Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

EuPTCVAg0254-02232003000100001

EuPTCVAg0254-02232003000100001

National varietyEu
Year2003
SourceScielo

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

EFEITO DA CASTA E DO PORTA-ENXERTO NO VIGOR E NA PRODUTIVIDADE DA VIDEIRA

-INTRODUÇÃO Na videira, como em qualquer planta enxertada, as funções metabólicas estão repartidas entre dois genótipos diferentes. Assim, enquanto o sistema foliar do garfo assegura a produção de fotoassimilados, o sistema radicular do portaenxerto fornece a alimentação hídrica e mineral. Deste modo, é natural que os estudos relativos às relações entre as castas, os porta-enxertos e as situações ambientais, assumam em viticultura uma particular relevância, devido à influência que exercem sobre a quantidade e a qualidade da produção.

A realidade vitícola nacional, com a sua diversidade de situações ecológicas, de castas, o aparecimento de clones seleccionados e de novos porta-enxertos, a complexidade das interacções e o facto de durante muito anos se ter privilegiado uma política de quantidade relativamente a uma perspectiva de qualidade dos produtos da vinha (Clímaco e Castro, 1991), justifica a importância de trabalhos nesta área.

A diversidade de trabalhos realizados, neste âmbito, nos principais países vitícolas (Pouget, 1978 e 1987; Carbonneau, 1985 e 1991; Conradie, 1988; Southey e Archer, 1988; Hidalgo, 1990; Striegler e Howell, 1991; Giorgessi e Pezza, 1992; Scienza et al., 1992; Pereira, 1997; Cordeau, 1998) mostra a importância que é dada ao conhecimento das combinações casta x portaenxerto para a obtenção de níveis qualitativos e quantitativos mais interessantes para um determinado terroir.

Este trabalho tem como objectivo o estudo da influência do porta-enxerto (99 R, 110 R, 140 Ru, 1103 P, SO4 e 41 B) no desenvolvimento e produtividade das cvs. Castelão (Periquita), Trincadeira e Camarate. A opção por estes hipobiontes teve em vista atingir alguns objectivos considerados prioritários: - testar o comportamento do SO4 em terrenos de encosta relativamente pobres e secos comparativamente ao 99 R, o porta-enxerto tradicionalmente utilizado em diversas regiões vitícolas, nomeadamente na Estremadura nestas condições ecológicas (Clímaco et al., 2003); - testar a capacidade de adaptação do 140 Ru (V. rupestris x V. berlandieri) e do 41 B (V. vinifera x V. berlandieri), os dois porta-enxertos mais resistentes ao calcário utilizados em Portugal (Clímaco, 1997), a condições de carência hídrica; - comparar o 110 R com o 99 R, agora com materiais de origem clonal; - avaliar o comportamento do 1103 P em relação aos porta-enxertos mais correntemente utilizados, dado tratar-se de um porta-enxerto de introdução relativamente recente na região da Estremadura, mas em franca expansão nesta região e na generalidade do país.

Relativamente às castas foi dada prioridade às tintas, sendo natural a escolha da cv. Castelão por ser a de maior expansão nas principais regiões vitivinícolas do Centro-Sul de Portugal, a cv. Trincadeira pela sua elevada capacidade de adaptação a condições de carência hídrica (Chaves, 1986) e a solos com elevados teores em calcário activo ou total (Clímaco e Castro, 1991). A cv.

Camarate por ser igualmente apta para a produção de VQPRD em diversas regiões da Estremadura e no Ribatejo.

MATERIAL E MÉTODOS O ensaio foi estabelecido num terreno de encosta com exposição Norte, possuindo um ligeiro declive no sentido S-N, situado na Quinta da Folgorosa, em Dois Portos (lat. 39º 02’ Norte; long. 09’ Oeste; alt. 222 m).

Segundo a classificação de solos da F.A.O./U.N.E.S.C.O. (1990), o solo enquadra-se, nos Cambissolos Calcários - CMc(1). De acordo com a classificação de Thornthwaite, o clima é mesotérmico, com nula ou pequena eficácia térmica no Verão, sub-húmido seco com superavit moderado de água no Inverno (B’2 C1 s) (Reis e Gonçalves, 1981).

Delineamento experimental e instalação do ensaio Os porta-enxertos foram plantados em Março de 1988 e, no ano seguinte, procedeu-se à enxertia no local definitivo, sendo o delineamento experimental do tipo split-plot com 5 repetições de três castas (tratamento principal) e seis porta-enxertos (sub-tratamentos). A unidade experimental de base é constituída por um conjunto de seis videiras contíguas.

