Processo de Caracterização dos Centros de Aconselhamento e Detecção Precoce da
Infecção VIH/SIDA
Processo de Caracterização dos Centros de Aconselhamento e Detecção Precoce da
Infecção VIH/SIDA
Joana Soares Ferreira
Serviço de Higiene e Epidemiologia da Faculdade de Medicina da Universidade do
Porto
Foi construído um modelo matemático da epidemia de VIH nos Estados Unidos da
América (EUA) entre 2001 e 2004 e calculado o número de novas infecções que
teriam ocorrido se o nível de conhecimento do estado serológico permanecesse
constante. Este modelo mostrou que cerca de 6000 novas infecções pelo VIH foram
prevenidas durante o período em estudo. Os autores concluíram que o processo de
aconselhamento e teste voluntários (ATV) é, pelo menos parcialmente,
responsável pela prevenção de novos casos nos EUA e que, apesar de outras
medidas preventivas também poderem ter contribuído para esta tendência, o ATV
tem um papel claramente importante; como tal, deve continuar a ser uma alta
prioridade (1).
Foi neste contexto que decorreu o processo de caracterização dos Centros de
Aconselhamento e Detecção precoce da infecção VIH/sida (CAD), de Abril a
Setembro de 2008, o qual utilizou várias fontes de informação:
- A página de entrada da Coordenação Nacional para a Infecção VIH/sida (CNI
VIH/sida) - consultada para averiguar quais os CAD teoricamente em
funcionamento e seus contactos;
- Telefonemas ao responsável por cada CAD - ainda que, inicialmente,
destinados a apurar qual o melhor meio de fazer chegar o questionário descrito
abaixo, estes telefonemas foram, igualmente, informativos;
- Telefonemas que pretenderam reproduzir aquele que um cidadão com qualquer
nível de literacia faria para um CAD; estes telefonemas tiveram um guião pré-
estabelecido: a) A pessoa que telefonou começou por perguntar se seria
possível, naquele momento, dirigir-se ao CAD para ser testado; b) No caso de
resposta negativa, quando poderia; c) Seguidamente, inquiriu acerca da
necessidade de colheita de sangue e se lhe seria dito "logo se tenho
[teria] sida".
- Questionário para preenchimento pelo responsável pelo CAD para caracterização
do centro;
- Visita aos CAD da Lapa e do Porto, para enriquecimento da informação
coligida. Como o CAD da Região Autónoma dos Açores tem financiamento próprio,
não foi alvo deste processo de caracterização.
A CNI VIH/sida estabeleceu um protocolo com a Escola Nacional de Saúde Pública,
no sentido da prestação de serviços de consultoria técnica especializada com
vista à análise económica da estratégia de aconselhamento e teste precoce para
VIH/Sida em Portugal; como tal, a relação de custo-efectividade do diagnóstico
precoce e aconselhamento para VIH/sida em Portugal não foi, igualmente,
avaliada.
As recomendações que, a seguir, se apresentam têm inteira correspondência com
os resultados deste processo de caracterização. Assim recomenda-se que:
- A CNI VIH/sida seja atempadamente informada de alterações sobre o acesso aos
CAD, de modo a poder actualizar as informações que disponibiliza ao público e
que os materiais de divulgação dos CAD sejam datados e o leitor avisado disso
mesmo;
- O acesso telefónico ao CAD não seja através da instituição onde se sedia mas,
antes, que seja directo e que quem atende o telefone no CAD esteja apto a
prestar informações correctas ou a direccionar a chamada a quem o estiver;
- Cada CAD tenha, pelo menos, um dia que permita que trabalhadores com um
horário semelhante a das 8h30min às 13h00min e das 14h00min às 17h30min tenham
acesso ao teste;
- Se planeiem antecipadamente formas de substituir os profissionais quando tal
se revelar necessário;
- A CNI VIH/sida elabore orientações sobre os aspectos éticos e jurídicos
relacionados com o consentimento para a realização do teste por parte de
menores de idade;
- Todo o utente que se submete ao teste para a detecção da infecção pelo VIH
receba aconselhamento antes e depois do mesmo, idealmente pelo mesmo
profissional;
- Todos os profissionais que executam teste rápido recebam formação adequada
para o efeito;
- Sejam envidados maiores esforços de modo a que todo o utente que se submete
ao teste para a detecção da infecção pelo VIH conheça o seu resultado;
- Todos os testes para a detecção da infecção pelo VIH com resultado reactivo
sejam confirmados;
- A referenciação seja oferecida a todos os utentes com diagnóstico da infecção
pelo VIH, que, em todos os CAD, as barreiras à referenciação sejam identificadas
e resolvidas, que sejam estabelecidos acordos formais entre os CAD e os locais
para onde os utentes são referenciados (de modo a que fiquem bem definidos os
papéis, as responsabilidades e os procedimentos de cada colaborador da rede de
referenciação) e que os profissionais que pertencem à rede de referenciação
informem regularmente os restantes de alterações nos recursos humanos, nos
procedimentos ou noutros aspectos que possam influenciar a referenciação;
- Seja criado um circuito de informação formalmente definido para confirmar a
presença do utente em consulta hospitalar para a qual é referenciado (até para
o próprio CAD verificar o sucesso do aconselhamento pós-teste);
- A CNI VIH/sida elabore orientações sobre a notificação da infecção pelo VIH
nos CAD;
- Haja reuniões inter-CAD periódicas, com o intuito de troca de experiências e
harmonização de procedimentos, para que, de facto, o todo seja maior que a soma
das partes;
- A CNI VIH/sida mantenha os esforços em: reduzir o estigma e a discriminação,
aumentar a percepção do risco individual e transmitir à população geral os
benefícios de conhecer o estado serológico para a infecção, de modo a reduzir
barreiras à procura do teste;
- Auto-avaliações, monitorização e avaliação regulares sejam incluídos como
parte integral da rede, de modo a contribuir para a melhoria da qualidade do
ATV.
Estes procedimentos deveriam, idealmente, constar de um protocolo escrito.
Assegurar um nível de qualidade num CAD que fomente a procura do teste é um
desafio considerável. Contudo, a plataforma de aconselhamento e teste está aqui
para ficar; temos é de maximizar o seu uso na prevenção (2).