais acentuadas que as de origem benigna. No estudo de BUFFET et al.(5), envolvendo 100 pacientes com doenças biliopancreáticas malignas e benignas, o valor médio da bilirrubinemia também foi significativamente maior em doença maligna do que em doença benigna.

Alguns estudos(29, 30, 33, 42) excluíram os pacientes com citologia inadequada, obtendo conseqüentemente, sensibilidade mais elevada para câncer do que seria se todos os casos submetidos a escovado fossem analisados. No presente estudo, se os pacientes com material insatisfatório para avaliação citológica fossem excluídos, a sensibilidade para câncer aumentaria para 78,1%.

Amostras citológicas e histológicas obtidas de estenoses biliares geralmente são classificadas como malignas, benignas ou atípicas. O termo atipia ou displasia se refere a alterações celulares causadas por lesões neoplásicas, pré-neoplásicas ou inflamatórias, que têm algumas características de malignidade, mas insuficientes para sua classificação como tal(28, 38). Essas alterações celulares são geralmente encontradas na periferia de carcinomas, portanto a coleta inadequada pode resultar em interpretação de atipia(24). A atipia de alto grau levanta grande suspeita para a presença de câncer, mas a atipia de baixo grau pode estar relacionada à lesão benigna ou pré-neoplásica, devendo ser interpretada em conjunto com o quadro clínico do paciente(21, 24, 28).

Na presente série, os escovados com suspeita para malignidade ou atipia foram considerados como testes positivos para câncer na análise estatística, assim como nos trabalhos de VANDERVOORT et al.(45) e FARRELL et al.(10). LEHMAN(27) relatou que pacientes com suspeita de carcinoma de pâncreas e atipia em amostras teciduais de ducto biliar ou pancreático, apresentaram câncer em mais de 95% dos casos. De BELLIS et al.(9) sugeriram que as células atípicas identificadas pela citologia em seu estudo poderiam ter sido consideradas como malignas sem resultados falso-positivos.

A insinuação de que interpretações citológicas de atipia ou suspeita de malignidade sejam equivalentes à malignidade, porém, deve ser feita com extrema cautela. A premissa de que essas diferentes interpretações citológicas sejam equivalentes não é invariavelmente aceita(47). Resultados de avaliação citológica compatíveis com atipia devem estimular pesquisa mais vigorosa da lesão comprometendo o ducto biliar.

O tipo de tumor influencia o resultado do escovado e da biopsia intraductal(36, 43). A positividade do escovado biliar para o diagnóstico de colangiocarcinoma (44% a 80%) tem sido superior em relação ao câncer de pâncreas (15% a 37%)(9, 18, 30, 33, 35, 43, 45). Neste trabalho, a positividade do escovado biliar na detecção de colangiocarcinoma (76,5%) também foi superior à dos pacientes com carcinoma de pâncreas (50%) e outros tumores (60%). No início, tumores pancreáticos e metastáticos comprimem o ducto biliar extrinsecamente ou manifestam crescimento submucoso, sendo pouco provável que, escovando a superfície epitelial do ducto, eles sejam diagnosticados. Por outro lado, tumor primário de ducto biliar, originado do próprio epitélio ductal, é diagnosticado provavelmente com maior facilidade(12, 16).

A etiologia mais encontrada no presente estudo para estenose biliar foi câncer de pâncreas. Infelizmente, os sintomas mais comuns dessa doença (perda de peso, dor e icterícia) ocorrem quando o tumor está avançado. Os tumores que acometem a via biliar também se desenvolvem habitualmente sem sintomas precoces, sendo o diagnóstico realizado de forma tardia. Conseqüentemente, tanto câncer de pâncreas, quanto colangiocarcinoma e câncer de vesícula têm índices de sobrevida desanimadores e as formas de tratamento disponíveis têm pouco ou nenhum efeito no prolongamento da vida desses pacientes(31).

A sobrevida dos pacientes com doença maligna, constatada no presente estudo, foi muito baixa, menor do que 20% em 1 ano. Os pacientes com escovado positivo ou maiores valores de BT ou BD, analisados separadamente, apresentaram tendência a menor sobrevida, embora sem significado estatístico. A associação de citologia positiva ou BD >15,5 mg/dL no mesmo grupo de pacientes, elevou o nível de significância para menor sobrevida. a análise da sobrevida dos pacientes com citologia positiva ou BD >15,5 mg/dL ou BT >21,5 mg/dL, associados no mesmo grupo, foi significativamente inferior à dos demais (P= 0,05). Esse fato permite supor que os pacientes com citologia positiva ou níveis elevados de bilirrubinas (BT ou BD), provavelmente, se encontravam em fase mais avançada da doença. O diagnóstico citológico poderia, portanto, ser obtido com maior facilidade nessa etapa. Talvez o número de pacientes avaliados tenha sido pequeno para obtenção de significância estatística com a análise isolada da citologia e da bilirrubinemia.

Seis pacientes apresentaram complicações da PCRE, sendo dois casos de pancreatite aguda, dois pacientes com obstrução precoce da prótese biliar, um caso de sangramento em esfincterotomia de acesso e um de perfuração da alça aferente. Todos esses pacientes evoluíram satisfatoriamente, exceto o último, que tinha gastrectomia com reconstrução a Billroth II e colangiocarcinoma em estádio avançado, que evoluiu para óbito, apesar de tentativa de tratamento cirúrgico, 4 dias após a PCRE. Em estudo prospectivo publicado recentemente(4), que incluiu 621 pacientes com anastomose a Billroth II submetidos a PCRE, foram encontradas complicações em 4,7% (29/621) dos casos. A complicação mais freqüente foi perfuração (10 casos), sendo 5 de intestino delgado enquanto o endoscópio era manipulado dentro da alça aferente e 5 pacientes com perfuração retroduodenal.

CONCLUSÃO A positividade do escovado biliar para malignidade e os níveis elevados de BT e BD em pacientes com estenose biliar podem estar relacionados à doença avançada e, conseqüentemente, menor sobrevida. Estudos envolvendo maior número de pacientes são aguardados para melhor esclarecimento deste assunto.


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