A vinha está conduzida em espaldeira, segundo o sistema de poda longa, formando as duas varas um ligeiro arco sobre o primeiro arame. O compasso é de 2.80 m x 1.20 m, a orientação das linhas N-S e a carga média deixada à poda por cepa é de 16 olhos ( 47 600 olhos/ha), para todas as combinações casta x porta-enxerto em estudo.

A aramação é baseada em 4 arames: o situado a 0,50 cm do solo; os dois do meio são pareados e localizados a 35 cm do arame; e, finalmente, o último à distância de 1,30 m do solo.

Trata-se de uma vinha apta à produção de vinhos DOC Torres Vedras, constituída por três castas tintas: Castelão (Periquita), Trincadeira e Camarate e seis porta-enxertos: 99 R (clone 96), 110 R (clone 191), 140 Ru (clone 101), 1103 P (clone 112), SO4 (clone 73) e 41 B (clone 86).

O material clonal certificado referido foi proveniente de vinhas-mãe nacionais, instaladas a partir de material clonal de categoria “base” importado de França e submetidas a controlo pela DGPC. Quanto às castas, a proveniência do material vegetal é a seguinte: Castelão (Periquita) - material policlonal obtido no âmbito do projecto Selecção massal e clonal da videira; Trincadeira material termoterapiado na E.A.N. e proveniente do Viveiro Nacional do Escaroupim (DGPC); Camarate - selecção massal positiva da melhor vinha seleccionada no concelho de Torres Vedras.

À vindima procedeu-se anualmente ao registo da produção e colheita de bagos para determinação das características qualitativas dos mostos. De igual modo, à poda efectuou-se o registo do peso de lenha do ano.

Tratamento de dados Os resultados obtidos neste ensaio foram submetidos a análise de variância, tendo-se recorrido ao programa “Genstat .

Apesar do número relativamente baixo de características em estudo procedeuse, complementarmente, à análise dos resultados por taxonomia numérica, tendo-se efectuado a estandardização da matriz original dos dados e calculada a semelhança entre as diferentes situações em estudo, usando o coeficiente de correlação. Foi usado o método de agregação UPGMA (Unweighted PairGroup Method using arithmetic Averages), tendo-se calculado o coeficiente de correlação cofenética (Sockal e Rolhf, 1962) e a árvore de conexão mínima.

Em seguida foi efectuada uma análise em componentes principais (ACP).

Todos os cálculos foram realizados usando o conjunto de programas NTSYS (versão 2.1) (Rolhf, 1997).

RESULTADOS E DISCUSSÃO Análise do rendimento e da expressão vegetativa No Quadro I apresentam-se os resultados referentes à produção média de uva e de lenha de poda (1992/97) e do índice de Ravaz (F/V) por casta e por porta-enxerto. O rendimento foi influenciado, significativamente (P<0,01) quer pela casta quer pelo porta-enxerto. Todavia a existência de uma interacção significativa casta x porta-enxerto (P<0,01) exige uma análise detalhada dos efeitos.

A análise desta interacção casta x porta-enxerto, permite pôr em evidência um conjunto de questões que contribuem para um maior conhecimento das suas influências recíprocas. Assim, e começando por analisar a influência da casta no comportamento do porta-enxerto (Fig. 1) importa referir que: - a casta Castelão originou um rendimento significativamente superior ao das castas Trincadeira e Camarate independentemente do porta-enxerto em estudo; - a produção de uvas da casta Trincadeira, apenas é significativamente superior ao da casta Camarate quando ambas as cultivares se encontram enxertadas sobre 41 B;

-No que se refere à influência do porta-enxerto no comportamento da casta (Fig. 2) é de salientar que:

- quando se considera isoladamente a casta Castelão, verifica-se que o portaenxerto 41 B induz uma produção de uvas significativamente inferior à dos porta-enxertos 140 Ru, SO4 e 1103 P; nesta casta verifica-se, ainda, que o 110 R origina uma produção de uvas significativamente inferior à do 140 Ru; - no que se refere à casta Trincadeira, o porta-enxerto 1103 P induz um rendimento significativamente menor ao dos restantes porta-enxertos; -- relativamente à casta Camarate, o porta-enxerto 41 B apresenta uma produção de uvas significativamente inferior à do porta-enxerto SO4.

Quanto ao peso de lenha de poda (Quadro I e Fig. 3), verifica-se que a casta Trincadeira, por um lado, e os porta-enxertos 1103 P e 140 Ru, por outro, diferenciam-se muito significativamente (P<0,01) das restantes castas e portaenxertos por apresentarem maior expressão vegetativa. Pelo contrário, os portaenxertos 41 B e 110 R diferenciam-se muito significativamente dos restantes, pelo seu menor peso de lenha de poda e, consequentemente, pela sua menor área foliar (Champagnol, 1984; Carbonneau, 1991). De salientar, ainda, o bom comportamento do SO4 em termos de vigor ao superar, em terrenos de encosta e nas três castas em estudo o 110 R, porta-enxerto consagrado na região neste tipo de solos (Freitas e Pato, 1965).

Estes resultados apresentam um interesse particular quando analisados em conjunto com os referentes à produção de uvas das diferentes combinações casta x porta-enxerto em estudo. Assim, verifica-se que: - a casta Castelão é simultaneamente o epibionte que apresenta menor peso de lenha de poda e maior rendimento, o que é revelador do seu elevado potencial genético, quer a nível de adaptação, quer de produção, mesmo em condições de solo relativamente pobres; - a casta mais vigorosa (Trincadeira) quando enxertada no porta-enxerto que imprime ao garfo maior expressão vegetativa (1103 P) induz, mesmo nas condições edáficas acima referidas, a menor produção de uvas de todas as combinações em estudo. Este resultado contrasta bem com o excelente comportamento do 1103 P quando enxertado com Castelão, a cultivar menos vigorosa; - o porta-enxerto que imprime menor vigor aos garfos (41 B) induz também menor produção de uvas no caso das castas menos vigorosas (Castelão e Camarate) e uma produção intermédia quando enxertada numa casta vigorosa (Trincadeira).

O índice de Ravaz (Champagnol,1984) vem confirmar que o factor casta assume um papel extremamente importante, superando na maior parte dos casos o efeito porta-enxerto. É notória a eficiência demonstrada pela cv. Castelão relativamente aos restantes epibiontes. No que se refere aos hipobiontes, é de salientar a eficiência (maior produção de uvas por peso de lenha) das variedades que induzem menor vigor (41 B e 110 R) relativamente às variedades que imprimem uma maior expressão vegetativa (1103 P e 140 Ru).

Análise qualitativa dos mostos No Quadro II apresentam-se os resultados analíticos relativos à caracterização dos mostos (valores médios de 1992/97) por casta (referentes aos 6 portaenxertos em estudo) e por porta-enxerto (considerando, conjuntamente, as 3 castas em ensaio). Verifica-se que a interacção casta x porta-enxerto não se revela significativa qualquer que seja a característica qualitativa analisada, pelo que se passa a analisar isoladamente o efeito casta e o efeito portaenxerto.

Relativamente ao teor em açúcar dos mostos verifica-se que as castas Castelão e Trincadeira apresentam valores significativamente superiores (P<0,01) aos da casta Camarate, qualquer que seja o porta-enxerto considerado (Fig. 4).

-O porta-enxerto não induziu diferenças significativas na acumulação de açúcares no bago, qualquer que seja a casta em estudo (Castelão, Trincadeira ou Camarate).

No que se refere ao teor em acidez total dos mostos verifica-se que a casta Camarate apresenta valores significativamente superiores ao dos restantes epibiontes (P<0,01). O porta-enxerto 1103 P induz a produção de mostos significativamente mais ácidos do que o 110 R.

Os dados referentes ao índice de maturação da uva (relação açúcar/acidez) apresentam um comportamento semelhante ao do teor em açúcar, isto é, verificase a ausência de influência significativa do porta-enxerto e uma diminuição muito significativa (P<0,01) do estado de maturação da uva na casta Camarate, relativamente às restantes variedades em ensaio.

No que se refere ao pH, é de salientar que a casta Camarate apresenta valores significativamente inferiores (P<0,01) aos das cvs. Castelão e Trincadeira, os quais podem dar origem a vinhos excessivamente ácidos em termos organolépticos (Nagel e McElvain, 1977; Usseglio-Tomasset, 1993). No que diz respeito aos porta-enxertos o 110 R apresenta valores de pH significativamente inferiores (P<0,01) aos dos porta-enxertos 1103 P, 110 Ru, SO4 e 41 B, contudo, estas diferenças numa perspectiva enológica, têm um significado bastante reduzido.

A análise destes resultados, permite-nos concluir que os porta-enxertos em ensaio, actualmente os mais plantados em Portugal, não exercem, por si , influência na elevação dos valores do pH dos vinhos, facto que se verifica, com frequência, em algumas das nossas regiões vitivinícolas (Douro, Terras do Sado e Ribatejo, entre outras).

Análise em componentes principais Na Figura 5 são apresentadas as projecções das 18 combinações das três castas com os seis porta-enxertos num plano definido pelos dois eixos principais que em conjunto representam 93,9% da variância total implícita na matriz de dados original, resultante da ACP efectuada. A estas projecções foi sobreposta a árvore de conexão mínima, resultante da matriz de correlação entre as várias combinações em estudo, que mostrou inteira congruência com o fenograma calculado sobre a mesma matriz (não mostrado neste trabalho) usando o método UPGMA, que apresentou um coeficiente de correlação cofenética de 0,97. A análise desta última figura confirma os resultados discutidos anteriormente com base na análise de variância.

A distribuição espacial das combinações casta x porta-enxerto, resultante da ACP evidencia a influência preponderante do factor casta - Castelão (C), Trincadeira (T) e Camarate (Cm) - relativamente ao papel desempenhado pelo porta-enxerto, uma vez que é evidente a constituição de três grupos bem separados correspondentes a cada uma das castas. Assim, a cv. Castelão distingue-se pela sua superior produtividade, a cv. Trincadeira pela maior expressão vegetativa e mais elevado valor de pH, enquanto que a cv. Camarate se salienta por possuir os mais elevados teores em acidez total, os mais baixos teores em açúcar e, igualmente os mais baixos valores de pH.

Os resultados obtidos neste ensaio, em solos relativamente pobres e secos, e portanto, aparentemente, mais propícios às cvs. Trincadeira e Camarate do que à Castelão, deixam em aberto uma reflexão no que respeita ao papel destas castas nos encepamentos dos diferentes VQPRD’s existentes na região da Estremadura. Com efeito, é de muito conhecida de viticultores e técnicos vitícolas as dificuldades de adaptação destas castas quando implantadas em solos medianamente férteis e em climas com humidade relativa por vezes elevada durante o Verão devido à influência atlântica, tornando-as muito susceptíveis aos ataques de Uncinula necator (oídio) e de Botrytis cinerea (podridão cinzenta).

-CONCLUSÕES A análise global dos resultados obtidos permite concluir que o factor casta exerce uma influência preponderante relativamente ao efeito porta-enxerto.

Assim, a casta Castelão sobressai pelo seu elevado potencial genético e poder de adaptação, tendo permitido obter uma boa maturação da uva, apesar de possuir menor vigor e um rendimento significativamente superior ao das cvs.

Trincadeira e Camarate.

A casta Trincadeira distingue-se, essencialmente, pelo seu elevado vigor, sendo uma casta privilegiada no aproveitamento vitícola de solos particularmente secos e pobres.

A casta Camarate salienta-se, negativamente, pelo seu mais elevado teor em acidez total e por apresentar valores de pH e teores em açúcar significativamente inferiores aos das cvs. Castelão e Trincadeira.

O porta-enxerto 140 Ru manifesta excelente capacidade de adaptação às condições ambientais deste ensaio quer através de um bom desenvolvimento vegetativo, quer de um elevado rendimento e interessante nível qualitativo, independentemente da cultivar utilizada como garfo. Apesar destas performances o 140 Ru, apenas, conseguiu ser significativamente superior ao 99 R, o porta-enxerto de referência, na expressão vegetativa.

O SO4, em terrenos de encosta, induziu uma expressão vegetativa significativamente superior ao 110 R e ao 41 B, independentemente da casta utilizada como garfo.

Os porta-enxertos 99 R e 110 R apresentaram, uma vez mais, um comportamento bastante semelhante, não se tendo detectado diferenças significativas em qualquer dos parâmetros analisados. Contudo, confirma-se a habitual tendência para o 110 R conferir uma expressão vegetativa inferior à do 99 R, pelo que é, normalmente aconselhado para castas vigorosas (como a Trincadeira e o Aragonez) ou em solos com fertilidade mediana.

No que se refere ao 1103 P é de salientar, em primeiro lugar, a maior expressão vegetativa que confere aos epibiontes nele enxertados, apresentando, por outro lado, o mais baixo índice de Ravaz. Contudo, quando enxertado com a cv.

Trincadeira, a casta mais vigorosa, induz um significativamente menor rendimento do que os restantes porta-enxertos.

O porta-enxerto 41 B, apesar de ter originado, simultaneamente, um menor vigor e uma menor produção de uvas na casta Castelão, não induziu, qualquer acréscimo significativo a nível da acumulação de açúcares no bago, relativamente aos restantes porta-enxertos. Curiosamente, o 41 B, foi mesmo o porta-enxerto que apresentou menor teor em açúcar quando enxertado com Trincadeira.


Download text